Pessoa coletiva com estatuto de utilidade pública
Resenha Histórica - O Serviço de Saúde da Força Aérea Portuguesa
Major-general Médico
Rui Manuel Luz Silva Gonçalves
I.  Introdução
 
A Força Aérea Portuguesa (FAP), propriamente dita, foi constituída em 01Jul1952 (DL 38 805, de 28Jun52) e resultou da fusão da Aeronáutica Militar - que era a 5ª Arma do Exército - com a Aviação Naval, uma das diversas especialidades da Armada.
 
A FAP foi, pois, a herdeira de um passado que remonta aos inícios da I República e tem como célula germinal o projecto de lei que o Dr António José de Almeida - médico, deputado, líder do Partido Evolucionista e futuro Presidente da República - apresentou à Câmara dos Deputados, a 24Jun1912, sobre a aviação militar que, à data, já era uma realidade nos países mais avançados tecnologicamente.
 
Esse projecto tinha em vista a criação de um Instituto de Aviação Militar, a construção de um aeroporto nas margens do Tejo e a instituição de um fundo financeiro destinado à aviação.
 
Pouco depois é criada uma comissão militar para proceder ao estudo das condições de aquisição de aeronaves para o Exército, sendo francamente maioritários nessa comissão elementos pertencentes ao Aero-Club de Portugal - fundado em 1909 - onde se fazia sentir como predominante a influência dos oficiais engenheiros do Exército (1).
 
A Ordem do Exército nº 12, 1ª Série, de 19/05/1914, publica o diploma que cria a Escola Aeronáutica Militar na Vila Nova da Rainha, sendo o seu 1º Comandante um oficial engenheiro.
 
No entanto, esta Escola só em 1916 começou a funcionar, não contribuindo directamente para a formação dos aviadores portugueses que lutaram em França, na Iª Guerra Mundial.
 
Em 28Set1917 a Armada desliga-se do Exército - anexa à Escola de Aeronáutica Militar existia uma “secção da marinha” para instrução e serviço relativos aos hidroplanos - e cria a Aviação Naval (2).
 
Em 1920 a Escola Aeronáutica Militar foi transferida para a Granja do Marquês.
 
Não será, porventura, abusivo considerar na história da FAP 5 períodos distintos, sendo os primeiros 4, anteriores a 1952, assim como o actual, protagonizados por homens feitos do mesmo barro, moldados pelo ideal da exploração de novas fronteiras, pelo espírito de coragem e de abnegação perante os riscos, pelo sentido patriótico de tentar colocar um Portugal por vezes adormecido na rota do progresso.
 
Esses períodos da história FAP serão:
1912-14: Concepção política, discussão e amadurecimento das ideias sobre a necessidade de uma Aeronáutica Militar
1914-18: Nascimento e implantação
1918-24: Serviço Aeronáutico Militar
1924-52: Arma de Aeronáutica (5ª Arma)
1952…..: Força Aérea Portuguesa, propriamente dita (Lei nº 2 055, de 27Mai1952)
 
Convém referir que já em 01Ago1950 (DL37 909) tinha sido criado o Subsecretariado de Estado da Aeronáutica, tendo assumido o cargo de 1º Subsecretário de Estado o oficial engenheiro TCor Kaúlza Oliveira de Arriaga.
 
 
II. O Serviço de Saúde na FAP
 
1.  Os primórdios
 
A Lei 2 055, de 27Mai1952, estabelecia a organização da Aeronáutica Militar em tempo de paz e definia os diferentes Serviços. No Cap IV - Organização Geral da Aeronáutica Militar em tempo de paz, art 18º, era salientado que “A Aeronáutica Militar não terá Órgãos Territoriais privativos dos Serviços de Saúde …”. No art 24º do mesmo Cap. IV determinava-se que a actividade se desenvolveria por duas espécies de serviços: o Serviço Especial da Aeronáutica (que incluía a área operacional) e o Serviço Geral que integrava o Serviço de Saúde, constituído por pessoal médico e de enfermagem privativo dos quadros do Exército e da Armada.
 
O DL nº 38 805, de 28Jun1952, veio definir a estrutura do Subsecretariado de Estado da Aeronáutica, as suas competência e organização.
 
Na sua estrutura estava incluída a 1ª Secção da 3ª Repartição da 2ª Direcção, a qual era responsável pela “Superintendência em tudo o que respeita a saúde e higiene das tropas das forças aéreas”, o seu chefe seria um TCor/Méd ou um Maj/Méd, tendo como adjunto um Cap/Méd ou um oficial subalterno médico.
 
Por despacho do Ministro da Defesa, de 04Set1952, foram nomeados para aquelas funções o TCor/Méd Alfredo António Barbiéri Figueiredo Baptista Cardoso, do Depósito Geral de Material Sanitário do Exército (chefe), tendo como adjunto o Ten/Méd Joaquim Bernardino Moreira de Sena Martins, do HMP.
 
O TCor/Méd Baptista Cardoso manteve-se em funções até 04Jul1953, data em que passou à situação de reserva, tendo sido substituído pelo TCor/Méd Augusto Carlos Mira da Silva que ocupou o cargo até 25Mai1955.
 
Aquele diploma previa igualmente que os oficiais médicos que já pres­tavam, à data da sua publicação, serviço em Unidades da Aeronáutica, pudessem ingressar nos quadros privativos da FAP ficando, porém, na situação de adidos nos Ramos de origem.
 
Foram considerados nesta situação, desde Jan1953, os seguintes oficiais médicos:
Cap/Méd  Francisco J.C.L. Costa Félix, do Grupo Independente da Aviação de Caça
Cap/Méd  José Neto Milheiriço, da B.A (Sintra)
Cap/Méd  João José Varela, da BA4 (Açores-Terceira)
Ten/Méd  António B.C. Anacleto, da BA4 (Açores-Terceira)
Ten/Méd  António Campos Felino Almeida, da BA3 (Tancos)
2ºTen/Méd Rúben Lopes Lavoura, da BA5 (S. Jacinto-Aveiro)
2ºTen/Méd Henrique Oliveira Alves, da BA6 (Montijo).
 
Poderemos considerar, portanto, a 1ª Secção da 3ª Repartição da 2ª Direcção, do Subsecretariado de Estado da Aeronáutica, como o embrião da futura Direcção do Serviço de Saúde da FAP; ela era, de facto, responsável pela coordenação da assistência médica às Unidades da Aeronáutica, a qual era assegurada por oficiais médicos oriundos dos quadros do Exército e da Marinha.
 
