Nº 2593/2594 - Fevereiro/Março de 2018
Pessoa coletiva com estatuto de utilidade pública
Breve incursão sobre a conceção chinesa do Poder nas Relações Internacionais
Tenente-coronel
Manuel Alexandre Garrinhas Carriço

A conceção chinesa stricto sensu relativamente ao poder nas relações internacionais não é substancialmente díspar da avançada pelos cientistas políticos e filósofos ocidentais, denotando-se, no entanto, um forte pendor realista na forma como aquele é definido – justificado em grande parte porque as dinâmicas de poder entre Estados e a primeira tentativa de as estruturar teoricamente remontar ao período dos ‘Estados Guerreiros’ (481-221 a.C. – ano da reunificação da China e do início da Dinastia Qin).

Na verdade, vários autores chineses defendem que a génese da escola realista das relações internacionais teve a sua origem no período pré-imperial chinês, antes do referencial civilizacional ocidental dessa mesma escola realista que foi a Guerra do Peloponeso (431-404 a.C.), descrita na incontornável obra de Tucídides[1].

Para eles, o poder relativo, a política e a guerra requerem estratégias de cálculo do emprego de recursos normativos, económicos e militares, destinadas a vencer o adversário, mas limitando ao máximo o recurso à força armada, em linha com o recomendado com a literatura clássica e moderna chinesa sobre estratégia, como os ‘Sete Clássicos Militares Chineses’ (Wujing Qishu)[2], as ‘Estratégias Não-Ortodoxas’ (Fei Zhengtong Celue), o ‘Romance dos Três Reinos’ (Sanguozhi Pinghua), ‘Na Margem do Rio’ (Shui Hu Zhuan), ‘Viagem para o Ocidente’ (Xi You Ji), ‘Sonhos do Quarto Vermelho’ (Hong Lou Meng) e o ‘Pensamento Militar de Mao Zedong’ (Mao Zedong Junshi Sixiang).

A grande diferença da conceção chinesa reside na forma como o poder pode ser empregue, em que contextos e para que fins. Aqui, a herança do pensamento de Sun Zi, Lao Zi, Mozi, Guanzi, Confúcio, Mencio e Hanfeizi, assume-se como a referência incontornável quanto ao entendimento de poder e de como este deve ser empregue, no plano interno e na interação entre Estados no sistema internacional[3].

Para Sun Zi, o recurso à força destina-se a obter a submissão do adversário, sendo, no entanto, um dos instrumentos possíveis de serem utilizados para alcançar tal desiderato e apenas como a última das opções, daí o aforismo de ‘vencer sem combater representar a suprema competência do general’. A estratégia ideal passa pelo emprego integrado da diplomacia, do conhecimento das vulnerabilidades do adversário, da pressão psicológica e do isolamento deste, da debilitação da sua base de apoio interno e da dissimulação das capacidades e vulnerabilidades próprias.

Além dos contributos iniciáticos de Sun Zi, Lao Zi, Mozi, Guanzi, Confúcio e Mencio (como deterministas conceptuais) e de Hanfeizi (como determinista materialista), dois outros bem mais recentes, têm sido relevados como importantes para o conceito chinês de poder: o ‘poder ou autoridade humanista’ e o ‘Poder Nacional Abrangente’ (PNA).

O conceito de ‘poder humanista’ (Wang Dao) de Yan Xuetong recicla o pensamento de Mencio e adapta-o à contemporaneidade, consubstanciando-se como uma ‘terceira via’ (mais benigna) face às outras duas tipologias de poder, que considera existirem no sistema internacional: a tirania (apoiada no hard power); e a hegemonia (apoiada na combinação coerciva do hard e do soft power) – numa referência oblíqua aos EUA[4].

Este estrategista caracteriza dicotomicamente a ordem internacional segundo o modelo de Wang e Ba. O sistema Wang é centrado numa superpotência dominante (mas benigna), sem ambições expansionistas. O sistema Ba é uma hegemonia clássica, baseada no primado da força. Daqui deriva que, segundo a sua lógica, os EUA aplicam o Wang na sua relação com os aliados e o Ba ao nível global, algo que a China fez durante o apogeu do poder imperial, ainda que restricto ao espaço asiático e aos ‘povos bárbaros’.

O conceito de ‘poder humanista’ proposto por Yan, e que a China deve desenvolver, recauchuta preceitos filosóficos milenares ao radicar na noção de autoridade moral e na virtude como ‘cimento’ agregador e catalisador da legitimidade do poder político de um Estado, o qual deve ser conjugado sinérgica, mas benevolamente, com o hard e o soft power – na linha do preceituado pela ‘escola política’ chinesa do soft power. Se devidamente conduzida, a ‘autoridade humanista’ poderá inspirar o resto do mundo – ainda que tal seja um desiderato difícil de atingir, como o próprio autor reconhece[5]. Segundo o seu racional, a China não será hegemónica, mas será um líder cuja conduta moral pautará a sua futura preponderância no sistema internacional.

Na mesma linha, Gong Tieying propõe o reforço do poder institucional, do poder identitário (capacidade de um Estado em influenciar outros Estados, através do reconhecimento, por parte destes, da sua liderança) e do poder assimilativo (atratividade dos valores culturais, ideológicos e sociais) da China – numa variação semântica e construtivista de dois dos três conceitos formulados por Todd Hall e que adotamos neste estudo[6].

Esta argumentação de cariz benevolente está em sintonia com a narrativa oficial da grande estratégia de ‘desenvolvimento pacífico’ e da visão de ‘mundo harmonioso’, estando também presente na formulação de Zhang Weiwei da ascensão da China como um ‘Estado-civilização’[7], com base num discurso político de excepcionalismo civilizacional milenar único, moral e cultural que privilegia a sabedoria, a sensatez e uma maior responsabilidade, em prol do racionalismo do Estado e da evolução da humanidade, “comparativamente ao egocentrismo de auto-preservação e de maximização do interesse próprio, excessivamente jurídico e em busca constante da riqueza e do poder por parte do Ocidente”[8]. Aqui, a noção de civilização assume a vertente de um forte dinamismo identitário, em contraponto à noção ocidental que sugere esta influência como sendo distante, indireta e quase inerte. Por outras palavras – e metaforicamente –, subjacente a este discurso está uma mensagem subliminar de que a China existe quase desde início da Terra e que o primeiro homem foi o ‘homo erectus pekinensis’.

A proposta de Zhang traz ainda à tona a ‘homogeneidade do discurso político e ideológico chinês’, caracterizado por três dinâmicas, que elencamos no sentido decrescente da sua importância: a obtenção de consensos (gongshi); a busca de unidade (tuanjie); e a necessidade da propagação desse mesmo consenso através da educação da população (jiayu) e da transmissão de mensagens baseadas em slogans oficiais uniformizadores do pensamento[9].

Estes vectores resultam da concatenação de uma cultura milenar, de uma herança ideológica marxista e, não menos importante, da riqueza metafórica e alusiva da linguagem política chinesa, que faz com que significados do discurso político devam ser entendidos da mesma forma tanto pelo seu autor (i.e., Partido Comunista Chinês – PCC) como pela audiência chinesa, catalisando processos de associação psicológica com base em memórias construtoras de um discurso oficial assente numa revitalizada ‘grande narrativa de carácter étnico-civilizacional’.

