Nº 2557/2558 - Fevereiro/Março de 2015
Pessoa coletiva com estatuto de utilidade pública
Emprego das Forças Armadas a nível interno – Um paradoxo
Coronel
Carlos Manuel Gervásio Branco

 

A, proprietário de uma vivenda com um anexo que serve para guardar os utensílios e alfaias com que cuida do terreno que circunda a sua casa e onde cultiva alguns produtos hortícolas, viu-se confrontado com uma situação verdadeiramente insólita.

Necessitou, para utilizar na casa de habitação onde vive e que fica sensivelmente no centro do terreno sua propriedade, de alguns dos utensílios guardados no anexo e que prioritariamente se destinam ao amanho da terra, mas que, no caso vertente, eram os mais adequados para as obras de reparação que tinha que realizar em casa, dado serem mais robustos do que as ferramentas caseiras.

Contudo, como A vive num país com leis bastante bizarras, foi denunciado por um vizinho e, em consequência, foi multado e viu as ferramentas apreendidas, dado que foram utilizadas dentro de casa e não no terreno exterior que a circunda, o que constitui um flagrante desvio ao fim a que aquelas se destinam.

A, ainda argumentou que as ferramentas eram sua propriedade e que apenas as utilizou em seu benefício, dado serem as mais apropriadas para as reparações que tinha que realizar em casa e que não faria sentido deixar de as utilizar, só porque a sua principal função seria o amanho da terra e, por consequência, no exterior da habitação.

De nada lhe valeu, tendo recebido como resposta que adquirisse outras do mesmo género, se necessário, e que as alocasse exclusivamente a reparações no interior da habitação.

A retorquiu que não era rico e que isso significaria duplicações desnecessárias, com custos acrescidos, porque apenas em situações pontuais seria necessário recorrer às ferramentas guardadas no anexo e que não faria qualquer sentido duplicar recursos, dado os existentes serem suficientes.

Pretende esta pequena caricatura, com as devidas cautelas e naturais diferenças, ilustrar a realidade portuguesa relativa à participação das Forças Armadas em missões no interior do território nacional, que não de protecção civil e sem que tenha sido declarado o estado de sítio ou de emergência.

Como ponto prévio, importa referir estarmos bem cientes que, nos termos da Constituição:

“a defesa nacional tem por objectivos garantir, no respeito pela ordem constitucional, das instituições democráticas e das convenções internacionais, a independência nacional, a integridade do território e a liberdade e a segurança das populações contra qualquer agressão ou ameaça externas;” e que,

“às Forças Armadas incumbe a defesa militar da República” e ainda que, a nível interno,

“as Forças Armadas podem se incumbidas, nos termos da lei, de colaborar em missões de protecção civil, em tarefas relacionadas com a satisfação de necessidades básicas e a qualidade de vida das populações”.

Releva, pois, na Lei Fundamental, como critério determinante para o emprego das Forças Armadas (FFAA), a origem da ameaça/agressão (externa), donde que, a sua utilização a nível interno, se apresenta extremamente limitada.

Decorre ainda do texto constitucional a clara dicotomia defesa nacional/segurança interna, ameaças externas/ameaças internas, o que está directamente conexionado com o emprego das FFAA ou das forças e serviços de segurança, numa lógica de estanquicidade e antagonismo.

O critério constitucional adoptado não tem em conta a intensidade ou a dimensão da ameaça/agressão, nem cuida de averiguar, qual ou quais os tipos de respostas mais adequados para se lhe opor.

A impossibilidade de intervenção das FFAA a nível interno é tão absoluta que não tem sequer em consideração se as forças e serviços de segurança dispõem, ou não, de capacidades próprias para fazer face a determinada ameaça/agressão, salvo se explicitamente se vislumbre a sua origem externa.

Este requisito pode comprometer a segurança do país, apesar do Estado poder dispor das capacidades adequadas e necessárias, mas, por estas não estarem alocadas às forças e serviços de segurança, estará impedido de as utilizar.

Numa primeira abordagem, afigura-se que o critério constitucionalmente consagrado para a intervenção das FFAA é de difícil operacionalização, sobretudo num momento em que as ameaças são difusas e imprecisas e se mostra bastante problemática a definição da sua verdadeira origem.

