A centenária Revista Militar comemora, em 2019, os seus 170 anos de publicação ininterrupta, estandarte único em Portugal e no Mundo. Apesar de ter sido fundada em 1 de dezembro de 1848, por um grupo de notáveis individualidades militares, a Revista só viria a publicar o seu primeiro número em janeiro de 1849, constituindo o seu vasto património um motivo de orgulho para todos os portugueses, em geral, e para os sócios da Revista, em particular.
Mantendo-se fiel ao espírito dos seus Estatutos, a Revista Militar tem ultrapassado os tempos e os inúmeros obstáculos e tem-se adaptado às novas tecnologias e paradigmas sociais, militares e políticos, dispondo, atualmente, de um acervo temático, literário, científico e cultural extraordinário, em especial na área da arte militar e das ciências militares.
Muitos foram os camaradas dos três ramos das Forças Armadas que, ao longo de mais de 170 anos, deram os seus contributos no âmbito da gestão da Revista ou na escrita de artigos que permitem, hoje, apoiar os historiadores, mas também todos aqueles que pretendem compreender melhor a evolução da Instituição Militar e da própria sociedade envolvente. Muitos deles alargaram o seu saber e labor a outras instituições de prestígio da área académica e científica, como a Academia das Ciências de Lisboa ou a Academia Portuguesa da História.
Nesta curta homenagem, vamos tratar, exclusivamente, das opções editoriais dos diferentes presidentes da direção da Revista Militar, pois muito trabalho de pesquisa tem sido feito ao nível da sistematização, da catalogação e da análise, nomeadamente, no período da publicação dos excelentes índices nos 150 anos da Revista Militar, então sob a direção do saudoso General José Lopes Alves. Mais recentemente, a informática tem vindo a facilitar a consulta e a análise, de acordo com diferentes critérios e pressupostos, instrumento disponibilizado a todos os sócios e leitores no portal da Revista Militar (https://www.revistamilitar.pt/) e no portal das Bibliotecas da Defesa, através dos quais tivemos acesso a todas as revistas publicadas.
A nossa análise será centrada na opção pelas introduções, notas de abertura ou editais (resumo dos primeiros números da Revista, entre 1849 e 2019), assim como na sua regularidade e conteúdos, pois não nos é possível fazer a leitura pormenorizada do impacto de cada editorial na sociedade civil e militar do seu tempo e em especial nos momentos mais significativos da história de Portugal.
O primeiro número de 1849 inclui uma “Introducção” da autoria de Fontes Pereira de Mello, então Tenente do Real Corpo d’Engenheiros, centrada nas palavras “Pensamento, Inteligência, Saber e Arte Militar”. Há uma preocupação assumida com a reflexão e a difusão da cultura das ciências e das artes, e em especial da “arte da guerra” e das “ciências militares”, com a consciência de que “a Guerra é a história dos homens e a Paz é o sonho dos sábios”.
Os primeiros números (em jeito de jornal, publicado mensalmente) tratavam temas tão diversos como a infantaria, a cavalaria, a artilharia, a administração da fazenda nacional, a história militar, a topografia, as variedades, a bibliografia, as crónicas interna e externa, a necrologia, a legislação militar e as promoções, mas não incluía editoriais.
O que podemos considerar como uma espécie de editorial ou nota de abertura da Revista Militar, foi publicado no número de 12 de dezembro de 1849, então “assinado” pela “direção da Revista”, e que se referia essencialmente ao primeiro ano de publicação. Esse número incluía, ainda, um índice, a lista dos senhores assinantes da Revista Militar em todo o ano de 1849, o boletim oficial do Exército (entre fevereiro e dezembro) e a já, então, “inevitável” mensagem de alerta para os pagamentos das quotas.
A tradição começa a marcar posição, no primeiro número de 1850, com mais uma “Introducção” da autoria da “direção da Revista”, cujo texto sublinhava a importância de Portugal ter uma Revista Militar que preenchesse uma lacuna da imprensa da época.
Nos anos seguintes, aquilo a que podemos associar a um editorial era assumido pela “direção da Revista”, no primeiro número de cada ano. Na “Introducção” de 1851, ano de grande instabilidade política e social, é destacada a importância do Exército enquanto “único esteio da sociedade: tão essencial para a guerra como útil na paz”.