Assim, não é de estranhar que Ye Zicheng subscreva também esta visão hipervalorativa da civilização chinesa, ao defini-la como:

“ […] Incorporando o melhor do marxismo com os valores e conceitos do socialismo chinês, concatenando o melhor do capitalismo com o repositório de valores tradicionais chineses associados à família, à moralidade e à ética. A civilização chinesa compensa as fraquezas da civilização ocidental e o seu poder nacional abrangente e influência estão destinados a aumentar, porque estão associados a verdadeiros valores universais como a paz e a estabilidade”[10].

Em consonância, Xu Jinlin incorpora esta argumentação ao defender um pluralismo cultural onde os Estados-nação são únicos na sua exclusividade cultural enquanto os Estados-civilização possuem um universalismo cultural independente do respetivo poder material, pelo que o objetivo da China deve ser o de ascender não como um Estado-nação poderoso, mas como um Estado-civilização. Concomitantemente, a sua cultura deve passar de uma fase em que tenta responder a questões como quem somos, de onde vimos e para onde devemos ir, para uma fase de questionar que valores são ou não bons[11].

Por fim, e numa perspetiva ainda mais realista, temos o conceito de ‘Poder Nacional Abrangente’ (Zonghe Guoli), desenvolvido no início da década de noventa do século passado, por Huang Shuofeng, sendo considerado por vários cientistas políticos chineses como “o maior contributo nacional para a teoria do poder nas relações internacionais” (na melhor tradição dos preceitos do determinismo materialista de Hanfeizi)[12].

A génese do PNA partiu do 14º Congresso do PCC, realizado em finais de 1992, que materializou o final de um ciclo de discussões relativo ao desenho de uma grande estratégia. Este processo conduziu à aprovação de um conceito político-estratégico de desenvolvimento do potencial económico e do estatuto internacional (guoji diwei) da China, assente numa estratégia de ‘competição pelo Poder Nacional Abrangente’ (zhonghe guoli jingzheng), que até hoje tem sido o ‘fio-de-prumo’ da métrica que afere a ascensão da China na escala de poder do sistema internacional, particularmente face aos EUA.

Estas preocupações com a validação de um sistema de cálculo do poder nacional são compreensíveis e não são exclusivas, espelhando o receio de que a ausência de um bom ‘sistema métrico’ de avaliação do shi possa conduzir a défices de informação estratégica que resultarão em exageros ou em amielias de atuação passíveis de pôr em causa a estabilidade e o poder do Estado[13]. Tais situações, a ocorrerem, revelar-se-iam complicadas para uma China, pois as suas acções contam mais do que as suas intenções, podendo aquelas resvalar para processos de maior integração ou de exclusão do sistema político internacional, ao qual Pequim pretende permanecer acoplada (se bem que, segundo a sua própria narrativa e conceção restritiva de salvaguarda e defesa do superior interesse nacional).

Para os analistas chineses, a importância da aferição do PNA é o reflexo directo de uma necessidade premente de prospectivar e hierarquizar a posição da China no sistema internacional, materializando-se como um instrumento de medição e comparativo, indispensável à concretização de avaliações do potencial estratégico[14]. O PNA simboliza a categorização e combinação de um conjunto de condições e potencialidades de um determinado país em numerosas áreas, sendo um aferidor do poder relativo de um Estado num sistema internacional competitivo, caracterizado pela ascensão e queda de potências[15].

Se, aquando do período bipolar, o poder de um Estado era largamente determinado pela sua capacidade militar, no ‘atual período unipolar em evolução para uma multipolaridade’, o poder militar já não é por si só o elemento definidor de poder nacional relativo. Na verdade, a economia, a ciência e a tecnologia, assumiram-se como elementos cada vez mais fulcrais na acesa competição pelo poder e influência internacional[16].

A formulação de PNA desenvolvida por uma equipa liderada pelo então Coronel Huang Shuofeng, da Academia de Ciências Militares, é a sistematização e concatenação evolutiva do pensamento estratégico de Sun Zi, Hanfeizi, Mao Zedong e Deng Xiaoping, conjugado com as quatro modernizações de Zhou Enlai de 1964 (agricultura, indústria, ciência e tecnologia, defesa nacional), tendo como baseainda que não reconhecidoo conceito japonês de Segurança Multidimensional de 1980.

Segundo a definição oficial avançada por Zhong Cai, o zhonghe guoli refere-se “à agregação do poder económico, militar e político de um país num determinado período. Sinaliza o seu nível de desenvolvimento e a sua posição relativa no seio do sistema internacional. Inserido no PNA, o poder económico – incluindo vetores como os recursos humanos e materiais – é o factor determinante e a base do poder político e militar de um país”[17]. O PNA mede e afere a contribuição de factores económicos, científicos, tecnológicos, educativos, culturais, militares, de governo e diplomáticos na determinação do poder dos Estados e da sua competição no sistema internacional, sendo entendido por Ye Zicheng como “a agregação da capacidade de sobrevivência, de desenvolvimento e de influência internacional da China, onde a última é o resultado das duas primeiras”[18].

O PNA permite ainda integrar as duas categorias de poder quanto ao critério da sua produção (entidade) numa dimensão unificadora e comportamental (relação). Concatena uma categoria mensurável (hard poweryin shili) e uma não-mensurável (soft powerruan shili)[19], esta passível de projecção segundo um prisma de actuação bem definido.

Justifica-se, então, a prioridade conferida pela liderança ao desenvolvimento económico, que se prefigura como o factor determinante e caracterizador da grande estratégia de Pequim. O objetivo, como anteriormente referido, visa transformar a China ‘numa sociedade moderadamente próspera, em 2020 e num país próspero, em 2050’, reforçando, até lá, a base industrial e tecnológica inerente à necessidade de construir umas ‘forças armadas modernas e fortes’ (até 2035): objectivos do ‘duplo centenário’ e um dos pilares do ‘sonho da China/chinês’ de Xi Jinping (‘o rejuvenescimento nacional’ – minzu fuxing’[20]).

Para o Grupo de Trabalho sobre o PNA, este é decomposto em:

– Poder básico: que caracteriza o ambiente envolvente à China e contra o qualcomo Estado soberanosobrevive e se desenvolve (inclui a sua localização geográfica, quantidade e qualidade educativa da sua população, recursos naturais e espírito nacional que agrega diversos grupos sociais, unindo-os em torno da identidade nacional);

– Poder económico: que remete para a capacidade industrial agrícola, comercial, financeira e tecnológica chinesa;

– Poder de segurança nacional: que se reflecte na sua capacidade de defesa e dissuasão (que inclui o arsenal nuclear);

– Poder diplomático: que se aplica à capacidade de influência chinesa nos assuntos internacionais por intermédio das suas actividades diplomáticas;

– Poder organizacional e coordenador: que transmite a capacidade da China em gerir os recursos disponíveis, de modo a alcançar objectivos estratégicos nacionais;

– Poder moral e cultural: que reflecte as atitudes políticas, as crenças e o carácter nacional da população; e

– Capacidade de tomada de decisões corretas, em termos de política interna e externa, baseadas num conhecimento consolidado dos problemas internos e externos da China (i.e., shi)[21].