Não será, no entanto, despiciendo referir que a Constituição portuguesa de 1976, mesmo tendo em consideração as sucessivas revisões posteriores (sete), não deixa de ser um documento datado, saído de uma revolução e, naturalmente, conotado com situações e factos de uma época e que, a partir da revisão de 1982, mantém uma funda separação entre segurança interna e segurança externa.

Mas não é sob o prisma constitucional que se pretende abordar este tema, até porque a Constituição, sendo uma lei, embora fundamental e superior às demais, não deixa de ser uma lei que pode ser melhorada ou alterada, de acordo com a vontade soberana do povo e conforme os especiais requisitos exigidos para tal, que como acontece com as demais leis, deverá servir para regular situações reais e dar resposta actualizada aos problemas, e não constituir-se num referencial desfasado da realidade que impeça soluções actuais para problemas dos nossos dias.

Deixando por agora os aspectos legais, recorramos a alguns exemplos para melhor ilustrar a situação de facto e a realidade com que nos confrontamos.

Um primeiro exemplo: em 1994, aquando do corte de estrada e da circulação rodoviária, entre as duas margens do Tejo ocorridos na ponte 25 de Abril, com o interrupção das ligações entre o norte e o sul do país pela sua principal via de acesso, o Governo decidiu empenhar uma força da Guarda Nacional Republicana (GNR) para restabelecer a ordem pública naquele local e desimpedir a via obstruída.

Dado que a GNR não dispunha de meios pesados que lhe permitissem rebocar os veículos que estavam a obstruir a via, o Governo requisitou, ao Exército, reboques para que, ao serviço da Guarda, colaborassem naquela missão. Esta decisão foi acompanhada de diversas dúvidas sobre a sua legalidade, chegando a alvitrar-se que os reboques do Exército teriam que ser pintados com as cores da Guarda ou, no mínimo, que ostentassem matrículas da GNR.

Para obviar a casos futuros, a GNR ou seja, o Estado Português – o erário público – adquiriu posteriormente vários reboques com capacidades semelhantes aos existentes no Exército e, que se saiba, nunca vieram a ser utilizados.

Afigura-se ser este um exemplo bastante elucidativo do ridículo da questão.

Um segundo exemplo, mais actual e até contraditório do anterior: a Marinha, ramo das FFAA, empenha quotidianamente meios navais para a fiscalização das pescas ou para interceptar tráficos de droga e outros, no mar territorial, bem como, nos períodos de veraneio, emprega militares do Corpo de Fuzileiros, em apoio aos elementos da Polícia Marítima, no policiamento e vigilância das praias.

Por seu lado, a Força Aérea, ramo das FFAA, efectua missões de “policiamento” do espaço aéreo nacional, como expressamente preconiza a Lei nº 28/2013, de 12 de Abril, que define as competências, a estrutura e o funcionamento da Autoridade Aeronáutica Nacional (AAN), onde o Chefe do Estado-Maior da Força Aérea é por inerência a AAN. Na estrutura desta autoridade encontra-se o Serviço de Policiamento Aéreo, com a finalidade de garantir o exercício da autoridade do Estado no espaço aéreo e marítimo, dentro do espaço estratégico de interesse nacional.

Entre as competências deste serviço, cabe salientar a de “planear e implementar as medidas adequadas para garantir a segurança do espaço aéreo nos eventos de elevada visibilidade, em coordenação com as demais entidades competentes e com as forças e serviços de segurança nos termos da Lei de Segurança Interna”.

E ainda um terceiro exemplo: durante o verão de 2013, e à semelhança de anos anteriores, foi activado o plano LIRA, plano implementado pelas unidades do Exército, ramo das Forças Armadas, na sequência de pedidos feitos pela Autoridade Nacional de Protecção Civil (ANPC).

O Exército empenhou em operações de combate aos incêndios florestais cerca de 1341 militares e 202 viaturas. Aos efectivos e meios atrás referidos acrescem ainda os militares e meios empenhados em acções de patrulhamento e vigilância física, com empenhamento diário contínuo nas regiões das serras de Arga, Cabreira, Amarante e Marão, serras do Alvão, Montesinho, Freita e Estrela (Gouveia e Seia), perímetro florestal de Alge e Peneda/Góis, serras do Caramulo e Montemuro, matas nacionais de Leiria, serras d’Aire e dos Candeeiros, serras da Malcata, de Monchique e de Sintra, Tapada de Mafra e serra de Santa Luzia e região de Tomar, num total de 288 militares e 77 viaturas (in Revista Militar nº 2539/2540).