Nos anos seguintes, a preocupação da Revista Militar na sua “Introducção”, publicada no primeiro número de cada ano, continuou a ser a de revelar a importância do Exército e dos seus valores, perante uma sociedade em crise e insensível ao papel do Soldado. Outros números são relativos a preocupações menores como o pagamento das quotas. A autoria varia entre a direção e o redator principal da Revista Militar.
Entre 1859 e 1865, não existe qualquer preocupação com a introdução, publicando-se artigos com temas diversos, claramente sem qualquer intenção ou objetivo pré-definido.
Entre 1866 e 1869, o espaço é ocupado por António Florêncio de Sousa Pinto (Tenente-coronel de Artilharia), que, neste último ano, escreve inclusivamente sobre os 20 anos da Revista Militar, sobre a Guerra e a Paz na Europa e ainda sobre a necessidade de reorganização do Exército. Nos anos seguintes e pelo menos até 1876, o mesmo autor assina uma rubrica sobre o Novo Ano, abordando as grandes preocupações internacionais e nacionais e as questões mais prementes associadas aos exércitos de então (neste último número faz o in memoriam do Marquês de Sá da Bandeira).
A partir de 1878, começa a ser mais interventivo o, então, Capitão Morais Sarmento (que viria a ser General e que escreveu na Revista Militar durante 60 anos e que a viria a dirigir durante 53 anos, entre 1878 e 1930)[1], que nesse ano faz inclusivamente alusão à importância de 30 anos de Revista Militar. Em 1896, é importante destacar uma mensagem de caráter ideológico, intitulada “Ao Exército”, em que a Revista Militar se congratula pela campanha de Moçambique.
Morais Sarmento continua a participar ativamente até que, em 1905, publica “Pró Pátria”, já como Presidente da Direção e enquanto General de Brigada. A Revista entra numa nova época, decorrente da fusão com outras revistas (Revista do Exército e da Armada, Revista de Administração Militar, Portugal Militar), numa demonstração de isenção e de harmonia entre todos os sócios, independentemente da diferença de opinião. E, assim, o novo lema “Pró Pátria”, voltando a Revista a ser mensal.
Até 1910, não existe qualquer editorial, até que, em setembro, o General Morais Sarmento, enquanto Presidente da Direção, escreve sobre “O desalento das virtudes cívicas”, numa verdadeira antecipação do que viria a acontecer a 5 de outubro. Assim, no número de novembro de 1910 é publicado o artigo “A Transformação do Regime Político em Portugal”, em que a direção da Revista Militar saúda e regista tão patriótico intento.
O General Morais Sarmento continua a publicar artigos diversos nos primeiros números do ano, à semelhança do que fazia em quase todos os números, tal a sua capacidade de produção escrita. Em 1919, publica “Lutuosa”, a propósito do assassinato de Sidónio Pais, a que se segue um artigo “Novo ano, novos cuidados”, com análise do pós-guerra, em que, na sua perspetiva, as condições da paz continuam ignoradas.
Nos dez anos seguintes, continua a não haver uma tradição a marcar os editoriais, sendo publicados diversos artigos por diferentes autores, normalmente, membros da direção.
O ano de 1929 inclui a “Concessão em Portaria do uso de uma Bandeira” pela Revista Militar, a “A memória dos fundadores da Revista Militar” e a “A Revista Militar e a evolução dos conhecimentos militares nos últimos 80 anos” a par da sessão comemorativa e de um artigo do General Morais Sarmento.
O primeiro número de 1938 inclui o discurso comemorativo do 90.º aniversário da Revista Militar e, dez anos depois, em 1948, no âmbito do “Ano centenário da «Revista Militar»”, é feita a evocação dos fundadores e publicado o artigo “No centenário da Revista Militar”, pelo General José Justino Teixeira Botelho (que dirigiu a Revista Militar durante 24 anos – viria a falecer a 16 de janeiro de 1956). Este artigo de referência inclui um resumo da história da Revista, a que se seguem outros artigos a propósito dos 100 anos. Nesse artigo, publicado no número 1-2, de Jan-Fev de 1948 e a páginas 29 e seguintes, refere a propósito dos fundadores:
“Correndo o ano de 1847, conta a tradição, alguns Oficiais que o acaso das operações militares juntou em certo acampamento, gizaram a criação de um jornal de conhecimentos militares ou – para me servir de palavras mais autorizadas que as minhas – a criação de uma publicação periódica literária, onde os indivíduos que exercitassem qualquer especialidade na grande classe militar, pudessem acompanhar, passo a passo, todos os melhoramentos e progressos que as artes e as ciências fazem todos os dias nos variadíssimos ramos que lhe dizem respeito.”
