Nº 2573/2574 - Junho/Julho de 2016
Pessoa coletiva com estatuto de utilidade pública
Desenvolvimento de elites militares. Visão estratégica, tomada de decisão e gestão da mudança
Coronel Tirocinado
Lúcio Agostinho Barreiros dos Santos

“Leadership is not a soft skill (…). It is a key factor of (…) success. The military learnt that lesson long ago. (Adair, 2005, p. 2)

Grande parte dos nossos sucessores na liderança já está entre nós – ainda crianças ou alunos, talvez, mas já em formação. (…) Mas como descobriremos e desenvolveremos os melhores entre nós (…)?”

(Weber, 1997, p. 300)[1]

 

Introdução

Admitindo previamente a possibilidade e a necessidade de desenvolver líderes para o contexto militar e passando diretamente ao lado da dialética “bornversusmade”, neste artigo, propomo-nos refletir, de forma prospetiva, sobre o processo que poderá conduzir à formação e desenvolvimento de elites militares. Desse processo isolam-se quatro tópicos principais a desenvolver neste artigo: (1) elaboração de um esboço de perfil teórico de competências, ajustável à realidade castrense e que responda adequadamente à multiplicidade de solicitações dos cargos e funções de topo da organização no âmbito dos respetivos contextos de atuação; (2) enunciação de alguns critérios e parâmetros que ajudarão a identificar militares de elevado potencial para que, se devidamente acompanhados ao longo do seu percurso profissional, possam desenvolver-se equilibradamente e virem a transformar-se em elites militares; (3) considerandos sobre a construção de um referencial teórico de formação e desenvolvimento, nas perspetivas individual e institucional, alinhado com o perfil de competências previamente elaborado e aplicável aos militares de maior potencial; e (4) definição de algumas linhas de orientação geral a aplicar à gestão de competências dos militares de elevado potencial.

Para efeitos desta reflexão elegeu-se como objeto de estudo as Forças Armadas (FFAA) portuguesas e, mais concretamente, o militar de carreira na qualidade de comandante ou líder formal que, pelas características do seu percurso profissional (longo e variado) e pela qualidade do seu desempenho, é projetado para o grupo das ‘elites militares’, a que correspondem formalmente os cargos e funções de maior complexidade e responsabilidade ao mais alto nível da organização[2]. A necessidade da sua “construção” (desenvolvimento na organização) decorre da impossibilidade de recrutar oficiais generais diretamente do mercado de trabalho – simplesmente porque o mercado os não “produz”, nem tão pouco seria desejável.

É para este arquétipo que é orientado o levantamento/determinação dos perfis de competências, procurando, simultaneamente, que eles incorporem toda uma capacidade de resposta às tradicionais e novas (emergentes) solicitações dos contextos de atuação dos militares. E é este perfil de competências que servirá de suporte à identificação de militares de elevado potencial e, posteriormente, constituirá a base para a definição do perfil (referencial) de formação para a criação de elites militares. Será igualmente o perfil de competências que ajudará a perceber qual o tipo de gestão que melhor se ajustará ao contexto e às especificidades militares.

Na sequência dos quatro tópicos inicialmente referidos e da definição do objeto de estudo, para a presente reflexão foram elencados os seguintes agrupamentos de perguntas, aos quais se procura responder de seguida:

1º) O que é/deverá ser um militar de elevado potencial? Que dimensões e particularidades deverão ser privilegiadas e/ou salvaguardadas na construção do seu perfil teórico de competências?

2º) Como identificar os militares com um potencial francamente acima da média e que tipo de referencial deverá servir para a avaliação desse potencial? Em que momento do percurso profissional se revelam e/ou a partir de que altura devem ser procurados? Que utilidade se reconhece aos atuais instrumentos de avaliação e de desenvolvimento de carreira para esta identificação?

3º) Até onde é possível e aconselhável que os militares de elevado potencial sejam sujeitos a ações de formação e desenvolvimento específicas, em contextos particulares, parcialmente diferenciadas dos outros militares? Que tipo de referencial de formação deve ser aplicado aos militares com elevado potencial, no sentido da construção das futuras elites militares? Que competências críticas deverão ser criadas e/ou desenvolvidas e que metodologias formativas deverão ser equacionadas? Que outras preocupações específicas de desenvolvimento existem em relação às elites militares efetivas?

4º) Que tipo de gestão deverá ser posta em prática em relação aos militares de elevado potencial e às futuras elites militares? Quais as razões que poderão justificar uma gestão diferenciada em relação aos restantes militares? Que entidades deverão participar nesta gestão e que responsabilidades caberão a cada uma?

Na figura 1 apresenta-se um modelo genérico inicial para a identificação, desenvolvimento e gestão que se pretende aplicável aos militares de elevado potencial, o qual permitirá sistematizar e apoiar, numa perspetiva integrada, a reflexão desenvolvida e que de seguida se apresenta nos seus aspetos mais significativos.

 

Figura 1 – Modelo holístico de identificação, desenvolvimento e gestão de talentos.

 

A aplicação deste modelo teórico de identificação, desenvolvimento e gestão de talentos tem em vista, sobretudo, o nível de topo da organização – nível estratégico da liderança. Veja-se, de seguida, isoladamente, cada um dos quatro tópicos referidos e os respetivos agrupamentos de perguntas a que há que dar resposta, os quais estão inscritos no modelo holístico da figura 1.

 

 

1. Perfil teórico de competências para um militar de elevado potencial

O actual contexto mundial, em permanente processo de mudança, quer em termos sociais quer tecnológicos, os ambientes operacionais e os tipos de missões cada vez mais imprevisíveis, as operações cada vez mais conjuntas e combinadas, exigem que o oficial esteja permanentemente preparado para actuar e liderar em qualquer circunstância.

(Cordeiro, Coimbra e Santos, 2008)

 

A estruturação de um perfil de competências para o militar de elevado potencial materializa a solução ao primeiro conjunto de perguntas. Esta questão prende-se, sobretudo, com as tipologias de respostas que se espera que possam vir a ser dadas pelos militares, quando em situação, no âmbito dos diversos contextos de atuação, o que nos remete inicialmente para uma caracterização geral baseada em múltiplas perspetivas ambientais: contexto interno e externo; nacional e internacional; conjunto e combinado; multiétnico e multicultural; ambiente de paz e em campanha. Num outro sentido, o perfil de competências deverá ser suficientemente transversal para que sirva, no âmbito de algumas particularidades, o conjunto dos cargos que, inscritos nos contextos referidos, são passíveis de virem a ser ocupados por militares de elevado potencial.