Para além dos exemplos antes mencionados, em diversas ocasiões, aquando da realização de alguns eventos de maior relevância, como cimeiras de chefes de Estado, a Expo 98 ou o Euro 2004, as FFAA foram chamadas a colaborar com as forças e serviços de segurança, na segurança dos mesmos.

Aqui chegados, cumpre referir que, no que tange ao “policiamento” aéreo, nenhumas vozes se ouviram a contestar ou criticar o empenhamento da Força Aérea naquele tipo de missões, mesmo que no diploma legal que lhe dá suporte se utilize o termo “policiamento” e se refira a segurança interna.

O mesmo não se poderá afirmar quanto às missões de fiscalização da Marinha e, de maneira mais acentuada, as respeitantes aos tráficos no mar territorial e, sobretudo, ao emprego de militares do Corpo de Fuzileiros em missões de policiamento das praias.

Mas maior controvérsia tem merecido o emprego do Exército nas acções de patrulhamento e vigilância das florestas e matas, situação que chegou ao Parlamento, sob o pretexto das patrulhas militares nas serras de Santa Luzia e de Sintra andarem armadas.

Nestes termos, cabe perguntar se, para além do meio em que o mesmo se concretiza, haverá alguma diferença conceptual entre o “policiamento” aéreo, marítimo ou terrestre, referidos.

Numa primeira leitura, parece que a resposta terá que ser negativa. Em qualquer das situações estaremos perante o mesmo tipo de operação.

Acresce que, em todos os casos, aquelas, à luz do direito internacional, se efectuam em território nacional, quer se trate do espaço aéreo, quer do mar territorial, quer ainda do espaço terrestre.

Contudo e como anteriormente referido, as objecções tendem a ser progressivamente maiores, e por esta ordem, quando se trata de operações terrestres, marítimas ou aéreas, não havendo sobre estas últimas notícias, até ao momento, de quaisquer controvérsias.

Isto deve-se fundamentalmente à utilização, por parte do julgador, de um critério que, não se alicerçando no texto constitucional, se fundamenta em razões de natureza prática, ou seja, na capacidade para operar.

Assim, será bom de ver que não existe em Portugal nenhuma força ou serviço de segurança com meios aéreos e capacidades para substituir a Força Aérea, no “policiamento” do espaço aéreo nacional.

Já no que tange ao “policiamento” marítimo, e embora com meios limitados, existe uma força de segurança que reparte com a Marinha aquela missão (no mar territorial), razão porque, quanto a este tipo de operações, já se encontra alguma controvérsia.

Mas, é sobretudo nas acções terrestres que, de uma forma avassaladora, se apresentam as críticas a uma participação do Exército no território nacional, dado existir a percepção que, ao invés do que se passa relativamente à Força Aérea ou em menor escala com a Marinha, as forças de segurança possuem os meios e as capacidades necessárias para evitar que o Exército opere no interior do território nacional.

Ora, se o critério constitucional apenas serve para impedir o emprego das FFAA em ambiente terrestre e colocar em dúvida o recurso a meios da Armada em acções de fiscalização nas águas territoriais, podendo neste caso ser derrogado, afigura-se pouco fiável a sua utilização.

Dirão os defensores do actual modelo que as intervenções da Força Aérea e da Armada no espaço aéreo nacional ou no mar territorial, respectivamente, partem do pressuposto de que a ameaça/agressão será externa, donde, à luz do texto constitucional, se encontraria plenamente justificado.

Cabe, no entanto, assinalar que para impedir qualquer desembarque na costa portuguesa, já em terra firme, não se vê ninguém defender o recurso ao Exército, o que nos reconduz ao problema inicial, da dificuldade de justificar os diferentes critérios utilizados para solucionar a questão.

Ou seja, a leitura constitucional da intervenção das Forças Armadas no território nacional, no âmbito da segurança interna, não tem sido uniforme, mas, antes, tem ficado dependente do meio em que aquelas vão operar e do ramo empenhado.

A este respeito podemos encontrar uma diversidade de opiniões e de justificações, que vão desde aquelas cujo entendimento se baseia numa leitura estrita da Constituição e sustenta a impossibilidade absoluta da intervenção das FFAA no interior do território nacional, com a qual concordam, às outras, no extremo oposto, que, embora coincidam na leitura do texto constitucional, defendem a sua alteração, por forma a ultrapassar o constrangimento detectado, passando por umas intermédias que, embora por outras razões, não pretendem qualquer revisão constitucional, mas admitem que o actual texto aceita uma leitura extensiva e flexível que, “fechando os olhos” à letra da lei, permite, o emprego das FFAA em missões de segurança interna, desde que “não deem muitos nas vistas”.