2. A criação do Serviço de Saúde
 
Cumprindo o determinado na Lei nº 2 055, de 27Mai1952, relativo à criação de Serviços, o DL nº 40 949, de 28Dez1956, instituiu o Serviço de Saúde da FAP e definiu a sua finalidade e composição: no seu art. 34º é referido que o Serviço de Saúde (SS) compreendia uma Direcção e uma Inspecção, assim como Órgãos de Execução, podendo estes últimos constituir, eventualmente, Hospitais, se o desenvolvimento dos SS assim o tornasse necessário.
 
Verificou-se, pois, uma evolução em relação ao estabelecido 4 anos antes, uma vez que o DL 39 071, de 31Dez1952, definia no seu artº 4º, § único, que “O Subsecretariado de Estado da Aeronáutica não dispõe de instalações hospitalares … Os respectivos serviços serão assegurados por intermédio dos Órgãos correspondentes do Ministérios do Exército e da Marinha”. Seria o caso particular do Hospital da Terra-Chã (Açores-Terceira) que estaria por detrás desta alteração significativa da legislação?
 
Este DL nº 40 949, de 28Dez1956, deve, portanto, ser considerado o documento que verdadeiramente criou o SS.
 
O DL nº 39 071 de 31Dez1952, atribuía à Aeronáutica Militar os seguintes efectivos:
 
a) Forças Aeroterrestres:
  11 Médicos                             40 Enfermeiros
      1     TCor/Méd              6      PSar
      1     Maj/Méd              12      SSar ou Fur
      5     Cap/Méd              22      Cabos
      4     Subalt/Méd
      1     Subalt/Farmacêutico
b) Forças Aeronavais:
  4 Médicos                6 Enfermeiros
      1     CapTen/Méd            2      PSar
      3     1ºs Ten/Méd           2      SSar
                                  2      Cabos
 
3. Instalações do SS
 
A Portaria 14 281, de 02Mar1953, determinou que os Serviços do Subsecretariado de Estado da Aeronáutica e o Comando Geral da Aeronáutica Militar ficassem instalados na Av Liberdade nº 252, incluindo, também a 1ª Secção da 3ª Repartição da 2ª Direcção, embrião da futura Direcção dos Serviços de Saúde (DSS). Em Maio de 1958 a DSS foi transferida para novas instalações, na Av da Liberdade nº 240, tendo pouco depois dividido a área ocupada com o Centro Médico-Psicológico, criado em 1959 (DL nº 42 074, de 31Dez58) e que posteriormente, originou o Centro de Medicina Aeronáutica e o Centro de Psicologia da FAP.
 
De facto, o 1º director do Serviço de Saúde (dSS), Cor/Méd José Maria Fernandes Lopes, teve a noção clara da importância da selecção médica dos candidatos a Pessoal Navegante e dos exames periódicos de revisão, inicialmente realizados no HMP por médicos não totalmente sensibilizados para a problemática do voo. Para obviar a esta situação foi então criado o Centro Médico-Psicológico, chefiado por um oficial médico com o Curso de Medicina Aeronáutica, sendo o 1º chefe do Centro o então Maj/Méd João José Varela.
 
Sob o impulso deste entusiástico oficial médico deu-se início à revisão médico-psicológica periódica do Pessoal Navegante, o que até então só se verificava em casos muito particulares.
 
Em 01Jun1974 procedeu-se à transferência da DSS para o Paço do Lumiar, ficando sediada no interior do perímetro do então Depósito Geral de Adidos da Força Aérea, que passou a ser designado Base do Lumiar (BALUM) por força do DL 412/83, de 23Nov.
 
A DSS foi novamente transferida, em 05Nov1985, desta vez para espaçosas e funcionais instalações localizadas no novo edifício do EMFA (Alfragide), regressando posteriormente ao Paço do Lumiar em 1995, numa fase de escassez de recursos humanos que se fazia sentir especialmente a nível do Centro de Medicina Aeronáutica (CMA) e do Hospital da Força Aérea (HFA), numa tentativa relativamente bem sucedida de aproveitar a capacidade técnica dos oficiais médicos colocados na DSS, que, na medida do possível, passaram a colaborar com aqueles importantes órgãos de execução do S.S.
 
Para além da DSS e das outras estruturas sediadas no Paço do Lumiar - o CMA, o HFA e o Centro de Psicologia da Força Aérea (CPSIFA) que, pela sua importância, irão merecer uma abordagem mais detalhada - há a referir as Secções de Saúde das diversas Unidades, dotadas de um posto de socorros, de gabinetes de consulta e de observação, com pequenas enfermarias acopladas, (dotadas de capacidade de internamento de curta duração para 8-16 doentes, incluindo um Sector de isolamento para doentes potencialmente contagiosos); estavam também equipados com aparelhagem rudimentar da radioscopia e, no caso específico da BA5 (S. Jacinto-Aveiro) de um esboço de bloco operatório, o que se poderia justificar devido ao relativo isolamento da Unidade nos períodos invernosos.
 
Um caso excepcional no panorama assistencial do SS consistiu no funcionamento do Hospital da Terra-Chã (Açores-Terceira), dotado de uma valência cirúrgica significativa, animado pelo espírito dinâmico e empreen­dedor de um dos mais carismáticos oficiais médicos do Quadro Permanente da FAP, o TCor/Méd Viriato M.C. Garrett.
 
O Hospital Militar da BA4 (Terra-Chã), começou a funcionar em 09Set1946 e manteve essa designação até 13Ago1972, passando em seguida a designar-se Núcleo Hospital Especializado da Força Aérea, nº 2 (NHEFA2).
 
A actividade do Dr Viriato Garrett neste Hospital foi particularmente intensa a partir de 1957 - o ano em que ingressou no Quadro Permanente da FAP, foi promovido a Cap/Méd e colocado na BA4 - e fez-se sentir até ao encerramento do próprio NHEFA2 de que foi director a partir de 1966, de um modo altamente prestigiante para este Ramo. Para tal contribuíram as qualidades naturais de homem e o valor científico deste militar, a sua longa permanência no Arquipélago dos Açores (chegou à Ilha Terceira em 1941, como Alferes Miliciano do Exército) e o forte apoio que sempre recebeu do 3º dDSS, Brig/Méd João José Varela (Set62-Out69), que procurou fazer do Hospital da Terra-Chã uma referência para os militares feridos evacuados dos teatros de operações em África.
 
4. O Serviço de Saúde e a Guerra em África (1961-74)
 
a) A instalação da FAP no Ultramar
 
Na sequência do determinado pelo DL nº 40 949, de 28Dez1956, que criava as 2ª e 3ª Regiões Aérea, o Subsecretário de Estado TCor/Eng Kaúlza de Arriaga enviou uma comissão de estudo a África com o objectivo de avaliar a mais apropriada implantação das futuras estruturas aeronáuticas no Ultramar.
 