Importa agora definir os conceitos de “elemento de elevado potencial” e de “elite”. READY et al. (2010) definem o primeiro conceito, aplicado ao contexto profissional, da forma que se apresenta de seguida:

High potentials consistently and significantly outperform their peer groups in a variety of settings and circumstances. While Achieving these superior levels of performance, they exhibit behaviors that reflect their companies’ culture and values in an exemplary manner. Moreover, they show a strong capacity to grow and succeed throughout their careers within an organization – more quickly and effectively than their peer groups do [3].

Desta definição releva-se a presença dos seguintes fatores: a excecionalidade e a estabilidade do comportamento, o diferencial em relação aos seus pares, a variedade de situações (circunstâncias diferentes), as questões de cultura e valores organizacionais representados, a capacidade individual de desenvolvimento ao longo da carreira profissional. Nota-se, em contraposição, a ausência de um aspeto nuclear – o termo de comparação (referencial ou standard ) em relação ao qual se possam cotejar as realizações, determinar o gap de desenvolvimento de competências para um determinado cargo/função, o tipo de formação necessária, entre outros aspetos.

Por outro lado, o conceito de “elite militar”, unidade de análise por referência neste artigo, tem sido, com demasiada frequência, definido em oposição às elites civis, numa relação civil-militar profusamente estudada pelos clássicos (e.g., Huntington, Janowitz, Segal, Cafório) e também por autores portugueses (e.g., Maria Carrilho, Loureiro dos Santos, Belchior Vieira). Porém, para efeitos da presente reflexão, pretende-se um conceito fora desta confrontação histórica e sem solução aparente que se desenvolveu, com grande intensidade, entre os anos 60 e 90 do século transato. São ainda exteriores ao conceito as designadas “tropas de elite” ou “unidades de elite”.

O conceito de ‘elite’ tem origem no latim clássico eligere, que significa ‘escolher’. A partir de uma sínteses de vários autores, considera-se que se reporta a grupos sociais e/ou profissionais dominantes ou uma parcela/subgrupo desse grupo dominante, correspondendo a uma estratificação social ou, em termos profissionais, a um patamar hierárquico superior e/ou de maior responsabilidade. A este conceito está ainda associada a capacidade de decisão, de liderança e de influência em geral ao mais alto nível. Neste sentido, o conceito, formalmente considerado, permite que, em contexto militar, sejam integrados neste grupo restrito os oficiais com os postos entre almirante/general e comodoro/Brigadeiro-general. Mas, note-se, a sua inserção formal no grupo não concede, por si só, o pleno direito de alguém figurar no lote das ‘elites’; terão que ser satisfeitos todos os parâmetros do conceito, com esta ou qualquer outra definição que vier a ser considerada de utilidade para a Instituição Militar.

 

1.1. Distinção e delimitação funcional dos conceitos ‘elites militares’ e ‘militar de elevado potencial’

Para efeitos desta reflexão, a condição de ‘elite’ (“eleitos” para exercer o poder formal e, preferencialmente, também informal) não tem origem social ou em qualquer outro condicionamento prévio extrínseco, mas antes nos elevados desempenhos conseguidos em ambiente profissional, no potencial “detetado”, no carácter demonstrado e na atitude em geral.

Ao pensar-se em ‘elites militares’ pode ocorrer à memória alguns grandes chefes/comandantes militares, com provas dadas, geralmente em contexto de guerra e em épocas e situações muito distintas: Napoleão, Alexandre o Grande, Átila o Huno, Annibal, Nuno Álvares Pereira, Wellington, George Washington, Horatio Nelson, Erwin Rommel, De Gaule, Montgomery, George Patton, Ariel Sharon, António de Spínola ou, mais recentemente, Colin Powell, Norman Schwarzkopf, Tomy Franks, David Petraeus, (…) e muitos outros. Haverá, decerto, um conjunto de traços e características comuns à maioria destes grandes líderes militares. Embora se reconheça que seria um exercício interessante levantar essas características, não é exatamente isto que se propõe aqui fazer. Porque esse exercício estará parcialmente feito e, principalmente, porque nos interessa, sobretudo, um exercício de natureza prospetiva. Por outro lado, hoje, para além do contexto de guerra, importa ponderar outros contextos, igualmente importantes, onde os militares passam a maior parte do seu tempo (e.g., o contexto de paz) e onde existem outros desafios, muitas vezes não menos complexos nem menos difíceis.

Pelo referido, o conceito de ‘elites militares’ adotado nesta reflexão será, necessariamente, abrangente e transferível entre as situações padrão do contexto militar (e.g., situação de paz, operações de apoio à paz, teatro de guerra). Visto desta forma, para a definição do conceito “elite militar”, que representará, como princípio, um militar que ascende ao topo da organização, deverão ser integrados, entre outros, os seguintes componentes[4]:

– Ocupação de cargos de topo da organização e, portanto, de maior responsabilidade;

– Desempenho de funções de natureza distinta, consoante o contexto de atuação;

– Aptidão especial para percecionar o contexto envolvente e para definir uma visão para a organização, ou parte dela, e ser capaz de a comunicar aos seus colaboradores/subordinados;

– Detenção de poder formal (autoridade) e autonomia para decidir, mas também capacidade de decisão;

– Competência técnica “transversal” mínima (conhecimento e experiência) que possa apoiar a adoção de boas soluções e obter os melhores resultados em qualquer situação;

– Coragem de gestão para operacionalizar as soluções/medidas que foram objeto da sua própria decisão;

– Competência interpessoal e emocional para motivar e conduzir os outros elementos da organização sob o seu comando/direção;

– Senso institucional e capacidade para representar a organização ao nível estratégico, dentro e fora do contexto militar;

– Disponibilidade para aprender de forma contínua e sistematica, designadamente por recurso ao autodesenvolvimento.

