Nº 2470 - Novembro de 2007
Pessoa coletiva com estatuto de utilidade pública
A China em África e o Caso da Cooperação Sino-Moçambicana (Parte I)
Tenente-coronel
Manuel Alexandre Garrinhas Carriço
Nota Prévia:   O autor foi assessor militar entre Julho de 2006 e Julho de 2007 para o projecto de cooperação técnico-militar de apoio à Academia Militar Marechal Samora Machel em Nampula. Todas as entrevistas e conversas tidas com elementos das autoridades e órgãos do Estado moçambicano, organizações não-governamentais e empresas privadas, foram feitas sob garantias de salvaguarda do anonimato dos mesmos. O autor agradece as respectivas colaborações e nalguns casos a franca amizade.
 
O racional argumentativo aqui exposto é da exclusiva responsabilidade do autor não representando a posição de outros assessores militares, do Exército e do Estado português.
 
 
1. Introdução
“Em geral, na relação entre amigos ambos devem assumir uma atitude de humildade de um para com o outro, pois tal beneficia a sua relação. Se um demonstrar arrogantemente ser superior ao outro, ou recriminá-lo aberta e publicamente, a sua relação será definitivamente prejudicada.”
Wang Yangming (1472-1529)
Desde o início deste século que se tem vindo a assistir a um paulatino mas consolidado crescimento do interesse da República Popular da China em investir política e economicamente no continente africano.1 Este interesse não é propriamente novo, basta atentarmos no apoio concedido pela China de Mao Zedong a alguns movimentos revolucionários e independentistas de países africanos desde finais da década de cinquenta e até princípios da de setenta do século passado, o qual, mesmo assim, nunca assumiu as elevadas proporções que se poderia extrapolar tendo em conta os apoteóticos discursos proferidos pela então liderança chinesa em apoio destes movimentos, especialmente no início da década de sessenta quando após um largo périplo pelo continente, Zhou Enlai afirmou que as “perspectivas revolucionárias africanas eram excelentes”.2
 
No entanto da parte de muitos outros Estados africanos havia uma visão utilitária e pragmática das relações com a “grande China”, preferindo auferirem dos benefícios económicos relativos ao reconhecimento político de Taiwan como um Estado independente da República Popular da China.
 
Em 1977 o comércio entre a China e África atingiu o valor de 817 milhões de dólares. Durante a década de oitenta quando as duas superpotências iniciaram um processo de retirada do continente e os países europeus reduziram quase para metade o volume da sua ajuda financeira, Pequim manteve os seus contactos locais e a sua ajuda. Quando os desenvolvimentos no Médio Oriente em finais da década de noventa voltaram a redireccionar o interesse dos principais actores do sistema político internacional para África, a China era a “maior fábrica do mundo” e necessitava dos recursos energéticos e das matérias-primas africanas para continuar a alimentar este motor fabril. Os contactos mantidos e as dezenas de milhares de africanos que estudaram na China, muitos deles com cargos de relevo na burocracia governamental de vários países, seriam agora de importância vital.
 
Com o início do século vinte e um a liderança política chinesa catalizou um processo mais intensivo de aproximação ao continente africano o qual é patente pelo facto de desde 1991 os sucessivos Ministros dos Negócios Estrangeiros terem escolhido sempre um país africano como primeira visita oficial no cargo. Desde 2004, seis dos nove membros do Comité Permanente do Politburo do Partido Comunista Chinês visitaram todos os países africanos com os quais a China tem relações diplomáticas.3
 
O ano de 2006, também popularmente designado de “o ano da China em África” parece ter sido um assinalável sucesso que culminou com mais um périplo do Presidente Hu Jintao em Fevereiro de 2007 por mais alguns países africanos (o segundo no espaço de um ano, o terceiro desde que é Presidente da China e o quinto desde que se tornou membro do Politburo no início dos anos noventa).4
 
Este elevado perfil político de visitas de líderes chineses ao continente africano deriva de uma abordagem fundamentalmente económica da China, a qual resulta essencialmente de três factores, sendo um bem mais percepcionável e palpável que os restantes.
 
O primeiro é observável pela impressionante taxa de crescimento económico da China desde as reformas de Deng Xiaoping cujo motor tem de ser alimentado com a obtenção de matérias-primas cada vez mais escassas e pela qual se intensifica uma competição cada vez mais acérrima no mercado mundial.5 A actual sustentação económica chinesa confere-lhe agora uma capacidade interventiva em África que nunca logrou possuir e desta forma permite-lhe tentar fazer corresponder os discursos por si proferidos com as acções no terreno propriamento dito.
 
O segundo é a resultante de uma percepção da ascensão da China no sistema político internacional, onde a pujança da sua economia é o pilar não apenas para o incremento deste seu estatuto mas também para uma projecção do seu poder juntos dos outros actores.Tal percepção é modelada não apenas por factores de natureza externa aos Estados (neste caso africanos) com os quais a China interage, mais concretamente através da observação atenta de uma cada vez maior autonomia e liberdade de acção de Pequim na arena internacional não obstante as tentativas de constrangimentos impostas (na versão do Zhongnanhai) por países como os Estados Unidos da América.
 
Também, e não menos importante, a forma como Pequim efectua a sua abordagem aos países africanos, enfatizando a não interferência nos assuntos internos de cada um deles em nome do respeito pela salvaguarda das respectivas soberanias, de acordo com o exarado pelos perenes cinco princípios da coexistência pacífica, formulados pelo antigo Ministro dos Negócios Estrangeiros Zhou Enlai, e que voltaram a ter uma renovada visibilidade demonstrada na Declaração Final do Fórum de Cooperação China-África efectuado em Pequim em Novembro de 2006, contribuem para a atractividade das propostas de cooperação chinesa.7
 
Neste contexto a evocação de normas de “solidariedade” com países congéneres em vias de desenvolvimento (dos quais a China “se auto-intitula como o maior”) e pós-coloniais acaba por se reflectir na referência frequente da liderança chinesa ao facto de a China nunca ter invadido ou colonizado África, não se escusando a efectuar o inevitável paralelismo com a experiência histórica chinesa do “século de humilhação e a opressão colonial por si sofrida”.8 Este é um discurso com contornos semânticos similares ao desenvolvido aquando da criação do Movimento dos Não-Alinhados após a Conferência de Bandung em meados da década de cinquenta do século vinte, e onde de uma forma sintética se substituiu a oposição aos blocos americano e soviético pela preservação e aplicação dos cinco princípios de coexistência pacífica.
 
Por fim, o “safari chinês” (como alguns analistas gostam de denominar) é facilitado pelo facto de muitos Estados africanos (especialmente os ditatoriais ou autoritários) procurarem agora emular o modelo de desenvolvimento económico e estabilidade chinês, algo que é perfeitamente notório através da leitura da Declaração Final do Fórum de Cooperação China-África, onde Pequim se compromete a apoiar vários países africanos a aplicarem o mesmo modelo de desenvolvimento da China.9
 
Independentemente destas considerações, o principal dínamo das relações sino-africanas é essencialmente a procura de matérias-primas por parte da China, o que permite caracterizar actualmente o investimento chinês no continente essencialmente como extractivo e não produtivo, comprando e ven­dendo sem produzir riqueza e empregos, e levando à ruína muitas das insipientes indústrias locais como a indústria têxtil que em países como o Lesoto, a Suazilândia, o Gana, o Uganda, a Nigéria, o Quénia, a África do Sul e Mar-rocos se vêm inundados por roupa chinesa produzida a baixos preços.10
 
Por exemplo na África do Sul os chineses dominam o sector retalhista de roupas, o que tem gerado desde 2004 fortes pressões dos sindicatos para que Pretória estabeleça quotas de importação mais apertadas de têxteis chineses como forma de proteger a indústria e os trabalhadores nacionais que desde 2003 viu perder mais de 70 mil empregos neste sector.11
 
De acordo com o vice-Presidente do Instituto Sul-Africano de Relações Internacionais, Moeletsi Mbeki, a China representa “tanto uma oportunidade como uma terrível ameaça. Nós vendemos-lhes matérias-primas e eles bens manufacturados com um resultado previsível - uma balança comercial desfavorável para a África do Sul que se cifra em mais de 400 milhões de dólares.”12
 
Muitos são os empresários africanos que começam a demonstrar fortes reticências quanto às vantagens da presença da diáspora empresarial chinesa uma vez que esta, à semelhança da sua congénere indiana, envia a maioria dos seus rendimentos para o país de origem em vez de o reinvestir nas economias locais, o que pode fomentar uma animosidade similar àquela que é direccionada para os indús.13
 
Pode-se pois afirmar que os programas de ajuda ao desenvolvimento conduzidos por Pequim em África são na sua essência, e continuarão a sê-lo num futuro próximo, meros processos de “trocas directas” onde as indústrias chinesas recebem petróleo, cobre, cobalto, algodão, madeira e minério de ferro entre outros e fornecem (ou inundam) o mercado local com produtos de baixa qualidade e preço que ameaçam extinguir nalguns casos a residual capacidade competitiva de algumas empresas e indústrias africanas.
 
De uma forma geral a maioria dos Estados africanos são fracos, conti­nuan­do condicionados pelo peso do passado. As suas economias são elementares e apoiam-se em actividades de extracção de matérias-primas ou de produção agrícola, com pouco valor acrescentado antes de serem exportados, fruto de opções de políticas de desenvolvimento económico implementadas inicialmente pelos países colonizadores (a única excepção é a África do Sul que logrou ultrapassar a excessiva dependência do exterior) e prosseguidas pelos governos pós-independência. Desde meados da década de setenta do século vinte que os preços das matérias-primas têm flutuado de forma assinalável mas sempre controlada por mercados e organizações localizadas fora do espaço geográfico das nações produtoras. Em resultado, a maioria dos Estados africanos detém um controlo limitado sobre as suas principais fontes de rendimentos o que dificulta qualquer acção de planeamento, agravada ainda mais por uma mal disfarçada corrupção.14
As burocracias governamentais foram usadas mais para o tráfego de influências do que para uma eficiente administração, degenerando em sistemáticos e debilitantes défices orçamentais. Projectos industriais foram catalizados pelo financiamento externo mas controlado pelo Estado, o que restringiu seriamente o florescimento de uma classe empresarial mas dinamizou a criação de indústrias ineficientes, autênticos “elefantes brancos”, desfasados das necessidades e capacidades dos trabalhadores e gestores locais.
 
Estruturalmente, poucos são os países africanos que têm um mercado interno bem desenvolvido padecendo na sua maioria de uma base de manufactura pequena e uma rede de transportes, comunicações e energia deficiente. O sector da saúde tem enormes lacunas e existem défices de pessoal habilitado e competente na área da gestão. Más opções económicas por parte de líderes africanos exacerbaram esta sintomatologia. Ao contrário da adopção de um modelo económico do tipo asiático que privilegiou a disciplina orçamental e financeira, o encorajamento do sector privado, o crescimento económico lento mas sustentado a longo prazo, e a integração na economia global primeiro através da produção de bens de mão-de-obra intensiva e depois por intermédio de capitais e indústrias de tecnologia intensiva, os países africanos seguiram modelos de desenvolvimento alternativos centrados no Estado e numa lógica de auto-suficiência, em detrimento de uma maior integração na economia global. Como consequência África perdeu rapidamente terreno face à América Latina, para não falar da Ásia. Resultado: para além das matérias-primas, África não produz ao preço certo produtos que o mundo queira.
 
Factores culturais também complicaram o desenvolvimento económico. A cultura africana enfatiza as obrigações para com a família (o que não é negativo em si mesmo) e a etnia. Se um africano adquirir algum poder, prestígio ou riqueza terá a obrigação moral de os usar em benefício dos membros da sua família ou etnia, independentemente da maior ou menor capacidade ou qualificação destes.
 
Esta sintomatologia é identificada pelos próprios africanos. A União Africana (UA) e a Nova Parceria para o Desenvolvimento Africano (NEPAD) esta-beleceram um acordo no sentido de se desenvolver uma maior transparência governamental, reforço da democracia, dinamização de uma imprensa livre, de uma sociedade civil mais forte, e de um sistema judicial independente do Estado, tanto numa base nacional, regional e pan-africana e que de certa forma as declarações chinesas aquando do terceiro Fórum de Cooperação China-África no sentido de apoiar o fortalecimento da unidade e da integração africana parecem querer reforçar. No entanto da retórica à acção vai uma longa distância e a realidade diária no continente não parece querer confirmar tais ensejos.
 
A China tem pecado até agora por não se envolver em fora de cooperação multilateral como o NEPAD e o Mecanismo Africano de Revisão de Conduta entre Pares, os quais pela sua natureza eminentemente regional justificavam um maior empenho e concretização da retórica política chinesa, ainda que algumas iniciativas no âmbito destes fóra não sejam condicentes com os valores e noções de ordem social defendidos por Pequim.15
 
Mesmo assim Pequim tem efectuado desde 1999 donativos ainda que não muito significativos para o fundo de paz da Organização de Unidade Africana e da sua sucessora a União Africana (100 mil dólares em 1999, 200 mil no ano seguinte, 300 mil em 2002, 400 mil em 2005, e 500 mil dólares em 2006).16
 
A abordagem chinesa aos países da África Austral ainda que consonante com a estratégia global para o continente tem algumas diferença de relevo, de acordo com as díspares particularidades e potencialidades que cada um deles aufere, e onde dois sobressaem naturalmente: a África do Sul e Angola.
 
No presente caso, iremos analisar a componente cooperativa bilateral sino-moçambicana, a qual ainda que não tão mediatizada (se o compararmos com Angola, o Zaire, o Quénia, a Etiópia, a Zâmbia, a Nigéria, o Gabão ou o Zimbabwe17) não deixa de ser menos instrutiva relativamente à penetração política e económica chinesa na África Austral, reflectindo um modus operandi estratégico de Pequim implementado por três canais político-diplomáticos: o do Fórum de Cooperação China-África, o do Fórum de Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa (CPLP) e o das relações bilaterais China-Moçambique.
 
O presente estudo está dividido em quatro blocos. Começa-se por abordar o contexto geral do “novo intervencionismo político-económico” da China no continente africano, para seguidamente se centrar especificamente naquilo que os Estados Unidos têm tentado efectuar em resposta a esta acutilância geopolítica de Pequim, e que se focaliza mais na vertente do combate ao terrorismo na África Austral como alavanca para uma maior participação regional americana.
 
A segunda parte (quarto bloco) centra-se na dinâmica cooperativa sino-moçambicana, através da abordagem dos problemas que a cada vez maior penetração de empresas e nacionais chineses em Moçambique têm trazido, especialmente no que concerne à construção de infraestruturas e exploração de madeira exóticas nas províncias do Norte do país. A vertente da cooperação militar será também referida em contraposição às iniciativas desenvolvidas por Portugal e às quais os Estados Unidos pretendem agora associar-se tirando partido do know how português.18
 
Concluir-se-á com uma síntese das principais linhas de força estratégica das relações a quatro: China-Moçambique-Estados Unidos-Portugal, tendo como fulcro este país africano.
 
 
 
2.  Linhas Gerais da Cooperação Sino-Africana: Ajuda ao Desenvolvimento vs Extracção e Fornecimento de Matérias-Primas
 
A nova incursão chinesa em África assume agora um perfil bem diferente do da década de setenta do século passado. Os três factores modeladores já referidos anteriormente a que se junta uma até agora quase marginalização do continente por parte da política externa dos Estados Unidos19 e que a recente criação de um Comando Militar Norte-Americano para África (USAFRICOM) apenas vem mitigar, têm permitido a Pequim uma penetração na política e economia local de muitos dos Estados africanos, a qual é também reforçada pela instrumentalização de fóra multilaterais.20 Por outras palavras, e recor­rendo a uma terminologia algo ambígua quanto ao critério do objecto na classificação de guerra, “assiste-se actualmente a um renovar do emprego da guerra política por parte da China no continente africano”.21
 
O segundo Fórum de Cooperação China-África decorreu em Dezembro de 2003 na Etiópia, tendo resultado na assinatura de vinte projectos de cooperação estimados em 680 milhões de dólares. Em Agosto de 2004 a China organizou em Pequim o Festival da Juventude Sino-Africana. Em Novembro de 2006 a China organizou o terceiro Fórum de Cooperação China-África o qual contou com a presença de um impressionante número de chefes de Estado e chefes de governo africanos (48 de um total de 53 Estados africanos).
 