E como é calculado o PNA?

Este, caracteriza-se pelo ‘particularismo algorítimico’ ao rejeitar quer os métodos clássicos ocidentais[22] (como o norte-americano, baseado no produto interno bruto[23]) quer os marxistas-leninistas[24]. Tem por base fatores qualitativos e quantitativos que mereceram o consenso da comunidade académica chinesa. Os principais vectores qualitativos de análise e que contemplam a ‘envolvente’ (shi) ao país são: o impacto da Revolution in Military Affairs (RMA) e das tecnologias da informação; a competição económica; a estrutura política organizacional nacional; e a grande estratégia nacional.

Atualmente, existem duas fórmulas de cálculo aprovadas: a conservadora (da Academia de Ciências Militares do EPL – Junshi Kexue Yan Jiu Yuan) e a reformista (da Academia Chinesa de Ciências Sociais – Zhongguo Shehui Kexueyuan).

A conservadora é baseada em quatro subsistemas (poder político, poder da política externa, poder da ciência e tecnologia e poder da defesa nacional), cada um desdobrado em vários índices[25]. A reformista baseia-se em oito subsistemas desdobrados em 64 índices, que, por sua vez, são classificados em sub-índices de hard power e soft power. Os subsistemas são inseridos numa matriz polimórfica assente em métodos de cálculo que combinam algumas (poucas) variáveis da fórmula de Ray Cline e mais algumas da fórmula japonesa de ‘segurança multidimensional’, criada em meados da década de oitenta do século XX. Os índices são divididos em dois grupos de sub-índices directos e indirectos (conforme a sua relação e influência no crescimento do PIB). A todos eles são afetados factores de ponderação.

Vários estudos sobre a ascensão de grandes potências no sistema internacional sugerem que o poder nacional é, em último caso, o produto da interação de dois componentes: a capacidade de um país em dominar os ciclos de inovação económica e tecnológica num determinado período histórico, o que se repercute na aplicação dos frutos desse domínio na construção e modernização das suas capacidades militares, as quais, por sua vez, reforçam o potencial económico nacional[26]. Estes dois componentes, ao mesmo tempo que produzem uma ordem política estável – mantida por razões de manifesto interesse estratégico –, podem beneficiar, ainda que de forma não tão directa, o sistema internacional como um todo.

Se esta ideia representar a génese e o tellos do poder no sistema político internacional, então os estudos sobre o poder nacional relativo (ou abrangente) de um país deverão ter em atenção o esforço do Estado no investimento e desenvolvimento de recursos que lhe poderão conferir benefícios no ambiente da competição internacional, pelo talento e pela inovação económica e tecnológica[27].

Em conclusão, o conceito de PNA está alicerçado numa visão ‘pseudo-darwiniana’ e realista do sistema internacional, encontrando a sua justificação numa base não atomística da noção de poder, ao abrigo da qual o sucesso da China na competição global depende da sua capacidade em implementar e controlar os ciclos de desenvolvimento económico e tecnológico e de maximizar as mais-valias que daqui possa retirar: “a condição sine qua non para poder assumir o estatuto de grande potência que em tempos foi seu e que agora reclama, justificadamente”[28]. Ou seja, “tal estatuto é um objectivo que conduzirá a uma maior segurança e prestígio internacional da China”[29].

Da conceção determinística do PNA derivam três perspetivas sobre a sua projeção, as que derivam de distintas interpretações sobre a essência da cultura estratégica chinesa (que analisaremos mais detalhadamente no capítulo seguinte)[30].

A primeira é a ‘perspetiva pacífica’ (culturalista), ao abrigo da qual os chineses vêm-se e querem ser vistos como um povo pacífico, cujas guerras que travaram tiveram um intuito meramente defensivo e sempre como último recurso, e que apresenta como corolário uma “concepção humanista das relações internacionais e intenções não-beligerantes”[31]. Esta perspetiva socorre-se da tradição filosófica milenar chinesa assente nos ensinamentos de Confúcio, Mencio e Lao Zi, para justificar a aversão ao conflito bem como uma narrativa de particularismo cultural associada a uma visão distinta quanto à interação entre os atores do sistema internacional (harmoniosa vs. conflitual; hegemónica vs. tirânica). A importância desta dimensão cultural é sublinhada por Lucian Pye, ao argumentar que o “poder é extremamente sensível a nuances culturais e, por isso, tais variações são determinantes para se aferirem desenvolvimentos políticos”[32], os quais se repercutem no plano interno e no plano externo aos Estados, como sublinham Peter Katzenstein, Muthiah Allagappa, Yan Xuetong e Zhang Weiwei[33].

A perspetiva funcionalista não crê na ‘benignidade absoluta’ do poder e respetiva projeção, refutando o argumento do particularismo cultural em favor de uma lógica mais próxima da escola realista, defendendo que são as diferenças na estrutura interna e externa dos e aos Estados que estabelecem as destrinças quanto à forma e aos objectivos e a aplicação do seu poder relativo[34].

A perspetiva determinista que deriva da funcionalista, argumenta que a cultura chinesa não é mais pacífica do que as outras, socorrendo-se dos aforismos filosóficos de Confúcio, Mencio, Sun Zi e de Hanfeizi para ilustrar que, apesar destes não serem apologistas do recurso indiscriminado e coercivo do poder – preferindo enfatizar a virtude da dimensão ética e moral dos homens –, justificam o seu emprego em última instância e apenas para ‘depor a tirania’[35]. Esta perspetiva faz a análise da cultura estratégica aquando do período dos ‘Estados Guerreiros’ para demonstrar a existência de um ‘paradigma de realpolitik’ (qiangquan zhengzhi), denominado, por Allastair Iain Johnston, por ‘cultura estratégica parabellum’, insinuando uma possível transposição e aplicação à contemporaneidade através de uma ‘estratégia calculista’ de emprego da força na defesa da sua soberania e integridade territorial – por sua vez, legitimadora da credibilidade e autoridade interna do PCC[36].

Qual destas três perspetivas de emprego do poder será atualmente a mais prevalente é a grande questão. Os sinais emitidos têm sido ambivalentes, revelando um misto das três, como bem resume David Shambaugh, ao afirmar que:

“As tradições chinesas em termos de política externa valorizam a constante mudança de alinhamentos táticos, o balance of power, a independência e a manipulação em prol da preservação da autonomia e da liberdade de acção, a personalização da sua política externa, uma propensão para o recurso a ações militares militares punitivas contra países vizinhos, a adoção de um padrão de escalada na gestão de conflitos, e o recurso à propaganda e a mitos para legitimar a identidade chinesa. Com o tempo tem havido uma obsessão crescente com a recuperação do estatuto da China e de práticas ritualísticas (como o salvar da ‘face’ na interacção com estrangeiros), a que se junta um intenso nacionalismo”[37].

