JOGOS AFRICANOS
Jaime Nogueira Pinto
O autor brinda-nos, neste livro, com uma descrição viva e rigorosa do que foi a História da África Austral no período que decorre de 1975 a 2002.
Intitulando-se a si próprio de "nacionalista, anticomunista, Português de Portugal do Minho a Timor, cold-warrior e apoiante e conselheiro da UNITA" ..., consegue, mercê das ligações privilegiadas que mantém em África, nos EUA, na União Sul Africana e na Europa, contactar as diversas partes em conflito tanto em Angola (UNITA - MPLA), Moçambique (RENAMO - FRELIMO) e até na Guiné (questão de Assumane Mané), procurando caminhos de entendimento umas vezes conseguidos e outras vezes não, apesar de todos os esforços realizados.
As malogradas tentativas de aproximação da UNITA e do MPLA e o bem conseguido entendimento entre a RENAMO e a FRELIMO, onde representou um papel essencial a comunidade de Santo Egídio, são exemplos evidentes e históricos.
Merece particular atenção a forma como o autor apresenta os diversos intervenientes africanos, europeus e americanos e as políticas que pretendiam conduzir e que a rápida evolução das situações no terreno fazia alterar com inusitada frequência.
Notável, igualmente, a descrição da batalha do Rio Lomba (ou do Cuito Cuanavale) entre as FAPLAS apoiadas por cubanos e russos e a UNITA apoiada pelas SADF
[1], os seus antecedentes e suas consequências, em particular por não ter sido executada a exploração do sucesso pelas SADF por razões políticas.
Os acontecimentos de Luanda de 31 de Outubro e 1 e 2 de Novembro de 1992, "três dias de luta e de morte (que) foram o culminar de um mês de tensões e provocações cruzadas e de uma imensa carga de desconfiança, de frustração, de raiva, de desejo de desforra. E acima de tudo de medo, de muito medo, de parte a parte", estão descritas de forma extremamente viva e dramática com o suporte de vários depoimentos de testemunhas oculares.
As citações dos relatos de Alcides Sakala sobre o que foram os últimos movimentos de Savimbi e dos seus mais próximos pelo Leste de Angola com o seu cortejo de vinganças e traições e que culminou na morte do "Mais velho" traído pelo seu chefe do Grupo de Escolta, são de um dramatismo impressionante e explicam muito do que, então, aconteceu.
Entretanto perpassam, por detrás de tudo isto, as sucessivas Administrações americanas e as suas políticas para a África (em especial a Austral), a evolução e posterior implosão da URSS e o fim de Guerra Fria e, mais desfocada, a Europa, tentando superar um certo sentimento de culpa devido aos interesses que mantém em África.
De uma conversa com Chester Crocker recorda o autor:
(...) "E derivei para o problema da estatal idade africana. A descolonização resultara de três pressões conjugadas: a pressão da Guerra Fria - americanos e soviéticos, sem colónias no sentido europeu, pressionando os europeus a desfazerem-se dos seus impérios sob uma retórica liberacionista; a das vanguardas nacionalistas com os ideais e interesses da independência, recorrendo ou ameaçando recorrer à luta armada; e a do consenso entre as classes dirigentes europeias de que a aventura colonial, como missão civilizacional, corolário de superioridade cultural ou forma de exploração económica, tinha chegado ao fim. E que os interesses económicos - o imperialismo - que afinal a Europa levara no fim do Séc. XIX para África, funcionaria melhor sem responsabilidades políticas.
Por isso, no momento da partida, deixávamos aos Africanos o Estado soberano, uma forma política que, na Europa, levara séculos a amadurecer e a consolidar sem averiguarmos das condições desta estatalidade"…
Concordando com o Autor, não podemos, porém, deixar de nos interrogar quanto à contribuição que todas estas evoluções políticas, económicas e sociais deram para a felicidade dos Povos Africanos. Será que não existiriam outros caminhos menos "pedregosos"?
Livro de leitura obrigatória para quem se interesse por História Contemporânea. Agradece-se ao Autor a sua oferta à Biblioteca da Revista. Cuidada edição da "Esfera dos Livros"
Coronel Tir Manuel Carlos Teixeira do Rio Carvalho
Vogal da Direcção da Revista Militar
[1] South African Defense Force.