Ao longo deste artigo usar-se-ão, quase indistintamente, as expressões “elites militares” e “militares de elevado potencial”, porventura, com maior assiduidade, esta última, por duas ordens de razões: porque as elites militares deverão resultar de um aturado trabalho de identificação e de desenvolvimento a realizar em relação aos militares que revelarem maior potencial durante o seu percurso profissional; e porque, sendo um conceito mais dinâmico e em constante construção/transformação, considera-se a expressão mais adequada às características do contexto castrense, onde deverão ser privilegiados o espírito de corpo, a coesão, a equidade, a igualdade de oportunidades, entre outros valores e práticas de gestão de pessoas. Assim, para as primeiras distinções entre as expressões “elites militares” e “militares de elevado potencial” assumem-se, explicitamente, os seguintes pressupostos:

– Tal como nas restantes áreas profissionais, nem todos os militares têm o mesmo potencial (vertente profissional em relação ao desempenho futuro), nem tão pouco têm a mesma capacidade e vontade (aquela que decorre da motivação intrínseca) para mobilizar todo o seu potencial em contexto de trabalho;

– Elevado potencial’ não é condição suficiente para que o militar possa vir a fazer parte das ‘elites militares’ – para além da necessária motivação individual (intrínseca), será fundamental que a excecionalidade seja confirmada em termos do seu valor absoluto e relativo em ordem aos seus pares e à organização militar como um todo, durante um lapso de tempo suficientemente alargado (consistência do comportamento); as necessidades orgânicas efetivas e os processos de gestão organizacional (e.g., mobilidade funcional e geográfica durante a carreira) que, tidos em termos estruturais e/ou conjunturais, influenciam igualmente esta seleção;

– Após identificados, os militares de elevado potencial deverão ser sujeitos a ações de formação e desenvolvimento específicas, em contextos particulares, parcialmente diferenciadas dos outros militares, na forma em que for mais proveitoso ou aconselhável, procurando, no entanto, salvaguardar a necessária coesão interna;

– Assume-se que a combinação, equilibrada, entre a qualidade dos talentos detetados (militares de elevado potencial) e o seu desenvolvimento em contexto profissional, quando adequadamente gerida, conduzirá, com maior probabilidade, à ascensão ao nível de topo da organização e à criação de ‘elites militares’ eficazes;

– Como expresso no conceito de ‘elite’, a pertença de pleno direito de integrar o grupo das elites é muito mais que uma mera questão formal, devendo ser verificadas, de um modo consistente, as competências genéricas enunciadas e outras, que de seguida são referidas.

 

1.2. Dimensões e particularidades a privilegiar e a salvaguardar na construção do perfil de competências

Para a identificação dos militares de elevado potencial, bem como, depois, para programar o seu desenvolvimento e proceder a uma correta gestão de recursos humanos, é necessário que exista previamente um perfil de competências que possa servir de referência e de comparação. Este perfil, sobre o qual se reflete de seguida, deverá, por sua vez, estar em sintonia/alinhamento com as solicitações e exigências que resultam dos contextos de atuação dos militares e das tipologias de cargos e funções que lhes estão associados. São estas relações que se pretendem representar na figura 2.

 

Figura 2 – Perfil de competências – correlações com os contextos de atuação e com a matriz formativa de desenvolvimento de competências.

 

Posteriormente, é necessário pensar na vertente técnica do perfil de competências, o qual deverá integrar um conjunto de dimensões que ultrapassarão, em larga medida, a sua grandeza funcional. Proceda-se, para o efeito, a uma breve revisão de literatura, tentando perceber um pouco qual é o estado da arte em relação a este assunto.

De entre vários modelos revistos, apresenta-se, inicialmente, de forma resumida, o modelo de liderança e gestão de Robert Quinn, sugerido pelo autor, pela primeira vez nos anos 80 do século transato. Quinn (1984)[5] sugere uma estrutura para ajudar a perceber como os gestores e os líderes se devem comportar na sua atividade profissional, a qual ficou conhecida como modelo situacional de valores contrastantes, e que nos parece, até certo ponto, bem adequada ao contexto militar e ao modelo teórico que se pretende construir para os militares de elevado potencial em geral e para os líderes do topo da organização militar. O modelo de Quinn (1984, 1988) foi posteriormente utilizado por Hunt e Phillips (1991) para caracterizar os diversos contextos militares e as atividades mais comuns que neles se desenvolvem, desde as de maior rotina e menor risco às situações imprevistas e de mais elevado risco, o que equivale a dizer que o modelo poderia adaptar-se praticamente a todas as situações do contexto militar, desde uma situação de guarnição a uma situação de guerra. A figura 3 sintetiza e posiciona, esquematicamente, os oito papéis de gestão e liderança que compõem o modelo de Quinn[6].

 

Fonte: Adaptado de Quinn (1984 e 1988) e Hunt e Plillips (1991)

Figura 3 – Modelo Situacional de Liderança para Combate e Guarnição.

 

Os oito papéis variam em termos de importância e intensidade, consoante se considere um contexto mais estável e de menor risco ou um contexto mais volátil e de risco acrescido. A partir do modelo de Quinn (1984, 1988), os investigadores Hunt e Plillips (1991)[7] procuraram refletir uma variedade de situações ao utilizar os valores contrastantes “tarefa de rotina/tarefa única” e “maior risco/menor risco” na caracterização das missões militares de “guarnição” (situação de paz) e “combate” (situação de guerra). Desta forma, a “estrutura da tarefa”, para além da dimensão que se estende de rotina/programada a vaga/indefinida (incerta), decorrente do modelo situacional de valores contrastantes de Quinn (1984, 1988), é enriquecida com o fator risco, específico da organização militar.

A atualidade e a adaptabilidade deste modelo ao contexto militar decorre do facto de ele integrar o pressuposto de que os líderes são sistematicamente confrontados com “valores contrastantes”[8] (competing values) ou “dinâmicas paradoxais”, para o que deverão estar aptos a gerir esses paradoxos a partir de um balanceamento dos seus comportamentos e a assumir compromissos, a correr riscos e a fazer experiências no âmbito dos binómios estabilidade versus inovação organizacional, e decisão racional versus ênfase no envolvimento das pessoas. A gestão destes paradoxos apela a uma “complexidade cognitiva” e a uma “complexidade comportamental” desejáveis por parte dos líderes militares, que se acredita possa vir a aumentar a probabilidade de sucesso no exercício das suas funções.