Na mesma linha de pensamento, Alastair Johnston conclui que “mesmo a crescente socialização da política externa chinesa, derivada da sua crescente participação em regimes e organizações internacionais, não é demonstrativa de uma alteração fundamental da sua cultura estratégica, ideologia ou de que tenha trocado a realpolitik por noções em voga como as de segurança cooperativa”[38]. O conceito maoísta de ‘contradição’ (maodun), a interpretação da ‘dialética dos opostos’ (de base filosófica daoísta) conjugada com a interpretação dos pensadores clássicos do período dos ‘Estados Guerreiros’ e adaptada à análise das relações internacionais contemporâneas que é feita por académicos e estrategistas chineses, torna a criação de um corpo de pensamento teórico chinês uma tarefa apelativa e complexa – como já haviam reconhecido Mao Zedong e Zhou Enlai[39] –, mas não está menos enferma de ambiguidades entre a sua teoria e prática quanto a sua congénere ocidental[40].

Estas, são reflexo, segundo David Shambaugh, de “‘uma crise de identidade internacional da China’, dada a multiplicidade de identidades e objectivos concorrentes entre si e que procura acomodar na condução da sua política externa, sendo expressas na frase ‘as grandes potências são a chave, as áreas geográficas vizinhas são a primeira prioridade, os países em desenvolvimento a base e os fóruns multilaterais importantes’” (daguo shi guanjian, zhoubian shi shouyao, fanzhanzhong guojia shi jichu, duobian shi zhongyao wutai)[41].

Em decorrência, e no plano geoestratégico a projeção do seu poder (hard e soft) é conduzida segundo uma conceção geográfica de prioridades, assente em quatro anéis de segurança. O primeiro anel incorpora o território que a China administra e reivindica (incluindo Taiwan, algumas ilhas no Mar do Sul da China e algumas ilhas no Leste do Mar da China); o segundo anel envolve os 14 países com os quais faz fronteira (cinco dos quais entrou em guerra nos últimos 70 anos); o terceiro anel abrange seis regiões geopolíticas bastantes distintas entre si e com riscos políticos, diplomáticos e de segurança muito específicos (nordeste asiático, Oceânia, sudeste asiático, sudoeste asiático, sul da Ásia continental e Ásia central); e o quarto anel engloba as áreas para além da sua vizinhança imediata (onde Pequim tem os principais mercados, muito do seu investimento, de onde importa a maioria do seu petróleo, e onde procura cativar simpatia e aliados em prol da sua visão e das propostas de reforma do normativo internacional vigente)[42].

No entanto, diga-se que esta moldura geográfica não mitiga os inúmeros debates académicos e políticos internos que relevam quer o dilema identitário, quer as dúvidas quanto ao que a China quer ser: a visão de ‘mundo harmonioso’; a grande estratégia (se existe ou não e como pode ser conduzida[43]); a estrutura da ordem internacional (unipolar ou progressivamente multipolar[44]); a governação global e o multilateralismo global e regional[45]; e o soft power[46].

A projeção do seu poder revela, atualmente, uma combinação de insegurança interna com um relativo excesso de confiança externa quanto à sua posição global (roçando, por vezes, a arrogância), mas que coexiste com uma relutância em se envolver em conflitos que envolvem outros países, por receio das consequências percetivas que estes possam trazer. Como refere Yin Chengde, a China quer identificar-se com’ (rentong) e ‘fundir-se na’ (rongru) comunidade regional asiática e global, mas receia influências que visem a sua ocidentalização (ziwo xihua), que possam pôr em causa a harmonia das suas relações externas e internas”[47]. Zhu Feng é mais crítico, ao afirmar que “Pequim quer fazer Acordos sem partilhar as responsabilidades, não estando ainda preparada psicologicamente para ser uma potência da qual se possa efetivamente depender para liderar”[48] – um desfasamento entre o seu ‘poder representacional’ (biaoda nengli) e ‘poder reputacional’ (shengyu dianyuan).

Esta sintomatologia da sua política externa é o reflexo das constantes preocupações quanto ao impacto interno que uma determinada política ou ação externa possa vir a ter, pelo que existe um amplo espectro de discursos de identidade internacional da China, que incorpora ‘nativistas’, ‘realistas’ (ofensivos e defensivos), defensores do ‘Clube das Grandes Potências’, do ‘Clube Ásia em primeiro lugar’, do ‘Sul Global’, ‘do multilateralismo seletivo’ e os ‘globalistas’[49].

No atual comportamento da sua política externa observamos uma combinação em maior ou menor grau de todas estas perspetivas identitárias, ainda que o centro de gravidade da sua identidade internacional esteja localizado nos ‘realistas defensivos’, com uma forte atração gravítica aos ‘nativistas’ e uma menor influência das escolas das ‘Grandes Potências’ e do ‘Sul Global’ – um espelho da interacção complexa entre o EPL (onde se subscreve a visão dos ‘realistas defensivos e ofensivos’ e dos ‘nativistas’) e o Ministério dos Negócios Estrangeiros (onde existe uma predilecção pelas perspetivas do ‘Clube das Grandes Potências’ e do ‘Sul Global’[50].

Em resumo, a identidade realista da China e a sua narrativa de cariz pacífico (i.e., ‘mundo harmonioso’, ‘desenvolvimento pacífico’, ‘ganhos mútuos’) são como o ‘yin e o yang’, espelhando a natureza ambígua dos seu discurso no plano das relações internacionais, demonstrando mais um racionalismo instrumental do que um tão propalado moralismo, pelo que não se deve confundir ideias ou ideais chineses com as respectivas realidades, nem esquecer que quanto ao emprego do seu poder, Pequim é pragmática: é paciente, a longo prazo e flexível, no curto prazo.

Como alerta Shaohua Hu, “o discurso pacífico da China não deve transmitir a noção de que os chineses possuem uma autoridade moral superior à de outros povos ou que não venerem o emprego do poder”[51]. Na verdade, nunca foi refutada a possibilidade de o país recorrer ao emprego do poder militar, desde que autojustificado moralmente, porque assumir o compromisso de preservar a paz e harmonia não significa refutar o emprego da força em prol da manutenção da paz e da criação da paz[52]. Esta é para Yu Xintian uma perspetiva pragmática que “integra idealismo com realismo, tornando o primeiro mais claro e o segundo mais exequível”[53].

A grande questão que se coloca é a de saber o que a China quer ser, algo que parece ainda não ter sido bem definido, apesar do conceito de ‘sonho da China/chinês’. Daí a defesa na liturgia oficial de uma weltanschauung tão genérica e com base em particularismos culturais, filosóficos e civilizacionais (e.g., ‘mundo harmonioso’) que não esconde a vantagem velada de não “fechar a atual janela de ´oportunidade estratégica’ (zhanlue jiyi qi)[54]” (entretanto, alargada de 2020 para 2025) nem de descartar janelas de oportunidade que após esta data. A China pode ser tudo e nada, ao mesmo tempo, tanto para quem formula e operacionaliza a sua política e estratégia como para quem a percepciona e dela é sujeito passivo ou ativo das suas acções.

Não obstante, a temporização dos seus objectivos estratégicos, a médio e longo prazo, revelam uma forte dinâmica identitária associada ao poder representacional, estando em consonância com a ‘agenda para os dois centenários’, onde o conceito de ‘sonho da China/chinês’ pretende guiar o desenvolvimento do país durante a próxima década e revitalizar a sua imagem externa, também como parte de um projecto de nation branding, ao abrigo do qual a China é caracterizada como uma potência pacífica mas não pacifista.