Assim, em princípios de 1961 a FAP já possuía alguns meios aéreos em Luanda e no Negage onde pouco depois, já estavam instalados a BA9 e o AB3, respectivamente.
 
Foram também rapidamente instalados o AB4 (Henrique de Carvalho) e alguns AM (Toto, Maquela do Zombo, Cabinda, Camaxilo, Portugália e Cazombo); quando se iniciaram as hostilidades na região do Luso, criaram-se pistas avançadas em Gago Coutinho, Cuito Cuanavale e Neriquinha.
 
Para além da BA9, Luanda passou também a ter o Comando da 2ª Região Aérea e o BCP21.
 
Na Guiné a FAP instalou em Bissalanca o Comando da ZACVG, a BA12 e o BCP12; bastante mais tarde, em 1970, passou a dispor de pistas asfaltadas em Nova Lamego, Cufar e Aldeia Formosa.
 
No norte de Moçambique instalaram-se até finais de 1962 os AB7 (Tete), AB5 (Nacala) e o AB6 (Nova Freixo), assim como o AM51 (Mueda), AM61 (Vila Cabral) e AM71 (Furacungo); o Comando da 3ª Região Aérea ficou sediado em Nampula; a BA10 (Beira) e o AB8 (Lourenço Marques) passaram a ser as sedes dos meios aéreos de transporte, efectuado basicamente pelos aviões NordAtlas e DC-3; já os pára-quedistas ficaram com as suas Unidades na Beira e em Nacala, respectivamente BCP31 e o BCP32.
 
Há, também, a referir a instalação do AT1, na Ilha do Sal (ZACVG), dotado de excelentes infra-estruturas, e o AT2 (S. Tomé - 2ª Região Aérea).
 
Apesar de todas estas novas infra-estruturas, disseminadas por área tão extensa e construídas quase todas nos primeiros anos da década de sessenta, os efectivos totais da FAP no Ultramar não terão excedido os 6 000 militares (4, 5 e 6).
 
b) O Serviço de Saúde perante o desafio africano
 
b-1 Pessoal Médico
 
Foi óbvia a necessidade de um acompanhamento mais próximo das questões de saúde envolvendo quer o Pessoal Navegante quer todos os outros militares destacados em África e, para tal, foi constituída, em 01Mai61, uma Delegação da DSS na 2ª Região Aérea (Luanda) que, no entanto, era integrada somente por 2 elementos, um chefe da Delegação, com a patente de TCor/Méd, e 1 adjunto, com posto de Cap/Méd ou subalterno médico.
 
O 1º responsável pela Delegação em Luanda foi o TCor/Méd João José Varela, ali colocado em 07Jun61. Com o seu proverbial espírito de missão e incansável capacidade de trabalho promoveu, nas melhores condições possíveis, as evacuações sanitárias para o Hospital da Terra-Chã (Terceira-Açores) ou para o HMP (Lisboa), pugnou pelo correcto cumprimento das normas vigentes sobre imunização de doenças infecto-contagiosas, insistindo particularmente na prevenção da malária e da doença do sono, e procurou sensibilizar as entidades responsáveis para a questão fulcral da qualidade das águas nas Unidades.
 
Como reconhecimento de toda esta meritória acção em prol da defesa da saúde dos militares que lutavam em Angola foi promovido por escolha a Cor/Méd, regressando a Lisboa para desempenhar as funções de dSS, a partir de 05Set62 (3).
 
Mesmo antes da abertura da Delegação em Luanda já tinham sido colocados na BA9 o Cap/Méd Pereira Rios e o Cap/Méd Gabriel Goucha Reis no AB3 (Negage).
 
Também para Moçambique começam a ser destacados oficiais médicos, sendo colocados na Beira, entre Agosto e Outubro de 1961, os Alf/Méd Domingos A. Pedrosa e o Ten/Méd Vítor Herbert Sequeira. No entanto, só em 17Ago1963 é que a Portaria nº 20 014, da Presidência do Conselho e do Ministério do Ultramar, fixa o quadro de pessoal da Delegação da DSS na 3ª Região Aérea, sendo nomeado seu responsável o TCor/Méd António Correia Anacleto transferido para a DSS em 08Mai65, tendo sido substituído pelo TCor/Méd José Nobre Góis.
 
Em 1963 acentua-se a nomeação de oficiais médicos para as 2ª e 3ª Regiões Aéreas e, agora, também para a ZACVG. O 1º responsável pela Secção de Saúde da BA12 foi o Cap/Méd Acácio Duarte Branco, substituído em 01Mai65 pelo Cap/Méd Fernando Leonel V. Álvares.
 
As crescentes necessidades de pessoal médico notadas já a partir de fins de 1961, justificaram alterações profundas ao “Regulamento do Concurso para Admissão no Quadro dos Oficiais Médicos da Força Aérea” definido pelas Portarias 17 222, de 16Jun59 e 18 809, de 14Nov61. Assim, a Portaria 19 354, de 18Ago62, veio a permitir, de um modo inovador e que se revelou eficaz, o recrutamento de alunos das Faculdades de Medicina que já tivessem completado o 3º ano e que terminassem a licenciatura antes dos 28 anos (ou antes dos 30 anos, em casos especiais).
 
As normas relativas às condições e ingresso no Quadro Permanente de Oficiais Médicos sofreu uma nova alteração com o determinado na Portaria 21 173, de 18Mar65.
 
Espelhando o significativo aumento dos efectivos de pessoal dependente da DSS, o DL 46 345, de 24Mai65, criou o posto de Brigadeiro para o dDSS. Deste modo, o Brig/Méd João José Varela foi o primeiro oficial-general médico da FAP.
 
O aumento aos efectivos da Força Aérea de pessoal militar em preparação (estudantes de medicina) com destino ao Quadro Permanente de Oficiais Médicos foi permitindo garantir a cobertura dos lugares de chefia a nível das Unidades, as quais integravam também oficiais milicianos médicos.
 
O número de candidatos reduziu-se, no entanto, drasticamente em finais dos anos sessenta: os 3 elementos que foram aumentados à FAP em 1970 contrastam profundamente com os 10 de 1962 e os 18 de 1963! Em finais de 1974 o Quadro Permanente de Oficiais Médicos era constituído por 68 elementos.
 
b-2 Enfermeiros
 
A FAP, constituída em 1952, passou a exercer a sua actividade operacional a partir de Unidades que, até esse ano, pertenciam à Arma de Aeronáutica do Exército e à Aviação Naval.
 
Durante os 4 anos seguintes, os médicos e enfermeiros militares colocados nessas Unidades ainda estavam vinculados àqueles dois Ramos e no que respeitava aos enfermeiros verificava-se uma diferença de preparação técnica entre os que eram oriundos da Marinha e os que provinham do Exército.
 
