Nº 2440 - Maio de 2005
Pessoa coletiva com estatuto de utilidade pública
O Ensino Superior Militar na Força Aérea Portuguesa
Tenente-coronel
Armindo Manuel Elias Barroso de Sampaio
“Como as instituições militares de hoje são diferentes das antigas”
In, Maquiavel, “Comentários sobre a primeira década de Tito Lívio”
 
1.  Introdução
 
A Academia da Força Aérea (AFA) é uma escola universitária não in­tegrada em universidade, na dupla tutela dos Ministérios da Defesa Nacional e da Educação, tendo como objectivos a preparação de nível superior - em diversas áreas - de um conjunto coerente de pessoal especializado para desempenhar a multifacetada actividade aeronáutica militar.
 
 
Vista da Academia da Força Aérea
 
Os cursos da Academia são de Licenciatura em Ciências Militares Aeronáuticas. Estes cursos, na sua vertente académica distinguem-se dos restantes cursos universitários do ensino superior público e privado, pela abrangência das suas estruturas curriculares que atribuem créditos, embora em diferentes proporções, consoante o curso, pelas ciências exactas, aplicadas, sociais, humanas, da engenharia, da gestão e da administração.
 
Além dos cursos de licenciatura que incluem os respectivos Tirocínios, a Academia organiza e ministra Estágios Técnico-Militares (ETM), aos quais são admitidos alunos com o grau de licenciado e que conferem habilitação complementar para ingresso no Quadro Permanente de Oficiais nas especialidades a que os cursos da Academia dão acesso.
 
Uma terceira via de ingresso no Quadro Permanente de Oficiais da Força Aérea é através da Escola Superior de Tecnologias Aeronáuticas (ESTMA)1, que funciona junto da Academia da Força Aérea, e confere o grau de bacharel.
 
 
2.  A evolução do Ensino Superior Militar na FAP a nível das licenciaturas
 
A formação dos oficiais da Força Aérea processou-se ao longo dos anos, na Escola do Exército2 e na Academia Militar. No entanto, a especificidade das qualificações necessárias aos oficiais do quadro permanente da Força Aérea determinou a criação da Academia da Força Aérea.
 
 
Chipmunk MK20
 
A AFA3 passou a ser o terceiro estabelecimento militar de ensino superior, paralelamente com a Escola Naval e a Academia Militar, tendo iniciado a sua actividade em 1 de Fevereiro de 1978, em instalações provisórias e apenas com os alunos, do 3º Ano de Aeronáutica, provenientes da Academia Militar. Com o progressivo desenvolvimento das instalações, a AFA absorveu sucessivamente todos os anos do curso de Pilotagem Aeronáutica e permitiu a conclusão do último ano dos cursos de Engenharia Aeronáutica, Engenharia Electrotécnica, Engenharia de Aeródromos e os dois últimos anos do curso de Intendência e Contabilidade4.
 
 
Outra panorâmica da Academia da Força Aérea
 
O preâmbulo do Decreto-Lei que cria a AFA consubstancia que “a Força Aérea, como ramo independente das Forças Armadas, irá dispor de um estabelecimento militar de ensino superior que ministre cursos de formação de oficiais para o quadro permanente da Força Aérea; a utilização da Academia Militar para a formação completa de algumas das especialidades do quadro permanente da Força Aérea não permite um ajustamento adequado dessa formação ao perfil desejável do oficial da Força Aérea, principalmente devido ao pouco contacto com o meio aeronáutico; é desejável a criação de cursos que contemplem outras especialidades, o que, dado o seu volume e especialização, não é possível realizar na Academia Militar; e não existe no País um estabelecimento de ensino que permita, através de cursos não especificamente militares, a identificação com a tecnologia de ponta e o desenvolvimento dos conheci­mentos aeronáuticos”.
 
A separação completa entre a Academia da Força Aérea e a Academia Militar deu-se no ano de 19825, sendo nesse ano ministrado na AFA o 1º ano do curso de Pilotagem Aeronáutica.
 