É um pouco na senda desta última visão que se adoptou o modelo vigente para as Autoridades Aeronáutica e Marítima, e se enveredou pelo conceito das “ameaças transnacionais”.

No entanto, nem mesmo a criação da Autoridade Aeronáutica Nacional e da Autoridade Marítima Nacional, coincidentes, respectivamente, com os chefes do estado-maior da Força Aérea e da Armada e dotadas de recursos humanos e materiais daqueles ramos das FFAA, resolvem o problema de fundo, porque aquelas entidades não passam de uma questão semântica, para que não sejam as FFAA, directa e formalmente, a desempenhar aquelas funções de segurança que, na dicotomia assumida na Constituição portuguesa, embora ultrapassada, se poderá inserir no âmbito da segurança interna.

Posto isto, recorramos ao pensamento do General Loureiro dos Santos que, a este propósito, nos diz: “a indefinição sobre a origem das novas ameaças que se venham a desenvolver sobre os nossos espaços de soberania, que conduz a uma certa ambiguidade quanto ao traço divisório das situações específicas da segurança interna (próprias das operações policiais) daquelas que se inscrevem na segurança externa, isto é, contra ameaças com origem externa, esta indefinição aconselha a promover rapidamente instrumentos legislativos clarificadores” (in Revista Militar nº 2437/2438).

Como facilmente se pode concluir, a nova tipologia de ameaças, bem como a dificuldade de identificação da sua origem, tornam totalmente obsoletos os sistemas compartimentados que separam a segurança externa, da segurança interna.

Para ultrapassar estes constrangimentos têm sido tomadas a nível nacional algumas iniciativas que, embora bem intencionadas, não resolvem o problema de fundo.

A primeira surge em 2003, através de um novo Conceito Estratégico de Defesa Nacional (CEDN), aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros nº 6/2003, de 20 de Janeiro, onde se aditam às capacidades das FFAA:

A capacidade para, em colaboração com as forças de segurança, na ordem interna, e em estreita relação com os aliados, na ordem externa, prevenir e fazer face às ameaças transnacionais” e,

A capacidade para, nos termos da lei, participar na prevenção e combate a certas formas de crime organizado transnacional, especialmente o tráfico de droga, o tráfico de pessoas e as redes de imigração ilegal, e para participar na prevenção e combate contra ameaças ao nosso ecossistema”.

Posteriormente, e desta feita já sob a forma de lei, em 2009, na revisão da Lei de Defesa Nacional (LDN), reiterado na sua revisão de 2014 e na Lei Orgânica de Bases da Organização das Forças Armadas (LOBOFA), é aditado às missões das FFAA, “a cooperação com as forças e serviços de segurança, no combate às agressões ou ameaças transnacionais”, sem que, em algum momento, se densifique este novo conceito de ameaças, sendo no entanto recorrente tipificar estas como o terrorismo, o crime organizado transnacional e os tráficos de pessoas e de drogas.

De igual modo, o CEDN de 2013 as acolheu no elencado antes referido.

A doutrina tem definido este novo tipo de ameaças como sendo não militares, não tendo fronteiras e que, simultaneamente, ameaçam a integridade social e política dos Estados, a saúde dos seus habitantes, assim como a sua qualidade de vida, o que se nos afigura uma definição suficientemente aberta para quase tudo poder incluir.

Contudo, e voltando ao elenco de ameaças contidas no CEDN que se relembra, são o terrorismo, o crime organizado transnacional e os tráficos de pessoas e de drogas, estamos sem dúvida perante uma qualificação de situações comumente tipificadas como criminosas e, consequentemente, incluídas na esfera de competências das polícias e dos sistemas judiciários que não se inserem no que comummente se consideram as ameaças externas.

Mas mesmo que aquelas ameaças caíssem no conceito constitucional das ameaças externas, o que é duvidoso, a verdade é que a mencionada cooperação entre as FFAA e as forças e serviços de segurança, prevista nos artºs 48º da LDN e 26º da LOBOFA, sob a epígrafe de articulação operacional entre as Forças Armadas e as forças e serviços de segurança, para lhes fazer face, não está assegurada, porque todo o modelo foi montado como estanque e sem possibilidade de recurso a vasos comunicantes, típico de um sistema.