Em termos práticos e muito concretos, o que este modelo preconiza é a capacidade de o líder poder desempenhar, em simultâneo, diversos papéis, localizados em quadrantes diferentes, embora, de acordo com o contexto e a situação concreta, alguns desses papéis possam ter maior importância do que outros e, por isso, mereçam também uma preocupação diferente[9].

Para a construção do referencial de competências recupere-se ainda a nova abordagem, atualizada, de Quinn et al. (2004)[10], na qual, a cada um dos oito papéis de liderança, os autores fizeram corresponder três competências-chave, num total de 24, tal como é representado na figura 4.

 

Fonte: Estrutura do autor, construída a partir de Quinn et al. (2004)

Figura 4 – Papéis e Competências-chave de Liderança – Modelo Situacional de Valores Contrastantes.

 

Veja-se agora, de uma forma resumida, outro modelo, construído expressamente para o contexto militar. Trata-se do referencial do Exército dos Estados Unidos da América (EUA), explicitado no manual de campanha FM 22-100, versões de 1983, 1986 e 1999 e, posteriormente, atualizado na revisão de 2006 (FM 6-22)[11].

A figura 5 procura resumir este referencial norte-americano (Leadership Framework), o qual é, por si só, explicativo. Em qualquer das versões, o modelo faz referência a três domínios de base: to be (que se traduz por ‘saber ser’ e ‘saber estar’), to know (‘saber saber’, conhecer) e to do (‘saber fazer’). Cada um destes domínios é depois analisado nos manuais norte-americanos sob o ponto de vista do líder e do que ele tem que ser, saber e fazer no exercício da liderança, a vários níveis organizacionais. Com estas três dimensões cruzam-se competências de natureza pessoal (valores e atributos), emocional, relacional, concetual e funcional.

 

Fonte: Construído pelo autor, a partir do FM 22-100 (1999)

Figura 5 – “The Army Leadership Framework” para o exercício da liderança em contexto militar.

 

De entre muitos outros modelos e estudos, existe um, a nível nacional (Silva et al., 2004)[12], conduzido pela Academia Militar (AM) e pelo Centro de Psicologia Aplicada do Exército (CPAE), concluído em 2006, que importa assinalar (figura 6).

 

Fonte: Silva et al. (2006)

Figura 6 – Modelo de Competências do Oficial do Exército Oriundo da AM.

 

Este estudo aborda o perfil desejável do oficial até ao posto de Capitão, o qual, posteriormente, veio a servir de base ao levantamento do referencial de formação para os mestrados integrados dos cursos da Academia Militar, nos termos das orientações de Bolonha. Este trabalho tem ainda o mérito de ter envolvido uma grande quantidade de oficiais, tendo sido utilizado o inquérito por questionário e por entrevista (“entrevistas de visão”) como instrumento de recolha de dados. O modelo que foi sugerido pelo grupo de trabalho AM/CPAE para os oficiais apresenta cinco agrupamentos de competências/ dimensões: Organizacional; Cognitiva; Emocional; Liderança; e Físicas. O modelo integra ainda uma dimensão relativa à Ética e aos Valores institucionais.

As cinco categorias deste modelo são, depois, desdobradas em 27 subcategorias (Quadro 1), para as quais foram definidos comportamentos elementares a adotar pelos oficiais até ao posto de Capitão.

 

Quadro 1 – Categorias do modelo de competências do Oficial do Exército oriundo da AM

Categorias

Subcategorias

Organizacional

Visão; envolvimento e comprometimento com a organização; burocrático-administrativa; tecnologia de informação e comunicação; valorização pessoal; conhecimento técnico e tático; planeamento e análise; autonomia e iniciativa; supervisão.

Cognitiva

Inteligência geral; raciocínio analítico; raciocínio crítico; pensamento criativo; resolução de problemas; consulta.

Emocional

Equilíbrio e estabilidade emocional; resiliência; autocontrolo; autoconfiança, assertividade; adaptação/flexibilidade.

Liderança

Construção de relações; construção de redes sociais; influência; execução e implementação; decisão e julgamento eficaz e ético.

Físicas

Aptidão física.

Fonte: adaptado de Silva et al. (2006)

 

Sugere-se ainda um outro exemplo para reflexão e debate, este resultante de um estudo qualitativo, conduzido pelo autor do presente artigo, a partir de uma revisão de literatura, o qual permitiu analisar cerca de 40 modelos diferentes (alguns já descritos anteriormente) e proceder, com a ajuda de um software específico, à codificação automática da informação recolhida e, com recurso a grupos focais (focus group), complementar o estudo, proporcionando uma maior integração e um apuramento das competências elementares que o constituem, as quais foram por sua vez integradas em seis clusters. Para apoio ao estudo foi elaborado um dicionário de termos e de competências. (Santos, 2014, p. 5) [13].

O modelo, apresentado de forma resumida na figura 7, é sobretudo aplicável aos níveis mais elevados da organização militar e, por isso, perfeitamente adequado aos líderes de topo das FFAA portuguesas.

 

Fonte: Santos (2014, p. 74)

Figura 7 – Modelo de competências para o exercício da liderança em contexto militar (esboço final).

 

Os constructos elementares (categorias) do conceito de competência (sentido lato) tal como foram retirados dos 40 modelos da literatura, estão percentualmente representados na figura 8.

 

Fonte: Santos (2014, p. 78)

Figura 8 – Constructos utilizados para a definição das categorias (competências) iniciais.