Desde o ano lectivo de 1978/79 passaram também a ser ministrados na AFA os estágios técnico-militares de Engenharia Aeronáutica, Electrotécnica e de Aeródromos, de Intendência e Contabilidade e de Medicina Aeronáutica. Estes estágios destinavam-se a preencher uma lacuna de formação, dando a licenciados em Engenharia, Economia ou Gestão de Empresas e Medicina a socialização e a formação militar necessária para ingresso no Quadro Permanente da Força Aérea Portuguesa.
O leque de licenciaturas ministradas na Academia da Força Aérea, mantém-se praticamente inalterado desde a publicação do supracitado Decreto-Lei6. Actualmente a Academia ministra os seguintes cursos de licenciatura7:
 
 
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As licenciaturas incluem, na sua parte final, um tirocínio. Os Tirocínios são estágios planeados e coordenados pela Academia em ligação com os vários Órgãos/Departamentos da Força Aérea, cuja duração varia entre 6 a 13 meses, e que visam ministrar aos alunos competências técnico-profissionais, não incluídas nos programas das licenciaturas, mas que são consideradas imprescindíveis, para o exercício das futuras funções dos novos Oficiais do Quadro Permanente (QP). Com os Tirocínios pretende-se garantir a inserção dos novos oficiais na estrutura orgânica, processos e sistemas de informação da Força Aérea e na aprendizagem e desenvolvimento dos proce­dimentos e metodologias de aplicação dos conhecimentos praticados pela Organização.
 
 
Planador ASK-21
 
O controlo e validação dos cursos de licenciatura têm sido efectuados, externamente, quer pelas Comissões de Avaliação do Ensino Superior, quer pelas ordens profissionais. Assim, todos os cursos de Engenharia da Academia estão acreditados pela Ordem dos Engenheiros. Quanto ao curso de Administração Aeronáutica, a Ordem dos Economistas não acredita cursos, tendo como metodologia avaliar o currículo de cada candi­dato. Os licenciados em Administração Aeronáutica pela Academia que recentemente se candidataram à inscrição na Ordem, foram aceites como membros efectivos, tendo-lhes sido conferida a respectiva cédula profissional.
 
O curso de Pilotagem Aeronáutica cumpre os requisitos da Joint Aviation Authorities (JAA), estando homologado pelo Instituto Nacional de Aviação Civil (INAC), e confere o acesso à licença de piloto comercial e ao exame teórico de piloto de linha aérea.
 
 
3.  Génese e evolução do Ensino Superior Militar a nível dos bacharelatos na FAP
 
Até 1988, a Marinha e o Exército promoviam, extraordinariamente, cursos de formação de oficiais, aproveitando as estruturas já existentes - Escola Naval para o Quadro Especial de Fuzileiros e a Escola Central de Sargentos do Exército em Águeda8 para o Quadro Especial de Serviços. A Força Aérea aproveitou numa primeira fase a estrutura existente no Exército e fez desta forma, internamente, a única fonte de recrutamento para o Quadro Permanente de Oficiais Técnicos9. Numa segunda fase o ingresso no QP de Oficiais Técnicos efectuava-se através da frequência com aproveitamento do “Curso de For­mação de Oficiais”, ministrado no Centro de Instrução nº 2 na Ota. Os cursos atrás referidos não eram reconhecidos pelo Ministério da Educação e consequentemente não conferiam qualquer título ou grau académico.
 
Por força da publicação do Estatuto dos Militares das Forças Armadas (EMFAR)10, em 1990, é relançada a  problemática da formação dos oficiais sendo a Instituição Militar levada a uma alteração qualitativa nesse âmbito.
 
Face ao disposto no novo estatuto, impunha-se que para o “ingresso na categoria de oficial é exigida uma licenciatura ou uma formação militar e técnica equiparada a curso superior de curta duração”11. O art. 145º do Decreto-lei 34-A/90, dispunha que em termos de carreiras de oficiais “...é exigida licenciatura ou formação militar e técnica equiparada a bacharelato”12, sendo que, “a carreira de oficiais cuja formação de base seja equiparada a bacharelato destina-se, essencialmente ao exercício de funções de comando ou chefia de áreas técnicas”13. Deste modo, a exigência do grau de bacharel consagrada no EMFAR originou mudanças significativas no processo de formação dos Oficiais Técnicos da FAP. Para cumprimento do imperativo legal decorrente no EMFAR, e de forma a racionalizar encargos financeiros e aproveitar infra-estruturas existentes, foi decidido superiormente que os cursos de nível bacharelato fossem ministrados nas instalações da Academia da Força Aérea, em Sintra.
A criação do Ensino Politécnico Militar não se deve apenas a questões de índole interna da Instituição Militar, mas também a alterações substanciais no âmbito do sistema de educação nacional. Com a publicação, em 1986, da Lei de Bases do Sistema Educativo14, é estabelecido que o grau de bacharel é conferido no ensino politécnico, sendo este ministrado em Escolas Superiores de Ensino Politécnico.
 