Dada a ligação que é feita entre o conceito de ‘sonho da China/chinês’, o estatuto, a imagem externa, a identidade internacional e a forma como a China define o seu poder relativo e a respectiva projecção nos vários domínios (justificando-a como tendo intuitos benignos associados ao desenvolvimento humano[55]), o telúrico debate interno sobre esta instrumentalização, expressa os desafios, dilemas, contradições e constrangimentos com que o país se confronta no sistema internacional. Esta é uma das muitas e exigentes tarefas que Xi Jinping terá de dirimir durante os seus vários mandatos.

 


* Adaptação de uma secção do capítulo 3 do seu livro intitulado “Harmonizando o Poder: Imagem, Diplomacia Pública e Diplomacia Militar da China”. O autor agradece a autorização de publicação concedida pela editora Letras Itinerantes.

**    Vogal da Direção da Revista Militar. Assessor do Instituto de Defesa Nacional.

 

[1]  Ver Yan Xuetong (1996). Analysis of China’s National Interests. Disponível em http://cns.miis.edu/books/pdfs/China_national_interests.pdf. [acedido em 20 de agosto de 2013]. Yan Xuetong (2006). “The Rise of China and its Power Status”. The Chinese Journal of International Politics nº1, pp. 5-33. Disponível em http://cjip.oxfordjournals.org/content/1/1/5.full [acedido em 20 de agosto de 2013]. Hu Angang (2000). Daguo Zhanlue Liyi yu Shiming (Estratégia de Grande Potência: Interesses e Missões). Liaoning: Liaoning Renmin chubanshe. Liu Yazhou (2004). Da Guoce (A Grande Estratégia Nacional). Disponível em http://www.yannan.cn/data/detail.php. [acedido em 20 de agosto de 2013]. Peng Guangqian e Yao Youzhi (2005). The Science of Military Strategy. Beijing: Military Science Press. Liu Mingfu (2010). Zhongguo Meng: Hou Meiguo Shidai de Daguo Siwei yu Zhanlue Dingwei (O Sonho da China: Pensamento de Grande Potência e Orientação Estratégica na Era Pós-Americana). Beijing: Zhongguo Youyi Gongsi chubanshe. Ye Zicheng (2011). Inside China’s Grand Strategy: the Perspective from the People’s Republic. Lexington: University of Kentucky Press. Yan Xuetong refere que “a China passou das noções de ordem hegemónica de Guanzi e de ordem moral de Confúcio para o realismo de Hanfeizi, enquanto o Ocidente passou do idealismo jurídico internacional de Grócio para o realismo”. Yan Xuetong (2011). Ancient Chinese Thought, Modern Chinese Power. New Jersey: Princeton University Press, p. 24. Ver Yu-lan Fung [1948] Derk Bodde (ed.) (1997). A Short History of Chinese Philosophy: A Systematic Account of Chinese Thought from Its Origins to the Present Day. New York: Free Press, p. 178. Warren Cohen (2001). East Asia at the Center: Four Thousand Years of Engagement with the World. New York: Columbia University Press, p. 478 e p. 483.

[2]    A melhor compilação é a edição anotada de Ralph Sawyer (ed.) (1993). The Seven Military Classics of Ancient China. Boulder: Westview Press.

[3]    Yan Xuetong (2011). Ancient Chinese Thought, Modern Chinese Power. New Jersey: Princeton University Press, p. 26. Ver ainda Theodore de Bary e Irene Bloom (1999). Sources of Chinese Tradition: From Earliest Times to 1600. New York: Columbia University Press, pp. 24-223. Arthur Waley (1991). Three Ways of Thought in China. Stanford: Stanford University Press.

[4]    Yan Xuetong (2011). Op. Cit., p. 6 e pp. 10-11. Para uma boa revisão crítica à obra, ver Linsay Cunningham-Cross e William Callahan (2011). “Ancient Chinese Power, Modern Chinese Thought”. The Chinese Journal of International Politics4, pp. 349-374. Disponível em http://cjip.oxfordjournals.org/content/4/4/349.full.pdf+html [acedido em 20 de agosto de 2013].

[5]    Yan Xuetong (2011). Op. Cit., p. xii, p. 2, p. 6 e pp. 15-16.

[6]    Gong Tieying (2007). “Lun Ruan Quanli de Weidu” (Sobre as Dimensões do Soft Power). Shijie Jingji yu Zhengzi 9 (Economia e Política Mundial), pp. 16-22.

[7]    Para uma crítica a este conceito, ver Lucian Pye (1990). “China: Erratic State, Frustrated Society”. Foreign Affairs nº 1, pp. 56-74. Disponível em http://www.polonews.info/documenti_originali/Repubblica%20popolare%20(1976%20in%20poi)/Pye%20Lucian_1990.pdf [acedido em 20 de agosto de 2013].

[8]    Zhang propõe oito ideias basilares para a nova narrativa política da China: obter a verdade a partir dos factos (shishi qiushi); primazia ao bem-estar da população (minsheng weida); pensar de uma forma holística (zhengti siwei); governar com virtude (zhengfu shi biyaodeshan); boa governação (liangzheng shanzhi); ganhar os corações e mentes da população e prioridade à meritocracia (minxin xianbei xuanxian renneng); aprendizagem seletiva e adaptação (jianshou bingxu); e harmonia e moderação (hexie zhongdao). Zhang, Weiwei (2012). The China Wave: Rise of a Civilizational State. Singapore: World Scientific, p. 27, p. 63 e pp. 125-138. A dimensão cultural deste excecionalismo é também defendida acérrimamente por Pan Wei (2009). “Dangdai Zhonghua Tizhi: Zhongguo Moshi de Jingji, Zhengzhi, Shehui Jiexi” (O Moderno Sistema Chinês: Análise do Modelo Económico, Político e Social da China) em Pan Wei (ed.), Zhongguo Moshi Jiedu Renmin Gongheguo de 60 Nian (O Modelo da China: Lendo 60 Anos da República Popular da China). Beijing: Zhongyang Bianshi chubanshe, pp. 3-85.

[9]    Neil Renwick e Cao Qing (1999). “China’s Political Discourse Towards the 21st Century: Victimhood, Identity and Political Power”. East Asia 4, pp. 111-143. Disponível em http://www.psa.ac.uk/journals/pdf/5/1999/renwick.pdf, p. 120 [acedido em 2 de agosto de 2013].

[10]    Ye Zicheng (2011). Op. Cit., p. 85.

[11]    Ver Xi Jinlin (2013). “Is China Able to Rise as a Civilization? And How?”. Fudan Journal of the Humanities and Social Sciences 1, pp. 15-32.

