Nº 2635/2636 - Agosto/Setembro de 2021
Pessoa coletiva com estatuto de utilidade pública
Guerra Híbrida
Coronel
António José Fernandes de Oliveira

Introdução

Os recentes conflitos destacam a necessidade de recordar em permanência que o inimigo é uma organização humana com a capacidade de raciocinar de forma criativa.

James Mattis (2005)

 

A intervenção russa na Ucrânia gerou um intenso debate sobre o uso e a eficácia de uma forma de fazer a guerra que foi designado de “guerra híbrida”.

A essência do debate é sobre a exploração de todas as dimensões de guerra, com o emprego de uma mistura de forças convencionais e não convencionais, meios abertos e clandestinos, para combater atores que apresentam uma grande superioridade, quase dissimétrica, no campo convencional. Esta situação cria uma lógica em que os Estados e atores não-estatais, ou uns com o apoio ou recorrendo aos outros, procuram sair do modo tradicional ou convencional de fazer guerra e desafiam os mais fortes através de uma abordagem assimétrica procurando alguma capacidade específica ou uma combinação inesperada de tecnologias e táticas para ganhar uma vantagem.

Parece evidente que os Estados ocidentais, apoiados na sua forte componente convencional, própria ou decorrente da participação em organizações de defesa coletiva, dominarão os adversários convencionais num futuro previsível criando assim uma situação de quase dissimetria para com outros atores. A estes, segundo James Mattis (2005, 1), será muito mais vantajoso o confronto através de uma combinação de diversas formas de fazer a guerra, isto é, através da guerra híbrida.

Apesar desta evidência, o enquadramento concetual desta forma de fazer a guerra e a definição do próprio conceito tem sido alvo de grandes debates e representa o primeiro grande desafio para abordar o tema, o que faremos na primeira parte deste texto.

A sua caracterização e compreensão das formas como diversos atores têm aplicado o conceito têm-se revelado a melhor maneira de ultrapassar as dificuldades conceptuais e o caminho para abordar o combate a atores que
recorrem a esta forma muito flexível e imprevisível de materializar as suas modalidades estratégicas. A maneira como se materializa o conceito é tratado na segunda parte do texto.

Por último fazemos uma abordagem àquele que é talvez o maior desafio que os Estados ocidentais e as organizações internacionais a que pertencem terão de enfrentar num futuro próximo – o combate às ameaças híbridas. Para além da resposta politico-estratégica, a componente militar mereceu a nossa atenção.

 

1. Enquadramento conceptual

O consenso internacional sobre o termo ‘guerra híbrida’ é claro: ninguém entende o termo, mas todos, incluindo a OTAN e a União Europeia, concordam que o mesmo constitui um problema.

Cullen, Reichborn-Kjennerud (2017, 3)

 

a. Referências históricas – uma velha realidade ou um fenómeno novo?

O termo “guerra híbrida” é utilizado genericamente para referir o uso simultâneo e coordenado de meios convencionais e não convencionais para atingir um estado-final desejado ao nível politico-estratégico (Sliwa, 2017, 14). Apareceu e generalizou-se em 2005 (Mattis e Hoffman), tendo sido posteriormente usado para descrever a estratégia utilizada pelo Hezbollah na guerra do Líbano, em 2006, e ganhou especial relevância com a intervenção militar russa na Ucrânia. Desde então, o termo tem vindo a ganhar importância, tendo sido adotado e promovido como uma base para a estratégia militar moderna e dominou grande parte dos debates entre académicos, militares e decisores políticos ocidentais (Sliwa, 2017, 13).

Alguns autores, no entanto, desvalorizam a atualidade do tema, alegando que as guerras sempre usaram todo o espetro possível de atividades tendo em vista derrotar o inimigo. Segundo esta corrente, embora os meios pelos quais atores estatais e não estatais conduzem a designada “guerra híbrida” tenham mudado, o princípio fundamental da utilização de uma combinação de métodos convencionais e irregulares para atingir um objetivo político é consistente com formas mais antigas de conflito e não algo genuinamente novo (Mosquera e Bachmann, 2016, 64) (Visacro, 2018, 67). Mansoor (2012, 1) resume a abordagem desta corrente defendendo que, embora a guerra vá mudando, as suas características de acordo com as circunstâncias, qualquer que seja o modo como ela se manifesta, a guerra no século XXI tem sido e continuará a ser um fenómeno complexo, em que a sua essência não mudou nem deverá mudar.

Outros autores têm uma visão diferente. Defendem que, pelo surgimento de formas aparentemente novas de combinar forças regulares e irregulares nos campos de batalha e apesar de ter as suas raízes na história, a atual conflitualidade de matriz híbrida é mais complexa pois foi estendida pela globalização e pelos poderes ressurgentes (Hoffman, 2009a, 34). Tem, assim, potencial para transformar os cálculos estratégicos de potenciais beligerantes devido à existência de novos ingredientes, como sejam o exponencial aumento de atores não-estatais, a tecnologia da informação e a proliferação da tecnologia e dos sistemas de armas avançados (Deep, 2015, 1), destacando-se a componente cibernética.

A combinação ou integração, por parte de um contendor, de meios irregulares com forças convencionais, ao nível operacional ou tático, é bastante desafiadora, mas encontra-se bem documentada ao longo da História (Hoffman, 2009a, 36). Alguns historiadores encontram as suas origens históricas na guerra do Peloponeso, no sec. V (AC), que opôs Atenas e Esparta e posteriormente nas campanhas travadas na antiga Hispânia, nos séculos II e III (AC), por Viriato e Sertório contra as forças romanas (Mansoor, 2012, 3). Esta combinação tem outros exemplos históricos na revolução americana, em que a atuação do exército continental foi coordenada com robustas forças de milícia (Deep, 2015, 1) ou nas guerras napoleónicas, no início do sec. XIX, em que a atuação das guerrilhas espanholas e portuguesas combinada com a atuação de forças regulares britânicas e portuguesas foi fundamental para gerar efeitos militares decisivos sobre as forças de Napoleão (Hoffman, 2007, 20, McCulloh e Johnson, 2015, 3).

Outros exemplos são sobejamente conhecidos.

Na revolta árabe, onde o exército britânico combinou operações convencionais na Palestina com forças irregulares sob o controle operacional britânico (Deep, 2015, 1). Durante a II Guerra Mundial, na frente oriental, onde o exército soviético sincronizou o emprego de dezenas de milhares de guerrilheiros soviéticos e outros irregulares com as suas forças militares convencionais (Visacro, 2018, 68), a fim de combater as forças alemãs que sofreram contínuas interrupções nas suas linhas de comunicações (Mansoor, 2012, 4). E, como mostra a segunda Guerra Sino-Japonesa de 1937 a 1945, esta não é apenas uma abordagem ocidental. Mao Tse Tung tornou-se especialistas na mistura de forças regulares e com forças irregulares para atacar o inimigo de forma simétrica e assimétrica. Para Mao, as forças convencionais e as forças de guerrilha eram claramente vistas como fazendo parte do mesmo continuum (Mansoor, 2012, 5).

Frank Hoffman1 (2009a, 36), apesar de reconhecer esta continuidade histórica e a não novidade da conflitualidade de matriz híbrida, defende que as atuais guerras híbridas são diferentes com base na alteração do contexto em que se desenvolvem2 e que atualmente carateriza as relações internacionais.

O sistema unipolar, que persistiu desde a queda da ex-União Soviética, deu origem a um sistema internacional em que desafios não convencionais para os Estado são cada vez mais prevalentes. A preponderância dos Estados ocidentais, especialmente do poder militar americano, condicionou os conflitos dando força aos métodos de guerra que tentam aproveitar as debilidades da estrutura militar convencional. Por outro lado, os atores estatais mais relevantes têm historicamente patrocinado combatentes irregulares e atores não-estatais na execução de campanhas militares mais amplas. Um exemplo emblemático foi o apoio iraniano ao Hezbollah e outros grupos de militantes xiitas (Deep, 2015, 1).