Em 1950, voltaram as “Introduções”, escritas em nome da “direção da Revista”, as quais desafiavam os sócios à escrita, numa postura de maior ligação aos sócios e aos leitores.
O primeiro artigo da primeira revista de 1954, escrito pelo General Telles Ferreira de Passos, Diretor Administrador, refere a velha praxe que impõe que o artigo inaugural do ano seja escrito por um dos mais antigos membros da direção.
Já sob a direção do General Afonso Botelho, a partir de 1956, continua a mesma linha de não haver qualquer introdução ou editorial, seja no primeiro número do ano, seja em qualquer outro número.
O primeiro número de 1959, intitulado “Inter-Armas em 1959” e escrito pelo Diretor Administrador, General Ferreira de Passos, destaca a restruturação que estava em curso e o aparecimento da Força Aérea e da terceira dimensão do teatro de operações, sem esquecer mais um aniversário da Revista Militar, que considera uma espécie de “Academia das Ciências Militares”.
Com a guerra na Índia e depois em África, e numa altura em que são colocadas em causa as colónias e a “existência da Nação no Além-Mar”, proliferam os artigos sobre o “Ultramar Português”. Destaca-se o artigo do vogal Capitão-de-mar-e-guerra Trindade de Sousa (a Marinha passa a ter maior participação nos corpos sociais da Revista), intitulado “1961 – Defesa das Fronteiras Morais”, onde sublinha, com exemplos históricos, a necessidade de garantir a defesa do Império, começando pelas fronteiras morais. Em 1962, com o início da guerra do Ultramar, o destaque vai para um artigo longo e profundo do General Afonso Botelho, Presidente da Direção, intitulado “Soldados de Portugal”. O artigo sublinha as qualidades dos soldados de Portugal, desde as grandes batalhas da história ao conflito mais recente nas colónias, em defesa do ultramar, desde a Índia até África. O isolamento internacional é destacado, assim como a necessidade de umas Forças Armadas unas para “a luta pela Pátria no Ultramar” em que Portugal não pode contar com os tradicionais aliados. Nas Forças Armadas passa a estar a perenidade da Pátria. É um artigo de incentivo à nova guerra de subversão em África, em apoio da posição do Presidente do Conselho, Dr. Oliveira Salazar, muitas vezes citado.
Nos anos seguintes, em plena guerra colonial, os primeiros números são escritos maioritariamente pelo Capitão-de-mar-e-guerra Guilhermino de Magalhães e intitulados “O Mundo Naval no ano de X”. Em 1973, é dado destaque ao 123º aniversário da fundação da Revista, com a presença do Presidente da República e a inclusão dos textos do General Humberto Buceta Martins e do General Chefe de Estado-Maior do Exército.
A revolução dos cravos de 25 de Abril de 1974 não consta dos editoriais (estranhamente ou não – até porque a direção se manteve), sendo o primeiro artigo de 1975, escrito pelo Capitão-de-mar-e-guerra Rodrigues Pinto sobre “Mundo Político – situação e perspetivas para 1975”, mas sem qualquer relação com um editorial, uma nota prévia ou mesmo uma introdução.
Em 1977, um artigo da autoria do Presidente da Mesa da Assembleia-Geral, General Buceta Martins, intitulado “O Milagre da Longevidade da Revista Militar” (segunda parte de um artigo publicado em Março de 1976 – continuaria num próximo número) é muito importante para compreender a idiossincrasia da Revista Militar.