De facto, os enfermeiros da Marinha tinham a sua formação na Escola de Enfermagem da Armada - a mais antiga escola de Enfermagem de Portugal, regulamentada em 1896 - e os enfermeiros do Exército ingressavam no Quadro Permanente por concurso, após terem frequentado um Curso de Sargentos Milicianos Enfermeiros, na antiga Escola do Serviço de Saúde Militar, anexa ao HMP, curso este que deveria mais apropriadamente ser considerado um curso de socorrismo (7 e 8).
 
Somente após o fim das campanhas em África é que se tentou adaptar a formação dos enfermeiros militares do Exército e da FAP aos imperativos da época, tendo os primeiros passado a frequentar a Escola de Enfermagem da Armada - que desde 1966 se encontrava em paridade curricular com as suas congéneres civis, tendo como referência a Escola de Enfermagem Artur Ravara - a partir do ano de 1977 e os segundos a partir do ano seguinte.
 
Em 1980 verifica-se a extinção da quase centenária Escola de Enfermagem da Armada, passando os cursos a ser ministrados na Escola do Serviço de Saúde Militar, sediada em Campo de Ourique, para os militares dos três Ramos, da GNR e alunos civis (através de protocolos com outras escolas).
 
Durante os 13 anos de hostilidades em África os concursos para alista­mento de voluntários para o Curso de Enfermeiros (DL 38 487, de 8Nov51, art 2º, e Lei 2 056, de 02Jun52, art 14º) consideravam como condições de admissão, entre outras, a idade (mais de 17 e menos de 21 anos, no acto do alistamento) e as habilitações (pelo menos o 1º ciclo, isto é, o 2º ano dos liceus ou equivalente). Estes voluntários comprometiam-se a servir um período de 3 anos e uma subsequente entrada para o Quadro Permanente era feita mediante concurso.
 
Se a formação técnica dos enfermeiros da FAP - em tudo semelhante à dos seus colegas do Exército - não era a mais adequada, já o mesmo não se pode afirmar do entusiasmo com que se entregaram à sua carreira. Não só conseguiram uma proficiência prática assinalável na vivência quotidiana dos problemas de saúde que urgia solucionar - e, frequentemente, em condições particularmente adversas - como também procuraram suprir as lacunas da sua formação com cursos complementares de diversas técnicas de diagnóstico e tratamento como, por exemplo, radiologia, estomatologia, fisioterapia e laboratório, não olvidando aqueles que enveredaram pela área cirúrgica e que se transformaram em excelentes instrumentistas de bloco operatório.
 
Estas capacidades, aliadas a um determinado espírito de bem servir e a sólidos hábitos de disciplina, tornaram-nos pedras angulares do edifício da saúde da FAP, apreciados e estimados pela família militar e, também, pela comunidade civil que, frequentemente, a eles recorria com total confiança.
Militarmente os Enfermeiros da FAP pertenciam, até há poucos anos, exclusivamente à classe de Sargentos, sendo o posto máximo possível o de SMor.
 
Os enfermeiros militares, oriundos de outros Ramos e que até finais de 1956 transitaram para a FAP, alcançando, no mínimo, o posto de 1SAR foram os seguintes:
SAJu António Augusto Fernandes
SAJu Júlio Américo Ferreira
SAJu António de Rosário Martins
SAJu Manuel Nunes
SAJu Luís Fino
SAJu José Caldeirinha
SAJu Afonso Nunes
SAJu Joaquim Branco
SAJu Fernando Bileu
SAJu Jaime Barbosa
1Sar Manuel Faustino
1Sar Ezequiel Marques Moura
 
Um caso muito particular a nível da FAP - e, seguramente, a nível das Forças Armadas de qualquer país com a mentalidade conservadora prevalente no Portugal do princípio dos anos sessenta - foi o das enfermeiras pára-quedistas que exerceram a sua actividade no teatro de operações africano, a partir de 1961.
 
Ainda hoje causa perplexidade o facto do então TCor/Eng Kaúlza de Arriaga, à data Subsecretário de Estado da Aeronáutica, ter conseguido obter do Presidente do Conselho, Prof Oliveira Salazar, a indispensável autorização para a implementação de um núcleo de enfermeiras pára-quedistas, desti­nadas a actuar junto das tropas em campanha, quer a nível da prestação de cuidados directos de enfermagem quer a promover, nas melhores condições possíveis, as evacuações sanitárias.
 
De acordo com o Despacho 418/61:
1) Os enfermeiros equiparados a militar pára-quedista destinam-se fundamentalmente à prestação de assistência de enfermagem de todos os graus de tecnicidade:
a.     Em locais de difícil acesso;
b.     A bordo de aeronaves;
c.     Em missões de especial responsabilidade.
 
2) Na ausência de missões referidas em 1), os mesmos enfermeiros devem utilizar-se na prestação de assistência de enfermagem de todos os graus de tecnicidade:
a.     Em locais de grande aglomeração de feridos ou/e doentes;
b.     Em hospitais militares e, excepcionalmente, em hospitais civis;
c.     Noutras missões.
 
3) A assistência de enfermagem referida em 1) e 2) é prestada, indistintamente, a elementos dos três Ramos das Forças Armadas e, sempre que conveniente, a elementos civis.
 
4) Em princípio, a assistência de enfermagem referida em 1), 2) e 3):
- de maior grau de tecnicidade, é atribuída a enfermeiros equiparados a oficial pára-quedista;
- de menor grau de tecnicidade, é atribuída a enfermeiros equiparados a sargentos pára-quedistas
 
Das 11 candidatas ao 1º curso de enfermeiras pára-quedistas iniciado em Junho de 1961 e concluído em 8 de Agosto do mesmo ano, 10 eram provenientes da Escola de Enfermagem das Franciscanas Missionárias de Maria e 1 da Escola de S. Vicente de Paula. Neste curso participaram as “seis Marias”, Maria Arminda Pereira, Maria do Céu Policarpo, Maria Ivone Reis, Maria Zulmira André, Maria de Lurdes Rodrigues e Maria Nazaré Andrade, as únicas que o concluíram (9).
 
Em 25Ago61 já 2 enfermeiras (Enf/Paraq Maria Arminda Pereira e Enf/Paraq Maria Ivone Reis) acompanharam o processo de lançamento de pára-quedistas na serra da Canda, naquilo que constituiu o seu primeiro contacto com o teatro de operações.
 
Entre 1961 e 1974 realizaram-se 9 cursos a que se candidataram 126 enfermeiras, das quais 47 foram brevetadas.
 