Este dinamismo cooperativo chinês reflecte-se na obtenção de “valor acrescentado” nas suas propostas, que têm permitido catapultar a imagem positiva da China no continente rivalizando assim e actualmente no jogo de acumulação de influência com países como os Estados Unidos, o Reino Unido, a França, Portugal (num contexto mais restrito) e organizações financeiras internacionais.
 
Esta acumulação de influência para além da vertente económica assume cada vez mais uma nova faceta, a da penetração cultural. Para tal Pequim tem alargado drasticamente o patrocínio de actividades culturais destinadas a promover a imagem da China no continente, as quais vão desde a realização de conferências académicas anuais, como o Fórum de Pequim, até à expansão do número de Institutos Confúcio que se pretende que até 2010 venham a ser uma centena em todo o mundo contra os actuais setenta.22 Neste campo a celebração de aniversários quer do estabelecimento de relações diplomáticas bilaterais, quer exclusivamente de âmbito nacional chinês, tem sido explorada e particularmente bem rentabilizada pelas diversas embaixadas chinesas em países africanos, para alargar ainda mais o conhecimento sobre a cultura chinesa e inerentemente um sentimento de maior simpatia para com este país asiático e os seus cidadãos.
 
Holisticamente, e na realidade parece estar a desenhar-se um arco de cada vez maior influência política e económica chinesa na África sub-Sahariana, o qual vai desde Cabo Verde, passa pela Nigéria, Chade, Etiópia, Sudão, Quénia, Zâmbia, Tanzânia, Moçambique e Angola.23
 
A China pretende triplicar até 2010 o volume das trocas comerciais com o continente africano, passando dos actuais 40,6 mil milhões de dólares para uns 100 mil milhões de acordo com a declaração do Primeiro-Ministro chinês Wen Jiabao, aquando da cerimónia de abertura do Fórum China-África, aproximando-o do valor das trocas actualmente existentes com os Estados Unidos e a União Europeia.24 Em 2006 o comércio entre a China e África atingiu um total de 52 mil milhões de dólares, um aumento de 23 por cento relativamente ao ano de 2005 (40 mil milhões de dólares), o qual por sua vez teve um aumento de 35 por cento face ao ano anterior, colocando a China em terceiro lugar, só ultrapassada pelos Estados Unidos e a França.
 
Este aumento do comércio deriva essencialmente da “complementaridade” existente actualmente entre estas duas economias, enquanto o incremento similar africano relativamente à União Europeia e à América do Norte resulta de acordos preferenciais de comércio como o African Growth and Opportunity Act (AGOA).25
 
O Relatório Abrangente sobre o Comércio e a Política de Investimento dos Estados Unidos na África sub-Sahariana de 2007 e sobre a implementação do AGOA, que engloba 38 dos 48 Estados sub-Saharianos, refere um aumento das trocas comerciais de 17 por cento entre 2005 e 2006 atingindo os 71,3 mil milhões de dólares registando-se tanto um aumento das exportações (12,1 mil milhões de dólares) como das importações norte-americanas26 (59,2 mil milhões de dólares), que desde a implementação do AGOA no ano de 2000, viu aumentar as trocas comerciais em cerca de 143 por cento.27
 
Em finais de 2006, mais de 800 empresas chinesas haviam investido um total de 1,2 mil milhões de dólares no continente, tendo na área da construção de infraestruturas assegurado contratos no valor de 30 mil milhões de dólares.28 Pequim chega a registar um défice comercial com os países da África equatorial da ordem dos 80 por cento, ainda que individualmente poucos são os países que auferem um excedente comercial com a China que ultrapasse os 10 por cento. Na realidade a China só tem grandes défices comerciais com os países produtores de petróleo como Angola, o Sudão, República do Congo, Gabão e Guiné Equatorial e pequenos défices com países fornece­dores de recursos minerais como a República Democrática do Congo, a Zâmbia, e o Zimbabwe. No global as importações chinesas de África totalizaram em 2005 cerca de 2,1 mil milhões de dólares.29
 
O allure africano pelo modelo de desenvolvimento chinês30 e pelas propostas de cooperação com o “Reino do Meio” prende-se, nalguns casos, pela ausência de exigências no plano político na forma como Pequim concede os seus empréstimos, não acoplando a estes condições no plano das práticas da boa governação desses Estados receptores, apesar de conferir um apoio retórico à NEPAD, um programa liderado por países africanos e destinado à promoção de uma melhor governação no continente e que conta com o apoio do Fundo Monetário Internacional, do Banco Mundial e dos países do G8, os quais estabelecem regras mais exigentes para a concessão de empréstimos e ajudas, que ao nível dos países do G8 se cifram nos 50 mil milhões de euros anuais.31
 
Agravadamente, Pequim ainda não fez qualquer referência política (de apoio retórico sequer) à iniciativa britânica sobre a Transparência nas Indústrias Extractivas, a qual requer que os governos declarem as suas receitas de impostos e comissões resultantes das actividades extractivas de companhias e indústrias ligadas à comercialização de matérias-primas, petróleos e pedras preciosas. Com esta iniciativa pretende-se evitar o desvio de parte, ou nalguns casos da totalidade, destes lucros para contas bancárias de líderes africanos ou de associados seus, sem que os mesmos sejam empregues na redução da dívida pública.32
 
O G8 pretende na reunião do Grupo dos Vinte a realizar no final de 2007 na Cidade do Cabo, entabular um diálogo com a China sobre as questões dos “empréstimos com responsabilidade ética e política” a Estados africanos, como forma de se potenciar a redução efectiva e sustentada da dívida do continente e não a criação sistemática de um círculo vicioso de débitos.
 
Nesta dinâmica de concessão de contrapartidas económicas e comerciais, Pequim também não se tem escusado a oferecer alguns “adoçantes” aos países africanos como o é a não atribuição de tarifas de importação a 190 produtos oriundos dos 25 países mais pobres de África (ao contrário de muitos países ocidentais) tal sendo realçado no Livro Branco da Política Chinesa para a África, publicado em Janeiro de 2006, que não se escusa a “apontar o dedo” aos países desenvolvidos pelo facto de continuarem a manter barreiras comerciais às importações vindas de países do hemisfério Sul, as quais, segundo o Painel das Nações Unidas para o Financiamento do Desenvolvimento rondam os 100 mil milhões de dólares/ano, ou seja o dobro da ajuda concedida anualmente pelo G8.33
 
O Livro Branco da Política Chinesa para África elenca quatro grandes áreas de cooperação bilateral: política; económica; educação, ciência, saúde e apoio social; e paz e segurança. A área económica é a maior, englobando dez sub-categorias: comércio, investimento, cooperação financeira, cooperação agrícola, infraestruturas, cooperação na exploração de recursos, cooperação no turismo, redução da dívida e ajuda, assistência económica, e cooperação multilateral.
 
Sob este prisma é importante realçar que a China não concede donativos, ao contrário de outros doadores. Ela prefere os empréstimos (com taxas de juro variáveis mas alegadamente elevadas) junto das nações devedoras, procurando maximizar a possibilidade de fortalecer as relações políticas e económicas, com aquelas em troca da concordância informal em, de uma forma calendarizada, e de acordo com os objectivos por si estabelecidos para cada uma das relações bilaterais abdicar desses empréstimos concedidos, os quais passam assim a doações.34 Este é o caso flagrante dos países produtores de petróleo que obtêm vantagens mais significativas que passam pela possibilidade de anulação total da dívida, do reforço do financiamento da construção de infraestruturas, de projectos de desenvolvimento, de cooperação militar e apoio político na Organização das Nações Unidas.
 
Estes empréstimos, se ligados a projectos de desenvolvimento e de construção de infraestruturas, trazem normalmente acoplados uma única condição: o de que uma percentagem muito assinalável dos contratos (cerca de 80 por cento) sejam atribuídos a empresas chinesas (preferencialmente estatais) que se encarregam da respectiva construção transportando consigo a maior parte da mão-de-obra e materiais, cabendo ao mercado local uma participação quase marginal nos projectos.35
 
No entanto, as empresas chinesas (na sua maioria estatais) ao apresen­tarem preços bastante mais baixos que a concorrência, graças aos subsídios conferidos pelo governo, não escondem em muitos casos uma inadequada capacidade de gestão e emprego de técnicas e materiais de construção de má qualidade, o que se repercute na maior parte das vezes quer em atrasos de alguma monta nos prazos inicialmente estipulados para a conclusão dos projectos de construção, com as inevitáveis derrapagens financeiras, quer na rápida degradação dos edifícios construídos por algumas dessas empresas.36 Na verdade elas limitam-se a aproveitar o facto de as instituições financeiras internacionais ocidentais negligenciarem esta área de investimento por razões perfeitamente justificáveis como as más garantias de gestão correcta e transparente dos fundos atribuídos para tais fins, mas também por deficiente informação ou elevada insegurança no país beneficiador da ajuda, como ainda pelo facto de as áreas preferenciais de apoio ocidental se focalizarem essencialmente nos sectores da educação e saúde.37 Reforçadamente e segundo Gal Luft, um especialista em segurança energética e director do Instituto de Análise da Segurança Global “os chineses são mais pragmáticos na forma de condução dos seus negócios recorrendo por vezes ao suborno de entidades locais, algo que actualmente e na maioria das situações as empresas norte-americanas e europeias não estão dispostas a fazer, muito pela obrigação de tornarem públicas as suas despesas”.38
 
Não obstante, o sucesso das empresas chinesas em arregimentarem a maioria dos contratos apesar das deficiências demonstradas por muitas delas naquilo que é teoricamente o seu core-business, traz para Pequim esta estratégia cooperativa tem uma dupla funcionalidade. No plano macro-político e externo assegura-lhe o incremento do seu estatuto e prestígio político junto dos governos locais, quanto mais não seja porque estes só terão de se “preocupar” com a “supervisão muito geral e a inauguração dos projectos” uma vez estes concluídos, sem esquecer que esta sua maior participação no continente é feita tendo como moeda de troca um maior isolamento político de Taiwan por parte destes países.39
 
No plano micro-económico e interno, permite uma maior e melhor rentabilização da relação custo/produção, assegurando uma maior eficácia no emprego das verbas concedidas a título de empréstimo (com o risco mais atenuado de existirem desvios destas por parte de entidades locais40), verbas essas que derivam dos orçamentos dos Ministérios das Finanças, Ministério do Comércio, e Ministério dos Negócios Estrangeiros; isto ao mesmo tempo que garante uma maior visibilidade às empresas chinesas, que poderão utilizar tais projectos como um trampolim para a obtenção de novos contratos com os empresários chineses de média dimensão a aproveitarem esta “boleia” para abrirem estes novos mercados aos seus produtos.41 Paralelamente o governo chinês assegura desta forma mais uma via de escoamento não apenas de produtos e equipamentos chineses como também de empregabilidade para operários chineses, que apesar de suportarem duras condições de trabalho, podem assim buscar além-fronteiras rendimentos que de outra forma lhes estão vedados no seu país, quer por razões de tectos salariais impostos quer por estarem simplesmente desempregados.42
 
Por outras palavras, os principais líderes chineses e respectivos diplomatas criam uma envolvente favorável ao investimento chinês em África através de uma mistura de diplomacia, ajuda económica, e apoio diplomático aos líderes africanos. Internamente as agências estatais chinesas encorajam as empresas estatais a incrementarem os seus investimentos e trocas comerciais com África, através de projectos de ajuda ao desenvolvimento, de extracção de recursos naturais estratégicos que são exportados para a China ou com assinalável margem de lucro para os mercados internacionais, e de aumento da base de produção da indústria chinesa. Os operários chineses concretizam os projectos de forma eficiente e com menos custos, enquanto os emigrantes chineses constroem uma rede de contactos e linhas de fornecimento de produtos entre a China e África. Pelo menos esta parece ser a estratégia para o continente africano, a qual faz parte de uma estratégia mais global que se pode caracterizar como de externalização ou “saída” (zou ququ) das principais empresas chinesas, ao abrigo da qual e até 2005 mais de 7 mil destas empresas investiram em 160 países num valor estimado em mais de 50 mil milhões de dólares.43
 
Um dos pivots desta estratégia são os centros de promoção do investimento e do comércio que têm como missão o fornecimento de serviços de consultadoria, apoio jurídico, atribuição de fundos, e simplificação dos procedimentos burocráticos para as empresas que pretendam investir no estrangeiro. Actual­mente a China tem dez destes centros de promoção do investimento e do comércio só para a África sub-Sahariana.44
 
Em Novembro de 2004 Pequim criou o Conselho para o Comércio Sino-Africano, numa parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, sendo esta uma iniciativa pioneira de cooperação entre o Estado chinês e o sector privado destinando-se a dinamizar o investimento chinês no continente, constituindo-se de certa forma como uma réplica do programa Guangcai o qual visa combater a pobreza e mitigar as assimetrias económicas entre o litoral e o interior da China.45
 
No plano funcional existem dois Ministérios que possuem um papel fulcral na dinamização do investimento chinês em África: o Ministério dos Negócios Estrangeiros e o Ministério do Comércio.
 
O primeiro, dividiu o continente africano em duas áreas de responsabilidade a partir das quais se interliga operativamente com o Ministério do Comércio: o Norte e o Ocidente de África e a África sub-Sahariana.
 
Por sua vez o Ministério do Comércio divide a sua acção em África por quatro departamentos. O Departamento para a África Ocidental e Assuntos Africanos (DAOAA) fornece aconselhamento político sobre o continente aos principais decisores políticos encorajando o investimento e o comércio através da distribuição a empresas chinesas de informação sobre as economias nacionais, respectivas características políticas jurídicas, e sociais.
 
O Departamento para a Cooperação Económica Externa (DCEE) é responsável pela regulamentação da acção das empresas chinesas no estrangeiro, o que inclui as normas de conduta das empresas para com os trabalhadores contratados nos países de destino do investimento. Toda a empresa com um volume de investimento no exterior do país superior a 10 mil dólares deve-se registar junto deste departamento se quiser obter uma licença para poder operar no estrangeiro.
 
O Departamento para a Ajuda Externa (DAE) é o pivot na administração dos projectos de ajuda ao desenvolvimento concedidos pelo governo chinês a muitos países africanos sob a forma de empréstimos concessionados e direccionados ao investimento na reconstrução de infraestruturas, os quais são levados a cabo por empresas chinesas. É a este departamento que compete a gestão do processo de “concurso público interno” e decisão sobre a empresa chinesa que implementará cada um dos projectos, bem como a supervisão da condução dos trabalhos, assumindo a responsabilidade pela segurança e qualidade dos projectos de ajuda ao desenvolvimento aprovados.
 
Por último o Ministério do Comércio tem autoridade sobre o Gabinete do Conselheiro Económico e Comercial (GCEC) sediado em cada uma das embaixadas chinesas em território africano. Este Gabinete tem quadros perten­centes ao Ministério dos Negócios Estrangeiros e Ministério do Comércio com áreas de actuação e responsabilidades perfeitamente delimitadas pelo embaixador.
 
A aplicação das verbas dos programas de cooperação e de ajuda ao desenvolvimento segundo os montantes e o calendário é estipulada por Pequim aquando de visitas oficiais de líderes políticos e militares chineses a países africanos e é da responsabilidade dos embaixadores chineses acreditados nestes em ligação directa (quando aplicável) com o Banco de Importação e Exportação da China (mais concretamente através de um dos seus depar­tamentos denominado de Banco Chinês de Construção) ou através do Gabinete do Conselheiro Económico e Comercial da embaixada o qual se liga com o Departamento para a Cooperação Económica Externa do Ministério do Comércio.46 Os embaixadores reúnem-se anualmente na capital chinesa sob a égide do seu Ministério para consolidarem e harmonizarem os planos dos empréstimos, os quais não contemplam organizações não-governamentais (veja-se figura 1).
 