 

Nesta investigação, no sentido de uma maior simplificação concetual, o autor apresenta ainda, como complemento interpretativo do modelo de competências, sugerido na figura 7, um esboço com redução e/ou integração de variáveis (competências), como se mostra na figura 9. Este esboço, simplificado, pode ser descrito a partir da seguinte sinopse:

[…] associação de quatro grandes eixos/dimensões: (1) relacional (em conexão com o próprio, com os outros, com a organização e com o contexto); (2) funcional/instrumental (relativo à missão, tarefas e papéis a desempenhar; à tomada de decisão e à resolução de problemas); (3) mudança (gestão da incerteza, da mudança e da complexidade, para o que se exige uma capacidade de ler o contexto/consciência situacional e uma visão estratégica em relação ao caminho a seguir pela organização); e (4) aprendizagem (autoaprendizagem e apoio à aprendizagem dos líderes subordinados ao longo da vida/percurso profissional). (Santos, 2014. p. 95)

 

Fonte: Santos (2014, p. 96)

Figura 9 – Grandes eixos do modelo de competências para o exercício da liderança no contexto das FFAA portuguesas.

 

Como é percetível, as dimensões “mudança” e “aprendizagem”, que juntamente concorrem para uma dimensão maior – “transformação” – têm implicações nas restantes (“relacional e “funcional”), dado que “[…] as lógicas de mudança/transformação e de aprendizagem têm reflexos ao nível das pessoas, dos sistemas e dos processos organizacionais” (p. 95)[14].

Numa lógica algo diferente da que foi apresentada em relação aos modelos anteriores, Gardner (2008)[15] sugere um modelo descritivo simplificado, considerando que as capacidades cognitivas[16] mais importantes e que serão mais procuradas nos próximos anos são cinco:

– Mente disciplinada, ligada ao domínio das principais correntes de pensamento (e.g., ciências, matemática, história) e ao ofício em questão;

– Mente sintetizadora, que se traduz pela capacidade de integrar ideias de diferentes disciplinas, num todo coerente, e comunicar essa integração a outras pessoas;

– Mente criadora, caraterizada pela habilidade para descobrir e esclarecer novos problemas, questões e fenómenos;

– Mente respeitadora, relativa à consciência e compreensão das diferenças entre humanos;

– Mente ética, ligada ao cumprimento das responsabilidades de cada um, enquanto profissional e cidadão.

 

1.3. Esboço de perfil teórico de competências para as ‘elites militares’

Depois da breve revisão, na secção anterior, importa agora sistematizar os aspetos chave para a edificação de um perfil teórico de competências destinado às ‘elites militares’. Antes, porém, começa-se por sublinhar que não parece prático nem sequer útil projetar, na primeira parte da carreira, um perfil de competências, na sua vertente transversal (soft skills) diferente entre militares da categoria de oficial e no âmbito de cada posto, independentemente de o seu potencial poder ser mais ou menos elevado. Parece mais correto e funcional estabelecer-se que o que distinguirá os militares, no início de carreira, será o nível de desempenho/realização quando as competências mobilizadas forem objeto de avaliação. Esta é a filosofia que está subjacente à matriz formativa militar nacional, considerada no âmbito de cada ramo, não obstante a maior ou menor especialização ao longo da carreira. É igualmente esta lógica que constitui a base para os sistemas de avaliação em vigor nos três ramos das FFAA portuguesas, os quais, a partir de 2015 (com a versão do EMFAR, de 29 de maio de 2015), passam a constituir um documento único, embora com uma parte transversal aos ramos e depois uma parte específica.

Quando se cotejam militares de patamares hierárquicos diferentes, é natural que algumas das solicitações e responsabilidades sejam também diferentes e, consequentemente, também a importância relativa (coeficientes) dos parâmetros de avaliação. Esta é a perspetiva que se encontra em muitos dos modelos de competências consultados, designadamente no modelo de liderança do Exército dos EUA (com referência às três dimensões-base): (1) a dimensão “ser/estar” é comum a todos os níveis de liderança (direta, organizacional e estratégica), constituindo um “pano de fundo” de natureza pessoal e sociocultural essencial ao exercício da liderança; (2) a dimensão “saber” faz variar as habilidades nos três níveis de liderança (apenas o elemento ”comunicar” das habilidades interpessoais se mantém comum aos três níveis); e (3) no que concerne à dimensão “fazer”, os elementos são os mesmos, embora a forma como são operacionalizados em cada nível possa variar conforme as responsabilidades.

A partir dos mais de 40 modelos de competências revistos, embora apenas uma minoria deles tenha sido apresentada neste artigo mercê das limitações de espaço a que estamos obrigados, foi elaborado um esboço macro, genérico, de referencial de competências para o exercício da liderança em contexto militar para o nível estratégico, o qual se apresenta na figura 10.

 

Figura 10 – Perfil macro de competências para o exercício da liderança eficaz em contexto militar – NÍVEL ESTRATÉGICO.

 

Este esboço, genérico, apresenta dois grandes grupos de competências – “SER/ESTAR” e “SABER e FAZER”, aos quais correspondem, depois, alguns clusters de competências: pessoais, emocionais e cognitivas, no primeiro grupo; interpessoais, conceptuais, de liderança e de gestão, no segundo grupo. As competências reportam-se a atividades concretas e têm subjacente uma dimensão ambiental onde elas são mobilizadas – o próprio contexto de atuação, visto como abstrato para qualquer situação-tipo, ou como específico quando se passa da perspetiva teórica deste referencial para uma situação concreta (e.g., situação de paz; situação de campanha) no desempenho de um cargo concreto. Serão as competências do primeiro grupo, que designamos de nível I, que servem de “iniciador” e primeiro suporte à manifestação das competências do segundo grupo (competências de nível II).

O Quadro 2, que de seguida se apresenta, identifica algumas das competências mais importantes dos clusters definidos no modelo da figura 10 para o exercício da liderança (formal) ao nível estratégico e em contexto militar. Estas competências e os respetivos clusters foram igualmente construídos a partir da análise dos vários modelos de competências revistos, a maioria dos quais se reporta ao contexto militar.

 

Quadro 2 – Clusters de competências do modelo

Grupo

Clusters

Categorias e Competências críticas

I

“SER/ESTAR”

Pessoais, Emocionais, Cognitivas.

II

“SABER E FAZER”

Interpessoais

Comunicação, Relação, Interculturalidade, Apoio.

Conceptuais

De Liderança

De Gestão

Visão Estratégica, Gestão da Mudança e da Complexidade, Resolução de Problemas e Tomada de Decisão, Gestão da Cultura Organizacional (“configurar a cultura organizacional”), Pensamento Crítico, Criatividade, Inovação, Gestão da Informação, Gestão do Tempo, Direção, Realização, Gestão de Recursos (humanos, materiais e financeiros).