Efetivamente, foi a atuação do Hezbollah libanês3, um ator não-estatal, que durante a sua atuação na guerra Israel-Hezbollah, em 2006, ao combinar os aspetos da guerra convencional e não convencional, para lutar contra o principal poder militar convencional do Médio Oriente – as Forças de Defesa de Israel –, deu uma nova dimensão a esta aproximação híbrida, levando o tema para o campo da discussão teórica e que alguns observadores e analistas antecipassem que a manifestação de ameaças híbridas fosse vista como algo de novo e se possa vir a constituir uma das tendências no futuro (McCulloh e Johnson, 2015, 3). No mínimo, como refere Deep (2015, 1), a guerra de Israel-Hezbollah mostrou que, embora o conceito pudesse não ser considerado novo, a sofisticação e letalidade de alguns atores não-estatais bem como a sua capacidade de resistir dentro do sistema do Estado moderno são uma realidade nova.

Estaremos então efetivamente perante uma nova geração na arte de fazer a guerra?

A resposta é também fonte de controvérsia. Segundo Sliwa (2017, 13), não há nenhuma discussão relativamente ao facto de adversários, no passado e no presente, usarem de forma criativa as diversas ferramentas do espectro da guerra, incluindo o uso de táticas convencionais e irregulares em todas as dimensões para atingirem os seus objetivos. No entanto, para este autor, não é claro que se deva usar o termo “híbrido”, para além do seu mero valor descritivo, pois, na prática, qualquer ameaça pode ser híbrida, enquanto não esteja limitada a uma única configuração e dimensão na forma de conduzir a guerra. Assim, continua Van Puyvelde (2015, 1), quando qualquer uso da força ou ameaça do seu uso é definido como “híbrido”, o termo perde o seu valor e causa confusão, em vez de esclarecer a real dimensão desta eventual “nova realidade. Outro problema que identifica com o termo “híbrido” é que o uso de um novo termo sugere que há algo de novo sobre a guerra moderna – podendo não ser o caso. Para reforçar o seu ponto de vista, recorre a Colin Gray (2005), que sobre a guerra no futuro argumenta que, por uma extensão do presente, a guerra será essencialmente mais do mesmo.

As alterações visíveis parecem ser apenas mais uma combinação dos “ingredientes” já conhecidos e teorizados, salvaguardando o enquadramento histórico (Oliveira, 2011, 35), materializando o pensamento de Gray (2005, 167), segundo o qual o caracter da guerra altera-se de acordo com as mudanças na sociedade, na cultura, na política e na tecnologia. Esta realidade não será um fenómeno novo, mas parece ser a mais recente face da guerra através de uma nova combinação de ingredientes relacionada com a escala, a velocidade e a intensidade do uso diferenciado das várias “ferramentas” de fazer a guerra que não encontra precedentes (NATO, 2016, 14).

Esta novidade baseia-se na capacidade de um ator sincronizar vários instrumentos de Poder de forma simultânea e intencionalmente explorar a criatividade, a ambiguidade, a não-linearidade e os elementos cognitivos da guerra (Cullen e Reichborn-Kjennerud, 2017, 3) para influenciar os dirigentes políticos mais influentes e os seus principais decisores. Combina operações cinéticas com esforços subversivos destinados a desestabilizar as funções de um Estado e polarizar a sua sociedade (Pindjak, 2014, 1) e, ao contrário de guerra convencional, o “centro de gravidade” passou a ser a população-alvo (McCuen, 2008, 111). Como referem Manko e Mikhieiev4 (2018, 15), o objetivo deste tipo de guerra é não só a liquidação, mas também a desmoralização e a imposição da vontade do agressor à população do Estado agredido.

 

b. Conceitos relacionados. Um novo rótulo?

Segundo Sliwa (2017, 27), parece claro que, neste início do sec. XXI, estamos efetivamente perante uma nova geração da arte de fazer a guerra. Esta deverá ser compreendida segundo uma nova abordagem decorrente da “revolução da informação” (Visacro (2018, 74) e em que, no futuro, os conceitos de guerra regular e irregular continuarão a ser materializados de formas diversas e expandindo as suas dimensões ao espaço e ao campo cibernético (Gray, 2005, 154) dando assim corpo ao atual paradigma.

Este paradigma tem sido alvo de diversas abordagens no sentido de o conceptualizar, em que os académicos tentam descrever os aspetos funcionais desta nova forma de fazer a guerra com uma variedade de modelos e metáforas. No atual debate sobre estes modelos incluem-se um conjunto de conceitos e termos, destacando-se a “quarta geração da guerra” (Lind, 1989, Hammes, 2004), a “guerra irrestrita” (Liang e Xiangsui, 1999), a “guerra composta” (Huber, 2004), a “guerra entre o povo” (Smith, 2005) ou a “guerra não linear” (Gerasimov, 2013). Ao introduzirmos o termo “guerra híbrida” estaremos apenas perante um novo rótulo?

A expressão “quarta geração de guerra” foi introduzida por William Lind, em 1989, e posteriormente desenvolvida por Thomas Hammes, em 2004, sendo o argumento-base do seu livro “The Sling and the Stone on War in the 21st Century”. Hammes (2004, 208) defende que os atuais conflitos fazem parte de uma nova tipologia de conflitos armados, que designa de “guerra de quarta geração”, e que se caracteriza por uma forma de insurreição envolvente, fundamentada no preceito de que uma vontade política superior, quando empregue corretamente, pode derrotar um potencial económico e militar muito superior.

Envolve a utilização em rede de instrumentos políticos, económicos, sociais e militares para convencer os decisores políticos inimigos que os seus objetivos estratégicos são inatingíveis ou demasiado dispendiosos para os retornos esperados. Assim, passaram a ser usadas todas as redes disponíveis para combater, pretendendo-se, em vez de tentar derrotar as forças militares opositoras, destruir a vontade política do adversário, aniquilando a vontade política dos seus decisores e conquistando a população que o apoia5. O campo de batalha torna-se cada vez mais disperso e a vitória resultará em primeira instância da implosão do inimigo, em vez da sua destruição física (Lind, 2004), o que normalmente é conjugado com o prolongamento da duração do conflito (McCulloh e Johnson, 2015, 59).

A base concetual dos dois conceitos parece evidente. No entanto, o conceito de “guerra de quarta geração” não é descritiva quanto à combinação de múltiplas formas de guerra, concentrando-se mais na importância crescente dos fatores não cinéticos no desenvolvimento dos atuais conflitos, tentando acima de tudo criar uma nova fase temporal em relação à abordagem do fenómeno da guerra em contraponto com períodos anteriores – as anteriores gerações. Em termos estratégicos e operacionais, a “guerra híbrida” pode recorrer a técnicas e táticas características da quarta geração da guerra, mas também das três anteriores.

A expressão “guerra irrestrita” ou “guerra ilimitada” deve-se aos coronéis chineses Qiao Liang e Wang Xiangsui que, em 1999, apresentaram um ensaio que se baseava na combinação de vários domínios na arte de conduzir a guerra, aparecendo este conceito como resposta a um clima de desequilíbrio estratégico.

A essência da guerra ilimitada é que esta explora os benefícios da implementação das possíveis combinações entre os diversos instrumentos do Poder (Hoffman, 2007, 22). Retirando-lhe os limites físicos do campo de batalha físico, destacam-se as ações de guerra que vão para além dos esforços militares, por expansão para outros domínios além do material, tais como a economia, a religião, a cultura, o ambiente e as redes de informação (McCulloh e Johnson, 2015, 57).