Finalmente, em 1978, a Revista Militar passa a ter a “Nota de Abertura” pelo Presidente da Direção, na altura, o General Câmara Pina. No entanto, nos anos seguintes, os artigos de abertura anual continuam a ser diversificados, como os in memoriam, a saudação aos 125 anos da “Revue Militaire Suisse” ou o artigo do, então, Coronel Loureiro dos Santos, intitulado “Contributos para uma caracterização das crises (políticas) internas”. Aparecem, então, as notícias do mundo militar, a cargo do Coronel Gomes Bessa, mas os editoriais e as notas de abertura continuam a não ser uma constante.
Em 1989 e no âmbito das comemorações do aniversário da Revista, é publicado um artigo intitulado “Os fundadores da Revista Militar” pelo General Fernando Louro de Sousa, Presidente da Mesa da Assembleia-Geral da Revista, em linha com a tradição – no início de cada decénio da Revista Militar, um preito de homenagem aos 26 Fundadores (os primeiros sócios efetivos), que não podemos deixar de recordar e evocar:
– António Maria de Fontes Pereira de Mello (Tenente Engª);
– João Tavares de Almeida (Major Artª);
– João Maria Fradesso da Silveira (Capitão Infª);
– Luís de Sousa Folque (Capitão Artª);
– António Ladislau da Costa Camarate (Capitão Artª);
– José Carlos Conrado de Chelmicki (Capitão Engª);
– Faustino José de Menna Apparício (Tenente Engª);
– António José da Cunha Salgado (Tenente Cavª);
– Augusto Xavier Palmeirim (Coronel Infª);
– José Maria Moreira de Bergara (Tenente-Coronel Engª);
– Joaquim José Gonçalves de Mattos Corrêa (1º Tenente, Marinha);
– José Maria de Pina (Major Artª);
– António José Gonçalves Chaves (Tenente Engª);
– António de Mello Breyner (Capitão Estado-Maior);
– Silvino Cândido de Almeida Carvalho (Capitão Estado-Maior);
– Barão de Eschwege (Guilherme Luís) (Brigadeiro Engª);
– Barão de Wiederhold (Augusto Ernesto Luís) (Tenente-Coronel Estado-Maior);
– Francisco Maria Bordallo (2º Tenente, Marinha);
– José Frederico Pereira da Costa (Capitão Artª);
– António Florêncio de Sousa Pinto (Capitão Artª);
– Francisco Xavier Lopes (Major Artª);
– Fortunato José Barreiros (Coronel Artª);
– Joaquim Henriques Fradesso da Silveira (Tenente Infª);
– Leopoldo Xavier de Miranda (Tenente Infª);
– Bento José da Cunha Vianna (Capitão Infª);
– João Manuel Cordeiro (Capitão Artª).
Só a partir de 1991 foi assumido pelo General José Lopes Alves, Presidente da Direção, que haveria, a partir desse número, um editorial do Presidente da Direção acerca do respetivo conteúdo. O General Lopes Alves, até 2000, incluiu no seu editorial uma “nota de abertura”, onde debatia as questões do ambiente internacional e nacional, seguida do “contexto da revista”, onde fazia a análise sumária dos diferentes artigos da revista. Em alguns números, acrescentava uma “nota final” onde abordava acontecimentos extraordinários, como o falecimento de alguma figura da Revista Militar ou importante da sociedade.
A partir de 1997, a Revista passa a ser produzida por processos informáticos, como viria a ser o caso do número especial sobre Macau, no âmbito do 150.º aniversário.
Em 1998 e 1999, a Revista Militar comemorou de modo particularmente ambicioso os seus 150 anos, num vasto programa coordenado pelo Presidente da Direção, o, então, General José Lopes Alves, e onde mais uma vez se fez alusão aos fundadores e à importância da Revista no panorama nacional e internacional. O n.º 1 de 1999 inclui, ainda, a reedição do primeiro número da Revista, de que faz parte a introdução de Fontes Pereira de Melo. Foi também neste âmbito que se fez o lançamento dos dois primeiros volumes dos precisos índices da Revista Militar.
A partir de 2001, e já com o saudoso General Gabriel Augusto do Espírito Santo, novo Presidente da Direção da Revista, o editorial mantém-se com “notas de abertura” (elogio ao antecessor e linha de continuidade), práticas de informação, do Coronel António Pena e contexto da Revista. Os editoriais passaram depois a ter um título e a abordar temas importantes como “O Serviço Militar: “Pas d’Argent, Pas des Suisses”, a “Energia e Segurança Nacional” e “Novo ano, Novos desafios: Ciberataques e Ciberdefesas”. Separadamente, era incluído um artigo sobre o “Resumo do acervo articular da Revista fornecido pelos autores”.