 

O quadro seguinte (3) apresenta, a título de exemplo e de uma forma concreta, os indicadores comportamentais (descrição dos comportamentos e/ou as ações esperados) por parte dos líderes estratégicos, no exercício das suas funções, no âmbito de três competências críticas[17] do Grupo II – Competências Conceptuais, de Liderança e de Gestão.

 

Quadro 3 – Grupo das competências conceptuais, de liderança e de gestão

CLUSTER

COMPORTAMENTOS/ACÇÕES ADOPTADOS COMO REFERÊNCIA

Visão
estratégica

Demonstrar consciência situacional (senso da realidade) política, estratégica e militar; ter capacidade para interpretar o contexto externo e interno (social, cultural, tecnológico) de forma holística e para fazer um diagnóstico rápido; criar e difundir uma visão e uma estratégia organizacional para o futuro; participar na seleção e no desenvolvimento dos líderes do futuro.

Gestão da Mudança e da Complexidade

Ser capaz de gerir a informação de forma eficaz; Saber lidar com a incerteza; tolerar a ambiguidade; ter capacidade para aceitar e valorizar a diversidade; saber analisar e gerir o risco; liderar processos de mudança; pensar e agir com inovação e criatividade; ser capaz de descobrir e esclarecer novos problemas, questões e fenómenos; demonstrar capacidade de adaptação e flexibilidade.

Resolução de Problemas e Tomada de Decisão

Ter capacidade para planear e organizar em larga escala; conseguir lidar com várias tipologias de problemas em simultâneo; julgar e decidir de forma eficaz e ética; ser capaz de tomar decisões sob pressão do tempo e de conteúdo (criticidade dos assuntos); estar apto a tomar decisões com informação reduzida; ter facilidade em usar o processo decisório participativo, envolvendo os colaboradores; tomar decisões importantes ainda que impopulares, assumindo a responsabilidade; saber construir e manter alianças e consensos.

 

Para as restantes competências terá que ser feito um exercício do mesmo género, em relação aos respetivos comportamentos/ações adotados como referência.

Na sequência das revisões sucessivas, da condução de entrevistas, do tratamento automático da informação e das reflexões sistemáticas, poder-se-á, de uma forma simples e compreensível, resumir, em poucas linhas e de um modo menos formal (mas também tecnicamente menos aceitável), o que de mais importante deverá conter um perfil de competências dos militares de elevado potencial, com vista ao seu desempenho superior e à seleção para os postos de topo da hierarquia militar (nível estratégico). Propõe-se, para reflexão, o seguinte alinhamento (decálogo):

1) Capacidade de leitura e interpretação dos contextos externo e interno e dos seus principais movimentos e tendências;

2) Conhecimento integrado da organização (vulgo, “visão de helicóptero”) nas suas dimensões funcional, estrutural e filosófica (relativa à sua própria existência e continuidade);

3) Visão, capacidade para comunicar eficazmente em larga escala e envolver as pessoas;

4) Tolerância à ambiguidade, à incerteza, à complexidade e ao risco e atitude adequada para encarar a mudança como natural e necessária, entendendo-a como uma oportunidade, capaz de encorajar a inovação e a criatividade, sem colocar em risco os elementos core que caracterizam e distinguem a instituição militar de outras realidades e os recursos necessários à Missão institucional e ao normal funcionamento organizacional;

5) Orientação para a missão e para os resultados, tendendo para uma gestão de/por objetivos;

6) Capacidade para planear e organizar em larga escala, para lidar com várias tipologias de problemas em simultâneo e para tomar decisões com informação e tempo limitados;

7) Capacidade para gerir com eficácia competências críticas ao mais alto nível (recursos humanos) e orçamentos complexos e exíguos;

8) Confiança em si próprio para inspirar os outros com a sua atitude e exemplo, seguindo a convicção de John Adair (2005, p. 11)[18], em que a confiança é “…the gift that makes a person a sucessful leader of others (…), the most important, the only absolutely indispensable qualification.”;

9) Capacidade de autoanálise e reflexão e pré-disposição pessoal para o autodesenvolvimento, em todas as circunstâncias;

10) Orientação para criar as melhores condições de desenvolvimento de outros líderes, para o futuro, contribuindo para o seu crescimento profissional e humano.

 

Estes indicadores “comportamentais” são, como será analisado no ponto seguinte, um referencial material, quer para programar a seleção/identificação dos militares de elevado potencial quer, depois, para a construção e operacionalização do modelo formativo a aplicar aos futuros líderes de nível estratégico, na sua componente mais técnica da definição dos conteúdos programáticos e da determinação das metodologias mais adequadas no âmbito do processo de ensino-aprendizagem.

Revistos que foram alguns modelos de competências e identificadas as principais dimensões a privilegiar na construção do perfil teórico de competências para os militares de elevado potencial, em ordem a ocuparem os cargos de topo da organização, antes de se avançar para os pontos seguintes do artigo, importa ponderar em algumas particularidades (dados e pressupostos) que deverão ser salvaguardadas em relação ao contexto militar, de forma a garantirem um adequado planeamento e uma subsequente operacionalização do modelo com sucesso, em termos de consequências, designadamente em relação ao processo de identificação dos melhores talentos, ao referencial de formação e ao processo de gestão de competências como um todo. Estas particularidades prendem-se com aspetos como:

Matriz organizacional – marcadamente hierarquizada, caracterizadora das organizações militares, tem a sua génese e fundamentação na tipologia de missões e na sua consequente estruturação e funcionamento, aspetos que induzem um particular tipo de modelo de gestão de carreira e condicionam parcialmente (não inviabilizando) a adoção de uma formação por competências; tendo por sua vez reflexos na forma de gestão de recursos humanos (também por competências), admite-se que seja necessário mapear e instituir novos processos e preparar instrumentos auxiliares (e.g., bases de dados), adaptando/alterando práticas e rotinas no âmbito da gestão;