A grande limitação deste conceito assenta na ausência de uma operacionalização do mesmo. Isto é, o conceito como apresentado está limitado a uma base teórica a ser aplicada ao nível político. No entanto, as bases aplicáveis a este nível não diferem muito das defendidas pelos teorizadores da guerra híbrida apoiando-se em três princípios semelhantes: a omnidirecionalidade, a sincronização e a assimetria (Hoffman, 2007, 23).

O termo “guerra composta” foi cunhado por Thomas Huber, na sua obra “Compound Warfare. That Fatal Knot”, publicada em 2004, e designa a “utilização simultânea de uma força regular ou principal e de uma força irregular ou de guerrilha contra um inimigo” (Huber, 2004, 1). O benefício desta combinação é que se pode pressionar simultaneamente um inimigo através da concentração de forças (efeito de massa) e da dispersão, usando ambas as forças de forma complementar, em que o todo é maior que a soma das partes (McCulloh e Johnson, 2015, 57). A revolução americana (Huber, 2004, 53) e a Guerra Peninsular (Huber, 2004, 91) são dois exemplos de guerra composta. Huber termina a sua obra admitindo que a intenção da complementaridade da atuação das forças foi sempre, ao longo dos tempos, descobrir ou criar e posteriormente explorar uma vulnerabilidade do inimigo (Huber, 2004, 314).

A contribuição da guerra composta para a evolução da teoria de guerra de híbrida é que ela descreve o benefício de empregar os dois tipos de forças sob um comando unificado. No entanto, o modelo da guerra composta descreve o emprego de duas forças distintas em diferentes espaços no campo de batalha, sendo apenas unificado o comando, garantindo o apoio físico de uma à outra (Hoffman, 2007, 20). Além disso, as subcomponentes das forças são também convencionais ou irregulares, sem uma capacidade inerente de adaptação a diferentes formas de atuação (McCulloh e Johnson, 2015, 57). Assim, segundo Hoffman (2009a, 36), as guerras compostas ofereceram a sinergia das combinações ao nível estratégico, mas não a complexidade, fusão e simultaneidade aos níveis operacionais e táticos e a componente irre-
gular estará, por princípio, subordinada em importância à componente convencional o que a distingue do novo conceito de guerra híbrida.

No entanto, apesar da tentativa de separar os dois conceitos, os teorizadores recorrem aos mesmos exemplos históricos para alavancar a sua teoria.

A doutrina russa desenvolveu o conceito de “conflito não linear”. De acordo com este conceito, também conhecido por “doutrina Gerasimov”, o conflito não-linear é descrito como a implantação sequencial de múltiplas e complementares táticas militares e não militares, convencionais e não convencionais (Sliwa, 2017, 15). Uma guerra não linear é travada quando um Estado emprega as forças militares convencionais e irregulares em conjunto com meios dos campos psicológico, económico, político e ataques cibernéticos (Stowell, 2018).

Os efeitos são compreendidos como uma mudança de estado de uma entidade e são o resultado de ações sincronizadas adaptadas contra as vulnerabilidades específicas de um determinado sistema (Cullen, Reichborn-Kjennerud, 2017, 13). Assim, na aplicação prática, o conceito russo de “conflito não-linear” parece exemplificar a estratégia que os teorizadores ocidentais designam por “guerra híbrida” (Stowell, 2018).

No entanto, Potîrniche (2018, 12) defende que os modelos não são semelhantes, pois, enquanto a palavra-chave para descrever a “guerra híbrida” é “variedade” (na perspetiva dos meios), a palavra-chave para descrever o conceito de “guerra não linear” é “penetração” (na perspetiva de rutura) e decorre de uma abordagem mais sequencial de ações.

Analisando os seis conceitos anteriores, parece evidente a proximidade entre muitos dos requisitos que os caraterizam. No entanto, o conceito de “guerra híbrida” parece ser o mais abrangente aos diversos níveis, nomeadamente ao nível da sua operacionalização. Assim, após o conflito no Líbano, em 2006 e, sobretudo, após a intervenção russa na Ucrânia, proliferou a literatura diretamente relacionada com este conceito, passando este a ser o termo mais utilizado pelos académicos e decisores políticos ocidentais e mesmo no campo das organizações internacionais.

 

c. Do conceito a uma possível definição

Após a introdução do conceito, passou-se à fase da definição do mesmo e diversos autores e organizações apresentaram definições de “guerra híbrida”6. Vejamos alguns exemplos recentes.

Hoffman (2007, 29) começou por defini-la como uma forma de guerra que incorpora um espetro de diferentes modos de fazer a guerra, incluindo capacidades convencionais, táticas e formações irregulares, ações terroristas e atividades criminais, podendo ser conduzidas pela mesma ou por unidades separadas, mas dirigidas e coordenadas no campo de batalha para atingir efeitos sinérgicos aos diversos níveis da guerra.

O USArmy (2011, 4) define-a como a combinação de ameaças regulares, irregulares, terroristas e de grupos criminosos que podem atuar de forma descentralizada ou coordenada e que possuem capacidades anteriormente monopolizadas pelos Estados-nação. Estas ameaças híbridas criam um ambiente de segurança mais competitivo.

Para McCulloh e Johnson (2015, 62), a guerra híbrida é um conflito violento onde é utilizada uma organização de forças regulares e irregulares, com meios e comportamento complexo, empregues em vários domínios para alcançar um efeito sinérgico. Definem ainda uma força híbrida como uma organização militar que emprega uma combinação de organizações convencionais e não convencionais, equipamentos e técnicas num ambiente único, desenhado para alcançar efeitos sinérgicos estratégicos (McCulloh e Johnson, 2015, 2).

Cullen e Reichborn-Kjennerud (2017, 8) definem a guerra híbrida como o uso sincronizado de múltiplos instrumentos de poder adaptados às vulnerabilidades específicas em todo o espectro de funções da sociedade para alcançar efeitos sinérgicos.

Stowell (2018) refere que o termo “guerra de híbrida” ou “ameaça híbrida” conota o uso da força militar convencional, apoiada por táticas de guerra irregular e cyber.

Tendo por base o estudo de caso da Ucrânia, Manko e Mikhieiev (2018, 17) definiram a guerra híbrida como um conjunto de ações pré-preparadas e operacionalmente implementadas de natureza militar, diplomática, económica e informacional para atingir objetivos estratégicos. O seu papel principal é o de subordinar os interesses de um Estado a outro, preservando formalmente o sistema político do Estado atacado.

A NATO, logo em 2009, reconheceu a complexidade deste tipo de ameaça através do relatório do Allied Command Transformation, “Multiple Future Projects. Navigating Towards 2030”, assumindo que parte das ameaças e riscos teriam uma “natureza híbrida” através de uma mistura imprevisível e coordenada de guerra convencional, guerra irregular, terrorismo e crime organizado (ACT, 2009, 7). No entanto, apesar de todos os estudos e planeamentos efetuados nesta área nunca conseguiu fazer aprovar uma definição sobre este conceito7 (Van Puyvelde, 2015, 1).

Para além dos exemplos anteriores, verifica-se atualmente uma prolificação de definições e o uso do mesmo termo para situações tão distintas, em que as definições de ameaças híbrida e de guerra híbrida variam, e segundo McCulloh e Johnson (2015, 1) até se contradizem, espelhando bem a falta de entendimento sobre uma definição e refletindo a diferente forma como o mesmo é abordado pelos académicos, Estados e organizações internacionais. Segundo Malksoo (2018, 376), esta situação decorre da ambiguidade associada ao termo, que considera o seu “pecado original” e materializa-se na crescente alusão ao termo, por referência a diferentes fenómenos, o que, por consequência, tem diferentes significados para os diferentes autores que o usam (Mosquera e Bachmann, 2016, 66).