O General José Luíz Pinto Ramalho sucede ao General Espírito Santo como Presidente da Direção da Revista Militar, em 2012, e, desde logo, assumiu os editoriais em todos os números da Revista, seguidos do “Resumo do acervo articular da Revista fornecido pelos autores”. Passou a escrever os seus editoriais sem título, mas particularmente interventivos, seja sobre questões internacionais ou nacionais. Aborda questões estruturantes do Estado em termos de segurança e defesa e não deixa por mãos alheias o seu pensamento e as criticas que entende fazer a quem coloca em causa os valores da Instituição Militar e dos seus servidores. Num período de crise económica e financeira, que se mantém desde 2008, as consequências para as Forças Armadas e para as Forças de Segurança fazem-se sentir, designadamente em termos de efetivos e de reequipamento, e o General Pinto Ramalho apresenta nos seus editoriais uma postura crítica, mas construtiva sobre todos os temas, no sentido de contribuir, como cidadão, para a resolução dos problemas das Forças Armadas e de Segurança, num Estado de direito democrático em que as funções tradicionais de soberania estão crescentemente fragilizadas.
A Revista Militar contribuiu, indiscutivelmente, ao longo dos últimos 170 anos, para o desenvolvimento da cultura e do pensamento militar em Portugal, numa postura em linha com o seu lema “Pró Pátria”. É o único órgão de imprensa militar a nível mundial que se publica ininterruptamente desde 1849, em respeito às suas características iniciais, normas e estatutos.
Tivemos o grato prazer de efetuar a leitura de todas as revistas militares, entre 1849 a 2019 e particularmente com maior ênfase no que respeita aos primeiros números de cada ano, no sentido de descortinarmos os editoriais, introduções ou notas de abertura e uma eventual linha de ação dos diferentes Presidentes de Direção. Nesse sentido, destacamos, de seguida, os aspetos que consideramos mais significativos para a compreensão da idiossincrasia da Revista Militar e que explicam, em parte, a razão da sua longevidade, credibilidade e sentido de utilidade.
A “introdução” fez parte do n.º 1 da Revista Militar, publicado em 1849 e da autoria de um dos fundadores, Fontes Pereira de Melo, mas não teria seguimento com regularidade. O texto é centrado nas palavras-chave “Pensamento, Inteligência, Saber e Arte Militar”, as quais seriam orientadores da conduta da própria Revista Militar.
Nos anos seguintes, os primeiros números de cada ano, passaram a incluir uma “introdução” assinada pela “direção da Revista” (ou pelo redator), e em geral fazendo alusão à situação política e militar, destacando a importância do Exército ou das Forças Armadas para a estabilidade e a Paz. A comunicação com os sócios fazia-se também através das sucessivas mensagens de alerta para o pagamento de quotas, afinal a sustentabilidade da Revista. O primeiro artigo da primeira revista de 1954, escrito pelo General Telles Ferreira de Passos, Diretor Administrador, refere a velha praxe que impõe que o artigo inaugural do ano seja escrito por um dos mais antigos membros da direção.
A publicação de um artigo no início do ano de cada década, e normalmente sobre os fundadores e o trabalho desenvolvido pela Revista Militar, transforma-se rapidamente numa tradição, publicada pela direção ou pelo Presidente da Direção. E o essencial desses números passa por relevar o papel do Exército, dos valores militares, do soldado, dos fundadores e da importância da Revista Militar como “Escola Prática” ou “Academia” das Ciências Militares.
Uma referência indiscutível da Revista Militar é o General Morais Sarmento (que escreveu na Revista Militar durante 60 anos e que a viria a dirigir durante 53 anos, entre 1878 e 1930), claramente interventivo e opinativo nos seus inúmeros artigos. É também com Morais Sarmento que se inicia a segunda época da Revista Militar com o lema “Pró Pátria” e a fusão com outras revistas.