É nesta base que, definitivamente, arrancam os cursos de bacharelato, inicialmente na Força Aérea, posteriormente no Exército e na Marinha, através de um modelo completamente novo que “rompeu decididamente com a formação tradicional dos oficiais técnicos...agrupados segundo afinidades funcionais”15. O primeiro curso de nível politécnico ministrado na FAP teve início no ano lectivo 1991/1992, tendo sido frequentado inicialmente por 40 alunos.
 
 
As Actividades de I&D
 
 
O Laboratório de Aeronáutica da Academia da Força Aérea
 
A Academia da Força Aérea é um órgão estruturalmente vocacionado para a realização de trabalhos de investigação. O ambiente académico e as infra-estruturas laboratoriais permitem a articulação e a integração consistente, de várias áreas de pesquisa.
Para a Academia da Força Aérea, aberta à colaboração com Universidades, empresas e instituições de pesquisa nacionais e estrangeiras, têm convergido várias actividades dispersas e tem-se acumulado “know-how” considerável, tornando a Academia num pólo dinamizador da aquisição de tecnologias essenciais ao desenvolvimento do ciclo ensino-investigação-aplicação no sector aeronáutico.
 
Deste modo acumularam-se na Academia da Força Aérea capacidades no domínio aeroespacial que permitem intervir, com acrescido rigor científico, no projecto, modificação e reparação, e promover actividades de I&D que garantem avanços do conhecimento e a aquisição de novas tecnologias, de modo a acompanhar o desenvolvimento mundial no domínio aeroespacial.
 
 
Túnel de vento subsónico tipo Göttingen
 
A Academia reúne infra-estruturas16 únicas no país e específicas para as actividades de desenvolvimento no sector aeroespacial utilizadas para a concepção, projecto, validação e certificação. Assim, os túneis aero­dinâmicos permitem testar modelos de aviões ou outros veículos aeroespaciais para confirmar as previsões de códigos computacionais, e fazer medições em casos para os quais os modelos existentes são inadequados.
O simulador de aviónica, de fabrico nacional (OGMA), instalado em 2003, permite estudar novas configurações (não existentes) por simulação, e permite também simular os sistemas existentes em situações de emergência demasiado perigosas para serem experimentadas em voo.
 
 
CASA C-212-100 Aviocar
 
Os ensaios em voo, capacidade desenvolvida conjuntamente com o Instituto Superior Técnico, são a prova final de qualquer veículo, equi­pamento ou subsistema aeroespacial, e são a base da certificação. Note-se que Portugal é um dos poucos países com um avião de ensaios em voo. Entre as parcerias criadas neste domínio salienta-se os ensaios com o CASA C-212 Aviocar, no âmbito da cooperação com o Eurocontrol.
 
A ligação e articulação da Academia da Força Aérea com a indústria aeronáutica, com as universidades nacionais e estrangeiras que possuam colégios de engenharia e infra-estruturas laboratoriais ligadas à indústria, como é já o caso da Florida State University (a FSU), que é apoiada pela Lockeed, General Electric Aircraft Engines, McDonnell Douglas Aircraft, Air Force Research Center, Office of Naval Research e NASA Langely Research Center, permite que o laboratório de aeronáutica se posicione apropriadamente no panorama mundial.
 
O apoio da agência de I&D da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), aqui designada por RTA, à Força Aérea tem permitido a vinda a Portugal de consultores estrangeiros da NASA, do Massachusetts Institute of Tehnology (MIT), dos laboratórios alemães de investigação aeroespacial (DLR) e a integração nas equipas nacionais de pesquisa, nomeadamente naquelas que executam os seus trabalhos no laboratório de aeronáutica da Academia da Força Aérea, de especialistas provenientes da Daimler-Chrysler Aerospace, das Agências Aeroespaciais Norte Americana (NASA) e Canadiana e da Força Aérea dos Estados Unidos da América (USAF).
 