Em Junho de 2007 foi anunciado por Pequim a constituição de um fundo no valor de mil milhões de dólares destinado a apoiar o investimento de empresas chinesas no continente africano. Este fundo será gerido através do Banco de Importação e Exportação da China e visa obstar a investimentos “menos conseguidos” por parte do Estado chinês.47
 
Este banco foi criado em 1994 e destina-se a promover as exportações e o investimento através de produtos como a exportação de crédito, atribuição de garantias internacionais, concessão de empréstimos para a construção e investimento em países estrangeiros, e abertura de linhas de crédito oficiais. Segundo algumas estimativas o seu orçamento é superior à das principais agências congéneres norte-americanas, japonesas e britânicas.48 Entre 2004 e 2005 o banco aprovou os seguintes projectos de financiamento: 1.2 mil milhões de dólares ao Gana, dos quais 600 milhões para a construção da barragem de Bul; 2.3 mil milhões de dólares a Moçambique para a construção das barragens e centrais hidroeléctricas de Mpanda Nkua e Moamba-Major; 1.6 mil milhões de dólares para exploração petrolífera na Nigéria; 200 milhões de dólares para a construção e lançamento do primeiro satélite de comunicações nigeriano; 2 mil milhões de dólares a Angola com a possibilidade de um reforço que poderá atingir os 10 mil milhões de dólares; entre outros créditos de menor monta concedidos ao Zimbabwe, Congo-Brazzaville e Sudão.49
 
Esta disponibilidade do Banco chinês para países como Moçambique e o Gana, os quais estão fortemente dependentes da ajuda externa, representa indirectamente não apenas um “balão de oxigénio financeiro” para os respectivos orçamentos do Estado - uma vez que a China não atribui verbas para aplicação directa nos respectivos orçamentos - como ainda um trunfo negocial face a eventuais condições - como as de boa governação e gestão dos fundos - impostas na concessão de créditos por parte de outros doadores como os Estados Unidos, a União Europeia e o Japão.
 
Recentemente, a China começou a dar alguns indícios de que pretende modernizar os seus programas de ajuda através da participação em reuniões de coordenação de grupos de doadores, ainda que nem sempre opte por seguir as estratégias delineadas nestas reuniões. Pequim não possui uma estrutura burocrática similar à Agência norte-americana para o Desenvolvimento Internacional (USAID), existindo indicações de que pretende criar um organismo similar que aglutine os diferentes intervenientes dos Ministérios das Finanças, do Comércio, e dos Negócios Estrangeiros, tendo enviado observadores para junto do Departamento Britânico de Ajuda Internacional, da agência USAID e da Corporação norte-americana Millenium Challenge para analisarem os processos de apoio e condução de ajuda internacional. Este é um desenvolvimento positivo que poderá ajudar a reduzir as críticas à presença chinesa em África como sendo meramente exploradora de recursos, embora neste ponto realisticamente ela não difira de muitos outros países ocidentais.50
­
Estruturalmente o apoio chinês a projectos de cooperação no continente africano pode ser caracterizado segundo quatro grandes áreas:
(1) Projectos de construção de infraestruturas que instituições financeiras internacionais como o Banco Mundial deixaram de apoiar, mas que agora devido à incursão chinesa voltaram a financiar apesar dos receios fundamentados de desvios de verbas.
(2) A utilização do Banco Africano para o Desenvolvimento (BAD) como instituição preferencial de canalização de empréstimos, uma vez que através de organizações financeiras regionais deste tipo o leverage da China faz-se sentir de uma forma mais palpável e vantajosa para si.51
(3) No treino de profissionais africanos na área da economia e da medicina, tendo criado para esse fim um fundo de desenvolvimento de recursos humanos africanos o qual treina anualmente cerca de 4 mil quadros africanos.
(4) Na criação de escolas de ensino do mandarim nas principais universidades africanas sob a égide do Instituto Confúcio, o qual já estabeleceu acordos de cooperação com 27 universidades.52
 
Este é um padrão de prioridades que não sofreu alterações substanciais desde finais da década de cinquenta do século vinte, tendo desde então e com maior ou menor envolvimento e empenho a China completado cerca de 900 projectos de desenvolvimento económico e social em África, oferecendo bolsas de estudo na China a mais de 18 mil estudantes oriundos de 50 países africanos.53 Pequim enviou cerca de 16 mil médicos e enfermeiros para 47 países africanos que trataram mais de 240 milhões de pacientes. A China empenhou também até hoje cerca de 3 mil militares em missões de apoio à paz da Organização das Nações Unidas em África.54 Nos próximos três anos Pequim tenciona enviar 300 “voluntários jovens” da Associação Chinesa de Jovens Voluntários adstritos a programas de ajuda humanitária, de ensino de mandarim e de tecnologias de informação, bem como cerca de 100 conse­lheiros técnicos agrícolas.
 
No plano do investimento económico directo da China este cresceu de uns 20 milhões de dólares anuais em 1998 para uns actuais 6,8 mil milhões de dólares. Esta exponenciação prende-se em parte com a cuidadosa coorde­nação e articulação que existe entre as empresas estatais chinesas e o governo de Pequim, o qual oferece vantagens financeiras a estas para investirem em países de risco como a Etiópia, a Nigéria, a Libéria, a Serra Leoa, o Sudão, o Zimbabwe entre outros.55
 
Por exemplo na Etiópia, Pequim financiou totalmente a construção da estrada Gotera-Wollo no Sul de Addis Abeba, a qual foi inaugurada em Dezembro de 2003 sob o nome de “Estrada da Amizade Etíope-Chinesa”. Desde 2000 que a China tem atribuído diversos empréstimos ao governo etíope, que rondam na totalidade cerca de 890 milhões de dólares através dos quais as empresas chinesas ganharam contratos na reabilitação da rede eléctrica nacional, na construção de estradas e no abastecimento de água às populações.
 
O investimento chinês neste país não deixa de ser um “aparente paradoxo” pois ao contrário da maioria dos países africanos a Etiópia não possui grandes riquezas naturais. O interesse da China pode-se antes explicar através influência geopolítica que Addis Abeba aufere na região. É na Etiópia que nasce o rio Nilo essencial para o Egipto, o país é uma área de confluência entre populações árabes do Norte de África e cristãos do Sul, e é na sua capital que se localiza a sede da União Africana.
 
No Quénia, empresas chinesas também se envolveram através de empréstimos do governo de Pequim em projectos de saneamento básico e de irrigação. À China Road and Bridges Corporation (que é controlada pelo Ministério Chinês das Comunicações) foi adjudicado um grande projecto de irrigação no Delta do rio Tana, sendo também responsável pelo projecto orçado em 100 milhões de dólares de construção da estrada costeira A-109 com cerca de 200 quilómetros de extensão entre o porto de Mombassa e a capital Nairobi.
 
No Oeste do Quénia foi também construída a estrada Serem-Shamakhokho orçada em 19 milhões de dólares e em Janeiro de 2006 foi anunciado a construção de duas linhas de alta tensão entre Kericho e Kisii e Kambauru e Meru pela Companhia Chinesa de Engenharia, num investimento de 19 milhões de dólares.56
 
Em Julho de 2004 dispendeu 3,8 milhões de dólares na renovação e equipamento no maior hospital do país, o Hospital Nacional Kenyatta em Nairobi.
 
Desde 2000 que a China financia um projecto de aproveitamento da energia solar em pequenas comunidades rurais e bianualmente desde 2004 que a Federação da Juventude Chinesa faz a doação de 40 computadores e impressoras à sua congénere queniana.
 
Num contexto mais propagandístico em Maio de 2001 a Televisão Central da China (CCTV) acordou o fornecimento de conteúdos programáticos dos seus canais 4 e 9 à sua congénere queniana, a Kenya Broadcasting Corporation (KBC). Em Junho foi doado equipamento de recepção por satélite e de realização televisiva no valor de 250 mil dólares. A Xinhua também doou equipamento informático à sua congénere queniana e desde Janeiro de 2006 a Rádio Internacional da China iniciou um serviço de rádio FM em Nairobi.
 
No mesmo contexto mais numa variante diferente, desde 2004 que as digressões de artistas chineses ao Quénia têm sido aproveitadas para desenvolver acções de recolha de fundos em prol de programas de apoio à população queniana afectada pelas secas ou por doenças endémicas como a malária e o SIDA, socorrendo-se de uma das por enquanto raras organizações não governamentais chinesas, a China Society for Promoting Guangcai Program.
 
Em Janeiro de 2005, e em resposta ao Tsunami no Oceano Índico, Pequim doou 100 mil dólares ao governo para apoiar a primeira fase do programa de auxílio aos mais de 12 mil quenianos afectados pelo fenómeno natural. No mês seguinte a China entregaria material, equipamento, medicamentos e alimentos no valor de 1,31 milhões de dólares.
 
Na Nigéria a cooperação chinesa faz-se sentir ao nível dos sectores da saúde, agricultura, educação, telecomunicações e produção e distribuição de energia.
 
Entre 2000 e 2003 a China doou 3,5 milhões de dólares em material e medicamentos para o combate à malária, tendo em 2003 atribuído mais 2,4 milhões para o mesmo fim.
 
Em Setembro de 2003 foram emprestados 2,5 milhões de dólares para apoio a programas de desenvolvimento rural através de acordos de cooperação entre o Estado de Gombe e a Província de Shandong.
 
Em Março de 2002 a China Machinery and Equipment Import and Export Company e a Shandong Power Construction Company iniciaram a construção de duas centrais de produção de energia eléctrica no valor de 390 milhões de dólares. Já em Junho de 2001 o governo do Estado de Akwa Ibom e Pequim haviam assinado um acordo de construção de uma refinaria e de uma central de produção de energia num total de 1, 5 mil milhões de dólares.
 
Em 2005 Pequim iniciou um outro projecto de apoio às populações centrado na abertura de 598 furos de água em 18 dos 37 Estados nigerianos, de acordo com o plano nacional de abastecimento de água.
 
No plano das comunicações foi financiado em Maio de 2005 um projecto de instalação de uma rede de telecomunicações rurais orçado em 200 milhões de dólares e em Março de 2006 ambos os governos assinaram um memorando de entendimento com vista à construção e reabilitação da rede ferroviária nigeriana, num investimento estimado em 2 mil milhões de dólares.
 
Não obstante esta pequena amostra, que exclui por razões de espaço investimentos bem mais volumosos e mais mediatizados como aqueles que a China está a fazer em Angola, deve-se salvaguardar que mesmo assim o continente africano não é aquele onde a China investe mais. A Ásia e a América Latina respectivamente com 53 e 37 por cento do total do investimento directo estão à sua frente.57 Mesmo assim estima-se que no presente ano (2007) a ajuda económica chinesa a África (8.1 mil milhões de dólares) supere a do Banco Mundial (2.3 mil milhões de dólares), tendo ultrapassado a ajuda económica concedida pelo Japão no ano de 2002.58
 
Concomitante e inevitavelmente assiste-se a uma onda migratória de chineses estimada em cerca de 80 mil pessoas - não apenas trabalhadores e operários mas também de pequenos empresários - em direcção ao continente africano levando a que em países como a Zâmbia e a África do Sul os emigrantes chineses tenham passado em dez anos de respectivamente 3 mil e 28 mil para 30 mil e 300 mil e em Angola dos 10 mil para os 80 mil. Apesar de serem uma pequena fracção do total de cerca de 4 milhões de chineses que trabalham fora da China, estes trabalhadores chineses em África assumem uma maior visibilidade mediática pelo facto de estarem essencialmente ligados a projectos de construção e recuperação de infraestruturas.
 
De certa forma associada a esta vertente migratória, e como um “adoçante para a boca” dos Estados africanos, a China desenvolveu um programa de incentivo interno ao turismo em África como forma de incrementar o estreitamento de laços culturais, mas também e numa perspectiva mais utilitária, com vista a facilitar ainda mais a entrada de nacionais seus no continente. Pequim aprovou 16 Estados africanos como destinos preferenciais e sancionados para turistas chineses nos quais se incluem a Etiópia, o Quénia, o Zimbabwe, Moçambique, entre outros, e onde nalguns casos os critérios de segurança e estabilidade social não parecem ter sido tidos em devida consideração, isto se alguém deseja passar umas “férias com a família” sem grandes sobressaltos. O programa, permitiu segundo os números oficiais do governo chinês, duplicar entre 2004 e 2005 o número de “turistas chineses” em África para um total de 110 mil, ainda que se possa questionar se as algumas dezenas de milhar de trabalhadores chineses com vistos temporários não estarão inseridos nestes números.
 
Em resumo pode-se dizer que a incursão comercial da China na África sub-Sahariana não se cinge à componente de exploração das matérias-primas e dos recursos naturais. Segundo as declarações oficiais de Pequim o objectivo é o de possibilitar aos Estados africanos a aquisição de tecnologia e de know-how que lhes permita tornarem-se em processadores de produtos e forne­cedores de serviços, consubstanciando uma abordagem diferente daquela que pautou até agora o seu relacionamento com os países do hemisfério Norte.
 
No entanto existem alguns desequilíbrios bilaterais que devem ser corrigidos, os quais passam por uma série de reformas a levar a cabo pelos países africanos como:
(1) “Reformas nas fronteiras” como a eliminação do crescimento das tarifas impostas às exportações de países africanos para a China.
(2) “Reformas aquém-fronteiras” capazes de potenciarem as forças de mercado e fortalecer as suas instituições básicas.
(3) “Reformas entre fronteiras” passíveis de melhorarem os mecanismos de trocas comerciais e de reduzirem os custos transacionais.
(4) Reformas ao nível da ligação entre investimento e comércio de forma a possibilitar a participação dos empresários africanos nas redes globais de produção e de investimentos geradas a partir das empresas chinesas.59
 
 
2.a.     A Cooperação Militar entre a China e África
 
Como já foi referido anteriormente, a maioria dos Estados africanos padecem ainda de uma correcta estruturação e implementação de um regime democrático na sua verdadeira acepção. Este défice torna-os mais propensos a intervenções por parte das respectivas instituições militares quer para estabilizarem quer para desestabilizarem a situação política local, com ou sem autorização do poder político vigente. Com excepção do Zimbabwe, de Moçambique e de Angola onde as actuais forças armadas buscam a suas origens nos respectivos movimentos de libertação, a maioria das forças armadas dos Estados africanos descendem directamente dos aparelhos de defesa coloniais, sendo empregues à época mais como um instrumento de controlo do governo e de enriqueci­mento das elites do que de protecção dos cidadãos. Esta é uma sintomatologia que assume actualmente em muitos casos diversos contornos, ainda que com resultados similares devido à persistência de linhas fracturantes internas nos Estados como o são as diferentes etnias, os regionalismos, as religiões ou o clientelismo. Apesar de muitos Oficiais africanos já terem recebido formação profissional em Academias Militares norte-americanas e europeias e tendo uma parte assinalável deles já participado em operações de apoio à paz no continente, existe uma grande disparidade no que à implementação do profissionalismo militar concerne, com os quadros de oficiais, sargentos e praças contratados a padecerem de enormes défices de formação e treino. A isto junta-se a ausência de um processo formal que estabeleça a ligação entre os objectivos de segurança nacional e os orça­mentos das respectivas forças armadas, bem como uma responsabilização das lideranças políticas e militares pela má gestão de fundos públicos acometidos às rubricas da defesa nacional.60
 
É neste contexto que a componente militar da política externa chinesa (“diplomacia militar”) assume um papel cuja importância não deve ser subestimada, pois as relações militares com os Estados africanos conduzidas pelos líderes do Exército Popular de Libertação (EPL)61 são consideradas como estratégicas pelo Zhongnanhai. Antes de avançarmos para uma análise mais concreta desta dinâmica é importante enquadrar conceptualmente a “diplo­macia militar” chinesa a qual apoia a agenda política, diplomática, económica e de segurança delineada pelo Partido/Estado. Concomitantemente as actividades levadas a cabo pelo EPL no exterior da China são classificadas pela liderança militar e civil como uma componente política de emprego de meios militares com objectivos estratégicos e não como um conjunto avulso de iniciativas militares conduzidas por militares exclusivamente no plano castrense.
 