Gestão de paradoxos – não obstante a sua matriz organizacional ser conotada, algumas vezes, como uma estrutura pesada e pouco flexível ou pouco adaptável, as respostas que a organização militar tem dado em vários domínios da sua atividade parecem contrariar claramente esta perceção; no entanto, a necessidade de fazer face a contextos e situações concretas completamente distintos, muitas vezes em simultâneo, ou a partir de uma transição imediata entre situações padrão (paz, operações de apoio à paz, guerra), impõe às FFAA, no âmbito dos seus recursos humanos, não apenas conhecimento e saber fazer, fundados numa formação e num treino contínuo e sistemático, mas também uma atitude de grande disponibilidade para a mudança, flexibilidade mental e adaptabilidade em termos de procedimentos;

Identidade Institucional e importância do ‘saber ser’ – esta dimensão, em contexto militar, é essencial ao funcionamento organizacional e à operacionalização do conceito de “condição militar”, algo que está muito para além da grandeza individual e se encontra adstrito à génese da organização e à própria sobrevivência da ‘dimensão instituição’, regulando as relações intra e inter-grupos e para com a própria instituição, a partir de valores partilhados entre os seus membros e de efetivas práticas de referência;

Tipo de recrutamento para ingresso na organização militar – o ingresso na carreira militar acontece sempre pela base (não é possível recrutar generais diretamente do mercado de trabalho), o que conduz, necessária e obrigatoriamente, a um percurso formativo longo até que possam surgir elites militares ao nível de topo da organização;

Escola dentro da organização – é fundamental a existência de um alinhamento entre aquilo que são as necessidades funcionais concretas dos ramos das FFAA em termos de desempenho e os conteúdos programáticos das ações de formação/desenvolvimento ao longo do percurso profissional dos oficiais; estando a “escola” dentro da própria organização, esse alinhamento mais facilmente poderá ocorrer, sendo, por outro lado, menos tolerável a existência de disfunções graves – este alinhamento deverá ser feito numa lógica de competências, entre os perfis funcionais e os perfis ou referenciais formativos;

Deteção de talentos – dado o funcionamento da organização militar e o tipo de gestão de carreira que lhe está subjacente, a identificação de militares de elevado potencial poderá acontecer ao longo de todo o percurso profissional (sobretudo a partir do meio da carreira), embora possam/devam ser definidos/considerados pontos de decisão e momentos chave, designadamente aquando da transição entre alguns postos da categoria de oficial; este exercício, enquanto metodologia de deteção/identificação de talentos, deverá funcional como um verdadeiro “assessment centre” interno;

Base de recrutamento interno – aumentar o universo de seleção em relação às várias origens (ingressos na carreira de oficial) significa melhorar a possibilidade de detetar outros talentos, ao mesmo tempo que se aumenta a “democratização” dos processos de gestão de pessoas com benefícios para a organização; isto é substancialmente diferente de definir, à partida, quais as origens socioprofissionais que poderão ascender ao topo da hierarquia organizacional, o que corresponde, no limite, a estabelecer antecipadamente, por decreto, quais serão os militares de elevado potencial e quem integrará as elites militares, independentemente de uma avaliação com base em provas ao longo da carreira militar (meritocracia); esta aceção disfuncional será tanto mais verdadeira quanto mais estreita for à partida a base de recrutamento sobre a qual incidirá a seleção;

Retenção de talentos – para além da identificação e desenvolvimento de talentos no seio da organização é importante prever a sua retenção por um período mínimo que possa salvaguardar o retorno do investimento na sua formação e capacitação geral; tratando-se de carreiras organizacionais, mais tradicionais (de acordo com as teorias e modelos de carreira), admite-se, no entanto, que o vínculo seja mais prolongado que este tempo mínimo, existindo, subjacente entre as partes, um género de “contrato psicológico” (que precisa de ser constantemente alimentado) que deverá ajudar a prolongar esse vínculo;

Teoria da meritocracia – desde 1991, que os ramos das FFAA têm um sistema formal de avaliação do mérito, sendo regulamentarmente diferente para os três ramos, embora os objetivos sejam, na generalidade, muito próximos; a imposição legal, muito recente (com a aprovação do novo estatuto de carreira, em 29 de maio de 2015), da construção de um sistema de avaliação comum, poderá criar-se a oportunidade de construção de um instrumento moderno, de gestão baseada nas competências, admitindo-se igualmente a possibilidade de ser incorporada a necessidade de uma gestão diferenciada a partir de um determinado momento da carreira, permitindo, desta forma, uma maior personalização da gestão (passagem de um tipo de gestão de carreira para uma gestão de percursos profissionais) e, por outro, ponderar-se a questão dos militares de mais elevado potencial.

 

 

2. Identificação/reconhecimento de militares de elevado potencial

Antes de a organização militar ter preocupações concretas em relação ao desenvolvimento dos militares de elevado potencial, a sua ação deverá, primeiro, dirigir-se para a deteção/identificação dos melhores talentos, respondendo às perguntas formuladas inicialmente que constituem o segundo grupo de questões e que aqui se recuperam.

– Como identificar os militares com um potencial francamente acima da média e que tipo de referencial deverá servir para a avaliação desse potencial?

Em que momento do percurso profissional se revelam e/ou a partir de que altura devem ser procurados?

Que utilidade se reconhece aos atuais instrumentos de avaliação e de desenvolvimento de carreira para esta identificação?

Por seu turno, para que esses talentos possam ser reconhecidos, terá que haver um perfil, previamente definido e o mais claro possível, a partir do qual possam fazer-se as necessárias comparações. Ou seja, tudo começa pelo início e, neste caso, tal como noutros, também o início é o perfil de competências, reflexão apresentada no ponto anterior.

Nestes termos, o “recrutamento”[19] e a seleção de talentos, por identificação/deteção de entre os militares que já pertencem à organização é, assim, um processo que se apoia na comparação entre um perfil previamente definido (podendo ser o referido perfil de competências, adaptado, ou uma matriz específica, de construção e aplicação mais ou menos complexa)[20], que serve de referência e de medida, e o perfil dos “candidatos a talento”, estimando-se o gap entre os dois perfis. Esta avaliação deve ter em atenção algumas preocupações: pretende-se que seja sistemática e confirmatória, ocorrendo durante um lapso de tempo mais ou menos alargado, de modo a distinguir formas de atuação consistentes[21] de comportamentos contingentes ou ocasionais. Por isso, ainda que possa existir a tendência, ou mesmo a tentação, de o processo ser feito por intuição, nada melhor do que recorrer a um standard, a ter em conta na referida comparação, ainda que seja de “banda larga”, devendo estar relativamente bem definido em termos de critérios, de parâmetros, de metas e de indicadores.