O sector aeroespacial nacional pode assim contar com as infra-estruturas da Academia da Força Aérea para os programas de aplicação que permitam a nossa participação em consórcios internacionais como parceiro de pleno direito, com actividade desde a investigação, desenvolvimento e projecto, até à produção.
 
A AFA realizou e tem em curso trabalhos de Investigação e Desenvolvimento (I&D) inseridos em programas específicos de apoio, conjuntamente com outros, de nível académico, que visam a graduação (bacharelato e licenciatura) e a pós-graduação (mestrado e doutoramento) no ensino superior dos seus Oficiais, a maior parte dos quais desempenha funções docentes na Academia.
 
Os programas e projectos de I&D em curso, desenvolvidos em parceria com Universidades maioritariamente estrangeiras, americanas e canadianas, são em parte, financiados pelas seguintes entidades ou programas:
- RTO (AGARD);
- Brite / Euram;
- Programa europeu de “Tecnologias industriais e dos materiais”;
- PRAXIS;
- PIDDAC;
- PRODEP;
- Projecto Europeu Growth - 5th and 6th RTD Framework Programme.
 
Assim, são de salientar os seguintes projectos e programas actualmente em curso na FAP:
- No domínio da propulsão, a combustão e o impulso vectorizado;
- Nas áreas das estruturas e materiais, o estudo das estruturas avançadas para aplicação aeronáutica;
- Ao nível dos sistemas, as comunicações ópticas, a navegação por satélite e as novas metodologias de controlo inteligente;
- No projecto aeronáutico, a certificação e os ensaios em túnel aerodi­nâmico e em voo;
- O desenvolvimento de aeronaves não tripuladas (UAVs), como sistemas integradores e demonstradores de tecnologia.
 
 
Ensaios em voo: certificação do POD de reconhecimento do Alpha-Jet
 
Para além destes, ainda no âmbito da I&D, foram realizados e estão em curso trabalhos cujo objectivo próximo é apoiar a operação e a manutenção das aeronaves que equipam as frotas da Força Aérea, mas que também têm servido para desenvolver novos processos e novas tecnologias e, por isso, mesmo objecto de divulgação em fóruns da especialidade.
 
Destes, salienta-se o estudo da influência das cargas externas, como por exemplo os sistemas de reconhecimento fotográfico (POD), nas características aerodinâmicas das aeronaves.
 
Tal estudo implicou o desenvolvimento de métodos computacionais de mecânica de fluidos e a sua compatibilização com ensaios em túnel aerodinâmico. Os resultados permitiram já a certificação de uma nova configuração na aeronave Dassault/Dornier Alpha-Jet.
 
 
Dassault/Dornier Alpha-Jet
 
Adicionalmente, a recolha em tempo real de dados em voo e a sua análise tem permitido a realização de diversos trabalhos relacionados, para o seguimento da vida de fadiga das aeronaves da FAP.
 
A ênfase e o cuidado na reparação das aeronaves da FAP originaram estudos de optimização no sentido do processo de reparação de modo a restituir a capacidade estrutural com um mínimo de redução na capacidade funcional e no aumento de peso.
 
Num projecto financiado pelo Programa de Desenvolvimento Educativo para Portugal, PRODEP, efectuou-se a modelação do comportamento à fadiga de materiais compósitos danificados por impacto e reparados a fim de determinar a sua resistência residual. Complementarmente, o programa, pela sua profundidade e rigor científico, esteve na base do doutoramento de um oficial superior da FAP em engenharia mecânica.
 
A nível internacional, é notório que a estrutura inteligente, e a tecnologia a ela associada, é uma das áreas prioritárias da pesquisa aeronáutica e aeroespacial. Em Portugal, associamo-nos também a este esforço de desen­volvimento. Naqueles que foram os primeiros programas nacionais neste domínio, investiga-se a viabilidade da aplicação da estrutura adaptativa no alívio de rajada e na atenuação da instabilidade aeroelástica de flutter e de buffeting nas superfícies sustentadoras das aeronaves.
 