O Livro Branco da Defesa Nacional de 2004 (como o de 2006) elenca cinco objectivos de segurança nacional: salvaguarda e promoção do desenvolvi­mento nacional (desenvolvimento económico); moldar o sistema internacional de modo a favorecer os interesses nacionais; manter a ordem pública e a estabilidade social interna; promover a reunificação de Taiwan e defender a soberania nacional e; modernizar o EPL de forma a acompanhar as principais potências mundiais.62
 
A “diplomacia militar” chinesa é coordenada no seio da burocracia do Estado/Partido tendo em atenção o tipo de relação militar bilateral que se pretende implementar e com que país ela é implementada. Por exemplo, no caso das relações com os Estados Unidos, compreensivelmente, o EPL coordena as suas propostas de interacção ao mais alto nível com o Pequeno Grupo de Líderes para a Política Externa do Comité Central do Partido bem como com o Ministério dos Negócios Estrangeiros.
 
As actividades de “diplomacia militar” chinesa podem-se agrupar em quatro categorias:
(1) actividades estratégicas;
(2) regionais;
(3) intercâmbios de formação profissional e;
(4) cooperação em questões de segurança menos tradicionais (combate ao narcotráfico, ao contrabando de armas, e crimes económicos transnacionais).
 
No plano estratégico incluem-se acções destinadas a modelarem o sistema internacional em apoio dos objectivos de defesa nacional, as quais assumem três formas: diálogos e consultas ao mais alto nível entre os principais actores do sistema político internacional (Estados Unidos, Rússia, Reino Unido, França, Alemanha, Japão, Austrália, África do Sul); intercâmbios entre delegações militares destes países ao mais alto nível e; vendas e transferências de armamento e equipamento militar (utilizadas mais como um instrumento de incremento de influência política da China junto de países que considera importantes para os seus interesses nacionais como são o caso do Sudão, da Nigéria, do Zimbabwe, da Líbia, do Irão, do Paquistão, e da Coreia do Norte).63
 
Actualmente a China é um dos dois maiores fornecedores de armas a África, logo a seguir à Rússia. Os seus principais clientes são o Sudão, o Zimbabwe, a Eritreia, a Etiópia, a Nigéria, e o Egipto. Ao primeiro foram vendidos aviões, carros de combate, helicópteros, lança-granadas foguete e metralhadoras. A Harare foram vendidos aviões (J-7), radares aéreos, viaturas de combate de infantaria, veículos de transporte militar e metralhadoras. Entre 1998 e 2000, durante a guerra entre ambos os Estados, Pequim vendeu armamento à Eritreia e à Etiópia avaliado em cerca de mil milhões de dólares, contornando o embargo de armas decretado pela ONU. Com Addis Abeba, Pequim tem vindo a reforçar os seus laços de cooperação militar bilateral, o que é ilustrado pelo interesse demonstrado pelo governo etíope aquando da visita em Agosto de 2005 do Comandante da Região Militar de Nanjing, o Tenente-General Zhu Wenquan, em dinamizar a cooperação nas áreas de treino, tecnologia e operações de apoio à paz.
 
Em 2001 a China concedeu um empréstimo de 1 milhão de dólares destinados à modernização das instalações das forças armadas nigerianas. Já no Verão de 2005 foram vendidas ao governo de Lagos aviões de combate F-8IIM fabricados pelas AVIC I e um esquadrão de 15 caças Chengdu F/FT 7NI no valor de 250 milhões de dólares e que serão fornecidos pela CATIC.
 
Em Outubro a China doou 2 milhões de dólares em equipamento militar para as forças armadas nigerianas, tendo sido enviada uma equipa de 21 oficiais chineses para apoiar o treino e operação destes novos equipamentos entre os quais se contam computadores, telefones por satélite, veículos de limpeza de pistas de aviação, veículos ligeiros e equipamento para mergulho a grande profundidade. No final do ano foi assinado um acordo com vista ao fornecimento de mísseis ar-ar de curto alcance, rockets, e mísseis anti-carro num valor global de 32 milhões de dólares.64 No início de 2006 a China entregou à Nigéria duas dezenas de lanchas de patrulha para operarem na região dos pântanos e canais do Delta do rio Niger.
 
Ao Quénia, Pequim doou em 2000 103 viaturas militares. No ano seguinte entregou mais 32 veículos militares (entre ambulâncias e autocarros) num valor aproximado de 1,2 milhões de dólares. No final do ano de 2003 foi feita uma nova entrega de 26 viaturas. Em finais de 2006 foi anunciado que o Quénia pretende adquirir mais cerca de 400 camiões Styer e 30 viaturas de combate de infantaria e a Serra Leoa irá receber em breve lanchas de patrulha costeira para combater a pesca e o tráfico ilegais.65
 
Quanto à África do Sul foi assinado em Julho de 2004 um acordo de cooperação militar bilateral, tendo na ocasião sido doado pelo representante chinês, o General Guo Boxiong (vice-Secretário Geral da Comissão Militar Central) equipamento militar de comunicações, conjuntamente com 100 computadores e impressoras laser para treino das forças armadas de defesa da África do Sul.
 
No âmbito dos países de língua portuguesa a China tem vendido ou doado equipamento militar a Angola e Moçambique respectivamente ao nível das transmissões, informática, do fardamento e viaturas de transporte.
 
Em Março de 2007, Cabo Verde e a China actualizaram um protocolo existente entre os dois países sobre o fornecimento gratuito de materiais militares ao primeiro por parte deste último no valor de cinco milhões de yuans (cerca de 50 milhões de escudos). A assinatura do documento marcou a visita da delegação chinesa chefiada pelo vice-director do Gabinete para Assuntos Estrangeiros do Ministério da Defesa, Major-General Bing Jingong, entre 24 a 27 de Março, para reforçar a cooperação técnico-militar entre os dois países.
 
O embaixador da China em Cabo Verde, Hong Mao, realçou o facto de ser esta a primeira delegação de âmbito militar a visitar o arquipélago, o que, segundo ele, traduz a grande relação de amizade e cooperação existente entre os dois países.66
 
No que concerne aos intercâmbios de formação profissional entre a China e os países africanos, estes visam essencialmente o envio de oficiais superiores para a frequência de diversos cursos de especialização no estrangeiro recebendo em troca outros oficiais que consoante a sua nacionalidade e experiência profissional poderão ser convidados como docentes temporários ou como meros estudantes. Incluem-se neste campo a troca de visitas entre Academias Militares de diferentes países.
 
No caso do intercâmbio militar sino-africano pode-se afirmar que a China tem vindo a assumir uma cada vez maior visibilidade no continente, fruto essencialmente da participação de militares seus em múltiplas missões de apoio à paz da ONU68, estimando-se que Pequim tenha empenhados em missões no estrangeiro cerca de 5 mil militares e polícias.
 
Pequim tem relações militares bilaterais com 25 dos 48 países africanos com os quais tem relações diplomáticas. Destes 25, em 14 existem adidos de defesa permanentes inseridos nos quadros de pessoal das embaixadas (Argélia, República Democrática do Congo, Egipto, Etiópia, Libéria, Líbia, Marrocos, Moçambique, Namíbia, Nigéria, Sudão, Tunísia, Zâmbia, e Zimbabwe).69 Em Pequim 18 destes países têm um adido de defesa permanente, com 7 deles a serem recíprocos (Argélia, Egipto, Namíbia, Nigéria, Sudão, Zâmbia, e Zimbabwe).70 A China não tem adidos de defesa permanentes nos restantes 11, a saber, a África do Sul, Burundi, Camarões, República do Congo, Costa do Marfim, Guiné Equatorial, Guiné-Bissau, Quénia, Mali, Niger e Tanzânia. Entre 2001 e 2006 foram efectuadas 30 visitas de líderes militares chineses a países com os quais Pequim tem relações diplomáticas e 110 encontros e consultas militares bilaterais, que passaram de 33 em 2003-2004 para 46 em 2005-2006.71
 
 
2.b.     O Fórum de Cooperação China-África
 
Este é um mecanismo multilateral iniciado em 2000 em Pequim e que se realiza de três em três anos com a organização do mesmo a ser feita de forma alternada entre a China e um país africano.
 
Desde o primeiro encontro que a China se fez representar ao mais elevado nível (Jiang Zemin e Zhu Rongji e posteriormente Hu Jintao e/ou Wen Jiabao) o que denota a importância conferida por Pequim a este fórum, o qual pretende prefigurar-se como um plataforma de desenvolvimento político e económico entre a China e os países africanos. A responsabilidade de supervisão e implementação dos diversos programas de apoio foi acometida a algumas comissões ministeriais conjuntas que validaram e reforçaram em 2003 em Addis Abeba as linhas de força para um novo programa de acção cooperativa.
 
O terceiro fórum realizou-se novamente em Pequim em Novembro de 2006 tendo contado com a presença de cerca de 1700 delegados de 48 países africanos, a quem foram concedidas bastantes mordomias e inúmeros ban­quetes, daí resultando directa ou indirectamente a assinatura de mais de 60 acordos de investimento e de comércio com países africanos num valor total estimado em 1,9 mil milhões de dólares72, tendo-se reafirmado e reforçado um conjunto de iniciativas que se assemelham a uma “parceria estratégica” baseada na “igualdade política e confiança mútuas, numa idêntica e mutuamente vantajosa cooperação económica e cultural”. A proposta final de cooperação entre as partes e os compromissos assumidos por Pequim pode-se sumarizar de acordo com a figura 3.
 
 
 
3.  Entre o Quase Esquecimento e o Renovado Interesse dos Estados Unidos
 
A maioria dos países mais ricos do mundo representados na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) têm prometido atribuir 0,7 por cento do seu produto interno bruto para ajuda ao desenvolvimento aos países mais pobres. No entanto apenas cinco países europeus têm cumprido esta meta e os Estados Unidos da América estão no final da tabela de cumpridores, tendo em termos globais a ajuda à África sub-Sahariana sofrido um decréscimo de 29 por cento desde o início da década de noventa do século vinte.74
 
Num período em que muitos dos países africanos se debatem com políticas económicas fracassadas, enormes défices financeiros, e massivas crises de saúde pública, a concessão de empréstimos parece não ser a melhor solução, pois só serve para exponenciar ainda mais a dívida pública dos Estados africanos, pelo que parece existir cada vez mais um consenso alargado de que a melhor solução passa pela atribuição de doações para projectos de apoio ao desenvolvimento.
 
Sondagens recentes efectuadas nos Estados Unidos mostram que a população norte-americana crê na sua maioria que África é vital para os interesses do país e que o reforço de programas de assistência e ajuda ao desenvolvimento no continente são essenciais para a promoção de uma maior estabilidade no sistema político internacional.75
 
Para a administração de George W. Bush a política dos Estados Unidos para África centra-se em três pilares:
(1) liberdade económica;
(2) incremento do comércio e;
(3) interligação e cooperação entre várias agências norte-americanas de forma a tornar o continente mais seguro e livre.76
 
Este grande projecto de uma maior liberdade no continente africano corre o risco de poder vir a ser minado, segundo a perspectiva dos sectores mais conservadores do espectro político norte-americano pela penetração da China em África, a qual faz parte de uma estratégia de crescimento de poder e de influência que na sua essência ameaça a médio-prazo a posição dos Estados Unidos no continente e que pode ser caracterizada por seis componentes:
(1) manutenção da estabilidade interna chinesa a todo o custo;
(2) cooperar com os Estados Unidos;
(3) apoiar o crescimento e desenvolvimento dos seus vizinhos asiáticos, garantindo a sua segurança e ganhando a sua amizade (fulin mulin anlin);
(4) reunificação pacífica de Taiwan;
(5) cultivar e desenvolver laços de cooperação com a Europa e a Rússia como contrapeso aos Estados Unidos e;
(6) preencher o vácuo resultante do pós Guerra-Fria existente na América Latina e em África.
 
A penetração chinesa neste último continente tanto por ser relativamente recente quanto volumosa financeiramente parece ter feito soar alguns alarmes na Casa Branca, no Foggy Bottom (edifício do Departamento de Estado) e no Pentágono.77
 
Em 2006 os Estados Unidos atribuíram 394 milhões de dólares a actividades destinadas a incrementar as trocas comerciais com a África sub-Sahariana (um aumento de 95 por cento face ao ano anterior) inseridas no projecto da Millenium Challenge Corporation e alocaram 200 milhões de dólares a um projecto de apoio ao aumento da competitividade global das empresas africanas sub-Saharianas. Por outro lado, o investimento directo dos Estados Unidos foi de 14,8 mil milhões de dólares.
 
Desde 2006 que Washington tem vindo a criar e a implementar um conjunto de iniciativas e mecanismos de apoio ao desenvolvimento económico como são o caso do Comité de Aconselhamento para o Comércio com África78 (um dínamo para a materialização dos objectivos do AGOA que teve a sua sexta reunião em Julho de 2007 em Acra, no Gana), o aumento do número de acordos de comércio e investimento bilateral (TIFA), a concretização de um acordo de cooperação com a União Aduaneira dos Países da África Austral (TICA) passível de vir a potenciar a criação a longo-prazo de um acordo de comércio livre.79
 
Passando do plano político para o plano da execução dos programas de apoio ao desenvolvimento no continente, é o Departamento de Estado norte-americano que assume a responsabilidade pelo planeamento e validação destes programas de natureza essencialmente civil. A Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID) conjuntamente com a Millenium Challenge Corporation é um dos principais pivots operativos na componente do apoio ao fortalecimento de instituições democráticas, crescimento económico, apoio à educação, saúde, rentabilização dos recursos naturais, segurança alimentar, e protecção ambiental. No continente ela interage cooperativamente com a SADC, a ECOWAS, a UA80 e a NEPAD. Os seus projectos por mais pequenos que sejam são elaborados de acordo com um planeamento estratégico a quatro anos e adaptados às necessidades de cada país, daqui resultando um estudo e investigação em profundidade de cada um dos países alvo. Teoricamente estes programas estão em consonância com os objectivos políticos dos Estados Unidos, com o Departamento de Estado a lidar com a componente político-diplomática bilateral, o Departamento de Defesa com as questões de segurança81, e a agência de desenvolvimento com as comunidades locais, ainda que para alguns especialistas seja urgente afinar os mecanismos de coordenação entre estes organismos, de forma a contrabalançar a eficiente estratégia chinesa.82
 
Em 2006 a agência tinha 25 centros na África sub-Sahariana, o maior dos quais na África do Sul, contando nos seus quadros de pessoal de cada centro não mais do que meia dúzia de norte-americanos e uma dúzia de trabalhadores contratados às comunidades locais trabalhando em parcerias com organizações públicas e privadas locais.83
 
Em 2006 a Agência teve um orçamento global de 986,463 milhões de dólares que foram dispendidos nos seguintes programas. Em termos de assistência económica, em 2006 a agência dispendeu 89,742 milhões de dólares em programas de apoio ao crescimento económico e do comércio através da Iniciativa Trade for African Development and Enterprise (TRADE); 237,927 milhões com o programa Enhancing Agriculture and Protecting the Environment 84; 47,090 milhões com a Iniciativa End Hunger in Africa e 15 milhões com a Congo Basin Forest Partnership. No plano da educação e treino de pessoal foram gastos 186,963 milhões de dólares dos quais 55 milhões com a Africa Education Initiative. Ao nível da saúde pública dispenderam 391,936 milhões de dólares na luta contra o SIDA, tuberculose e malária.85 Em termos de ajuda humanitária em situações de emergência a USAID entregou 1,234 milhões de dólares em ajuda alimentar e medicamentosa durante 2006. Quanto aos programas de fortalecimento da democracia e prevenção de conflitos englobaram uma despesa de 79,885 milhões de dólares, 7,500 milhões dos quais para a Iniciativa Anti-Corrupção.86
 
No entanto a USAID não se encontra só no terreno. Algumas organizações não-governamentais norte-americanas têm desempenhado nalguns casos um papel bastante relevante. A principal é a Africare cuja actividade se centra na segurança alimentar, no combate ao SIDA, à malária, gestão ambiental, educação básica, e projectos de desenvolvimento rural. A Catholic Relief Services é outra ONG que também centra a sua acção nos programas apoiados pela Africare.87 Por fim, ainda que com menores meios à disposição existem o Mercy Corps e Peace Corps.88
 
 
3.a.     A Cooperação Militar entre os Estados Unidos e África
 
No plano estratégico e de segurança e defesa, o início de 2007 trouxe consigo tanto uma nova série de iniciativas como o reforço ou recuperação de outras que pareciam ter sido esquecidas ou secundarizadas devido ao empenhamento militar norte-americano no Iraque e Afeganistão. A recente criação em 8 de Fevereiro de 2007 de um Comando Militar Norte-Americano para África (USAFRICOM), o qual deverá plenamente operacional em 30 de Setembro de 2008, foi uma primeira indicação de um reajustamento estratégico dos Estados Unidos no continente africano.89
 
Este novo comando irá diferir dos restantes comandos norte-americanos ao incluir pessoal nas áreas diplomática, de ajuda ao desenvolvimento e apoio económico (cerca de 50 por cento do total de 500 elementos que aí trabalharão), sendo o cargo de vice-Comandante reservado para um elemento do Departamento de Estado.
 
