Vivendo o rescaldo dos acontecimentos de Bruxelas, a Europa tem vindo a tomar consciência das ameaças a que está exposta e, simultaneamente, dos reais problemas internos de coesão que, mais cedo ou mais tarde, terá de encarar com frontalidade ou correr o risco da sua inoperância política, com reflexos na sua saúde económica e estabilidade e confiança no Euro, a par de demonstrar uma evidente incapacidade para lidar, quer com questões internacionais que se perfilam nas fronteiras da União quer com outros actores internacionais, seja a sua relação transatlântica com os EUA, com a Rússia e, naturalmente, com a China.
Constituem inequívocos desafios à sua coesão e unidade, a cooperação no combate ao terrorismo, sempre propalada, mas reconhecida como ineficiente e com lacunas, quando nos confrontamos com a concretização de mais uma acção violenta e com o seu balanço de vítimas e destruições; também a crise dos refugiados e a posição diversa de diferentes países membros, relativamente às soluções propostas, evidenciam perspetivas pouco consentâneas com os designados ideais europeus. Pelo contrário, temos assistido a um crescendo do xenofobismo, aos apelos para o fecho das fronteiras, ao reforço da extrema-direita e das atitudes anti-imigração, a par de atitudes críticas contra decisões tomadas sem legitimação popular, caso do recente referendo na Holanda, desfavorável relativamente ao acordo com a Ucrânia e às preocupações crescentes, quanto a um desfecho idêntico no referendo no Reino Unido, que venha a configurar o “Brexit”, de consequências inevitáveis e ainda não devidamente avaliadas, para a União.
Mas é também um sério desafio à coesão europeia a postura política da Alemanha, relativamente aos valores da solidariedade, que tem dimensões díspares quando se refere às políticas de apoio e receção dos refugiados, ou quando lida com a necessidade de estimular políticas de dinamização da economia e de criação de emprego, designadamente jovem, seja nos países do sul – Grécia, Portugal, Espanha – mas também na Itália e na França. Esta é igualmente uma questão que se prende com a segurança do “espaço europeu”, se tivermos presente que os atentados em Paris e em Bruxelas, foram cometidos por cidadãos nacionais europeus, mais despertos para o apelo da “jihad”, do que para os valores nacionais, a que não são alheios sentimentos de exclusão e de marginalização, de ausência de perspetivas de futuro e de um quadro económico com preocupações sociais.
A política para com os refugiados não pode ser dissociada de uma política europeia para o Médio Oriente, de maior cooperação, desenvolvimento e ajuda económica no caso da Jordânia e do Líbano, tendo em conta a dimensão dos campos de refugiados ali existentes, mas também de apoio à consolidação da estabilidade na Tunísia; essa política europeia para esta região tem de ter em conta a situação de conflito militar que se vive na Síria, bem como no Iraque e na Líbia, sem esquecer a realidade do DAESH e o tipo de resposta que é necessário dar. Neste domínio, a Europa tem de reavaliar com realismo, a consistência política e estratégica da sua PESD e as capacidades militares dos países membros que a devem credibilizar.
Na “fronteira”, existem ainda os problemas da Ucrânia e mais recentemente o reacender do diferendo sobre Nagorno-Karabakh, assim como a situação sempre instável do Afeganistão e o diferendo entre sunitas e xiitas, tendo como expoentes o Irão e a Arábia Saudita. Também a histórica ligação europeia à África e a procura da estabilidade e desenvolvimento dos países da bacia sul do Mediterrâneo, do Sahel e do Golfo da Guiné, constituem uma área de interesse estratégico e de influência que não pode ser descurada.
Coloca-se assim à União Europeia a necessidade urgente de se tornar um interlocutor ativo com a Rússia, pelo protagonismo que esta tem em algumas da situações referidas, mas também pelas questões relacionadas com a sua política energética relativamente a alguns países do leste europeu e, ainda, pela questão das sanções económicas que se afiguram como um potencial elemento de discórdia, envolvendo também os EUA.
No caso dos EUA, embora seja muito importante que se preserve uma relação transatlântica, que nasceu com as guerras na Europa e se fortaleceu com a OTAN, os europeus têm de assumir e reconhecer que o pressuposto de que os americanos tomariam a iniciativa e a liderança estratégica de qualquer problema de segurança que surgisse nas regiões referenciadas, é uma visão do passado e ultrapassada. As grandes prioridades estratégicas americanas estão hoje direcionadas para os desafios que se lhe colocam, face a três grandes questões: o crescente protagonismo político-económico da China e o seu cada vez maior e melhor investimento militar; o crescimento da importância económica da Ásia como um todo e da América Latina; uma menor dependência energética do Médio Oriente.
Esta situação requer que a Europa se prepare para assumir maiores responsabilidades na construção da paz e estabilidade internacional ou, por sua ausência de capacidade política, económica e também militar, vir a tornar-se dispensável e andar a reboque dos diversos acontecimentos da conjuntura internacional.
Nasceu em Sintra, em 21 de Abril de 1947, e entrou na Academia Militar em 6 de Outubro de 1964.
Em 17 de Dezembro de 2011, terminou o seu mandato de 3+2 anos como Chefe do Estado-Maior do Exército, passando à situação de Reserva.
Em 21 Abril de 2012 passou à situação de reforma.
Atualmente exerce as funções de Presidente da Direção da Revista Militar e de Presidente da Liga da Multissecular de Amizade Portugal-China.