Os programas em curso nesta área, resultado de uma iniciativa conjunta da Academia da Força Aérea e do Instituto Superior Técnico (IDMEC), iniciaram-se em 1996, com a criação, no Laboratório de Aeronáutica da Academia, de uma estrutura de apoio experimental, para a pesquisa da aplicação aeronáutica de materiais multifuncionais e da estrutura adaptativa.
 
Um exemplo do nível internacional entretanto conseguido é a participação no Projecto Europeu Growth - Key Action 4 do 5th RTD Framework Programme sob o título “Active Aeroelastic Aircraft Structures Project”. Neste projecto a três anos Portugal assume um papel de liderança na área das estruturas adaptativas. Participa em conjunto com parceiros oriundos de organizações ligadas à investigação académica (DLR-Alemanha, INTA-Espanha, KTH-Suécia, Manchester University-Inglaterra, Politecnico di Milano-Itália, CIRA-Itália, Technion Haifa-Israel e TsAGI-Russia) e à indústria (Alenia-Itália, Casa-Espanha, GAMESA-Espanha, Onera-França, DASA-Alemanha, Israel Aircraft Industries e SAAB-Suécia). A exploração desta área científica permitiu o arranque e a conclusão com êxito de mestrados e doutoramentos de oficiais da FAP, docentes da Academia, em engenharia mecânica e aeroespacial.
 
A FAP, consciente da importância dos modernos sistemas de comunicação ópticos a nível nacional, e muito especialmente a nível militar, tem em curso a implantação de alguma capacidade laboratorial neste domínio, tendo em vista dar suporte, às actividades normais de ensino, de actualização e formação contínua bem como de investigação.
 
Particularmente, no âmbito da investigação esta capacidade laboratorial permitirá dar corpo ao desenvolvimento da análise e caracterização por métodos experimentais de componentes electro-ópticos.
 
O aparecimento de Sistemas Globais de posicionamento e Navegação por Satélite, especialmente o Sistema Militar GPS, veio provocar uma profunda transformação e um considerável desenvolvimento nas técnicas e processos nos mais variados domínios. Por tal a União Europeia se prepara, hoje, para criar o seu próprio sistema civil, GALILEO.
 
Na FAP utiliza-se esta nova tecnologia para efectuar a navegação e a localização precisa das aeronaves e dos novos UAVs em desenvolvimento.
 
 
UAV ANTEX-M, Modelo X01 (escala 1:2)
 
Está identificada uma vertente comum às actividades de pesquisa mais desenvolvidas, actualmente em curso na FAP. Procura-se integrar os trabalhos de I&D de modo a culminarem no desenvolvimento de sistemas autónomos. A estratégia consiste no desenvolvimento de meios aéreos não tripulados destinados funda­mentalmente a servirem de veículos demonstradores de novas tecnologias, de baixo custo relativo e requerendo um mínimo de infra- estruturas de apoio.
 
Na Academia têm sido testadas, com assinalável êxito em túnel aerodinâmico e em voo, plataformas de UAVs à escala da 1:2. A plataforma final, à escala real, já construída, efectuará os primeiros voos no decurso do corrente ano.
 
Numa vertente complementar estuda-se, em colaboração com a Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP), uma metodologia para a concepção, desenvolvimento e avaliação do controlo hierárquico de equipas de aeronaves militares não tripuladas semi-autónomas com elevado grau de fiabilidade de missão.
 
 
UAV à escala real
 
No projecto “Joined-Wing” desenvolveu-se uma asa não conven­cional para UAV’s de vigilância e reconhecimento, sendo a AFA responsável pelo seu estudo estrutural não linear associado ao desenvolvimento de fenómenos aeroelásticos.
 
O programa decorre em parceria com o Instituto Superior Técnico e com a USAF, através do European Office of Aerospace Research and Development (EOARD).
 