Não havendo nenhuma definição universalmente aceite de “guerra híbrida” ou mesmo de “ameaça híbrida”, alguns autores começaram por desvalorizar a atualidade do tema, alegando que as guerras sempre usaram todo o espetro possível de atividades tendo em vista derrotar o inimigo (Rodrigues, 2016, 1) e esta lacuna conceptual levou ao debate sobre a própria utilidade do termo. Van Puyvelde (2015, 1) num artigo na NATO Review chegou mesmo a propor a exclusão do termo do léxico de trabalho: “a recomendação é que a NATO e outros decisores ocidentais, deve esquecer tudo sobre o termo “híbrido” e focar-se na especificidade e na interligação entre as ameaças que enfrentam. A guerra, seja ela antiga ou moderna, híbrida ou não, sempre foi complexa e dificilmente pode ser incluída num único adjetivo. Qualquer estratégia eficaz deve levar em conta este ambiente complexo e encontrar formas de nele atuar, sem ser simplista”.

No entanto, como resumem de forma muito clara Cullen e Reichborn-Kjennerud (2017, 3) “o consenso internacional sobre o termo ‘guerra híbrida’ é claro: ninguém entende o termo, mas todos, incluindo a OTAN e a União Europeia, concordam que a mesma constitui um problema”. Isto significa também um claro entendimento de que a falta de consenso sobre uma definição, não significa que uma realidade não exista e que os Estados, organizações internacionais e a comunidade académica não tenham que encontrar soluções e estratégias para concetualizar, caraterizar e contrariar as ameaças colocadas neste contexto.

Na OTAN, apesar da impossibilidade de fazer aprovar uma definição ou uma doutrina sobre os conceitos de “guerra híbrida” ou “ameaça híbrida”, que os permitam explicitar aos níveis estratégico, operacional ou tático, os seus oficiais utilizam os termos de forma sistemática (Oren, 2016, 58). Assim, atendendo aos desafios identificados, e para efeitos de apoio ao planeamento, a OTAN apoiou-se em algumas definições de trabalho, de que destacamos8:

(i) Guerra híbrida – o emprego hostil de uma estratégia híbrida que inclui a ameaça ou uso da força, incluindo a ação militar aberta. Pode ser também descrita como um ataque híbrido;

(ii) Estratégia híbrida – estratégia integrada para atingir objetivos políticos e estratégicos, baseada numa abrangente, complexa, adaptativa e frequentemente bem integrada combinação meios convencionais e não convencionais, atividades abertas e encobertas, atores militares, paramilitares, irregulares e ou civis, conduzida em todo o espetro dos instrumentos de poder (diplomático/político, informacional, militar, económico, financeiro, informações e legal – DIMEFIL), com a intenção de criar ambiguidade e atingir as vulnerabilidades e fraquezas de um adversário. A estratégia híbrida tem um foco particular no processo de decisão;

(iii) Ameaça híbrida – um Estado ou ator não estatal com a capacidade e aparente vontade de empregar uma estratégia híbrida. Uma ameaça híbrida manifesta-se em atividades que caem perto de uma ação militar convencional e que podem ser conduzidas por um período longo; e

(iv) Modelo híbrido – uma manifestação específica de uma estratégia híbrida empregue por um adversário particular.

Na comunidade académica, alguns autores encontraram uma base de partida e justificaram o aprofundamento do tema, pois, como conclui Sliwa (2017, 19), embora as definições e perceções sobre o termo “híbrido” aplicado neste contexto possam variar, a essência mantêm-se. Nesta linha, Hoffman (2009a, 1) defende que, apesar de algumas preocupações sobre a nova terminologia, as alterações no léxico ajudam a distinguir alterações ou nuances na nova realidade e às vezes um novo pensamento requer novos termos para o apoiar. Colin Gray (2005, 24), por seu lado, apesar de defender a imutabilidade da natureza da guerra, assume que esta pode ter um “carácter altamente variável” afirmando que, enquanto conceito, este – “a guerra híbrida”, pode ser um meio útil para pensar no fenómeno da guerra no presente e no futuro.

 

2. A materialização da Guerra Híbrida

a. As características dos conflitos híbridos

A linha de pensamento de alguns dos estudiosos destas temáticas é clara em assumir que a conflitualidade de matriz híbrida, independentemente da sua definição, será um desafio crítico para os Estados no século XXI. Este desafio foi já abertamente reconhecido pelos próprios Estados e pelas organizações internacionais e uma das abordagens à temática parece passar pela perceção do fenómeno e essencialmente por compreender as suas características (Mansoor, 2012, 2), em vez de exercer o esforço na adoção de uma definição consensual.

As caraterísticas atribuídas à conflitualidade de matriz híbrida dão relevância a um conjunto de ingredientes por norma presentes quando os diversos autores abordam esta temática. Podemos assim identificar sete caraterísticas9 que, não sendo individualmente exclusivas deste tipo de conflitualidade, em conjunto parecem dar coerência ao conceito: (i) A assimetria; (ii) A combinação de componentes; (iii) A sincronização e a unidade de comando; (iv) A população como objetivo; (v) O uso intensivo da comunicação e das novas tecnologias; (vi) A fluidez e a flexibilidade; e (vii) A exploração intencional da ambiguidade.

Um conflito híbrido é assimétrico por natureza, colocando a conflitualidade num patamar para além de uma abordagem física, baseada no atrito, em que um ator busca a assimetria, qualitativa e quantitativamente, para degradar os recursos do adversário (Cullen, Reichborn-Kjennerud, 2017, 8).

Um “ator híbrido” combina simultaneamente diversas componentes (Deep, 2015, 1). Estas componentes incluem, entre outras, capacidades convencionais, táticas irregulares, formações irregulares, diplomacia, política, atos terroristas, violência indiscriminada e atividade criminal (McCulloh e Johnson, 2015, 16). Um ator procura, por norma, formas de compensar uma aparente desvantagem na capacidade militar convencional (McCulloh e Johnson, 2015, 16) recorrendo a uma combinação de outras componentes geradas por outros instrumentos do Poder.

A capacidade de sincronizar os meios militares e não militares simultaneamente dentro do mesmo campo de batalha é considerada uma das características-chave de um ator que recorre à guerra híbrida (Cullen, Reichborn-Kjennerud, 2017, 12) e que permitem alcançar efeitos sinérgicos nas dimensões física e psicológica do conflito (Hoffman, 2009a, 36). A sincronização é a capacidade de um ator para coordenar efetivamente os seus instrumentos do Poder em termos de tempo, espaço e finalidade para criar os efeitos desejados, sendo o emprego dos meios e a materialização dos diferentes instrumentos feitos em todo o espectro de conflito, com uma estratégia unificada, e sob um comando unificado (Rodrigues, 2016, 2).

Na guerra híbrida a combinação de meios convencionais e não convencionais, conjugados com os restantes ingredientes, é materializada simultaneamente no espaço e no tempo para atingir um objetivo: a conquista da população. Assim, a batalha decisiva resulta do combate pela vontade da população, quer no campo interno quer no campo externo, e a conquista da população irá determinar o sucesso ou o fracasso final (McCuen, 2008, 107). Desta forma, sendo removidos os limites físicos e temporais de atuação dos diversos instrumentos do Poder, o combate ocorre simultaneamente em três campos de batalha distintos: o campo de batalha convencional, a população local da zona de conflito e a comunidade internacional10 (Rodrigues, 2016, 2) (McCulloh e Johnson, 2015, 16).