O modo esforçado como se empenharam nas inúmeras missões que lhes foram destinadas foi bem demonstrado pelas inúmeras manifestações de carinho que receberam ao longo dos 13 anos de campanha e, também, pela dádiva do seu sangue: a Enf/Paraq Maria Celeste Ferreira da Costa faleceu na Guiné ao embarcar para uma missão e a Enf/Paraq Maria Cristina Rodrigues da Silva foi ferida no norte de Moçambique, quando procedia a uma evacuação sanitária (10).
 
Embora o Quadro de Enfermeiras Pára-quedistas fosse considerado em extinção progressiva a partir de 1974 (ano em que se realizou o último curso), algumas delas mantiveram-se em funções de chefia no HFA, quer como Enfermeiras Directoras quer como responsáveis pelos serviços de internamento e bloco operatório, até à extinção do Corpo de Tropas Pára-quedistas na FAP (31Dez1993).
 
5. O Serviço de Saúde após o fim das hostilidades em África
 
Uma das consequências imediatas da independência dos territórios ultramarinos sob administração portuguesa foi o encerramento do NHEFA2 (Açores-Terceira) que, como foi anteriormente referido, teve como percursor o Hospital Militar da Terra-Chã que desempenhou um papel de primordial importância no tratamento e recuperação de inúmeros feridos nas campanhas do Ultramar.
 
Quer o NHEFA2 quer o NHEFA1 (antecessor do Hospital da Força Aérea - Paço do Lumiar) foram criados pelo DL 296/72, de 14Agosto; o encerra­mento do primeiro causou algum impacto negativo junto da população açoriana e dos militares sediados na BA4, que não deixaram de experimentar um sentimento de mágoa pela perda de uma estrutura hospitalar que, particularmente na sua vertente cirúrgica, tinha demonstrado assinalável capacidade de resolução dos problemas com que fora confrontada durante quase três décadas.
 
No entanto, o seu encerramento permitiu uma concentração de recursos humanos e materiais no seu homónimo do Paço do Lumiar que, poucos anos depois, já era designado, com plena propriedade, por Hospital da Força Aérea, (DL nº 114/79, de 04Mai).
 
Para que tal fosse possível foi, obviamente, determinante o regresso e a fixação na área de Lisboa de muitos dos oficiais médicos, dos enfermeiros e das enfermeiras pára-quedistas que, até então, desempenhavam funções nos territórios ultramarinos.
 
No Paço do Lumiar, dentro do perímetro do Depósito Geral de Adidos (posteriormente Base do Lumiar), desenvolveu-se o “núcleo duro” das actividades do SS, constituído por 3 estruturas fundamentais:
 
a) O Centro de Medicina Aeronáutica (CMA)
 
Em 1949 lamentava-se o Cap/Méd Henrique de São Payo, colocado na Base Aérea nº 2, que a 5ª Arma do Exército, apesar de dispor de meios aéreos há cerca de três décadas não contava com nenhum oficial médico diplomado em Medicina Aeronáutica. Segundo aquele militar não era realista assumir que qualquer oficial médico estivesse apto a desempenhar as funções de médico de uma Base Aérea e salientava que o Médico Aeronauta três assuntos teria que conhecer: o ar, o avião e o aviador.
 
O Cap/Méd São Payo sugeria vivamente a frequência de cursos em França (por ficar mais próximo de Portugal o que implicava menor despesa) e estabelecia um paralelo com o que acontecia na Aviação dos EUA que criara uma Escola de Medicina Aeronáutica (Randolph, Texas) em finais da Iª Grande Guerra (11).
 
Poderia igualmente este oficial médico mencionar - para acentuar mais profundamente o atraso nacional - o exemplo germânico, uma vez que o Serviço de Saúde Militar alemão foi o pioneiro em Medicina Aeronáutica, criando uma secção especial para o estudo da fisiopatologia do voo em 1915. Terá sido o trabalho profícuo desta secção que impediu, nos primeiros anos de Iª Grande Guerra, os numerosos acidentes devidos a falha humana que ensombraram a aviação de outros países beligerantes.
 
Como evoluiu então a Medicina Aeronáutica na FAP, desde a fase da sua “não existência”, deplorada pelo Cap/Méd São Payo até aos dias de hoje em que o CMA é uma indesmentível realidade que tem, inclusivamente, a capacidade para realizar, com periodicidade regular, cursos de Medicina Aeronáutica, na sequência daquele que foi efectuado entre 08Abr e 29Mai1991 (com a presença de 6 oficiais médicos da FAP, 3 da Força Aérea Angolana e 1 da Força Aérea Moçambicana) e que, para além de ter constituído um assinalável êxito em termos de formação científica, teve o mérito de ter sido o primeiro a ser realizado em território nacional.
 
Antes de ter entrado em funções o Centro Médico e Psicológico da Força Aérea, em 1959, de acordo com o relatado pelo então Cor/Méd João Varela, “… o nosso serviço vivia da acção e do trabalho de oficiais médicos adidos, oriundos da Armada e do Exército os quais, animados pelo gosto da Aviação, formaram a plêiade dos que viriam a ser integrados no Serviço de Saúde da Força Aérea …. Durante estes 4 anos (o autor refere-se ao período de 1952-56) pode dizer-se que a acção médica começou a exercer-se ao nível das Bases Aéreas então criadas, actualizando-se e renovando-se os exames médicos de admissão do Pessoal Navegante, em particular dos pilotos-aviadores, que vinham desde há anos a realizar-se na vetusta Granja do Marquês, depois BA1, e então Escola Militar de Aeronáutica … Com o avanço constante da técnica, o avião passou a operar a grandes velocidades, a ter linhas de subida rapidíssimas e a atingir tectos elevados, o que levou a fazer sair a selecção médica do pessoal navegante da antiga Granja do Marquês e, assim, passaram os exames médicos de selecção a uma segunda fase da sua história …. Começaram a fazer-se alguns dos exames médicos de admissão nas clínicas especializadas do Hospital Militar Principal, resultando daqui uma mais perfeita e apropriada decisão.
 
Mas dentro do princípio de obter-se um maior rendimento e evitar sobrecarregar-se serviços hospitalares, já de si trabalhando à sobreposse, conseguiu-se obter instalações próprias nas quais começou a funcionar um Centro de Exames Médicos de Admissão e Revisão do Pessoal Navegante, hoje (o autor escreve em 1964) conhecido pelo nome de Centro Médico e Psicológico da Força Aérea (CMPFA), que nos seus cinco anos de existência conta já com milhar e meio de observações, de exames de admissão e revisão do Pessoal Navegante” (12).
 