O grande problema que se coloca actualmente ao Departamento de Defesa é o da localização deste novo comando em solo africano, tendo países como a Argélia, a Líbia e Marrocos tendo rejeitado a possibilidade de este ficar sediado no seu território. Entre Abril e Junho de 2007, o sub-Secretário para a política africana do Departamento de Defesa Ryan Henry, visitou a África do Sul, a Etiópia, o Quénia, o Senegal, a Argélia, Marrocos, a Líbia, o Egipto, o Djibouti, e teve uma reunião na sede da União Africana com o intuito de obter apoios quanto à localização e construção do futuro centro de comando do AFRICOM, sem ter logrado obter grande sucesso.90 Entretanto a equipa de transição ficará temporariamente instalada na Alemanha em Estugarda-Mohringen, no campo militar Kelley.
 
A criação do novo Comando obrigou a um rearranjo das áreas de responsabilidade dos já existentes. A anterior organização dos comandos militares regionais norte-americanos fazia com que o continente africano ficasse na sua maior parte (35 países) sob a responsabilidade do Comando Europeu (EUCOM) com o Comando Central (CENTCOM) a assumir a responsabilidade pela região que englobava o Egipto, Sudão, Eritreia, Etiópia, Djibouti, Somália, Quénia, e as Seychelles. O Comando do Pacífico (PACOM) tinha à sua responsabilidade a área correspondente às ilhas Maurícias, Comoros e Madagáscar. O recém-criado AFRICOM só exclui da sua área de responsabilidade o Egipto, que permanece no CENTCOM.
 
A análise que se segue visa elencar de uma forma não exaustiva um conjunto de iniciativas no plano da cooperação militar que Washington tem vindo a desenvolver com vários países africanos desde o final do segundo mandato de Bill Clinton e que deverão sofrer um reforço de meios financeiros a breve prazo como forma de retirar espaço de manobra estratégica a Pequim e de reforçar a influência norte-americana no continente.
 
As prioridades dos Estados Unidos e da sua Secretaria da Defesa podem-se caracterizar de acordo com uma ênfase em mecanismos de prevenção através da cooperação de segurança, sendo elencados da seguinte forma:
(1) Combate ao terrorismo e à prolferação de armas de destruição massiva.
(2) Fortalecimento das relações militares bilaterais.
(3) Ênfase no profissionalismo militar e na reforma democrática das instituições.
(4) Construção de uma capacidade de auto-sustentação das forças armadas dos países africanos.
(5) Cooperação com aliados europeus e organizações sub-regionais.
(6) Apoio à boa governação e estabilidade dos países africanos.91
 
No plano do intercâmbio militar tem-se notado no último ano um crescente número de reuniões e consultas entre adidos de defesa norte-americanos sediados em África e as lideranças políticas e militares dos países onde estão em missão. Estas actividades revolvem em torno de programas de treino, apoio à segurança, operações humanitárias e de manutenção de paz92, e evacuação de não-combatentes através de um racional cooperativo bilateral e multilateral regional (UA) e sub-regional (SADC93 e a ECOWAS94) do qual o programa ACOTA (African Contingency Operations Training and Assistance) é a “jóia da coroa” da iniciativa de George W. Bush denominada Global Peace Operations que conta com um orçamento anual de 660 milhões de dólares destinados ao treino e equipamento de militares de todo o mundo para operações de apoio à paz, de forma a constituir até 2010 uma força global de 75 mil efectivos vocacionada para este tipo de missões.
 
O programa ACOTA criado em 1997 sob a égide do Departamento de Estado norte-americano em ligação com o Departamento de Defesa, recorre a empresas militares privadas para treino e formação dos militares, e conta com 19 países africanos95 e visa apoiá-los no desenvolvimento de capacidades que lhes permitam participar em operações de manutenção da paz no continente.96 Em última análise o objectivo é o de conferir à União Africana uma força de manutenção de paz com cerca de 25 mil efectivos, capaz de ser autónoma quanto ao apoio logístico. Em dez anos cerca de 92 mil militares africanos receberam formação ao abrigo deste programa pretendendo-se que em 2010 atinga o número de 228 mil. O orçamento do ACOTA foi de 40 milhões de dólares em 2006, no entanto para 2007 este sofreu um aumento para 71 milhões, em resultado da exponenciação do número de militares africanos em operações de manutenção da paz.97
 
Podem-se descriminar as actividades desenvolvidas pelos Estados Unidos segundo as seguintes vertentes:
(1) exercícios militares conjuntos como o MEDFLAG (apoio sanitário) e o FLINTLOCK (exercícios de Estado-Maior);
(2) treino conjunto de forças de operações especiais em território afri­cano98;
(3) apoio à Iniciativa Africana de Resposta a Crises;
(4) formação conjunta no Centro Africano de Estudos de Segurança;
(5) contactos militares entre Oficiais superiores e Oficiais-Generais, visitas de navios de guerra a portos africanos, realização de seminários sobre questões de segurança e defesa africana, patrocínio de revistas académicas sobre segurança e defesa regional, apoio logístico à realização de exercícios de gestão e resposta a crises da UA destinados a melhorar a interoperabilidade de potenciais aliados, os quais incluem o Reino Unido e a França;
(6) financiamento de programas militares de aquisição de armamento e equipamento norte-americano99 e da frequência de Institutos e Academias Militares norte-americanos por parte de Oficiais de 44 países africanos e;
(7) programas de ajuda humanitária como a construção de escolas, abertura de furos de água, construção de estradas e actividades de desminagem.100
 
Entre 2005 e 2007 vários foram os países africanos que efectuaram exercícios militares conjuntos com forças norte-americanas, a saber: Benin, Botswana, Costa do Marfim, Gabão, Gana, Guiné, Etiópia, Quénia, Malawi, Mali, Moçambique, Nigéria, Senegal, África do Sul, e Uganda.
 
No plano da formação militar de quadros de oficiais de países africanos através da frequência de cursos nos Estados Unidos, os países que enviaram militares aos Estados Unidos em 2007 são os seguintes, estimando-se que venham a totalizar os 1 400 homens a um custo total de 15,6 milhões de dólares: África do Sul, Argélia, Benin, Botswana, Burquina-Faso, Burundi, Camarões, Cabo Verde, República Centro Africana, Chade, Comoros, Costa do Marfim, República Democrática do Congo, Djibouti, Guiné Equatorial, Eritreia, Etiópia, Gabão, Gâmbia, Gana, Guiné, Guiné-Bissau, Quénia, Lesoto, Madagascar, Malawi, Mali, Mauritânia, Maurícias, Marrocos, Moçambique, Namíbia, Níger, Nigéria, República do Congo, Ruanda, São Tomé e Princípe, Senegal, Seychelles, Serra Leoa, Suazilândia, Tanzânia, Togo, Tunísia, Uganda e Zâmbia.102
 
Por fim, e não menos importante, muitos são os países do continente que conferem autorizações de trânsito ou de estacionamento de forças e meios militares norte-americanos, de onde retiram algumas contrapartidas políticas e financeiras.
 
Na periferia do continente e no Oceano Índico, a base mais importante é a de Diego Garcia103 onde os Estados Unidos têm armazenado equipamento e armamento suficiente para uma Brigada de 3500 efectivos e para uma Divisão de Marines de 17 500 homens. Na ilha existe ainda uma base com aviões B-52 e B-2. A sua importância tem vindo a ser sistematicamente demonstrada nos conflitos do Golfo Pérsico de 1991, na Guerra do Iraque e na do Afeganistão.
 
No continente propriamente dito, Washington tem acordos de utilização de bases das quais se realçam Camp Lemonier no Djibouti, a base aérea de Tamanrasset no Sul da Argélia para aviões de vigilância P-3 Orion104, o porto de Mombassa e as bases aéreas de Embakasi e Nanyuki (Quénia)105, o aeroporto de Entembe (Uganda), a base aérea de Bamako (Mali), a base aérea de Dakar (Senegal), e aeródromos e portos no Gabão, Namíbia, Marrocos e Tunísia e por fim uma base aérea na Zâmbia. Com a criação do AFRICOM, Washington tem procurado obter, por enquanto sem grande sucesso, acordos de utilização de bases na Mauritânia, Niger, Chade, e Gana.106
 
Recentemente os Estados Unidos manifestaram interesse em construírem uma base naval em São Tomé e Princípe, cuja localização no Golfo da Guiné perto dos principais produtores africanos de petróleo mas convenientemente afastado dos conflitos étnicos e políticos que afectam os países sitos no continente, a tornam numa opção muito apropriada.107 Na verdade, a região do Golfo da Guiné tem sido nos últimos cinco anos o principal fulcro das operações navais norte-americanas em África. Em Outubro de 2004 realizou-se em Nápoles no EURCOM uma conferência internacional sobre segurança marítima no Golfo da Guiné que contou com a participação de chefias das Marinhas de Angola, Benim, Camarões, Guiné-Equatorial, Gabão, Gana, Nigéria, República do Congo, São Tomé e Princípe, e Togo e observadores dos Estados Unidos, França, Itália, Holanda, Portugal, Espanha, e Reino Unido. Este encontro serviu de catalizador para a realização em Janeiro de 2005 de uma missão de patrulhamento naval multinacional de combate ao contra­bando, pirataria, e terrorismo na região com a duração de dois meses e que se repetiu em Maio-Junho do mesmo ano. Em Setembro foram efectuados exercícios americano-britânicos de desembarque anfíbio na costa do Senegal. A tipologia destas operações denota uma preocupação de Washington de, em caso de agravamento da situação de segurança na Nigéria, a modalidade de acção de uma possível intervenção norte-americana passará muito provavelmente pela projecção de meios aéreos e terrestres a partir de plataformas navais ancoradas ao largo da costa deste país.
 
 
3.b.     Os Programas Norte-Americanos de Contra-Terrorismo em África
 
Em 1995, o Departamento de Defesa na sua Estratégia de Segurança dos Estados Unidos para a África sub-Sahariana referiu que em “não existe um grande interesse estratégico na África”.
 
Após os atentados de 7 de Agosto de 1998 às embaixadas norte-americanas em Nairobi e Dar-es-Salam, Washington rapidamente alterou a sua perspectiva, tendo focalizado a sua atenção em actividades de combate ao terrorismo neste continente, acções que foram ainda mais reforçadas após os atentados de 11 de Setembro de 2001 em Nova Iorque e Washington. Com a guerra do Iraque e as acções de guerrilha contra as forças norte-americanas estacionadas no país, estimativas do Departamento de Estado norte-americano apontam para a possibilidade de cerca de um quarto dos guerrilheiros estrangeiros a operarem no Iraque sejam africanos, e na sua maioria oriundos da Argélia e de Marrocos.
 
Em consequência desta conjuntura programas importantes de apoio ao desenvolvimento em África passaram a ser sub-financiados em benefício de programas militares e de contra-terrorismo.
 
Desde 2002 que os Estados Unidos lançaram uma série iniciativas de contra-terrorismo no continente africano, que, nalguns casos, vieram degradar ainda mais a imagem do país entre as populações da região, facilitando o abrir de portas à penetração chinesa. São estas iniciativas que são o fulcro analítico deste sub-parágrafo temático.
 
Os programas de contra-terrorismo são condicionados por particularismos históricos locais. Factores como a divisão artificial das fronteiras terrestres e marítimas entre Estados africanos não impedem a livre circulação de pessoas de ambos os lados da fronteira, visto que os laços étnico-familiares são compreensivelmente bem mais fortes do que uma separação política e um governo central que pouco ou nada lhes diz. A pobreza e a escassez alimentar tornam muitas dessas comunidades bastante vulneráveis e abertas a qualquer tipo de ajuda, o que abre uma janela de aportunidade para que organizações extremistas árabes e muçulmanas de caridade e apoio social manipulem os seus programas de ajuda humanitária, tendo entre os seus quadros de pessoal militantes radicais. Adicionalmente, a corrupção governamental dificulta a implementação de actividades de fiscalização e controlo de tais grupos.
 
Estruturalmente as operações de contra-terrorismo são conduzidas ao nível militar, governamental e social. Os programas operacionais assumem a forma de ajuda directa ao sector da segurança (formação e treino de forças militares e policiais), assistência económica ao desenvolvimento, e de aquisição de competências e capacidades (apoio à boa governação), sendo supervisados respectivamente pelo Departamento de Defesa, a USAID, e o Departamento de Estado108, com o Departamento do Tesouro a centrar-se no plano do financiamento de actividades terroristas e a controlar a atribuição e distribuição global das verbas. No entanto alguns dos programas do sector de segurança contam também com a participação do Departamento de Estado e a USAID.109
 
Um dos programas mais importante levados a cabo pelo Departamento de Defesa é o de combate ao problema das “áreas não governadas”, entendo-se estas como áreas físicas ou não-físicas onde não existe a capacidade do Estado em exercer um controlo e autoridade, mesmo que as delegue em organizações que assumam as funções e obrigações tradicionais do Estado nessa área, o que as torna propensas à criação de santuários e ao recrutamento de efectivos locais por parte de organizações terroristas.110 A atractividade destes espaços para grupos terroristas é ainda mais incrementada pela acessibilidade destes às tecnologias de informação e armas, permitindo-lhes criar “placas giratórias” para descanso e/ou treino dos seus operacionais sem que estes sejam detectados, ou levantem suspeitas a nível nacional e internacional.
 
Como já referido anteriormente, no plano continental a principal iniciativa dos Estados Unidos é a Global Peace Operations Initiative (GPOI) que tem como vertente operacional mais visível o programa ACOTA que é gerido pelo Departamento de Estado, ainda que não seja na sua essência um programa específico de combate ao terrorismo. Em 2005 de um orçamento total de 101,2 milhões de dólares, foram dispendidos 42,2 milhões de dólares no treino e sustentação do Quartel-General. Mais 26 milhões foram investidos em equipamento, a maioria do qual seguiu para África.111
 
No plano dos programas específicos de contra-terrorismo existem actuamente o Trans-Sahara Counter Terrorism Initiative (TSCTI), a Joint Task Force AZTEK SILENCE (JTF-AS), a Combined Joint Task Force Horn of Africa (CJTF-HOA), e a East African Counter-Terrorism Initiative (EACTI).112
 
No Leste de África a EACTI e a CJTF-HOA são os pilares dos programas norte-americanos de contra-terrorismo. Os objectivos de Washington nesta região de África são a contenção do terrorismo na Somália, contra-terrorismo e promoção da paz e estabilidade no Sudão, e parcerias de segurança com o Quénia e a Etiópia.113
 
A CJTF-HOA está sediada em Camp Lemonier no Djibouti, nos antigos aquartelamentos da Legião Estrangeira francesa, tendo estado até à criação do USAFRICOM sob o comando completo do USCENTCOM. Possui cerca de 250 elementos em funções de Estado-Maior e entre 1 200 e 1 800 efectivos operacionais, contando com o apoio da Marinha em missões de vigilância no Mar Vermelho.114 A sua missão é conjunta apenas ao nível do Estado-Maior e prende-se com a recolha de informações e o treino de forças terrestres e navais de Estados da região de forma a reduzir as condições favoráveis ao reaparecimento e crescimento da al-Qaeda e movimentos afiliados. Adicionalmente, militares da CJTF-HOA efectuam missões de apoio às comunidades locais como a abertura de poços de água, construção e reparação de estradas e escolas. Oficialmente, os efectivos adstritos à CJTF-HOA não se envolvem directamente em operações de combate ao terrorismo.
 