Sendo o fator humano o elemento-chave, o uso de comunicação de massas para propagar as suas mensagens é um fator crítico e de grande relevância. Este tipo de conflitos será tendencialmente muito prolongado (McCuen, 2008, 109) e o ator híbrido procurará evitar combates decisivos, tentando acumular uma série de pequenos efeitos táticos, ampliá-los através dos media e pela guerra de informações, para enfraquecer a determinação dos Estados e ir conquistando a população (Mattis, 2005, 1). O crescimento das redes de comunicação de massa, nomeadamente as redes sociais e os meios audiovisuais, oferecem poderosas ferramentas de propaganda e recrutamento (McCulloh e Johnson, 2015, 16).

Pelo menos um dos contendores atua de forma híbrida, com uma organização complexa e um comportamento muito fluído, podendo ser um Estado ou um não-Estado. Os atores não estatais podem atuar de per si com uma agenda própria ou como proxies para os atores estatais. Um “ator híbrido” é flexível e adapta-se rapidamente ao contexto estratégico e ao ambiente operacional e usa sistemas de armas avançados e outras tecnologias disruptivas, apoiadas nas novas tecnologias da informação (Rodrigues, 2016, 2).

Através da criatividade são feitos ataques com pouca visibilidade, atuando numa zona cinzenta são adaptados para ficar abaixo de certos limiares de resposta, incluindo os limites jurídicos internacionais, dificultando assim o processo de decisão e tornando também mais difícil a deteção, a reação e a eventual retaliação a um ataque híbrido (Cederberg, Eronen, Mustonen, 2017, 5).

Tendo presente o conjunto de caraterísticas da guerra híbrida, importa perceber como um ator aplica o conceito, que, como em todos os conflitos e guerras, depende do contexto onde se materializa.

 

b. A aplicação do conceito e os seus desafios

O contexto político é o principal condutor das incidências da guerra e das suas características. Assim, a guerra reflete um comportamento político e este comportamento político reflete o Poder11 (Gray, 2005, 383).

Assim, a abordagem político-estratégica mais consensual da guerra híbrida é feita com base numa abordagem aos instrumentos do Poder. Estes surgem a partir da sistematização das capacidades geradas pelas fontes de Poder e existem diversas formas de efetuar a sua sistematização, de acordo com os domínios considerados. Pelo seu caráter exemplificativo e descritivo adotamos a sistematização utilizada pela NATO que organiza os instrumentos de Poder em poder militar, diplomático/político, económico, civil e informacional – MPECI.

Figura 1 – Balanceamento da conflitualidade híbrida.

(Adaptado de Cullen, Reichborn-Kjennerud, 2017, 9)

 

Em linha com as suas caraterísticas, na aplicação do conceito da guerra híbrida, um ator irá empregar os seus instrumentos do Poder balanceando-os da forma mais adequada e irá desencadear uma série de atividades específicas para criar efeitos verticalmente e horizontalmente.

A chave desta abordagem é entender que um ator pode escalar o esforço verticalmente, aumentando a intensidade de um ou de vários instrumentos, ou horizontalmente, através da sincronização (Cullen, Reichborn-Kjennerud, 2017, 9). Assim, a sincronização12 permite que o ator incremente medidas horizontalmente, ao invés de apenas verticalmente, proporcionando mais opções para o agressor e multiplicando os seus efeitos.

A sincronização permite ainda ir substituindo medidas entre um ou mais instrumentos de poder e/ou alternar os meios, mantendo a ameaça global num determinado nível (Cullen, Reichborn-Kjennerud, 2017, 12) e de acordo com o período temporal pretendido (Cederberg, Eronen, Mustonen, 2017, 4). Pretende-se que o resultado seja sempre superior à soma das partes, quando medidas no eixo vertical.

Este tipo de pensamento permite que o ator que pretende usar uma ameaça híbrida use os diversos meios à sua disposição para criar diferentes soluções para conduzir ataques sincronizados que são adaptados especificamente às vulnerabilidades percebidas do sistema alvo. Assim, os instrumentos do Poder a utilizar e os meios deles decorrentes dependerão das capacidades do ator que pretende ameaçar ou atacar e das vulnerabilidades percebidas de seu oponente, bem como dos objetivos políticos do atacante e da manobra estratégica a implementar para alcançar esses objetivos (Cullen, Reichborn-Kjennerud, 2017, 9).

Militarmente, as ações podem ir desde a pressão até uma ação militar convencional, passando por uma ameaça aberta do uso da força ou pelo uso limitado da mesma (Cederberg, Eronen, Mustonen, 2017, 4). O balanceamento do esforço será executado ao longo do eixo horizontal através da já referida sincronização de diferentes meios essencialmente não militares, permitindo ainda a um ator ficar abaixo de certos limiares de deteção e de resposta, evitando a retaliação. Esta atuação abaixo do limiar da conflitualidade aberta é o fator mais identificativo da guerra híbrida. Um dos instrumentos (militar ou económico) pode ser usado de forma coerciva, enquanto outros serão usados para implementar medidas de compensação, como o “pau e a cenoura”13 (Cullen, Reichborn-Kjennerud, 2017, 13).

Esta abordagem à forma de conduzir a guerra, muito flexível e com grande enfoque numa matriz não convencional, quer na sua natureza, nos meios e nas suas formas de aplicação (Hoffman, 2007, 28), levanta um conjunto de desafios as Estados e organizações internacionais. Segundo Reis Rodrigues (2016, 2), estes desafios começam com o facto desta abordagem colocar em causa várias ideias e conceitos que se julgavam relativamente claros e firmes: (i) desafia o conceito de dissuasão que originalmente foi desenvolvido à volta da possibilidade de um ataque convencional por parte de outro Estado e a capacidade de o outro retaliar de forma adequada; (ii) esbate a fronteira entre a situação de paz e a situação de guerra; (iii) impede a distinção clara entre combatentes e não combatentes; (iv) deixa de ser possível delimitar o campo de batalha porque a ameaça pode atuar sobre qualquer setor de atividade da sociedade; (v) a tradicional associação do uso de forças do tipo convencional ao âmbito exclusivo dos Estados e do emprego de forças irregulares apenas a atores não estatais está posta em causa; (vi) as possíveis ações da ameaça permitem diversas interpretações o que dificulta a clara identificação da origem, complicando o processo de decisão e a coordenação das respostas; (vii) exige respostas de natureza idêntica (combinação de respostas militares e não-militares), o que representa um grande desafio para os Estados, tradicionalmente com o setor da defesa organizado sob uma conceção clássica convencional, mas, sobretudo, para as organizações internacionais que apoiam a sua decisão em mecanismos de unanimidade ou consenso.

É este quadro de abordagem e a dificuldade de compreensão comum do fenómeno que estabelece a base para desenvolver novos modelos para encarar, dissuadir e combater a ameaça híbrida (NATO, 2016, 14).

 

3. O combate à ameaça híbrida

A vitória tornou-se incerta, uma vez que deixou de ser prerrogativa dos soldados alcançá-la no campo de batalha

Visacro (2018, 157)

 

a. A resposta político-estratégica

Os Estados, por norma, desenvolvem os cenários para planeamento de defesa concentrando-se nas ameaças tradicionais ou convencionais. Esta abordagem reflete uma lógica, pois as ameaças convencionais baseadas no Estado fazem parte do quadro histórico de referência. Sendo forçoso manter as capacidades de combate tradicionais, pois efetivamente estas ameaças não desapareceram, como poderão os Estados estabelecer uma resposta eficaz ao desafio de adaptar as suas capacidades ao novo paradigma das ameaças?