[12]    Ver Huang Shuofeng (1992). Zhonghe Guoli Lun (Sobre o Poder Nacional Abrangente). Beijing: Zhongguo Shehui Kexue chubanshe. Wang Songfen (ed.) (1996). Shijie Zhuyao Guojia Zonghe Guoli Bijiao Yanjiu (Estudo Comparativo do Poder Nacional Abrangente dos Países Mais Importantes do Mundo). Changsha: Hunan chubanshe. Zhongguo Xiandai Guoji Guanxi Yanjiu Suo (Instituto da China para a Relações Internacionais Contemporâneas) (2000). Zhonghe Guoli Pinggu Xitong: Yanjiu Baogao (Sistema para Estimar o Poder Nacional Abrangente: Relatório de Investigação). Beijing: CICIR. Hu Angang (ed.) (2003). Zhongguo da Zhanlue (Grande Estratégia da China). Zhejiang: Renmin chubanshe. Hu Angang e Meng Honghua (2002). “The Rise of Modern China (1980-2000): Comprehensive National Power and Grand Strategy”. Disponível em http://www.irchina.org/en/xueren/china/pdf/mhh3.pdf [acedido em 20 de agosto de 2013]. Sobre os diversos think tanks chineses dedicados a este conceito e as respetivas fórmulas de quantificação, ver o estudo de referência de Michael Pillsbury (2000). China Debates the Future Security Environment. Washington: National Defense University Press, pp. 203-256. Disponível em http://www.fas.org/nuke/guide/china/doctrine/pills2/part08.htm [acedido em 14 de março de 2012]. Parte desta secção dedicada ao conceito de PNA foi adaptada e atualizada a partir de Alexandre Carriço (2006). De Cima da Grande Muralha: Política e Estratégias de Defesa Territorial da China, 1949-2010. Lisboa: Prefácio, pp. 459-465.

[13]    Sintomatologia também aplicável à Índia, onde a Foundation for National Security Research publicou, em 2012, o seu National Power Index, no qual os EUA ocupam o primeiro lugar, seguido da China e a Índia no oitavo lugar, entre 27 países. Os critérios de medição do poder nacional e as conclusões do relatório estão disponíveis em http://www.fnsr.org/index.php?option=com_content&view=article&id=4173 [acedido em 22 de agosto de 2013].

[14]    Peng Guangqian e Yao Youzhi (2005). Op. Cit., pp. 41-42. A Academia Chinesa de Ciências Sociais (Zhongguo Shehui Kexueyuan) continua a publicar avaliações anuais do PNA da China e de onze outros países (Alemanha, Brasil, Canadá, Coreia do Sul, Estados Unidos da América, França, Índia, Itália, Japão, Reino Unido e Rússia) no seu ‘Livro Amarelo da Política Internacional’. Ver Zhongguo Shehui Kexueyuan (2013). Guoji Zhengzhi Huangpishu (Livro Amarelo da Política Internacional). Beijing: Zhongguo Shehui Kexueyuan chubanshe.

[15]    Em finais de novembro de 2003, a 9ª sessão de estudo do Comité Político do PCC, presidida por Hu Jintao, foi dedicada ao estudo da história de nove países, desde o século XV: Portugal, Espanha, Holanda, Grã-Bretanha, França, Alemanha, Japão, Rússia e EUA. O objectivo foi o de retirar lições quanto aos fatores que levaram à sua ascensão e declínio (quando aplicável). Na sequência da reunião, o canal 2 (economia) da Televisão Nacional da China (TNC) organizou a produção de uma série documental em 12 episódios sobre a ‘Ascensão das Grandes Potências’ (Da Guo Jue Qia), a qual levaria três anos a ser concluída. Entre 13 e 24 de novembro de 2006, a série documental foi exibida em horário nobre, sendo repetida a pedido do público, em 27 de novembro e 8 de dezembro. Adicionalmente, a tiragem de 100 mil exemplares dos 8 volumes editados esgotou em três dias. A série está disponível em http://www.ovguide.com/the-rise-of-the-great-powers-9202a8c04000641f8000000004700d6c [acedido em 22 de agosto de 2013]. De notar que, já em 1988, a TNC exibiu uma série documental em seis episódios, intitulada ‘Eulogia do Rio: Reflexões sobre a Cultura Chinesa’ (He Shang: Zhongguo Wenhua Fansilu) que concluiu sob uma perspetiva hegeliana, que as civilizações ocidentais foram predominantes face às suas congéneres asiáticas devido à sua natureza marítima. A série está disponível para visualização integral em https://archive.org/details/ddtv_40_china_presenting_river_elegy [acedido em 22 de agosto de 2013].

[16]    Ashley Tellis, Janice Bially, Christopher Layne e Melissa McPherson avançaram com o enquadramento-base de três vetores fundamentais na caracterização do poder nacional, a saber: nível de recursos disponíveis ou produzidos por um país; capacidade de performance do Estado na cena internacional; e capacidade militar, que é entendida em termos de proficiência ou eficácia operacional produzida quer como resultado dos recursos estratégicos disponíveis para a instituição militar, quer como a sua capacidade em traduzir estes recursos num poder coercivo. Ashley Tellis; Janice Bially; Christopher Layne e Melissa McPherson (2000). Measuring National Power in the Postindustrial Age. Santa Monica: RAND. No entanto, deve referir-se que muita da literatura relativa ao crescimento do poder relativo da China e à forma como este é encarado, deriva mais de perceções de poder do que do poder estimado, para utilizar a terminologia de William Wohlforth. Ver William C. Wohlforth (1993). The Elusive Balance. Ithaca: Cornell University Press, especialmente pp. 3-10.

[17]    Citado em Yongnian Zheng (1999). Discovering Chinese Nationalism in China: Modernization, Identity and International Relations. Cambridge: Cambridge University Press, pp. 114-115. Ver ainda Yong Deng (1998). “Chinese Conception of National Interests in International Relations”. The China Quarterly 154, p. 315. Huang Shuofeng (1992). Zhonghe Guoli Lun (Sobre o Poder Nacional Abrangente). Beijing: Zhongguo Shehui Kexue chubanshe, p. 7. Para mais variações semânticas desta definição e um upgrade ao estudo de Michael Pillsbury, ver Sean Golden (2011). “China’s Perception of Risk and the Concept of Comprehensive National Power”. The Copenhagen Journal of Asian Studies 2, pp. 79-109. Disponível em http://ej.lib.cbs.dk/index.php/cjas/article/view/4028/4411 [acedido em 22 de agosto de 2013].

[18]    Ye Zicheng (2011). Op. Cit., p. 19 e p. 24.

[19]    Existem quatro expressões em mandarim para soft power: ruan shili; ruan liliang; ruanguoli; e ruan quanli. A mais popular, segundo Li Mingjian, é ruan shili. Li Mingjian (2008). “China Debates Soft Power”. Chinese Journal of International Politics 2, p. 291, nota 12. Disponível em http://cjip.oxfordjournals.org/content/2/2/287.full.pdf+html, p. 291, nota 12 [acedido em 28 de agosto de 2013].