A atribuição de competência conjunta ao CEMGFA e ao Secretário-Geral do sistema de segurança interna para, entre si, implementarem as medidas de coordenação, é bem o retrato da pouca eficácia do modelo, onde não existe uma clara linha de comando, antes se optando por termos vagos e pouco claros como são a “coordenação” e a “cooperação”.

Por esta ou outras razões, não estão definidos conceitos de emprego, relações de comando, delimitação de competências, disponibilização e afectação de meios, etc., para fazer face às ditas ameaças transnacionais.

Não existe, pois, compatibilidade de equipamentos e de doutrina, nem de meios, entre as FFAA e as forças e serviços de segurança e, mesmo em relação à GNR, com quem as FFAA deveriam manter uma estreita ligação, de há alguns anos a esta parte que as compatibilidades de equipamentos e de outos meios tem sido descurada, não se efectuando, inclusivamente, exercícios conjuntos entre ambas, há mais de uma década.

Se, actualmente, o conceito de força conjunta é o que impera entre as FFAA modernas, pela cada vez maior integração inter-ramos, o mesmo conceito terá aplicação quando se abordam questões de segurança nacional e nos referimos às relações FFAA e forças e serviços de segurança.

Conceito que não implica a transformação de militares (das FFAA) em polícias, dotados de poderes de autoridade policial ou de órgão de polícia criminal, o que, num estado de direito, só poderá suceder em situações de excepção. Contudo e recorrendo a exemplos bem próximos de nós, como sucede em França ou em Itália, não representa nenhum atentado à democracia a presença de patrulhas mistas das FFAA e das forças de segurança, nas capitais daqueles países, bem como a vigilância de monumentos e outros pontos sensíveis por parte dos militares em apoio e suplemento das forças de segurança.

Em França, desde 1978, vigora o sistema nacional de alerta “VIGIPIRATE”, cuja designação decorre da contracção das palavras “vigilância” e “pirata” e consiste num plano de prevenção e reacção a ameaças graves à segurança, onde, a par das forças de segurança, intervêm as FFAA. O plano consta de quatro níveis de alerta, consoante o grau de amaça, a saber: amarelo, laranja, vermelho e escarlate.

Também a legislação italiana, desde 2008 que prevê o emprego das FFAA em reforço das forças de segurança, na segurança pública, através de missões de vigilância a locais e objectivos sensíveis e em patrulhamentos conjuntos com as forças policiais (art.º 7º da Lei nº125, de 24 de Julho de 2008).

A utilização das FFAA neste tipo de missões, para além do aplauso das populações, constitui-se num importante factor que aumenta o sentimento de segurança da comunidade e fortalece a ligação das FFAA com o país que, com o fim do serviço militar obrigatório e a retração do dispositivo militar, se têm afastado dos cidadãos.

“Nos nossos espaços de soberania, o esforço deve ser de natureza policial e nas operações de transição entre as operações policiais e militares (Guarda Nacional Republicana), suplementadas, quando necessário, por operações militares. As FFAA podem dispor de meios que lhes permitam levar a efeito operações tipo policial ou de apoio a operações policiais, sempre que, por motivos de rentabilidade económica, a organização de forças policiais a elas destinadas (as designadas como outras operações de interesse público a cargo das FA) se não justificar” (Gen Loureiro dos Santos, in Revista Militar nº 2437/2438).

Enquanto se não ultrapassar o preconceito ideológico existente e se não passar do patamar de Conceito Estratégico de Defesa Nacional, para o de Conceito Estratégico de Segurança Nacional, com tudo o que tal mudança implica, a situação real não se alterará, mesmo que se criem a AAN e a AMN, se apele ao termo “ameaças transnacionais” ou se inscreva nos diplomas legais, a “cooperação” entre as FFAA e as forças e serviços de segurança.

Só uma visão abrangente e integrada da Segurança, em que a complementaridade e a interdependência entre todas as forças e o emprego progressivo de meios constituam o referencial para a resposta à intensidade e dimensão da agressão, poderá ultrapassar os constrangimentos decorrentes de critérios difíceis de operacionalizar e obstrutores de uma rentabilização dos recursos que o país pode alocar a esta função essencial do Estado.

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2015-06-05
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REVISTA MILITAR @ 2024
by COM Armando Dias Correia