O principal problema, segundo Mattis (2005, 1), prende-se com a simultaneidade da materialização das ameaças. Assim, como vimos anteriormente, o combate a uma ameaça de natureza híbrida deve ter por base a articulação de respostas de natureza idêntica, isto é, a combinação de respostas militares e não-militares, através do emprego coordenado de todos os instrumentos do Poder (NATO, 2016, 14).

Em termos práticos, ao nível político-estratégico, o combate às ameaças híbridas exige um esforço também simultâneo e conjugado de medidas passivas e ativas. Por um lado, pretende-se incrementar a resiliência de um
Estado evitando ataques ou reduzindo o impacto dos mesmos e, por outro lado, estabelecer um quadro de medidas a serem implementados para preparar, proteger e recuperar as funções e estruturas mais suscetíveis de serem alvo de ataques (Hagelstam, Narinen, 2018).

Dada a sua natureza, uma ameaça híbrida exerce o seu esforço sobre as vulnerabilidades específicas do alvo, tornando o ataque altamente contextual. Exercer o esforço na prevenção parece representar a melhor abordagem (Pindjak, 2014, 2). Assim, a primeira resposta, de natureza preventiva, deve ser a avaliação das funções críticas e vulnerabilidades do alvo que possam criar uma oportunidade para um ataque (Cederberg, Eronen, Mustonen, 2017, 5). Esta avaliação às funções críticas exige uma avaliação às interdependências entre essas funções e as vulnerabilidades que ultrapassam o sector militar ou de segurança (Cullen, Reichborn-Kjennerud, 2017, 12).

Figura 2 – O quadro de resposta à conflitualidade híbrida.

(Adaptado de Cullen, Reichborn-Kjennerud, 2017, 23)

 

A análise da ameaça tradicional é complementada por uma análise das ameaças híbridas em que os militares se focam na componente militar da ameaça, enquanto outros especialistas, em estreita cooperação, efetuam a análise de ameaças não tradicionais tendo em conta os restantes instrumentos do Poder (Cullen, Reichborn-Kjennerud, 2017, 23), mas também a cooperação internacional.

Os Estados que se apresentem vulneráveis à desestabilização devem adotar antecipadamente um conjunto de medidas para aumentar a sua resiliência começando pelos seus sectores de segurança. O conceito de Reforma do Sector de Segurança (RSS), incorporado na Resolução n.º 2151 do Conselho de Segurança das Nações Unidas, oferece uma ferramenta indispensável para enfrentar os desafios da guerra híbrida14 (Pindjak, 2014, 4).

Na fase do combate às ameaças híbridas, esta deve ser uma atividade igualmente dinâmica e adaptável, exercendo o esforço no acompanhamento das variações da ameaça numa abordagem prospetiva tentando antecipar os métodos e as ferramentas que podem ser empregadas no futuro (Hagelstam, Narinen, 2018). O esforço no combate deverá centrar-se no reforço da legitimidade aos olhos da população (McCuen, 2008, 108), devendo esta ser o verdadeiro centro de gravidade de todo o planeamento e execução do plano político-estratégico.

A este nível, Cullen e Reichborn-Kjennerud (2017, 24) fazem um conjunto de recomendações que conjugam algumas características da guerra híbrida com as respostas ao nível político-estratégico e que nos parecem muito pertinentes. Assim:

(i) Sendo a guerra híbrida projetada para explorar vulnerabilidades nacionais em todo o espetro, os governos nacionais devem, no mínimo, realizar uma autoavaliação das funções críticas e vulnerabilidades em todos os setores e manter esta avaliação atualizada. Esta avaliação deve permitir detetar, compreender e estabelecer linhas de resposta coordenadas e sincronizadas;

(ii) Como a guerra híbrida utiliza de forma coordenada os instrumentos de Poder e, portanto, muito para além do domínio militar, os esforços nacionais devem melhorar a atividade de avaliação tradicional das ameaças, passando a incluir recursos e ferramentas nos campos político, económico, civil e não-convencional;

(iii) As ameaças híbridas são normalmente uma questão internacional – a resposta também o deve ser. Os governos devem coordenar uma abordagem coerente entre si para detetar, compreender e responder a estas ameaças de forma coletiva. Estruturas multinacionais – de preferência usando processos e instituições existentes – devem ser desenvolvidas para facilitar a cooperação e a colaboração internacional15.

 

b. A componente militar

De forma genérica, a componente militar pode executar cinco funções estratégicas: destruir, coagir, dissuadir, conter ou melhorar (Smith, 2008, 370) e o seu emprego depende, sobretudo, do contexto estratégico e resulta das relações, especialmente as de conflitualidade, estabelecidas entre as entidades políticas (Gray, 2006, 1). O desafio para o instrumento militar será o de executar as suas funções estratégicas de forma eficaz e efetiva face ao contexto da guerra híbrida.

Historicamente, e numa “matriz vestefaliana”, este instrumento tem assumido a tendência para se mostrar superior a todos os outros quando se estabelecem este tipo de relações. No entanto, o aumento da complexidade do novo contexto e a emergência de um novo tipo de ameaças parece estar a diminuir a relevância do instrumento militar no jogo estratégico dos Estados, apesar do permanente aumento das suas capacidades (Rosenau, 1998, 65).

A condução de operações militares começou a ser a “arte do possível”, implicando que cada vez mais as forças militares se adaptem a contextos não militares e aos condicionamentos políticos, socioculturais, económicos, tecnológicos e geográficos (Gray, 2006, 31). Assim, o instrumento militar deve estar em apoio dos restantes instrumentos do Poder, garantindo-lhe o nível de coação e robustez necessário e, ao mesmo tempo, ser capaz de obter vantagens táticas e operacionais que possam ser potenciadas pelos restantes atores.

Esta realidade não parece diminuir a importância da componente militar, mas reflete as grandes dificuldades que as forças armadas tradicionais experimentam para responder aos desafios colocados pelas ameaças híbridas, por natureza de matriz multidimensional e assimétrica. A génese destas dificuldades está na estratégia organizacional seguida pelos Estados, que, como referido anteriormente, têm por norma a sua estrutura de Defesa apoiada em forças militares de natureza convencional e estas estão organizadas, equipadas e treinadas para combater forças militares de natureza semelhante (Gray, 2005, 186). No entanto, o desenvolvimento da conflitualidade de matriz híbrida não representa o fim da conflitualidade convencional (Hoffman, 2007, 9), mas parece fazer emergir a necessidade de revisitar a natureza e a organização da componente militar pelos Estados face a um ambiente operacional volátil, incerto, complexo e ambíguo (Vissacro, 2018, 158).

Em termos operacionais e táticos, face aos níveis de incerteza, ambiguidade e assimetria, as maiores implicações estão relacionadas com a proteção da força (Hoffman, 2009a, 38). A estes níveis, uma força, ao enfrentar uma ameaça híbrida, não irá enfrentar uma série de cenários separados, mas sim uma combinação ou fusão de diferentes modos e meios de fazer a guerra (Mattis, 2005, 1), alguns deles de natureza não cinética e cujas atividades são marcadas por técnicas e táticas de natureza essencialmente assimétrica (Deep, 2015, 1). Espera-se que estas ameaças olhem para diferentes abordagens como uma espécie de menu e selecionem uma combinação das técnicas e táticas mais atraentes face aos seus objetivos por forma a neutralizar a ação da força ou mesmo provocar a sua destruição.

Compreender como uma força militar poderá atuar perante um ambiente operacional de natureza híbrida específico é o fator chave que permitirá garantir uma visão clara sobre a eficácia dos elementos da estratégia a desenvolver (McCulloh e Johnson, 2015, 4), salvaguardando a sua proteção e garantindo a necessária liberdade de ação e iniciativa para desenvolver as suas modalidades de ação. Neste contexto, uma força militar necessita de utilizar uma vasta gama de capacidades, incluindo sistemas de aquisição e produção de informações, unidades de combate convencionais para cenários de alta intensidade, forças de operações especiais, meios cibernéticos e meios para conduzir sofisticados operações de informação, apoiados por plataformas tecnológicas (Deep, 2015, 1) que parecem ser a grande aposta recente, especialmente desde que os Estados ocidentais iniciaram a então designada Revolução dos Assuntos Militares (RAM).