Na África Ocidental os principais programas são a Pan-Sahel Initiative (PSI) e o seu successor, a Trans-Sahel Counter-Terrorism Initiative (TSCTI). A PSI funcionou entre Novembro de 2002 e Março de 2004, tendo desde então passado a designar-se de TSCTI. Visa assegurar a países como o Chade, o Níger, o Mali, o Senegal, a Argélia, a Nigéria, Marrocos e a Mauritânia treino e equipamento destinado à melhoria do controlo das suas fronteiras, e localização, captura e destruição de células terroristas, sendo da responsabilidade do EUCOM até à criação do USAFRICOM.115 Membros das forças especiais e dos Marines norte-americanos são os instrutores que têm formado e treinado por ano uma Companhia de reacção rápida de cada um destes países.116
 
A JTF-AZ foi criada em Dezembro de 2003 sob o comando da Sexta Esquadra da Marinha norte-americana, operando no Norte de África. A sua missão centra-se na recolha e troca de informações, vigilância e reconhecimento sobre grupos terroristas no Norte de África, partilhando-os com os países aliados.
 
No centro e Sul do continente, os Estados Unidos não possuem uma presença programática tão acentuada, sendo a sua principal iniciativa a International Law Enforcement Agency (ILEA) localizada em Gaborone, no Botswana, sob a direcção do Federal Bureau of Investigations (FBI). A ILEA treina forças policiais em várias áreas como vigilância, informações, e operações de grupos terroristas.117
 
Esta agência tende a receber um cada vez maior financiamento, visto que existem indícios concretos de que células terroristas ligadas à al-Qaeda têm procurado cada vez mais refúgio em países do Sul de África como a Tanzânia, o Malawi, e muito provavelmente no Norte de Moçambique, atraídas pelo diminuto controlo dos respectivos governos sobre vastas áreas dos respectivos países, pela corrupção generalizada118, pelo facto de largas faixas da popu­lação ser muçulmana, da fácil acessibilidade ao tráfico de recursos minerais e de pedras preciosas locais119, do narcotráfico120, e da venda de produtos pirateados, os quais constituem uma fonte de financiamento das suas activi­dades.121
 
Este mais do que aparente progressivo redireccionamento das células terroristas do Norte para o Sul do continente122, dificilmente deixará de fora um país como Moçambique, que a curto-médio prazo será um dos principais dínamos da competição sino-norte-americana pela acumulação de influência no país, centrada em duas áreas principais: a extracção e comercialização de recursos naturais e matérias-primas, e o combate ao terrorismo, que funcionará como uma alavanca para uma maior penetração norte-americana no país.
 
Na segunda parte deste estudo (a publicar brevemente) irá analisar-se esta componente, ainda que essencialmente sobre a díade sino-moçambicana, não deixando de, sempre que pertinente, referir algumas iniciativas desenvolvidas por outros actores como Portugal, França, e Reino Unido, para tentarem em conjugação com as iniciativas já atrás referidas conduzidas pelos Estados Unidos contrabalançarem as acções chinesas, ainda que no que respeita a estes actores sob uma vertente essencialmente económica e cultural.
 
___________
 
*      Sócio Efectivo da Revista Militar.
 