No entanto, esta melhoria qualitativa da situação não era de modo a satisfazer o desejo de melhor servir a causa que abraçara e o então dDSS, de um modo crítico, acrescenta: “O trabalho já realizado atesta, em larga medida, o anseio de expandir-se o CMPFA, com o apetrechamento de novas instalações donde não pode estar ausente um departamento para exames psicológicos, uma câmara de descompressão e uma centrífuga, meios e equipamentos hoje indispensáveis ao bom e sério julgamento das capacidades e aptidões dos navegantes, assim como para estudar e averiguar as causas de perturbações referidas ou sentidas durante os voos” (12).
 
O Brig/Méd João José Varela, tal como o profeta Moisés, não chegou a usufruir da Terra Prometida; no entanto, pouco antes do seu falecimento tinha bem a noção de que um CMA modelar, pelo qual tanto pugnara, estava em vias de conclusão.
 
Entre 1959, ano do início das actividades do CMPFA em instalações partilhadas com a DSS num edifício da Av da Liberdade, nº 240, 1º, e 1972, ano da criação do CMA, que passou a funcionar no Paço do Lumiar, junto ao NHEFA1, os exames de selecção de candidatos a pessoal navegante e as revisões periódicas eram efectuados com o apoio de médicos civis, de diversas especialidades, que tinham um vínculo contratual com a FAP e que recebiam nos seus consultórios todos os elementos enviados pela DSS, elaborando em seguida os relatórios ou realizando os exames clínicos solicitados.
 
A partir de 1972 a situação foi substancialmente modificada, para melhor, uma vez que os novos contratos determinavam que o exame clínico se realizasse nas novas instalações do CMA, dotadas de adequados gabinetes de consulta e com o apoio da maioria dos meios auxiliares de diagnóstico.
 
Tal facto facilitou a comunicação entre as pessoas e promoveu um maior “espírito de corpo”, passando esses médicos civis a sentir-se como parte integrante do CMA.
 
Em 1978 podia, muito justamente, o então TCor/Méd Ernesto Madeira, responsável pelo CMA, afirmar:
“É no Centro de Medicina Aeronáutica que se realiza a selecção dos candidatos a pilotos da Força Aérea. Aí, uma numerosa equipa de especia­listas, abrangendo desde o clínico geral ao psicólogo, tendo em vista o factor segurança (do piloto, dos passageiros e das populações em terra) e o factor económico (é bom não esquecer o alto custo em que fica a preparação de um piloto e o valor dos aviões) procede à selecção dos candidatos.
Nesta selecção, para além de uma integridade absoluta, funcional e orgânica de todos os órgãos, verificada através dos diferentes exames médicos, procura-se avaliar por meio dos variados testes de habilidade psicomotora e da motivação, factores imprescindíveis para uma previsão favorável da aptidão para a carreira de piloto militar” (13).
 
Nesse mesmo ano de 1978, a Revista Mais Alto entendia como oportuno recordar que a Portaria nº 77/72, de 27Dez, determinava que o Pessoal Navegante fosse submetido a exames periódicos no CMA e que o desrespeito das normas vigentes que, eventualmente, se verificasse da parte de alguns elementos, constituía uma infracção disciplinar e representava um factor acrescido de risco para a actividade aérea, com probabilidades incalculáveis de lesão dos interesses da Força Aérea e do património nacional (14).
A necessidade desta recordatória, no órgão oficial da FAP, e as constantes diligências efectuadas pelo CMA no mesmo sentido tinham como origem o receio - nunca totalmente debelado - que o Pessoal Navegante experimenta de ficar impedido, por razões de saúde cuja gravidade nem sempre valoriza, de exercer uma actividade profissional que tanto ama.
 
Para fazer dissipar esta nuvem de receio, o Brig/Méd Fernando Melo Coelho, que foi responsável pelo CMA e que é grande entusiasta pela Medicina Aeronáutica, insistia com veemência num “novo tipo de médico” que, para além de uma sólida preparação clínica, deveria sentir e viver os problemas próprios do voo, tivesse a verdadeira noção da relevante importância do componente psicológico da actividade aérea e se envolvesse, de modo muito personalizado, com o Pessoal Navegante (15).
 
Neste sentido de facilitar o relacionamento do médico aeronáutico com o Pessoal Navegante, aquele passou, desde há uns anos, a ter um estatuto de voo que determina que seja obrigado a voar um mínimo de horas nas aeronaves das Bases Aéreas onde esteja colocado.
 
Desde que em 1978 o então CEMFA, Gen José Lemos Ferreira, decidiu dotar o CMA com umas instalações mais adequadas ao seu pleno funcionamento que se iniciaram as obras, as quais foram efectuadas em simultâneo com outras de grande envergadura - a Base de Alfragide e a Academia da Força Aérea (Sintra) - o que influenciou alguma morosidade na sua conclusão. Somente em Out1984 foi possível concluir o Sector de Treino Fisiológico (STF), que iniciou imediatamente funções, operando com os efectivos planeados, de 2 oficiais e 7 sargentos treinados nos EUA; o edifício principal do CMA foi concluído em Dez1986.
 
Este renovado CMA foi estruturado em 2 grandes departamentos contando, ainda, com uma Secretaria e diversos sectores de apoio (gestão de recursos, secção de microfilmagens e de reprografia).
 
a) Departamento de Avaliação de Aptidão Aeromédica - responsável pelos exames médicos de selecção e pelas revisões periódicas;
 
b) Departamento de Instrução e Prevenção que comporta 3 secções:
 
    b.1)     Factores humanos e segurança de voo - tem como objectivos a redução da contribuição do factor humano para a ocorrência de acidentes e incidentes aéreos;
 
    b.2)     Informação e ensino - tem por missões realizar cursos de Medicina Aeronáutica, organizar estágios (particularmente de treino em evacuações sanitárias) e manter actualizada a Biblioteca Técnica do Serviço de Saúde;
 
    b.3) Sector de Treino Fisiológico que garante a execução de programas de treino fisiológico exigidos pela OTAN e que está equipado com:
- Câmara hipobárica com capacidade de altitude simulada de 100 000 pés
- Simulador de ejecção, com regulação de impulso de ejecção até 9G
- Simulador de acuidade visual nocturna (construído pelo próprio pessoal do STF, constituindo uma adaptação melhorada do modelo americano de então e que custou uma fracção centesimal do original!)
- Cadeira de Barany (simulador de desorientação vestibular, também construído no STF a custos ínfimos)
- Simulador de desorientação espacial, construído a nível nacional, mediante colaboração entre as OGMA e o STF, a funcionar desde Out1987, e com custos avaliados em 30% de modelos similares europeus (16).
 