As relações de vantagem ou desvantagem tecnológica são dominadas pelo contexto político, estratégico e operacional onde o conflito se desenvolve (Gray, 2005, 121). Uma ameaça híbrida misturará várias abordagens e irá encaixá-las dentro da sua cultura estratégica, dos legados históricos, das realidades geográficas e dos meios económicos disponíveis. Assim, Mansoor (2012, 2) defende que contra estas ameaças a superioridade tecnológica é útil, mas é insuficiente.

James Mattis (2005, 2) vai mesmo mais longe, afirmando que estes conflitos não podem ser vencidos centrando-se a ação na tecnologia16. Defende que eles serão vencidos, preparando as forças militares para o que o general Charles Krulak designou por “guerra dos três blocos”, mas face à complexidade propõe adicionar uma nova dimensão – um quarto bloco, que lida com os aspetos de operações psicológicas ou operações de informação. Este bloco desterritorializa as forças, podendo estas não estar fisicamente localizadas numa determinada área, mas estar a comunicar ou transmitir a sua mensagem, confirmando o papel predominante da dimensão humana na guerra (Mattis, 2005, 1). Mais uma vez se reforça a importância da população enquanto centro de gravidade das operações no atual contexto, também ao nível operacional.

Assim, as ações mais importantes das forças estão relacionadas com a construção da credibilidade e com o estabelecimento de relações com a população e as suas lideranças, reforçando o papel das operações de informações dentro de cada bloco. Em cada um deles, as forças militares serão simultaneamente os “sensores” que recolhem informações e os “transmissores” de uma ideia. Tudo o que fazem ou deixam de fazer transmite uma mensagem que permite estender o alcance de outras atividades e influenciar as populações conquistando a sua vontade (Mattis, 2005, 2).

 

c. Que implicações para as forças militares?

Os exemplos históricos mostram que os adversários sempre evitaram os pontos fortes e dirigiram os seus esforços para áreas de fraquezas percebidas. A necessidade de reduzir áreas de fraqueza e incrementar a resiliência, por um lado, e a capacidade interventiva, por outro, estão a levar os Estados a uma nova abordagem da componente militar, nas vertentes genética, estrutural e operacional.

Neste sentido, a NATO, logo em 2009, através do seu Comando para a Transformação (ACT, 2009, 47), preconizava a necessidade de desenvolver doutrina, apostar na formação e no treino, e implementar capacidades (convencionais, não convencionais, cibernéticas e outras) necessárias para enfrentar um adversário que usa todos esses elementos nos níveis estratégico, operacional e tático.

Mas o desafio da guerra híbrida parece ter outro tipo de implicações. Diversas áreas como a coordenação de operações interagencial, a cultura organizacional, a área das informações, o planeamento e geração de forças, o planeamento operacional e as operações de informação deverão ser desenvolvidos em complemento à doutrina, formação e treino17 (Hoffman, 2007, 43).

Isto não implica abandonar as capacidades convencionais ou transformar as estruturas existentes em forças de contrassubversão, mas desenvolver capacidades que até recentemente eram consideradas fora do catálogo das capacidades militares e lhes permitam expandir o leque de missões (Vissacro, 2018, 207). No entanto, Hoffman (2007, 47) alerta para o risco de se criarem forças “generalistas” em vez das desejadas forças “multitarefa”, com flexibilidade e capacidade de combate real.

A mudança da cultura organizacional, com uma abertura cada vez maior ao desenvolvimento de relações e à execução de tarefas envolvendo outras entidades ou mesmo estruturas civis (Hoffman, 2007, 48), é um passo que tem que ser dado para permitir a condução de operações em coordenação com organizações civis, com ou sem o seu apoio.

O sucesso militar e os objetivos militares a atingir devem ser vistos antes como pontos decisivos para atingir o estado final desejado em termos globais, num balanceamento dinâmico com os objetivos não militares (Alberts, 2002, p. 48). Assim, em termos de planeamento operacional é necessário desenvolver metodologias que permitam incorporar linhas de operações não militares, através de uma abordagem integrada de meios cinéticos e não cinéticos, militares e não militares com uma aplicação muito objetiva e discriminada da força, quando necessário, com um maior controle de danos e redução de efeitos colaterais (Vissacro, 2018, 159).

A perceção transmitida é hoje mais importante que os resultados obtidos no campo de batalha (Hoffman, 2007, 53). A interação com os meios de comunicação social, as organizações não governamentais e outras agências presentes nos teatros de operações (Vissacro, 20018, 159) é outra exigência que obrigará ao desenvolvimento de novas competências próprias e à coordenação com meios não militares.

Para combaterem ameaças híbridas as forças militares necessitam de aprofundar as vertentes da doutrina, formação e treino, sendo estas o polo aglutinador da mudança relativamente ao nível da abordagem à atual conflitualidade, que exige uma maior agilidade concetual, flexibilidade e tolerância à incerteza e à ambiguidade (Hoffman, 2007, 49).

Pela sua versatilidade, o futuro deverá testemunhar um papel crescente das Forças de Operações Especiais, que pela sua forma irregular de combater podem passar a ser dominantes nas guerras do futuro (Gray, 2005, 211) (McCulloh e Johnson, 2015, 38). A sua capacidade de atuação de forma encoberta e discreta, abaixo do patamar da deteção e da linha da utilização da força de forma aberta, configuram-nas como um elemento a ter em conta no combate, de forma integrada, às ameaças híbridas.

 

4. Síntese conclusiva

Apesar da controvérsia sobre a novidade do termo e da sua própria natureza, a guerra híbrida, ao incorporar as caraterísticas do novo ambiente estratégico, parece, de facto, ser uma abordagem muito específica à forma de fazer a guerra.

A assimetria, a combinação de componentes, a sincronização e a unidade de comando, a flexibilidade, a população como objetivo, o uso intensivos da comunicação, a fluidez e a exploração intencional da ambiguidade são um conjunto de caraterísticas que permitem o uso diferenciado das várias “ferramentas” de fazer a guerra, a uma escala, a uma velocidade e numa intensidade que não encontra precedentes.

Na aplicação do conceito, um ator irá desencadear uma série de atividades específicas, de forma balanceada e coordenada, conjugando a intensidade e a dimensão das mesmas. Esta abordagem permite que um ator use os diversos meios à sua disposição para criar diferentes soluções e conduzir ataques sincronizados e assim implementar a manobra estratégica mais adequada para atingir os objetivos propostos.

Esta capacidade de um ator sincronizar vários instrumentos de poder, de forma simultânea e intencionalmente explorar a criatividade, a ambiguidade, a não-linearidade e os elementos cognitivos da guerra para atingir objetivos políticos e estratégicos projetou a ameaça híbrida para patamares que colocou esta ameaça na agenda dos decisores políticos. Esta forma de conduzir a guerra, muito flexível e com grande enfoque numa matriz não convencional e em que a população se assume como o claro centro de gravidade aos diversos níveis, levanta um conjunto de desafios aos Estados e as organizações internacionais.

Os modelos a desenvolver dever centrar-se no esforço simultâneo e conjugado para implementar medidas passivas e ativas para, por um lado, incrementar a resiliência dos alvos, evitando ataques ou reduzindo o impacto dos mesmos e, por outro lado, estabelecer um quadro de ações a ser implementado para preparar, proteger e recuperar as funções e estruturas mais suscetíveis de serem alvo de ataque.