[20]    Em novembro de 2013, Yang Yiyong, Vice-presidente do Instituto de Desenvolvimento Social da China, anunciou que o índice de ‘rejuvenescimento da China’ tinha atingido os 65,2%, em 2012, contra os 62,7%, em 2010. Este anúncio gerou dúvidas e questões quanto à metodologia empregue e quais os fatores e critérios de ponderação adotados. Alegadamente, o índice congrega 28 indicadores de progresso nacional agrupados em seis categorias: desenvolvimento económico, com um peso de 25%; desenvolvimento social (20%); educação (15%); inovação tecnológica (15%); recursos e ambiente (15%); e influência internacional (10%). Josh Chin (2013). “China’s National Rejuvenation Now 65.3% Complete, Index Says”. Disponível em http://blogs.wsj.com/chinarealtime/2013/11/22/chinas-national-rejuvenation-now-65-3-complete-index-says/ [acedido em 28 de agosto de 2013].

[21]    The Research Group of China’s Comprehensive National Power (1995). The Measurement and Analysis of China’s Comprehensive National Power. Beijing: National Defence University, pp. 4-19.

[22]    As fórmulas de Nicholas Spykman, Ray Cline e William Fuchs, depois de analisadas, foram desvalorizadas, uma vez que, na perspetiva chinesa as duas primeiras alicerçam-se no conceito de power politics e de hegemonia (aos quais Pequim se diz avessa) e a terceira não insere nos seus cálculos factores de soft power, como a ciência e a tecnologia, determinantes para a quantificação do poder de um Estado.

[23]    Aliás, este método tem vindo a ser sistematicamente posto em causa, uma vez que se alicerça numa variável discreta, o produto interno bruto (PIB), a qual não permite mais do que uma visão nublada do poder nacional que, não obstante ser interessante, peca por não conseguir captar detalhes essenciais à caracterização do poder de um Estado.

[24]    Se bem que os principais teóricos chineses que se dedicam ao estudo deste campo citem como influências incontornáveis Karl Marx, Friedrich Engels, Vladimir Lenine, Mao Zedong e Deng Xiaoping.

[25]    Ver Huang Shuofeng (1992). Op. Cit.

[26]    Ashley Tellis, Janice Bially, Christopher Layne e Melissa McPherson (2000). Op. Cit. Ver também Robert Gilpin (1981). War and Change in World Politics. Cambridge: Cambridge University Press. Paul Kennedy (1988). Ascensão e Queda das Grandes Potências. Lisboa: Publicações Europa-América. George Modelski e William Thompson (1996). Leading Sectors and World Powers. Columbia: University of South Carolina Press.

[27]    Yan Xuetong (2011). Op. Cit., pp. 14-17. Em 2014, e pela primeira vez, o investimento directo da China noutros países suplantou o investimento directo externo na China (140 mil milhões de dólares vs. 120 mil milhões). Sem autor (2015). “Duiwai Touzi shou chao Yinzi Guimo (Shachang Guancha)” (Investimento Externo da China Suplanta pela Primeira Vez Aquele que Recebe do Exterior – Observador do Mercado). Renmin Ribao (Diário do Povo). Disponível em http://paper.people.com.cn/rmrbhwb/html/2015-01/26/content_1526312.htm [acedido em 27 de janeiro de 2015]. Estes números aumentarão substancialmente durante os próximos anos com a progressiva concretização de projectos ligados à Belt and Road Initiative e às aquisições de empresas nos mais diversos países por parte de consórcios chineses.

[28]    Yan Xuetong (2001). “The Rise of China in Chinese Eyes”. Journal of Contemporary China 26, p. 34. Para Ye Zhicheng, a China está na quinta ou sexta posição no ranking do PNA internacional, devido ao facto de ainda não ter reunificado Taiwan; de ter uma população muito numerosa e um PIB per capita baixo; dos índices de educação e saúde, de desenvolvimento científico e tecnológico serem relativamente baixos face ao Ocidente; e de a sua influência internacional, ainda que tenha vindo a aumentar, não ser proporcional ao seu PNA. Ye Zicheng (2011). Op. Cit., p. 26.

[29]    Yong Deng (2008). Op. Cit., p. 8, p. 12 e p. 21. O autor advoga que esta busca por um estatuto internacional orbita os objectivos de criar uma envolvente externa estável que permita ao PCC prosseguir com as suas reformas; de incrementar o poder e o reconhecimento externo de forma a defender os interesses vitais do país; de assegurar aos restantes Estados que as intenções da China são pacíficas; e de projectar a sua influência na Ásia e no mundo.

[30]    Para Yu Bin só existem dois campos interpretativos: a ‘escola da cultura estratégica’ que, segundo a sua argumentação de relativismo cultural, refuta – ao contrário do discurso oficial chinês – a preponderância da história, da cultura e da filosofia chinesa; e a ‘escola da hierarquia-estabilidade’ que, com base em David Kang, advoga a implementação de um ‘sistema tributário 2.0’ na Ásia centrado na China e no seu modelo civilizacional. Yu Bin utiliza a expressão ‘escola da cultura estratégica’ com o objectivo inverso ao que empregamos neste estudo. Yu Bin (2008). “China’s Harmonious World: Beyond Cultural Interpretations”. Journal of Chinese Political Science nº 2, pp. 120.

[31]    Max Weber (1951). The Religion of China: Confucianism and Taoism. Glencoe: Free Press, pp. 169-170. Kung-chuan Hsiao (1965). “The Chinese Philosophy of War: The Traditionalists’ Arguments” em Joel Larus (ed.), Comparative World Politics: Readings in Western and Premodern Non-Western International Relations. Belmont: Wadsworth, p. 153. Ver John King Fairbank (1968). The Chinese World Order: Traditional China’s Foreign Relations. Cambridge: Harvard University Press. Ver o clássico de Frank Kierman e John King Fairbank (eds.) (1974). Chinese Ways in Warfare. Cambridge: Harvard University Press. Tiejun Zhang (2002). “Chinese Strategic Culture: Traditional and Present Features”. Comparative Strategy 2, pp. 73-90. Huiyun Feng (2007). Chinese Strategic Culture and Foreign Policy Decision-Making: Confucianism, Leadership and War. London: Rouledge. Yuan-kang Wang (2011). Harmony and War: Confucian Culture and Chinese Power Politics. New York: Columbia University Press.

[32]    Lucian Pye (1985). Asia Power and Politics: The Cultural Dimensions of Authority. Cambridge: Belknapp Press of Harvard University Press, p. vii.

[33]    Ver Peter Katzenstein, Allen Carlson e J. J. Suh (eds.) (2004). Rethinking Security in East Asia: Identity, Power, and Efficiency. Stanford: Stanford University Press. Peter Katzenstein (2008). Rethinking Japanese Security: Internal and External Dimensions. London: Routledge. Muthiah Alagappa (1998). Asia Security Practice: Material and Ideational Influences. Stanford: Stanford University Press. Zhang Weiwei (2011). Op. Cit. Yan Xuetong (2011). Op. Cit.

[34]    Ver Andrew Nathan e Robert Ross (1998). The Great Wall and the Empty Fortress: China’s Search for Security. New York: Norton. Abram Shulsky (2000). Deterrence Theory and Chinese Behavior. Santa Monica: RAND. Disponível em http://www.rand.org/pubs/monograph_reports/MR1161.html. [acedido em 29 de agosto de 2013]. Warren Cohen (2001). East Asia at the Center: Four Thousand Years of Engagement with the World. New York: Columbia University Press.