___________
 
 1 Neste contexto inúmeras têm sido as análises sobre as motivações para este renovado interesse. Veja-se por exemplo as seguintes entre as muitas disponíveis em fonte aberta na World Wide Web: Xúlio Ríos; (2006); La Apuesta Africana de China; FRIDE. Abanti Bhattacharya; (2006); China’s Power Projection in Africa; IDSA; Joshua Kurlantzick; (2006); Beijing’s Safari: China’s Move into Africa and Its Implications for Aid, Development, and Governance; Carnegie Endowment for International Peace. Philip Bowring; (2006); China and Africa: Then and Now; International Herald Tribune. Adam Wolfe; (2006); Upcoming Summit Highlights Africa’s Importance to China; Power and Interest News Report; Wei-Wei Zhang; (2006); The Allure of the Chinese Model; International Herald Tribune. Elizabeth Economy e Kate Monaghan; (2006); The Perils of Beijing’s Africa Strategy; International Herald Tribune. Wenran Jiang; (2006); China’s Booming Energy Relations with Africa; China Brief; Jamestown Foundation. Valérie Niquet; (2006); La Stratégie Africaine de la Chine; Politique Étrangère. Joshua Eisenman e Joshua Kurlantzick; (2006); China’s Africa Strategy; American Foreign Policy Council. President Hu Meets 5 African Presidents in Beijing (3 de Novembro de 2006); China Daily. China Courts Africa, Angling for Strategic Gains (3 de Novembro de 2006); New York Times. Peter Ford; (2006); China Woos African Trade (3 de Novembro); Christian Science Monitor. Jean-Jacques Mével; (2006); Pékin, Capitale de l’Afrique pour Trois Jours (3 de Novembro); Le Figaro. Wu Jiao; (2006); Aid, Trade Package Readied for Africa (3 de Novembro); China Daily. V Conferência Internacional FLAD/IPRI-UNL, 12 e 13 de Outubro de 2006 em Lisboa com as seguintes comunicações: Estratégia e Segurança na África Austral: A Dimensão Africana na Política Externa da China; Evan S. Medeiros, Rand. A China e a África Austral; Steve Stead, The Brenthurst Foundation. Segurança Nacional, Mercados Internacionais e Critérios do Investimento Chinês no Petróleo em África; Ricardo Soares de Oliveira, Cambridge University. Os Equilíbrios Estratégicos Regionais na África Austral; Agostinho Zacarias. Energy and Security in Southern Africa; Jakkie Cilliers and Prince Mashele, Institute for Security Studies. Ana Cristina Alves; (2006); Emerging Postcolonial Solidarities: China’s New Economic Diplomacy Towards Subsaharan Africa; Comunicação apresentada na 16ª Conferência da Associação Australiana de Estudos Asiáticos que decorreu em Wollongong entre 26 e 29 de Junho. Bates Gill, Chin-hao Huang e Stephen Morrison; (2007); China’s Expanding Role in Africa: Implications for the United States; Washington, CSIS. Harry Broadman; (2007); Africa’s Silk Road: China and India’s New Economic Frontier; Washington, World Bank. Andrea Goldstein (Ed); (2006); The Rise of China and India: What’s in It for Africa?; Paris, OCDE. Chris Alden; (2005); “Leve  http://yaleglobal.yale.edu/display.article?id=5336. Chris Alden e Martyn Davies; (2006); “A Profile of the Operations of Chinese Multinationals in Africa”; South Africa Journal of International Affairs nº1; pp. 83-96. Chris Alden; (2005); “China in Africa”; Survival nº3; pp. 147-164.
 2 Os projectos de apoio mais mediáticos e propagandísticos foram os da construção de uma linha de caminho-de-ferro entre a Tanzânia e a Zâmbia e vários estádios, edifícios governamentais e monumentos em diversos países. Diversos acordos de cooperação militar foram assinados neste período, especialmente com amigos ideológicos como a Etiópia, o Uganda, a Tanzânia, a Zâmbia e num plano diferente com o Egipto. Entre 1955 e 1977 a China vendeu armamento a África num total de 142 milhões de dólares. Para uma contextualização e desmistificação deste apoio veja-se Peter Van Ness; (1970); Revolution and Chinese Foreign Policy; Berkeley, University of California Press e Bruce Larkin; (1971); China and Africa 1949-1970: The Foreign Policy of the People’s Republic of China; Berkeley, University of California Press.
 3 Wenran Jiang; (2007); “Hu’s Safari: China’s Emerging Strategic Partnership in Africa”; China Brief nº 4.
 4 Em 2006 Hu Jintao, Wen Jiabao (Primeiro-Ministro) e Li Zhaoxing (Ministro dos Negócios Estrangeiros) visitaram um total de 15 países africanos. Em Janeiro de 2006, Li visitou Cabo Verde, o Senegal, o Mali, a Libéria, a Líbia e a Nigéria. Em Abril, Hu visitou Marrocos, a Nigéria e o Quénia. Em Junho, Wen visitou Angola, o Egipto, o Gana, a República Democrática do Congo, a África do Sul, a Tanzânia, e o Uganda. Entre 30 de Janeiro e 10 de Fevereiro de 2007, Hu Jintao visitou o Sudão, a Libéria, os Camarões, a Zâmbia, a Namíbia, a África do Sul, Moçambique e as Seichelles.
 5 Basta atentarmos no crescimento exponencial do preço do aço, do cobre, do níquel, do manganésio, do zinco entre muitos outros metais, fruto essencialmente da procura chinesa (o primeiro importador mundial destes) e indiana. O petróleo também não é uma excepção, e o factor China e Índia é uma variável da equação, ainda que os elementos que condicionam a sua cotação sejam mais especulativos, resultante de uma maior acuidade geopolítica dos mercados face à situação de segurança de alguns dos países e regiões produtoras. Não obstante, e em resultado desta procura sino-indiana o produto interno bruto da África sub-Sahariana cresceu uma média de 5,1 por cento entre 2001 e 2006, comparado com os 2,6 por cento nos cinco anos anteriores.
 6 Para uma extrapolação das possíveis percepções dos Estados africanos sobre a China é interessante ler no contexto empírico a incontornável obra de Robert Jervis; (1976); Perception and Misperception in International Politics; Princeton, Princeton University Press; especialmente pp. 356-380.
 7 Os princípios são o respeito mútuo pela integridade territorial e soberania; não agressão mútua; não interferência mútua nas questões internas; igualidade e benefício mútuo; e coexistência pacífica. Estes princípios foram formulados em Dezembro de 1953 no prefácio do memorando de entendimento com a Índia a propósito do comércio e comunicações com o Tibete, tendo sido generalizada e aplicada ao “mundo socialista” em Novembro de 1956 aquando da conferência Bandung após os distúrbios na Polónia e Hungria. Esta formulação foi agora enquadrada no conceito de “mundo harmonioso” publicado pela China em 2005 e que favorece uma mecânica global de cooperação multilateral. Veja-se Information Office of the State Council of the People’s Republic of China; (2005); China’s Peaceful Development Road, White Paper; Beijing. Disponível em http://www.china.com.cn/english/features/book/152760.htm. Os casos do apoio chinês ao Sudão e ao Zimbabwe são exemplos da aplicação do terceiro princípio, não obstante a pressão da comunidade internacional em sentido contrário.
 8 Esta vertente civilizacional no discurso de política externa chinesa e a sua aplicação em termos de poder, reflecte-se quando aplicável, no desenvolvimento de um sentimento de solidariedade civilizacional, fruto da perda de um estatuto mais ou menos relevante outrora auferido, que pode potenciar um “sentimento positivo” (gangqing) de países em vias de desenvolvimento face a Pequim. O gangqing é por sua vez empregue para dinamizar uma “amizade” (youyi) que pode ser operacionalizada em prol dos objectivos políticos da liderança chinesa no sistema internacional.
 9 Forum on China-Africa Cooperation: Beijing Action Plan (2007-2009). Disponível em http://www.fmprc.gov.cn/zflt/eng/zyzl/hywj/t280369.htm. Um dos líderes africanos mais cépticos é o Presidente sul-africano Tabo Mbeki, que afirmou em 2005 que o seu país não irá seguir o modelo de desenvolvimento chinês, argumentando que África não pode replicar a China que beneficia da injecção massiva de capital que cataliza um crescimento económico baseado nas exportações, o que não sucede com os países africanos.
10 O mesmo problema verifica-se tanto nos mercados de rua de Dakar como de Maputo e Nampula onde se vêm produtos chineses importados mais baratos que os produzidos localmente. Em Nampula, a roupa e o calçado chinês chega a ser mais barato que a roupa e calçado usado doados por países ocidentais aquando de catástrofes climatéricas que sazonalmente afectam esta região e que são desviados dos contentores no porto de Nacala. O nome do mercado semanal de Domingo é sugestivamente apelidado de “Calami­dades”.
11 No Lesoto foram perdidos 13 mil postos de trabalho, na Suazilândia cerca de 12 mil.
12 Veja-se Paul Mooney; (2005); “China’s African Safari”. Disponível em http://www.YaleGlobal.edu.
13 Conversa do autor com alguns empresários moçambicanos em Nampula e Maputo cujas áreas de negócio estão a sofrer uma forte concorrência chinesa. São também conhecidos os casos de descontentamento nas minas de cobre da Zâmbia operadas por empresas chinesas relativamente às deficientes condições de trabalho dos mineiros e respectivos vencimentos, bem como o encerramento de indústrias têxteis locais que levaram na semana anterior à visita do Presidente Hu Jintao ao país, a manifestações de protesto em frente da embaixada chinesa e à eliminação do programa inicial da visita de Hu à região das minas. Num relatório da Christian Aid datado de Fevereiro de 2007, referia-se que empresas mineiras suíças e indianas também não tinham melhores condições de trabalho mas ofereciam alguns benefícios sociais como programas de combate à malária e apoio a actividades desportivas por parte dos seus mineiros. O mesmo relatório referia que dois mineiros haviam sido feridos por disparos de armas de fogo do pessoal de segurança quando participavam numa manifestação em frente ao edifício da administração chinesa de uma mina. Este incidente veio confirmar um sentimento crescente entre a população de que os empresários chineses são exploradores e brutais. Disponível em http://www.telegraph.co.uk/news/main.jhtml?xml=/news/2007/02/04/wzambia04.xml. A polícia zambiana teve de isolar o quarteirão do hotel em Lusaka onde Hu ficou alojado para que este não pudesse ouvir os protestos de estudantes e trabalhadores locais. Não obstante, os empresários chineses continuam a afluir em grande número a Lusaka, onde em 2006 foi inaugurado o primeiro grande casino e o primeiro hotel de cinco estrelas com o nome de Livingstone, ambos de capital maioritário chinês. Em finais de 2006, o governo do Gabão ordenou à empresa petrolífera chinesa Sinopec, que suspendesse a exploração petrolífera no parque nacional de Loango, designado em 2002 como reserva natural graças ao financiamento de doadores internacionais, após um grupo conservacionista norte-americano ter denunciado a empresa de destruição da floresta e de operar sem ter qualquer estudo de impacto ambiental aprovado. Disponível em http://www.cfr.org/publication/11886/perils_of_beijings_africa_strategy.html. As empresas petrolíferas chinesas tanto estatais como privadas têm participações financeiras em 20 congéneres africanas, tendo dispendido nos últimos cinco anos cerca de 15 mil milhões de dólares na compra de licenças de exploração de petróleo e gás natural. Wenran Jiang; (2006); “China’s Booming Energy Relations with Africa”; China Brief. Mesmo assim esta incursão chinesa nos campos petrolíferos africanos acarreta riscos para o seu pessoal pois recentemente 14 nacionais seus foram raptados e mortos na Nigéria, e na Etiópia ocorreram alguns incidentes similares. Um rumor que circula entre alguns cículos mais conservadores do EPL é o de que estas acções estão a ser fomentadas pela CIA. Citado em Susan Puska; (2006); “Resources, Security and Influence: The Role of the Military in China’s Africa Strategy”; China Brief nº 11.
14 Veja-se os relatórios anuais publicados pela Transparency International “The Corruption Perceptions Index”. Disponíveis em http://www.transparency.de/documents/cpi/index.html.
15 Veja-se Vanessa K. Snoody; (2005); The New Partnership for Africa’s Development (NEPAD): Will It Succeed or Fail?; Carlisle Barracks, Strategic Studies Institute.
16 “China Donates US$400,000 to AU”; 29 de Abril de 2005. Disponível em http://www.allafrica.com/stories/200505090243.html.
17 Onde o interesse chinês se centra respectivamente no petróleo, no cobre, na madeira e na platina. A China importa actualmente 28 por cento das suas necessidades em petróleo da África sub-Sahariana, contra 15 por cento dos Estados Unidos. As empresas chinesas ex-ploram minas de cobre na Zâmbia e na República Democrática do Congo, entre outros Estados africanos. Para além das segundas maiores reservas mundiais de platina, o Zimbabwe também tem reservas significativas de 40 outros tipos de minerais como o ferro-crómio, o urânio, o ouro, a prata e o cobre. No Gabão a exportação ilegal de madeira constitui 70 por cento das exportações deste país para a China.
18 Os Estados Unidos desenvolvem actualmente com Portugal três projectos de cooperação militar. Um no sentido de detectar e tratar o SIDA entre militares das Forças Armadas de Defesa de Moçambique através de médicos militares portugueses; outro similar na Guiné-Bissau e em São Tomé e Princípe; e o terceiro no treino de forças militares angolanas de manutenção de paz inserido no programa ACOTA. Expresso; 19 de Maio de 2007. O ACOTA (African Contingency Operations Training and Assistance Program) está inserido num plano norte-americano e europeu denominado de Global Peace Operations Initiative (GPOI). Para uma visão estratégica com mais de uma década mas não menos actual sobre a importância deste tipo de cooperação luso-americana veja-se Kimberley A. Hamilton; (1992); Lusophone Africa, Portugal, and the United States: Possibilities for More Effective Cooperation; Washington, CSIS.
19 As suas maiores preocupações estão no Médio Oriente, na Ásia Central e no Nordeste asiático sendo a cooperação com países africanos mais ao nível do contraterrorismo e privilegiando Estados do Norte e Este de África. A política de restrição de visas a estudantes africanos e a redução do número de oficiais de ligação nas diversas embaixadas norte-americanas em África são também ilustrativas deste menor empenho.
20 O anúncio da criação do USAFRICOM coincidiu com o périplo africano de Hu Jintao, o que pode indiciar o renascer de uma competição geopolítica por África à qual se poderá juntar a União Europeia através da organização em Dezembro de 2007, em Lisboa, sob a presidência portuguesa da União, da segunda Cimeira Europa-África, assim se consiga ultrapassar as questões associadas à representação do Zimbabwe na mesma.
21 Definido-se “guerra política” como um instrumento não violento da grande estratégia envolvendo a coordenação de actividades e resulta em efeitos tangíveis sobre os alvos designados. Visa influenciar governos e população através de palavras e acções em prol dos objectivos da grande estratégia de um Estado. As principais operações de “guerra política” incluem as de ajuda económica; apoio ao desenvolvimento; treino e equipamento de forças militares e de segurança. As operações de segundo nível são aquelas relacionadas com as visitas bilaterais e os intercâmbios culturais. Veja-se Donovan C. Chau; (2006); “Political Warfare - An Essential Instrument of U.S. Grand Strategy Today”; Comparative Strategy nº2; pp. 109-120.
22 Segundo o Ministério Chinês da Educação em 2006, cerca de 8 mil estudantes africanos aprendem mandarim nos Institutos Confúcio.
23 Arnaldo Gonçalves; (2006); “O Safari Chinês”. Correspondência por e-mail com o autor.
24 Forum On China-Africa Cooperation: Beijing Action Plan (2007-2009). Disponível em http://www.fmprc.gov.cn/zflt/eng/zyzl/hywj/t280369.htm.
25 Acordo estabelecido no ano de 2000. Podem aderir a este acordo países que façam reformas políticas e económicas que permitam reduzir as barreiras comerciais, aumentar as exportações, criar emprego e reduzir a pobreza, combater a corrupção, proteger os direitos humanos e dos trabalhadores, e expandir as oportunidades de negócio entre empresários africanos e norte-americanos. A China tirou partido deste acordo para adquirir algumas fábricas em África redireccionando alguma da sua produção nacional para estas, contornando assim as restrições impostas às exportações de têxteis chineses para o mercado norte-americano. Quando o Acordo Multi-Fibras entrou em vigor em 2005 muitas destas fábricas foram encerradas. Veja-se The Effect of China and India’s Growth and Trade Liberalisation on Poverty in Africa; (2005). Disponível em http://www.sarpn.org.za/documents/d0001312/P1555-China_trade_Report_May2005.pdf.
26 Muito devido ao petróleo africano. Por exemplo o comércio com a Nigéria aumentou 56 por cento e com a República do Congo 98 por cento. Os Estados Unidos passaram a importar petróleo do Chade uma vez que o oleoduto entre este país e os Camarões já se encontra em funcionamneto desde 2006.“The Bush Administration’s Agenda for Africa in 2006”; Jendayi E. Frazer, Assistant Secretary for African Affairs; Remarks to the AGOA 3 Action Committee Meeting; Washington, DC; January 10, 2006. Disponível em http://www.ustr.gov.
27 Este relatório também detalha os vários programas de ajuda económica ao desenvolvimento através do fomento do comércio e está disponível em http://www.ustr.gov.
28 Dados compilados pelo autor a partir da informação sobre a visita do Primeiro Ministro Hu Jintao a África em 2006. Disponível em http://politics.people.com.cn/GB/1024/5388818.html. Dos milhares de projectos em curso, 500 são da responsabilidade exclusiva da Empresa Chinesa de Estradas e Pontes, pertença do Estado, a qual subcontratou 43 outras empresas chinesas. Na Etiópia a China está envolvida no sector local das telecomunicações; na República Democrática do Congo tem uma forte participação na empresa mineira estatal Gecamine; no Quénia procedeu à reparação da estrada Mombassa-Nairóbi e está a construir as estratégicas estradas Kima-Chemasuru e Kipsagak-Serem-Shamakhokho no Leste do país; na Nigéria financiou o lançamento do primeiro satélite de comunicações deste país; na Guiné Equatorial está a construir um grande complexo habitacional e uma nova rede estradal através de um empréstimo no valor de 2 mil milhões de dólares. Veja-se Accenture Consulting Group; (2005); “China Spreads Its Wings: Chinese Companies Go Global”. Disponível em http://www.accenture.com/NR/rdonlyres/
6A4C9C07-8C84-4287-9417-203DF3E6A3D1/0/Chinaspreaditswings.pdf.
29 Disponível em http://ipsnews.net/news.asp?idnews=36351.
30 Apoiado em seis princípios-chave: a população é o mais importante; experimentação constante; reforma gradual; Estado como entidade progressista; aprendizagem selectiva; e estabelecimento de uma correcta sequência de prioridades.
31 The Associated Press; (2007); “G-8 Finance Officials Stress Support for Africa, Urge Smart Investing, Good Financial Governance”; May 19, 2007.
32 Veja-se Extractive Industries Transparency Initiative. Disponível em http://www.eitransparency.org.
33 Ainda que o seu conteúdo seja bastante genérico ele permite descortinar algumas linhas de força da actuação estratégica chinesa face a este continente. Disponível em http://news.xinhuanet.com/english/2006-01/12/content/_4042521.htm. Os diversos Livros Brancos publicados pela China estão disponíveis em http:www.china.org.cn/e-white.
34 A China defende-se argumentando que já perdoou desde o ano 2000, 156 dívidas num valor global de 1313 milhões de dólares. Xúlio Ríos; (2006); La Apuesta Africana de China; FRIDE; p. 9.
35 Ao contrário do que sucede noutros países como o Brasil que impõe na adjudicação de contratos de construção que dois terços da mão-de-obra seja local. Veja-se Barry V. Sautman; (2006); “Friends and Interests: China’s Distinctive Links With Africa”; Center on China’s Transnational Relations; Working Paper nº 12. Disponível em http://www.cctr.ust.hk/articles/pdf/WorkingPaper12.pdf.
36 São exemplos entre muitos outros, a construção do hospital Oratta em Asmara na Eritreia e do projecto de 300 milhões de dólares da barragem e da central de produção de energia eléctrica do rio Tekeze na Etiópia, onde os sucessivos atrasos levaram o governo etíope a reclamar uma indemnização por parte da empresa pelo não cumprimento dos prazos contratados.
37 Chris Alden e Martyn Davies; (2006); “A Profile of the Operations of Chinese Multinationals in Africa”; South Africa Journal of International Affairs nº 1; pp. 83-96.
38 Citado em “Bottom of the Barrel: Africa’s Oil Boom and the Poor”; (2006). Disponível em http//www.Catholicrelief.org.
39 A China tem relações diplomáticas com 48 dos 53 países africanos. Taiwan é reconhecido pelos restantes cinco: Gâmbia, Burquina-Faso, Malawi, Suazilândia e São Tomé e Princípe.
40 Em Dezembro de 2006, em Angola, e por inédita pressão de Pequim, o Secretário do Conselho de Ministros de Angola, António Pereira Mendes de Campos Van Dunem foi forçado a demitir-se devido ao desvio de parte das verbas de um empréstimo concedido pela China para a construção de infraestruturas e que acabou num fundo governamental destinado à campanha do MPLA nas eleições gerais no país.