Os momentos mais marcantes da História de Portugal, caso da implantação da República em 1910, da participação na Grande Guerra, do início da guerra em África, em 1962, ou da revolução de 25 de Abril de 1974, são abordados de forma cuidada, normalmente através de artigos de congratulação por parte da direção da Revista, mas também dos Presidentes da Direção (caso do General Afonso Botelho e do seu artigo sobre “Os Soldados de Portugal”, publicado em 1962).
Entre os números comemorativos (por décadas e, por vezes, nos anos terminados em 8 – criação da Revista – e outros em 9 – publicação do primeiro número), que fazem alusão à memória dos fundadores da Revista Militar, destacam-se o de 1929 (80 anos), com um excelente artigo sobre “A Revista Militar e a evolução dos conhecimentos militares nos últimos 80 anos”, a par da sessão comemorativa e de um artigo do Presidente da Direção, o General Morais Sarmento. No número relativo ao centenário, publicado em 1948, já sob a direção de outro grande Presidente da Direção da Revista Militar, o General José Justino Teixeira Botelho (que dirigiu a Revista Militar durante 24 anos – viria a falecer a 16 de janeiro de 1956) é feita a evocação dos fundadores e publicado o artigo “No centenário da Revista Militar”, que inclui um resumo da história da Revista. Para além destes números, destacamos as comemorações dos 150 anos da Revista, em 1998/1999, com vários artigos alusivos à história da Revista Militar, publicados no âmbito de um programa vasto e ambicioso, coordenado pelo General José Lopes Alves, mas também o primeiro (e excelente) número de 2019, alusivo aos 170 anos.
O artigo publicado entre 1976 e 1977 (em três partes) pelo Presidente da Mesa da Assembleia-Geral, General Buceta Martins, intitulado “O Milagre da Longevidade da Revista Militar”, é particularmente importante para compreender a idiossincrasia da Revista Militar sendo um dos aspetos referidos a posição “Pró Pátria” dos presidentes em face de situações conjunturais.
Finalmente, em 1978, a Revista Militar passa a ter a “Nota de Abertura” pelo Presidente da Direção, na altura, o General Câmara Pina, mas foi ação sem continuidade periódica, apesar da sua elevada participação em artigos de opinião publicados nas diferentes revistas.
A tradição de um editorial publicado em todos os números só viria a ter lugar a partir de 1991, com o General José Lopes Alves como Presidente da Direção (até 2000 incluiu no seu editorial uma “nota de abertura”, onde debatia as questões do ambiente internacional e nacional, seguida do “contexto da revista”, onde fazia a análise sumária dos diferentes artigos da revista).
Esta linha de conduta, com editoriais publicados em todos os números da Revista, agora seguidos do “Resumo do acervo articular da Revista fornecido pelos autores”, manteve-se com o General Gabriel Augusto do Espírito Santo e, mais recentemente, com o General José Luíz Pinto Ramalho. Neste caso, os editoriais não têm título, mas são particularmente interventivos, seja sobre questões relacionadas com o ambiente internacional ou nacional, com destaque para as grandes questões da segurança e defesa, numa postura crítica e construtiva, assente no princípio da liberdade de pensamento e no lema da Revista Militar “Pró Pátria”.
Honra e Glória à Revista Militar.
[1] Depois do fundador, Tenente Fontes Pereira de Melo, foram presidentes da direção da Revista Militar: Coronel Fortunato José Barreiros, General de Brigada Francisco Xavier Lopes, Coronel António Florêncio de Sousa Pinto, Coronel António Ladislau da Costa Camarate, Generais de Divisão João Tavares de Almeida, Augusto Xavier Palmeirim, António de Mello Breyner, Coronel Luíz Travassos Valdez, Coronel Augusto Frederico Pinto de Rebello Pedrosa, General de Divisão João Manuel Cordeiro, General de Brigada João Esteves de Moraes Sarmento e Generais José Justino Teixeira Botelho, Affonso Talaya Lapa de Sousa Botelho, Luíz Maria de Câmara Pina, José Manuel de Bethencourt Rodrigues, José Lopes Alves, Gabriel Augusto do Espírito Santo e José Luíz Pinto Ramalho.
Vogal da Direção da Revista Militar. Presidente da Comissão Portuguesa de História Militar.