Face ao apresentado e tendo em consideração os objectivos expressos no Programa Operacional da Ciência e Inovação, acredita-se que a Força Aérea poderá intervir nas seguintes áreas:
 
- Em projectos de I&D, nomeadamente no domínio das aeronaves não tripuladas, visando transferir tecnologia para o sector empresarial. Trata-se de projectos de arranque rápido de grande impacto na captação de riqueza e na promoção da produtividade e da competitividade. As plataformas a desenvolver permitirão o ensaio e teste em voo dos diferentes produtos resultado da I&D no domínio aeronáutico em Portugal. Encurta-se o ciclo de pesquisa, desenvolvimento e industrialização de eventuais equipamentos que se venham a desenvolver em Portugal. O sector aeronáutico nacional verá reforçada a sua capacidade de intervenção em programas e consórcios internacionais;
 
- Criação de capacidade experimental em novas áreas de investigação, nomeadamente no domínio dos escoamentos supersónicos. Trata-se de um projecto inovador em ambiente de ensino superior. Uma vez que no nosso país não existe nenhuma instalação para este efeito, o impacto positivo será sentido a nível nacional, com vantagens para a investigação e o ensino da aeronáutica em Portugal.
 
 
Adicionalmente, a Academia iniciou já os processos em parcerias conducentes ao seguinte:
 
- Formação avançada de investigadores e docentes, nomeadamente através da qualificação académica de militares dos “nichos de excelência” atrás expostos;
 
- Criação de infra-estruturas cientificas, através da actualização e desenvolvimento da capacidade laboratorial da Academia;
 
- Reorganização da sua formação superior militar, no espírito da Decla­ração de Bolonha17.
 
 
Conclusão
O Futuro do Ensino Superior Militar na FAP
 
A subordinação a critérios de excelência em matérias de formação académica, humana e militar dos Oficiais destinados aos Quadros Permanentes das Forças Armadas é uma prioridade inerente aos valores e aos objectivos decorrentes do conceito estratégico nacional, impondo-se a criação de condições para sua efectivação, pelo que cada vez mais se impõe um paralelismo com o Ensino Superior não Militar.
 
 
 
Os subsistemas de ensino com atribuições específicas na formação de Oficiais dos QP adoptados nos 3 Ramos apresentam uma certa similaridade com o modelo adoptado pela Força Aérea, e que se traduz na existência de 3 pilares, com denominações diferenciadas, mas equiparadas:
 
- uma Academia [Academia da Força Aérea (AFA) e Academia Militar (AM), respectivamente na FAP e no Exército, e Escola Naval (EN), na Marinha], com a missão de formar os Oficiais para o ingresso na carreira em que é requerida a licenciatura como habilitação mínima de ingresso;
 
- uma Escola Politécnica [Escola Superior de Tecnologias Militares Aeronáuticas (ESTMA), Escola Superior Politécnica do Exército (ESPE) e Escola Superior de Tecnologias Navais (ESTNA)], destinada à formação de oficiais técnicos, com reduzidas expressões no Exército e na Marinha, em que a habilitação académica mínima requerida é o bacharelato;
 
- um Instituto Superior [Instituto de Altos Estudos da Força Aérea (IAEFA), Instituto de Altos Estudos Militares (IAEM) e Instituto Superior Naval de Guerra (ISNG)], com a missão de ministrar cursos que habilitem à progressão na carreira.
 
Funcionando, qualquer um dos órgãos, na dependência directa dos CEM’s respectivos, os cursos ministrados possuem natureza e reconhecimento distintos. Enquanto aos cursos ministrados nas Academias são conferidos graus académicos (licenciatura) e existe a preocupação de reconhecimento e certificação pelas Ordens profissionais, onde se enquadram as qualificações adquiridas, tal como nas Escolas Politécnicas, embora o grau académico conferido seja hierarquicamente inferior (bacharelato), nos Institutos Superiores os cursos ministrados têm um carácter profissionalizante, não lhes sendo atribuído qualquer grau académico, assumindo-se, porventura, como uma formação pós-graduada de natureza profissionalizante.
A integração dos EMES no Sistema Educação Nacional (SEN), com a consequente avaliação externa, confere uma maior transparência e visibilidade do Ensino Superior Militar, incutindo-lhe um maior rigor, pela introdução de novas práticas orientadas para uma maior qualidade. Porém, se a avaliação do ESM pode proporcionar a oportunidade de melhorar, não deixará de comportar o risco de evidenciar os seus pontos fracos e, consequentemente, a sua irrelevância ou desnecessidade.
A adaptação do SEN à Declaração de Bolonha, faz com que por arrasto, o Ensino Superior Militar tenha de absorver entre outros compromissos, que foram acordados pelos 31 países europeus signatários da Declaração, os seguintes:
- adoptar um sistema de diplomas facilmente compreensíveis e compa­ráveis;
- adoptar um sistema de ensino superior assente em três ciclos:
- 1º ciclo - graduação (Licenciatura)
- 2º ciclo - Mestrado
- 3º ciclo - Doutoramento
- estabelecer um sistema de créditos (ECTS - European Credit Transfer System), como instrumento de promoção da mobilidade dos estudantes através da possibilidade de transferir e acumular créditos. Estes créditos, pela primeira vez, são passíveis de obtenção em contexto de ensino não-superior, incluindo a aprendizagem ao longo da vida;
- promover a cooperação europeia pelo desenvolvimento de acções interinstitucionais.
 