Constatamos, pois, que de todos os equipamentos mencionados em 1964 pelo então Cor/Méd João Varela como indispensáveis para uma boa prática da Medicina Aeronáutica, somente a centrífuga não foi instalada no novo CMA … que se assume, desde os finais da década de oitenta do passado século, como “o órgão verdadeiramente específico e representativo dentro do sistema de saúde da Força Aérea” e que “constitui a placa giratória do pessoal navegante, desde a selecção até ao controlo da aptidão, passando pela instrução e treino fisiológico” (17).
 
b) O Hospital da Força Aérea (HFA)
 
A modificação de 2 camaratas do Depósito Geral de Adidos da Força Aérea, no Paço do Lumiar, terá sido o embrião do HFA. Aí se constituiu, em 1966, por decisão do CEMFA, o Centro de Diagnóstico e Tratamento do Quartel de Adidos da FAP, compreendendo 1 enfermaria geral e o Centro Médico Psicológico.
 
A construção do NHEFA1 não terá suscitado aplauso unânime dos restantes Ramos, um deles advogando firmemente as vantagens de 1 único Hospital Central das Forças Armadas e o outro preferindo manter a sua identidade total, mesmo a nível hospitalar.
 
De qualquer modo, a criação do NHEFA1, o seu rápido desenvolvimento e a evolução para HFA, foram possíveis “mercê da invocação da necessidade de existir um órgão principalmente vocacionado para a recuperação do pessoal navegante para, não só curar as doenças e lesões, mas também preservar a manutenção da aptidão para o voo” (16).
 
O NHEFA1 (HFA após 1979) foi inicialmente dimensionado para 92 camas, lotação que em caso de catástrofe poderia ser fisicamente aumentada com recurso às camaratas da actual Base do Lumiar.
 
Ficou localizado numa zona periférica da cidade de Lisboa, onde ainda não se fazia sentir a explosão urbanística que, a partir das 2 últimas décadas do passado século, facilitou a implantação de numerosas edificações nas áreas circundantes da Base do Lumiar que, até então estavam recobertas de oliveiras e onde pastavam, tranquila e bucolicamente, pacíficos rebanhos de ovelhas.
 
O NHEFA1, possuía - como ainda hoje se verifica em relação ao HFA - algumas importantes vantagens estratégicas: estava edificado na malha urbana periférica, dispunha de um heliporto, tinha reservas de água no subsolo, apoiava-se em caso de catástrofe na capacidade instalada de camas das camaratas do Depósito Geral de Adidos (Base do Lumiar a partir de 1983), situava-se muito próximo do aeroporto da Portela e estava servido por importantes eixos viários.
 
Uma outra significativa mais-valia consistia - e ainda consiste - numa notável capacidade de ampliação de infra-estruturas que já foi aproveitada para a construção de uma nova ala hospitalar com 3 pisos, inaugurada em 23Dez1981, e de profundas intervenções de renovação e ampliação iniciadas em 2002 e ainda não totalmente concluídas.
 
Entre estes 2 períodos procedeu-se a uma total renovação do Bloco Operatório que teve como objectivos primordiais dotá-lo de 3 salas para cirurgia, de 1 serviço de esterilização adequado, de um circuito eficaz para o material “sujo” e de condições de ventilação apropriadas para melhor prevenção de infecções nosocomiais (18).
 
Ao NHEFA1 (e, posteriormente ao HFA) era atribuída a finalidade primária do tratamento e reabilitação dos doentes, competindo-lhe ainda apoiar o Centro de Medicina Aeronáutica, sob o ponto de vista técnico, e colaborar na formação técnica dos profissionais de saúde e na investigação científica.
 
Em 1978 o NHEFA1 prestava assistência a militares das Forças Armadas, a pessoal civil em serviço na FAP (quando a doença fosse adquirida por razões de serviço) e a beneficiários não militares da ADMFA, ADME e ADMA.
 
Era dirigido por um Cor/Méd coadjuvado por um subdirector com o posto de TCor/Méd, existindo 2 directores de departamento: um director clínico com a categoria de chefe de clínica, responsável pelo Departamento de Acção Médica, e um director administrativo que se ocupava de toda a gestão administrativa, funções essas desempenhadas por um oficial de Administração Aeronáutica, possuindo o Curso de Administração Hospitalar.
 
O Departamento de Acção Médica compreendia 3 Serviços de Internamento: Serviço de Medicina (com 2 enfermarias de 10 camas), Serviço de Ortopedia (com 3 enfermarias de 10 camas) e Serviço de Cirurgia (com 2 enfermarias de 10 camas). Havia também 22 quartos individuais, com banho, destinados em primeira prioridade a doentes com indicação clínica para internamento isolado e, em segunda prioridade, a oficiais, sargentos e familiares (19).
 
O primeiro director do NHEFA1 - que mandou publicar a 1ª Ordem de Serviço em 24Ago1973 - foi o então TCor/Méd Gabriel Goucha Reis.
 
Durante a dinâmica gestão do primeiro director do HFA, o já então Brig/Méd Fernando Viegas Álvares, tendo como colaboradores o subdirector, Cor/Méd Manuel Fernandes Moreira, e o administrador Maj/IC Avelino Cunha Rodrigues, foram realizadas significativas obras de ampliação e renovação que permitiram aumentar o número de camas para 135, melhorar as condições de atendimento das consultas externas e modernizar as instalações do Laboratório de Análises Clínicas e dos Serviços de Estomatologia e Radiologia.
 
Um outro exemplo dos “ventos de mudança” que animavam o HFA consistiu na implementação de terminais de computador, de modo a permitirem o fornecimento de dados arquivados, fossem eles de natureza médica ou de índole administrativa. E isto em 1981 …, numa fase em que o HFA contava com a colaboração de 14 oficiais médicos, 19 médicos civis, 19 sargentos enfermeiros, 6 enfermeiras pára-quedistas e 26 enfermeiras civis (20).
 
Em princípios da década de noventa foi instalada uma Unidade de Medicina Nuclear que tem prestado assinaláveis serviços, não só à família militar mas também à comunidade civil.
 
Recentemente, a partir dos anos 2001/2002, contando com apoio total e decisivo do então responsável pelo Comando Logístico da FAP, TGen Rolando Santos, iniciou-se mais um ciclo de importantes obras de ampliação e beneficiação (ainda em curso), destinadas a preparar o HFA para os desafios dos próximos anos.
 
c) Centro de Psicologia da Força Aérea (CPSIFA)
 
Desde os primórdios da aviação que se procurou definir o perfil psicológico adequado ao Pessoal Navegante, especialmente aos pilotos e, dentro destes, ao caso muito particular dos pilotos militares.
 
Embora a Aviação Militar se começasse a desenvolver, no nosso País, no período final da Iª Guerra Mundial somente em 1959 entrou em actividade o Centro Médico e Psicológico da FAP, o qual se pode considerar o antecessor directo de 2 importantes estruturas actuais, o Centro de Medicina Aeronáutica e o Centro de Psicologia da Força Aérea.
 