Mas a base para a implementação dos modelos parte da avaliação das funções críticas e vulnerabilidades que possam criar uma oportunidade para um ataque. Assim, os Estados devem efetuar e manter atualizada uma avaliação das suas funções críticas, identificando as vulnerabilidades. Esta avaliação deve permitir detetar, compreender e estabelecer linhas de resposta. No entanto, a resposta nacional poderá ser insuficiente. Dada a natureza eminentemente internacional da ameaça híbrida, as entidades nacionais devem coordenar uma abordagem coletiva coerente para enfrentar o desafio colocado por estas ameaças.

Sendo a ameaça híbrida de natureza multidisciplinar, que ultrapassa em muito a componente militar, os esforços nacionais devem abranger a atuação dos outros instrumentos do poder do Estado, alargando avaliação tradicional das ameaças e passando a incluir recursos e ferramentas nos campos político, económico, civil e não-convencional nas suas opções de resposta. O conceito e o combate à ameaça reforçam assim o princípio da abordagem holística ao fenómeno da guerra em que os instrumentos do Poder passam a ter um papel próprio, deixando de ser apenas instrumentos secundários em apoio e complementares do instrumento militar.

A componente militar, apesar das grandes dificuldades que as forças armadas tradicionais experimentam para responder aos desafios colocados pelas ameaças híbridas, manterá a sua importância neste combate, mas parece evidente a necessidade de os Estados revisitarem a organização das suas estruturas militares para fazerem face a mais este desafio, que não será o único.

Acima de tudo, deverá desenvolver-se um novo quadro mental em que o instrumento militar enfrentará cada vez mais situações em que estará não como a componente apoiada, mas sim em apoio dos restantes instrumentos do Poder, garantindo-lhe o nível de coação necessária e as capacidades que estes não conseguem gerar autonomamente. Assim, a componente militar, de acordo com o contexto operacional específico, deverá encontrar novas formas de realizar as suas funções estratégicas, obtendo as consequentes vantagens táticas e operacionais para que estas possam ser potenciadas pelos restantes atores.

Isto pressupõe o desafio de transformar a componente militar adaptando-a as exigências que este tipo de ameaça veio adicionar ao já complexo leque de ameaças que enforma o seu quadro de emprego. Parece necessário aprofundar uma nova cultura organizacional, com uma abertura cada vez maior ao desenvolvimento de relações e à execução de tarefas envolvendo outras entidades que permitam a cooperação e a condução de operações em coordenação com outras estruturas do Estado e organizações civis.

Para além desta nova abordagem que permita a coordenação de operações interagencial, áreas como as informações, a interação com os meios de comunicação social, o planeamento e geração de forças, o planeamento operacional e as operações de informação deverão ser desenvolvidos ao mesmo tempo que deverá ser equacionada a necessidade de implementar novas capacidades e competências necessárias para enfrentar um adversário que usa todos esses elementos nos níveis estratégico, operacional e tático. As vertentes da doutrina, formação e treino devem ser o polo aglutinador da mudança relativamente ao nível da abordagem à atual conflitualidade.

Quando olhamos para este conceito, embora difuso e difícil de definir, parecem evidentes os desafios por ele colocados aos Estados. E como qualquer desafio, o primeiro passo será identificar as perguntas a que teremos de responder. Tomamos a liberdade de nos colocarmos no papel de um Estado e começar pelas seguintes:

– Como gerar capacidades recorrendo o todos os instrumentos do Poder para contrariar e combater uma ameaça híbrida?

– Como criar estruturas resilientes que possam resistir aos diferentes tipos de ataque, desde os mais abertos até aos mais insidiosos?

– Como estruturar, preparar e empregar o instrumento militar neste contexto?

Responder a estas questões com as estratégias, os meios e as medidas de coordenação próprias já seria um bom começo.

 

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     VISACRO, Alessandro (2018). A Guerra na Era da Informação. S. Paulo, Brasil: Contexto.

 

________________________________________________

1 Que é reconhecido como o autor do termo “guerra híbrida”.

2 Segundo Clausewitz, cada época tem o seu próprio tipo de guerra, as suas próprias condições enquadrantes e as suas conceções peculiares.

3 Hoffman (2007, 35) considera o Hezbollah como o protótipo da guerra híbrida.

4 Estes dois autores ucranianos escreveram um artigo muito interessante sobre o conceito de “Guerra Híbrida” baseado na ação da Rússia na Ucrânia (ver Bibliografia).

5 Um conceito já anteriormente teorizado por Sun Tzu.

6 À distância, a maioria destas definições parecem agora quase orientadas para um único caso de estudo – a operações do Hezbollah no Líbano (McCulloh e Johnson, 2015, 59).

7 Este facto pode ser comprovado pela consulta do AAP-06: NATO Glossary of Terms and Definitions. Edition 2018.

8 Malksoo (2018, 377) adotou uma abordagem semelhante.

9 Manko e Mikhieiev (2018, 17) identificaram um conjunto de caraterísticas relativas ao que designaram por “caos controlado” e que emergiram da atuação russa na Ucrânia.

10O combate nestes três espaços de batalha também não é uma novidade. Foi uma característica das manobras subversiva e contra subversiva durante a maioria das guerras de libertação, durante o sec. XX.

11Numa perspetiva realista das relações internacionais, o Poder pode ser definido simplesmente como a capacidade de cada Estado influenciar os outros Estados na sua política ou, até mesmo, impor-lhes a sua vontade (Boniface, 1996, 276).

12Uma das principais caraterísticas da guerra híbrida.

13Dando razão aos críticos da novidade da guerra híbrida, também esta abordagem não é uma novidade. Já em 2007, Joseph Nye defendia que, de acordo com a situação e o nível de coação pretendido sobre um ator, se deveria articular o hard power como soft power para que estes funcionassem de forma integrada e complementar de forma a induzir os comportamentos do outro, mas também para garantir o poder de atração. Esta forma de utilização coordenada, articulada e sinérgica dos instrumentos do poder, Nye, designa-a por smart power (Nye, 2007).

14A RSS visa reforçar a capacidade do Estado para fornecer a segurança pública e garantir o estado de direito, dentro dos princípios da transparência e da responsabilização. Estas medidas visam não só melhorar a preparação do Estado contra as ameaças externas, mas também ajuda a preparar o seu caminho para um desenvolvimento sustentável e a prosperidade (Pindjak, 2014, 4).

15Nesta área merece destaque o novo Centro de Excelência Europeu para Combate às Ameaças Híbridas (Hybrid European Centre of Excellence for Countering Hybrid Threats - Hybrid COE), com sede em Helsínquia, desde 2016, e que desempenha um papel único na facilitação da cooperação entre a NATO e a União Europeia que identificaram o combate às ameaças híbridas como uma prioridade para a cooperação entre as duas organizações (Hagelstam, Narinen, 2018).

16Segundo James Mattis (2005) o entusiasmo com a tecnologia foi um reflexo da nossa própria imagem no espelho e um desejo irrealista de ditar a conduta da guerra de acordo com a nossa vontade.

17Estas implicações enquadram-se na área da segurança, no entanto, também os desafios na área legal são cada vez mais complexos (Mosquera e Bachmann, 2016, 86).

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Coronel

António José Fernandes de Oliveira

Mestre em Estudos da Paz e da Guerra nas Novas Relações Internacionais, pela Universidade Autónoma de Lisboa (UAL). Foi docente no Instituo Universitário Militar (IUM) e assessor militar do Ministro da Defesa Nacional, sendo, atualmente, o Comandante do Centro de Tropas de Operações Especiais (CTOE).

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by COM Armando Dias Correia