      Andrew Scobell (2003). Op. Cit. Andrew Nathan e Andrew Scobell (2012). China’s Search for Security. New York: Columbia University Press.

[35]    Tanto Confúcio como Mencio reconhecem que “o mundo não pode ser conquistado pela espada, apenas pela virtude, justiça e boa-fé, as quais produzem submissão em prol do bem comum”. Confúcio considera que “liderar povos que não tenham sido educados na guerra é um desperdício”, enquanto Mencio não deixa de abordar e colocar em práctica aspetos técnicos para a condução de operações defensivas, ver Herrlee Creel (1971). Chinese Thought: From Confucius to Mao Tse-Tung. Chicago: The University Press of Chicago, pp. 26-27 e pp. 54-55. Ver ainda Yan Xuetong (2011). Op. Cit.

[36]    Ver Allastair Iain Johnston (1995). Cultural Realism: Strategic Culture and Grand Strategy in Chinese History. New Jersey: Princeton University Press. Allastair Iain Johnston (1998). “China’s Militarized Interstate Dispute Behavior, 1949-1992: A First Cut at the Data”. The China Quarterly 153, pp 1-30. Disponível em http://cc.sjtu.edu.cn/G2S/eWebEditor/uploadfile/20120914184823358.pdf [acedido em 29 de agosto de 2013]. Alexandre Carriço (2006). Op. Cit. Taylor Fravel (2008). Strong Borders, Secure Nation: Cooperation and Conflict in China’s Territorial Disputes. New Jersey: Princeton University Press. Michael Swaine e Ashley Tellis (2000). Interpreting China’s Grand Strategy: Past, Present, and Future. Santa Monica: RAND. Disponível em http://www.rand.org/pubs/monograph_reports/MR1121.html [acedido em 29 de agosto de 2013]. Joanna Waley-Cohen (2006). The Culture of War in China: Empire and the Military under the Qing Dinasty. London: I.B. Tauris.

[37]    David Shambaugh (2013). China Goes Global: The Partial Power. Oxford: Oxford University Press, p. 54.

[38]    Alastair Iain Johnston (2008). Social States: China in International Institutions, 1980-2000. New Jersey: Princeton University Press, p. xxvii e p. 203.

[39]    Mao Zedong (1969). Mao Zedong Xuanji (Trabalhos Selecionados de Mao Zedong). Beijing: Renmin chubanshe, pp. 295-297. Zhou Enlai (1990). Zhou Enlai Waijiao Wenxuan (Trabalhos Diplomáticos Selecionados de Zhou Enlai). Beijing: Zhongyang Wenxian chubanshe, pp. 58-62.

[40]    Ler, por exemplo, as elaborações ambíguas centradas numa ‘ontologia da coexistência’ e num ‘relacionismo metodológico’ feitas por Zhao Tingtang e Qin Yating sobre a aplicabilidade do conceito confuciano de ‘tianxia’ (tudo sob o céu) às relações internacionais. Zhao Tingtang (2011). “Rethinking Empire from the Chinese Concept All-under-Heaven” e Qin Yating (2011). “The Possibility and Inevitability of a Chinese School of International Relations Theory” em William Callahan e Elena Barabantseva (eds.), China Orders the World: Normative Soft Power and Foreign Policy. Baltimore: Johns Hopkins University Press.

[41]    David Shambaugh (2011). “Coping with a Conflicted China”. The Washington Quarterly 1, p. 9. Disponível em http://csis.org/files/publication/twq11wintershambaugh.pdf [acedido em 30 de agosto de 2013].

[42]    Andrew Nathan e Andrew Scobell (2012). “How China Sees America”. Foreign Affairs 5, pp. 33-34. Ver também Yuan Peng (2013). “Zai Zhongguo de da Zhoubian Zhanlue xin Shiqi Sixiang” (Pensamentos sobre a Grande Estratégia de Periferia da China no Novo Período). Xiandai Guoji Guanxi6 (Relações Internacionais Contemporâneas). Disponível em http://www.cicir.ac.cn/english/ArticleList.aspx?cid=540 [acedido em 5 de janeiro de 2014].

[43]    Ver Alexandre Carriço (2013). “Cinco Debates, Uma Grande Estratégia”. Nação e Defesa 134, pp. 133-184.

[44]    Ver Mark Leonard (2008). What China Think?. New York: Public Affairs.

[45]    Ver Ye Zicheng (2011). Op. Cit., pp. 175-222 e David Shambaugh (2013). Op. Cit., pp. 18-43.

[46]    Ver Li Mingjian (ed.) (2011). Soft Power: China’s Emerging Strategy in International Politics. Lanham: Lexington Books.

[47]    Yin Chengde (2007). “Jiangou Hexie Shijie” (Construindo um Mundo Harmonioso). China Institute of International Studies. Disponível em http://www.ciis.org.cn/index-news.asp?NewsID=2007010914845255&d=4&classname0%C9%EE%B6%C8%B7%D6%CE%F6&classid=9 [acedido em 30 de agosto de 2013].

[48]    Citado em Peter Ford (2011). “The Rise of an Economic Superpower: What Does China Want?”. Christian Science Monitor. Disponível em http://www.csmonitor.com/World/Asia-Pacific/2011/1105/The-rise-of-an-economic-superpower-What-does-China-want [acedido em 30 de agosto de 2013].

[49]    Para a descrição detalhada de cada uma destas escolas ver David Shambaugh (2013). Op. Cit., p. 27-44.

[50]    Idem, p. 43.

[51]    Shaohua Hu (2003). The Chinese View of Power. Paper presented at the annual meeting of the American Political Science Association, p. 24. Sobre esta dimensão moral ver também Liu Yazhou (2005). Xinnian yu Daode (Fé e Moralidade). Disponível em http://www.yannan.cn/data/detail.php [acedido em 30 de agosto de 2013].

[52]    Ver Niu Hanzhang (2007). “Shixi Haixia Liangan de Yitihua Quxiang” (Análise da Tendên-
cia de Integração no Estreito de Taiwan) em Liang Shoude e Li Yihu (eds.), Quanqiuhua yu Hexie Shijie (Globalização e Mundo Harmonioso). Beijing: Shijie Zhishi chubanshe,
pp. 360-369.

 

[53]    Yu Xintian (2007). “Harmonious World and China’s Path for Peaceful Development” em Wang Zhongchan e Chen Senlin (eds.), World Security Environment. Beijing: College of Defense Studies, National Defense University, PLA, p. 6.

 

[54]    Sobre esta formulação ver Yang Jiemian (2003). “Zhongyao Zhanlue Jiyu qi yu Zhongguo Waijiao de Lishi Renwu” (O Importante Período de Oportunidade Estratégica e a Missão Histórica da Diplomacia Chinesa). Mao Zedong Deng Xiaoping Lilun Yanjiu 4 (Estudos das Teorias de Mao Zedong e Deng Xiaoping), pp. 60-67.

 

[55]    Exemplificada pela narrativa oficial associada aos objetivos da Belt and Road Initiative (BRI).

 

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Tenente-coronel

Manuel Alexandre Garrinhas Carriço

Tenente-Coronel de Infantaria. Assessor do Instituto da Defesa Nacional. Vogal da Direção da Revista Militar.

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