Estes 2 órgãos, assim como o Hospital da Força Aérea, estão integrados, desde 18Nov92, numa estrutura nova, o Instituto de Saúde da Força Aérea (ISFA) sediado no Paço do Lumiar, que “nasceu de uma lógica de coorde­nação e administração centralizada… no que se refere a optimização dos recursos humanos e equipamentos, cuja actividade e utilização são comuns” (17).
 
Tal como a DSS, o ISFA encontra-se na dependência directa do Comando de Pessoal (CPESFA).
 
 O CPSIFA é integrado por oficiais e civis diplomados em Psicologia e tem como primordial objectivo colaborar na rigorosa selecção do pessoal navegante e, também, de outras especialidades.
 
A selecção do pessoal navegante assenta em 3 pilares: provas de aptidão perceptivo-cognitiva, testes psicomotores, prova de grupo e entrevista individual.
 
Mais do que os testes físicos ou os exames médicos a avaliação do perfil psicológico dos candidatos é, indiscutivelmente, a mais difícil barreira que devem ultrapassar sendo, habitualmente, a percentagem de eliminações superior a 60%.
 
Para além da colaboração no processo de selecção, o CPSIFA também promove, de acordo com o determinado no Dec Reg 51/94, de 3SET, art 33º, a realização de estudos psicológicos e auxilia os militares e seus familiares na área da Psicologia Clínica, tendo um papel relevante no apoio aos familiares directos dos militares falecidos em acidentes de serviço (21).
 
Uma outra área de intervenção dos elementos do CPSIFA é, obviamente, o apoio imediato a quaisquer grupos de cidadãos, nacionais ou não, evacuados pelos meios aéreos da FAP de zonas de conflito armado ou de catástrofe natural.
 
d) Centros de Saúde das Unidades
 
Em todas as Bases Aéreas existe um Centro de Saúde, instalado em estruturas que foram edificadas há várias décadas, por norma amplas e espaçosas, que têm sido sujeitas a intervenções periódicas ao longo dos anos. Na Base Aérea nº4 (Lages-Terceira), por exemplo, efectuaram-se muito recentemente (2004) alterações radicais à traça original do Centro de Saúde, de modo a torná-lo mais funcional e adequado aos imperativos actuais.
 
Os elementos do Serviço de Saúde colocados nestes Centros dependem, hierarquicamente, do Comando das Unidades e, tecnicamente, da DSS.
 
Tem sido, frequentemente, difícil para a DSS - em colaboração com a Direcção de Pessoal - encontrar a fórmula adequada para a colocação de oficiais médicos nas Unidades na medida em que o Quadro Médico não tem podido contar com especialistas em Clínica Geral que, enriquecidos com os Cursos de Medicina Aeronáutica e/ou Saúde Pública e Medicina do Trabalho, passariam a adquirir o perfil adequado para desempenhar as funções de chefia deste Centros de Saúde.
 
Até aos dias de hoje tem sido imprescindível recorrer à colaboração de oficiais médicos de diferentes especialidades (embora todos dotados do Curso de Medicina Aeronáutica), alguns deles muito diferenciados em áreas particularmente importantes para o apoio técnico ao CMA e ao HFA, para o preenchimento dos efectivos destes Centros de Saúde.
 
 
Agradecimento
 
O Autor agradece a preciosa colaboração do MGen/Méd (Ref) Fernando Viegas Álvares e do Cor/Méd (Ref) Manuel Pais Quina.
 
 
Bibliografia
 
1. “As origens da aviação militar portuguesa” Cor/ADMAER Alves de Fraga. Mais Alto, Jun/Jul 1999.
2. “Um olhar sobre o passado. I Parte” Gen QE Brochado de Miranda. Mais Alto, Mar/Abr 1995.
3. “Um médico aeronáutico - o brigadeiro médico João José Varela, a 10 anos da sua morte”. Brig/Méd Henrique P. Singer. Mais Alto, Jan/Fev 1994.
4. “A Força Aérea em África (1961-74)”. Gen Manuel Diogo Neto. Mais Alto, Mar/Abr 1984.
5. “A Força Aérea em Angola (1960-63)”. Gen (R) Fernando P. Resende. Mais Alto Mar/Abr 1984.
6. “A Terceira Região Aérea e a defesa do ultramar oriental”. Gen (R) Manuel Machado de Barros. Mais Alto, Mar/Abr 1984.
7. “A Enfermagem na Marinha de Guerra Portuguesa”. Júlio Gomes. Nursing, Maio 2003, Nº 177.
8. “Enfermagem Militar, que formação?”. SCH/SS Manuel António Pereira. Nursing, Jul/Ago 2003, Nº 179.
9. “A vida são os dias de que nos lembramos”. “ENF/Paraq Maria Arminda Pereira. Boina Verde, Set. 1989.
10. “Paraquedismo feminino”. TCor/SG Paraq Luís Grão. Boina Verde, Abr/Jun 1993.
11. “Formação de Médicos Aeronáuticos”. Cap/Méd Henrique de São Payo. Revista do Ar, Out 1949, nº 133.
12. “A Força Aérea e o seu Serviço de Saúde”. Cor/Méd João Varela. Mais Alto, Maio 1964.
13. “Selecção de Pilotos”. TCor/Méd Ernesto Madeira. Mais Alto, Out/Nov 1978.
14. Mais Alto, Ago/Set 1978 (Informação)
15. “Medicina Aeronáutica”. Brig/Méd Melo Coelho, Mais Alto, Jul/Ago 1991.
16. “Medicina Aeronáutica na FAP. Potencialidades actuais e perspectivas futuras”. IAEFA. Boletim nº 3, Maio 1990.
17. “O Sistema de Saúde na Força Aérea”. Brig/Méd António Entrudo. Mais Alto, Mai/Jun 1994.
18. “Novo Bloco Operatório do Hospital”. Cor/Méd Pedro Manuel Barreiros. Mais Alto, Nov/Dez 1994.
19. “Hospital da Força Aérea”. Mais Alto, Out/Nov 1978.
20. “Hospital da Força Aérea”. TenM Manuel Doutel. Mais Alto, Jan/Fev 1982.
21. “O Instituto de Saúde da Força Aérea e as missões específicas da Medicina Aeronáutica”. Cor/Méd Pedro Barreiros, Maj/Méd Nuno Ribeiro, Cap/TPAA António Barata. Mais Alto, Set/Out 1994.
 
___________
  
*      Ex-Director do Serviço de Saúde da Força Aérea.
Gerar artigo em pdf
2006-10-21
835-0
15672
35
REVISTA MILITAR @ 2024
by CMG Armando Dias Correia