41 As empresas chinesas apresentam orçamentos de construção de infraestruturas em média 25 por cento mais baixos que as suas congéneres ocidentais. Em Angola por exemplo, a recente linha de crédito de 4,2 mil milhões de dólares do Banco de Importação e Exportação da China para a construção de estradas, caminhos-de-ferro, habitações de preço económico e escolas, pressupõe que apenas 30 por cento dos sub-contratos sejam concedidos a empresas angolanas. Este empréstimo é pago em barris de petróleo. Nesta perspectiva, pode-se alegar que este empréstimo é mais transparente do que aquele de 2,35 mil milhões de dólares concedido pelo Standard Chartered Bank, pelo Barclays Bank e pelo Royal Bank of Scotland, o quais não têm “contrapartidas” tornando-os passíveis de eventuais “desvios parciais”.
42 Conversa do autor com um empresário chinês residente em Nampula. A mão-de-obra chinesa custa em média o dobro da africana mas trabalha mais, mais rápido e melhor. Estima-se que a China tenha cerca de 80 mil trabalhadores em África envolvidos em projectos de construção de infraestruturas, a maioria dos quais na África do Sul, Argélia, Sudão, Nigéria, Angola, Senegal, Gabão, República Democrática do Congo, e Zâmbia. Assiste-se actualmente a um forte crescendo desta presença em países como o Quénia, Tanzânia e Moçambique.
43 Accenture Consulting Group; (2005); “China Spreads Its Wings: Chinese Companies Go Global”. Disponível em http://www.accenture.com/NR/rdonlyres/
6A4C9C07-8C84-4287-9417-203DF3E6A3D1/0/Chinaspreaditswings.pdf.
44 Harry Broadman; (2007); Africa’s Silk Road: China and India’s New Economic Frontier; Washington, World Bank; pg.243.
45 Jing Zhuqing; (2004); “Council Promotes Sino-African Cooperation”; China Daily, November 18. Disponível em http://www.chinadaily.com.cn/english/doc/2004-11/18/content_392419.htm.
46 Veja-se o site do Banco Chinês de Importação e Exportação disponível em http://www.exim.cn. No total cerca de 80 por cento dos empréstimos do banco para África destinam-se a cinco países: Angola, Moçambique, Nigéria, Sudão e Zimbabwe, com 40 por cento dos fundos atribuídos a direccionarem-se para o sector da produção de energia. Export-Import Bank of China; (2006); “Nianbao” (Relatório Anual). Disponível em http://english.exim-bank.gov.cn/annual/reportall.jsp.
47 Várias indústrias chinesas adquiriram acções sobrevalorizadas de empresas petrolíferas nacionalizadas de países africanos de forma a garantirem uma quota de mercado. O mesmo sucedeu no sector dos recursos minerais especialmente em Moçambique e no Zimbabwe. Ilustrativamente o Banco Mundial num recente relatório referiu que um terço das empresas chinesas tinham perdido dinheiro nos seus investimentos no estrangeiro e que 65 por cento das joint ventures haviam fracassado. Accenture Consulting Group; (2005); “China Spreads Its Wings: Chinese Companies Go Global”. Disponível em http://www.accenture.com/NR/rdonlyres/
6A4C9C07-8C84-4287-9417-203DF3E6A3D1/0/Chinaspreaditswings.pdf.
48 Todd Moss e Sarah Rose; (2006); China EXIM Bank and Africa: New Lending, New Challenges. Disponível em http://www.cgdev.org.
49 Export-Import Bank of China; (2006); “Nianbao” (Relatório Anual). Disponível em http://english.exim-bank.gov.cn/annual/reportall.jsp.
50 Extractive Industries Transparency Initiative é uma Organização Não Governamental que goza do apoio de 14 governos de Estados africanos, empresas multinacionais, organizações internacionais, outras organizações não governamentais, investidores institucionais e organizações comerciais tendo como objectivo assegurar que as receitas resultantes das actividades extractivas contribuam para o desenvolvimento sustentado e para a redução da pobreza. Veja-se http://www.eitransparency.org.
51 Em Maio de 2007 realizou-se em Pequim a reunião entre o BAD e a China onde foi acordado o reforço da cooperação bilateral especialmente entre o Banco de Importação e Exportação da China e aquele, de forma a aumentar a eficiência do processo de financiamento chinês a projectos no continente africano.
52 Por exemplo em Portugal este modelo também foi aplicado através de um protocolo assinado com a Universidade do Minho.
53 Em 2005 mais de 3 mil técnicos de governos e organizações africanas participaram na China em programas e cursos técnicos e 1100 estudantes africanos beneficiavam de bolsas de estudo em universidades chinesas. Disponível em http://espanol.chinabroadcast.cn/161/2006/10/14/1@10455.htm. O objectivo é atingir os 10 mil técnicos africanos por ano em 2010.
54 Disponível em http://ipsnews.net/news.asp?idnews=36351.
55 É conhecido o facto que em 2004 o Banco Chinês para o Desenvolvimento ofereceu um empréstimo de 10 mil milhões de dólares ao gigante de telecomunicações Huawei para financiar os planos de expansão internacional desta. Na Serra Leoa e na Libéria as empresas de construção chinesa detêm os principais contratos de construção de infraestruturas. Disponível em http://ipsnews.net/news.asp?idnews=36351.
56 Após ter financiado em mais 20 milhões de dólares a modernização da rede eléctrica nacional. de John Oyuke; (26 de Janeiro de 2006); “China Funds Sh1.4b Electricity Projects”. Disponível em http://www. Allafrica.com/stories/200601250978.html.
57 Mauro de Lorenzo; (2007); “China and Africa: A New Scramble?”; China Brief nº 7.
58 Disponível em http://www.bloomberg.com. Curiosamente e apesar do significativo apoio ao desenvolvimento concedido pelo Japão este tem optado por acções menos mediáticas junto da opinião pública dos Estados beneficiários o que leva a que aquela tenha uma percepção errada da dimensão e valor deste apoio nipónico. Para uma confirmação desta percepção no caso de Angola e Moçambique veja-se Patrícia Magalhães Ferreira; (2007); “O Papel dos Actores Externos em Angola e Moçambique”; Diplomacia, Cooperação e Negócios: O Papel dos Actores Externos em Angola e Moçambique; Lisboa, IEEI; p. 62. Disponível em http://www.ieei.pt/files/PMF_Relatorio_Africa_2007.pdf.
59 Veja-se Harry G. Broadman; (2006); Africa’s Silk Road: China and India’s New Economic Frontier; Washington, World Bank Publications.
60 Por exemplo no Zimbabwe o governo concedeu licenças de longa-duração a um elevado número de militares por incapacidade em pagar os respectivos salários, ao mesmo tempo que as chefias políticas e militares adquiriram uma nova frota de automóveis oficiais.
61 Onde se insere a Polícia Popular Armada (PPA).
62 China’s National Defense in 2004, Government White Paper. Disponível em http://www.china.org.cn/e-white/20041227/index.htm.
63 A China não publica relatórios sobre a sua venda de armas e num recente relatório da Amnistia Internacional foi mencionado que 17 por cento das armas ligeiras apreendidas pelas forças de manutenção da paz no Congo são de fabrico chinês, a maioria delas novas. Por exemplo, aquando da guerra civil moçambicana foram importadas cerca de 6 milhões de armas ligeiras mais de metade delas de fabrico chinês. Uma inspecção a paióis de armas ligeiras das unidades operacionais sitas em Nampula e Nacala permite facilmente confirmar este facto.
64 O que a tornou no maior fornecedor de armas à Nigéria, à frente do Brasil.
65 David Shinn; (2006); Africa and China’s Global Activism; Fort Lesley, National Defense University; pp. 4-5.
66 A delegação militar chinesa, integrada ainda por três Coronéis, um Tenente-Coronel e um Major, visitou as instalações do Comando da 3ª Região Militar, em Achada Mato, e manteve um encontro como o Chefe de Estado-Maior das Forças Armadas Cabo-Verdianas, Coronel Antero Matos. “Cabo Verde Reforça Cooperação Militar com a China”; 27 de Março de 2007. Disponível em http://www.panapress.com.
67 Disponível em http://www.onu.org/dpko.
68 Em Junho de 2007 a China era o 13º maior contribuinte de forças militares para operações da ONU contra o 1º lugar do Paquistão e o 48º lugar dos Estados Unidos, com 1572 militares em forças constituídas, 63 observadores militares e 174 polícias chineses.
69 Ao contrário da Europa, onde Pequim tem um adido de defesa em quase todas as capitais. Nos últimos 20 anos os adidos de defesa chineses em África passaram de 9 para 14. Disponível em http://www.bjmac.org.
70 Destes a China tem interesses petrolíferos em quatro (Sudão, Egipto, Argélia e Nigéria) prevendo-se que o Gabão e a Guiné-Equatorial venham a colocar a curto prazo um adido de defesa permanente em Pequim.
71 Para leitura de uma relação incompleta de líderes do EPL que efectuaram visitas a África entre 2001 e 2006 veja-se Susan Puska; (2006); “Resources, Security and Influence: The Role of the Military in China’s Africa Strategy”; China Brief nº11.
72 Disponível em http://www.ghanaweb.com.
73 O texto está disponível na íntegra em http://www.fmprc.gov.cn/zflt/eng/zyzl/hywj/t280369.htm e http://english.focacsummit.org/2006-11/05/content_5167.htm. Veja-se também http://www.focacsummit.org/zxbd/2006-11/05/content_5186.htm.
74 Veja-se The World Bank; (2007); African Development Indicators 2006; Washington. The World Bank; pp. 1-19.
75 Disponível em http://www.ustr.gov.
76 Jendayi E. Frazer; (2006); “The Bush Administration’s Agenda for Africa in 2006”; Jendayi E. Frazer, Assistant Secretary for African Affairs; Remarks to the AGOA 3 Action Committee Meeting; Washington, DC; January 10, 2006. Disponível em http://www.ustr.gov.
77 Veja-se Anthony Lake e Christine Tood Whitman; (2006); More Than Humanitarism: A Strategic U.S. Approach Towards Africa; Independent Task Force nº56, Council on Foreign Relations. Disponível em http://www.cfr.org/content/publications/attachments/Africa_Task_Force_web.pdf.
78 A primeira reunião deste grupo foi em Março de 2007.
79 As áreas identificadas pelos Estados Unidos como com maior potencial de exportação para o mercado norte-americana são: floricultura, produtos florestais, horticultura, processamento de produtos agrícolas (cacau, café, mariscos), minerais e metais, petróleo e gás natural, pescas, e serviços (turismo).
80 União Africana.
81 Em Outubro de 2005 foi criado no seio da USAID um gabinete para os Assuntos Militares, o qual ficou sediado em Washington e tem como missão ser um facilitador dos contactos entre a agência e as estruturas militares. U.S. Agency for International Development; (2006); USAID Primer: What we do and how we do it; Washington DC; USAID; pp. 6-7.
82 “Os Estados Unidos não estão a utilizar a guerra política de uma forma coordenada e eficaz.” Donovan C. Chau; (2007); Political Warfare in Sub-Saharan Africa: U.S. Capabilities and Chinese Operations in Ethiopia, Kenya, Nigeria, and South Africa; Carlisle Barracks, Strategic Studies Institute; p. 54.
83 Veja-se http://www.usaid.gov/our_work/
84 Para uma análise dos vários programas de protecção ambiental, segurança alimentar, e conservação de energia conduzidos pelos Estados Unidos no continente africano veja-se “Fact Sheet: The United States and Africa: Building Resilience to Climate Change and Variability, Conserving Forests, Securing Energy for Africa’s Future”. Disponível em http://www.usaid.gov/
85 Em 27 de Junho de 2007, a Primeira-Dama dos Estados Unidos Laura Bush, visitou Maputo onde fez a entrega de um donativo de 2 milhões de dólares para o programa de combate à malária.
86 “Overview of U.S. Economic Assistance to Africa in 2006”; Disponível em http://www.usaid.gov/
87 Office of the Coordinator for Reconstruction and Stabilization; “CRS Core Objectives”. Disponível em http://www.state.gov/s/crs/c15212.htm.
88 Veja-se respectivamente http://www.mercycorps.org/ e http://www.peacecorps.gov.
89 Em Março de 2007 foi criada uma equipa de transição com cerca de 60 elementos, liderada pelo Contra-Almirante Robert Moeller, a qual constituirá o núcleo duro do AFRICOM. ISN Security Watch; (2007); Skepticism Over US Africa Command. Disponível em newslist@isn.ch.
90 Está prevista para o Outono de 2007 a realização de uma reunião de conversações entre os Estados Unidos e representantes de países europeus com interesse e experiência no continente (no qual se insere obviamente Portugal). Em agenda estará a concertação de estratégias associadas à criação do AFRICOM.
91 Teresa Whelan; (2006); “Africa’s Ungoverned Spaces”; Nação e Defesa nº 114; p. 70.
92 Leia-se um bom enquadramento desta tipologia de operações aplicada ao continente africano em António Pinheiro; (2006); “Modelos de “Africanização” das Operações de Apoio à Paz”; Nação e Defesa nº 114; pp. 141-168. John A. Aho; (2005); Stabilization of Africa through Military Power; Carlisle Barracks, Strategic Studies Institute.
93 Em Maio de 2007 realizou-se em Maputo uma reunião dos Representantes do Comité Interestatal de Defesa e Segurança da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC) na qual foi analisada a criação de uma Força Africana de Intervenção Rápida. A criação desta força, que foi decidida em 2006, inscreve-se no Programa de Integração Regional da SADC apoiado pelos Estados Unidos.Uma das prioridades do processo de integração regional é definir os aspectos conceituais e legais ligados à criação da Força Africana Rápida de Intervenção que foi oficialmente lançada em Lusaka (Zâmbia) durante a Cimeira da SADC de Agosto de 2007. A reunião agrupou delegados de Moçambique, da África do Sul, do Botswana, do Lesoto, da Namíbia, da Tanzânia, da Zâmbia e do Zimbabwe. Para além destes países, a SADC integra Angola, as ilhas Maurícias, Madagáscar, o Malawi, a República Democrática do Congo e a Suazilândia.
94 Comunidade Económica dos Estados do Oeste de África.
95 Os países aderentes são o Benin, o Botswana, o Burquina Faso, a Etiópia, o Gabão, o Gana, o Quénia, o Malawi, o Mali, Moçambique, a Namíbia, o Níger, a Nigéria, o Ruanda, o Senegal, a África do Sul, a Tanzânia, o Uganda e a Zâmbia. Militares destes países após terem recebido treino do programa ACOTA têm desempenhado missões na República Democrática do Congo, na Libéria, no Burundi, na Costa do Marfim, no Sudão/Darfur, na Somália e no Líbano.
96 O treino de dois meses inclui escoltas a comboios de viaturas, montagem e operação de checkpoints, operações de desarmamento, manuseamento de armamento, gestão de refu­giados, técnicas de negociação e comando de pequenas unidades. O treino de pessoal ao nível de Estado-Maior e exercícios de escalão Batalhão e Brigada são também efectuados, sempre que possível no plano multinacional. É fornecido fardamento e equipamento aos militares bem como sessões de prevenção do SIDA.
97 Jim Fisher-Thompson; (2007); “U.S. Military Training Program Benefits African Peacekeepers: State Department Official Cites Success of 10-year, 19-nation Partnerships”. Disponível em http://usinfo.state.gov.
98 Algumas destas actividades e programas têm sido subcontratadas a empresas militares privadas como a MPRI (Military Professional Resources Incorporated) que é composta por militares na reserva e na reforma e que tem relações fortes com o Departamento de Estado e a Agência Norte-Americana para o Desenvolvimento Internacional.
 99 As vendas de armamento são canalizadas através da Agência de Cooperação de Defesa e Segurança que depende do Secretário da Defesa Assistente para os Assuntos de Segurança Internacional. O material mais sensível é vendido com licença do Gabinete de Controlo de Comércio de Armamento sob a autoridade do Gabinete de Assuntos Político-Militares do Departamento de Estado. As vendas de armas dos Estados Unidos a países africanos passaram de 39,2 milhões de dólares em 2005 para 59,8 milhões em 2006, estimando-se que possam cair para os 27,9 milhões em 2007. Daniel Volman; (2007); “U.S. Military Programs in Sub-Saharan Africa, 2005-2007”; Director of the African Security Research Project in Washington, DC. Information from the U.S. State Department, Congressional Budget Justification for Foreign Operations, Fiscal Year 2007. Disponível em http://usinfo.state.gov.
100 As unidades do Exército norte-americano mais vocacionadas para este tipo de actividades são o 3º Grupo de Forças Especiais, o 96º Batalhão de Assuntos Civis e a XXXª Brigada Médica. Na Marinha a Força Naval de Construção (popularmente denominada de Seabees) está bem talhada para este tipo de missões, tendo por exemplo em Março de 2006 terminado a construção de uma rampa de acesso ao mar para as lanchas de patrulha da Marinha queniana sediadas na baía de Manda.
101 Daniel Volman; (2007); “U.S. Military Programs in Sub-Saharan Africa, 2005-2007”; Director of the African Security Research Project in Washington, DC. Information from the U.S. State Department, Congressional Budget Justification for Foreign Operations, Fiscal Year 2007. Disponível em http://usinfo.state.gov.
102 Disponível em http://www.usinfo.state.gov.
103 A soberania da ilha é reclamada pelo Reino Unido e pelas Maurícias. Refira-se que a ilha foi cedida aos Estados Unidos pelo Reino Unido ao abrigo de um Tratado mútuo.
104 Que têm sido empregues para vigiarem as actividades das guerrilhas Salafistas argelinas que operam no Chade. As informações obtidas são transmitidas a ambos os governos africanos.
105 Utilizadas aquando da intervenção militar americana na Somália em 1992 e que mantêm a sua utilidade na realização de operações de contra-terrorismo na região.
106 Foram recentemente descobertas enormes reservas de petróleo no Gana, estando a decorrer complexas negociações entre os dois países com vista à assinatura de um acordo de utilização de bases aérea e/ou navais no mais curto espaço de tempo possível.
107 São Tomé e Princípe é também um produtor de petróleo através da recente assinatura de um acordo de exploração conjunta do Golfo da Guiné com a Nigéria.
108 Que também financia mecanismos como o Controlo Internacional de Narcóticos e de Imposição da Lei e o de Não-Proliferação, Anti-terrorismo, e Desminagem.
109 Estas iniciativas visam derrotar os terroristas e as suas organizações; negar-lhes patrocínios, apoios e santuários; reduzir as condições propícias as fomento de actividades terroristas; e defender os interesses norte-americanos tanto no seu território como fora dele. Veja-se http://www.ndu.edu/inss/Symposia/Africa2005/whelan_ppt.pdf.
110 Expressão utilizada pela Secretária Adjunta da Defesa dos Estados Unidos para os Assuntos Africanos, Teresa Whelan. Disponível em http://www.jhuapl.edu/POW/rethinking/SeminarArchive/121905_WhelanNotes.pdf. Veja-se ainda Teresa Whelan; (2006); “Africa’s Ungoverned Space”; Nação e Defesa nº 114; pp. 61-73. Não se deve confundir com o conceito de “Estado falhado” que ilustra a incapacidade de um Estado em assegurar as funções básicas de governação com a inerente perda de legitimidade e um associado ou subse-quente colapso económico.
111 William P. Pope; (2006); “Eliminating Terrorist Sanctuaries: The Role of Security Assistance”; Testemunho perante o International Relations Committee Subcommittee on International Terrorism and Nonproliferation; Washington, March 10.
112 Veja-se Thomas Dempsey; (2006); Counterterrorism in African Failed States: Challenges and Potential Solutions; Carlisle Barracks, Strategic Studies Institute.
113 J. Stephen Morrison; (2002); “Somalia and Sudan’s Race to the Fore in Africa”; The Washington Quarterly nº 2; pp. 191-205.
114 Al J. Venter; (2003); “Red Sea Anti-Terror Force”; Jane’s Terrorism and Security Monitor, March 1.
115 Em 2005 a TSCTI recebeu uma verba de 5 milhões de dólares, a qual passou para 31 em 2006 e 81,7 milhões em 2007. Prevê-se que o orçamento atribuído a esta iniciativa venha a atingir os 100 milhões de dólares anuais entre 2008 e 2013.
116 Phillip Ulmer; (2004); “Special Forces Support Pan-Sahel Initiative in Africa”; Armed Forces Information Service, March 8. Lameen Witter; (2004); “U.S. Marines Start Training in Niger”; Marine Forces Europe Public Affairs Release, August 10.
117 Informação sobre a International Law Enforcement Academy (ILEA) disponível a partir do U.S. State Department website em: http://www.state.gov/p/inl/ilea/c11283.htm.
118 A USAID tem vindo a reforçar as suas actividades de apoio a uma melhor governação em Moçambique em conjugação com uma miríade de organizações não governamentais europeias, australianas e japonesas que operam na província, tendo a maioria delas escritórios na cidade de Nampula.
119 Relativamente disseminado em Moçambique, mas muito intenso na província de Nampula, especialmente na região de Moma.
120 Na província de Nampula a quantidade de haxixe apreendida passou dos 142 quilogramas em 2006 para os 395 quilogramas durante o primeiro semestre de 2007. Notícias de Nampula, TVM, 18 de Junho de 2007.
121 John Solomon; (2007); “The Danger of Terrorist Black Holes in Southern Africa”; Terrorism Monitor nº 5.
122 A Al Qaeda estabeleceu núcleos terroristas na Libéria e na Serra Leoa de forma a tirarem proveito do tráfico ilegal de diamantes, efectuarem lavagem de dinheiro, e desenvolverem contactos com as redes locais de crime organizado e de tráfico de armas. Na Somália a Al Qaeda e o grupo Al Ittihad Al Islami estabeleceram uma base de apoio a operações terroristas por todo o Leste de África, tendo surgido uma nova organização de nome Aden Hashi’ Ayro orientada para o rapto de funcionários de organizações não-governamentais ocidentais bem como de jornalistas ocidentais. Existem também células da Al Qaeda no Quénia e na Tanzânia.
Gerar artigo em pdf
2008-02-08
1157-0
9793
216
Avatar image

Tenente-coronel

Manuel Alexandre Garrinhas Carriço

Tenente-Coronel de Infantaria. Assessor do Instituto da Defesa Nacional. Vogal da Direção da Revista Militar.

REVISTA MILITAR @ 2024
by COM Armando Dias Correia