Tendo em conta o actual edifício da formação superior nas Forças Armadas e a reorganização necessária decorrente do espírito de Bologna, várias hipóteses de trabalho se podem colocar, antevendo-se, assim, o futuro do ensino superior na Força Aérea.
A iniciativa governamental, no que respeita à criação do ensino superior militar conjunto, terá necessariamente de aguardar18. Embora se fosse beneficiar do efeito sinergético da junção dos estabelecimentos de ensino superior militar, e consequentemente de economias de escala, a prioridade está, na actual conjuntura, no reequacionar do curriculum dos cursos, planos de estudos, projectos pedagógicos e integração vertical do ensino a jusante e a montante das Academias. A possível integração horizontal das Escolas só poderá acontecer depois de assimilada e cimentada a reorgani­zação referida.
Todo o processo de mudança deve ocorrer de forma planeada, mesmo impulsionado por variáveis contextuais externas, portanto de natureza extrínseca às Forças Armadas, cujo grau de controlo é deveras diminuto.
 
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* Tenente-Coronel de Administração Aeronáutica. Coordenador do Departamento de Ciências de Gestão e Administração, Director do Curso de Administração Aeronáutica e Docente da Academia da Força Aérea.
 
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 1 São comuns à AFA/ESTMA o Comando, o Corpo de Alunos e o Grupo de Apoio.
 2 Designação dada em 1940 à Escola Militar, sucedendo-lhe a Academia Militar em 1959 (Decreto-Lei 42151 de 12 de Fevereiro de 1959).
 3 Criada pelo Decreto-Lei 27/78, de 27 de Janeiro.
 4 Cuja designação no Exército é de Administração Militar.
 5 Portaria 961/82 de 13 de Outubro.
 6 Onde no art. 8º previa as licenciaturas em Pilotagem Aeronáutica, Engenharia Aeronáutica, Engenharia Electrotécnica, Engenharia de Aeródromos e Administração Aeronáutica.
 7 Nos termos do art. 13º do D.R. 32/97 de 06 Setembro.
 8 Designado mais tarde Instituto Superior Militar.
 9 O Curso de Formação de Oficiais da Força Aérea, com a duração de dois anos, funcionou no 1º ano em Águeda e no segundo ano na ex-Base Aérea nº2 na Ota. Posteriormente passou por completo para a Ota.
10 Decreto-lei nº34-A/90 de 24 de Janeiro.
11 Id. ibidem, preâmbulo.
12 Id. ibidem, nº1 do artº 145º.
13 Decreto-lei nº34-A/90 de 24 de Janeiro, nº4 do artº 145º.
14 Lei 46/86.
15 BATISTA ALVES, José (1992), “A Formação Base nas Academias Militares”. In: IDN-CESEDEN, Funchal: 10ª Jornada, “O Ensino Superior Militar e a Formação dos Oficiais”, p. B-46.
16 Refere-se a propósito a criação em 1996 do Laboratório de Aeronáutica da AFA.
17 De 19 de Junho de 1999.
18 Tal como refere o General Vaz Afonso “esta perspectiva de conjunto para o ensino superior militar iria...proporcionar condições para que a formação técnica comum aos vários cursos dos três ramos possa ser dada em conjunto. VAZ AFONSO, José (1995), “O Ensino Militar Conjunto”, in: Boletim do Instituto de Altos Estudos da Força Aérea. Lisboa, Fev., p.16.
 
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