Ainda no que concerne ao modus operandi e aos momentos de avaliação, julga-se que as avaliações deverão ocorrer apenas a partir da altura em que se considere que os militares começam a ter já alguma maturidade e experiência profissional, para o que se sugere, como primeiro momento, nunca antes do posto de 1º tenente/capitão[22]. Considera-se que é a partir da transição deste posto para o seguinte que deverão ser procurados os militares de mais elevado potencial, sendo que, à medida que aumenta a complexidade e a responsabilidade dos cargos, que vão sendo assumidos ao longo do percurso profissional, essa avaliação tende a ser mais fidedigna e, portanto, tendencialmente também mais frequente. Na figura 11 sugerem-se vários momentos de avaliação, tornando-se mais frequentes à medida que o militar vai progredindo na carreira. Mas, como poderá ser observado na figura, são sobretudo os cargos de comando e chefia que constituem os momentos privilegiados para que esta avaliação ocorra, sendo a sua justificação fundada nas referidas complexidade e responsabilidade crescentes bem como na grande exposição a que o militar está sujeito nestas alturas e ainda no peso que esta avaliação tem tradicionalmente no seu percurso profissional. Para além disso, o oficial das FFAA é, na sua versão mais tradicional, um comandante, diretor ou chefe; um líder de corpo inteiro e não apenas formal – é este arquétipo que deverá continuar a servir de referência na procura e desenvolvimento dos líderes do futuro e das elites militares.

À medida que vão existindo vários momentos de avaliação (preferencialmente acompanhados e com aconselhamento de carreira), melhora a perceção sobre os militares que mais se destacam, sendo importante verificar se o critério da consistência/estabilidade em relação ao valor da avaliação se manifesta ou se, pelo contrário, as (eventuais) excelentes apreciações são meramente esporádicas, alternando com avaliações perfeitamente comuns. Poderá igualmente acontecer que o “talento” se manifesta mais tarde, pelo que importa que os ramos estejam atentos, não apenas em seguir os militares identificados desde o primeiro momento; o processo de identificação/seleção deverá, por isso, prever que outros “talentos” possam ser apenas detetados numa fase posterior.

 

Figura 11 – Pontos de decisão para a identificação de militares de elevado potencial – NÍVEL ESTRATÉGICO.

 

Quanto ao instrumento formal de avaliação, em si mesmo (e.g., regulamento ou outro normativo), que apoiará a identificação formal dos militares de elevado potencial no sentido em que foi anteriormente definido – detenção de competências críticas – haverá que perceber até onde os instrumentos existentes, designadamente os sistemas de avaliação em vigor e que estão a ser utilizados atualmente pelos ramos, poderão ajudar neste exercício. Sobre este assunto, deixamos também aqui a nossa opinião, considerando que os modelos de avaliação do mérito, atualmente em vigor, não obstante o seu valor e utilidade em outras áreas, têm algumas limitações para avaliar e identificar militares de elevado potencial com vista ao nível estratégico (em relação ao modelo de competências referido), uma vez que, em termos gerais, eles foram construídos, sobretudo, para servirem os cargos e funções adstritos ao nível tático e, pontualmente, ao nível operacional[23]. Por outro lado, não foram construídos exatamente numa lógica de competências, nem sequer numa lógica suficientemente distintiva de responsabilidades crescentes e de tipologias de cargos, pelo que, ainda que possam servir como uma primeira referência para o trabalho de revisão/reconstrução, terão que ser reformulados. Portanto, à pergunta “Que utilidade se reconhece aos atuais instrumentos de avaliação e de desenvolvimento de carreira?”, para este efeito, a resposta é: “utilidade muito limitada”[24].

Num outro sentido, a referência que for definida para a identificação e seleção de militares de elevado potencial, com vista ao nível estratégico, deverá ser coerente com a componente do modelo de formação e de desenvolvimento que depois vier a ser aplicado em contexto de trabalho (dimensão prática), na medida em que, muitas das dimensões a desenvolver serão as mesmas que se procuram avaliar/detetar na seleção, devendo, por isso, ser consideradas como mais importantes ou críticas.

Meramente a título de exemplo, resultante da reflexão neste ponto, deixa-se um esboço onde se alinham competências e critérios que se considera importante que sejam incluídos na construção de um modelo de deteção e avaliação do potencial dos militares “candidatos” ao nível estratégico da organização.

 

Quadro 4 – Competências e critérios para avaliação de militares de elevado potencial

Consciência Situacional

Perspetiva e entendimento global do mundo e dos contextos específicos onde se situa/move; autoconsciência cultural.

Eficácia Conceptual

Visão e sentido estratégico; capacidade de síntese; conhecimento profissional; sentido de comando/direção/chefia e gestão.

Eficácia Operacional

Eficácia geral; oportunidade/rapidez de atuação; decisão; controlo de gestão.

Eficácia Interpessoal

Direção de equipas; capacidade de negociação; mediação e conflito; influência e ascendente pessoal; dotes oratórios.

Eficácia Intrapessoal

Motivação para a realização; ambição; interesse profissional; controlo emocional; autodesenvolvimento.

Fonte: adaptado de Mário Ceitil (2007, p. 236)[25]

 

Às competências elementares apresentadas no Quadro 4 são acrescentadas outras nos pontos seguintes, devendo ainda ser cotejadas com os conteúdos dos quadros anteriores.

Considera-se que nestes dois primeiros pontos (capítulos) do artigo ficaram exemplos suficientes, uns mais, outros menos sistematizados, a partir do que será possível construir um adequado instrumento que permita, não só reconhecer/identificar os militares de mais elevado potencial, como também avaliá-los ao longo do seu percurso profissional.

 

 

3. Matriz de formação e desenvolvimento de elites militares – algumas considerações

“There are not bad strategic leaders, only bad teachers of leadership. (…) Most strategic leaders fall short of the generic role’s requirements not out of ill will, nor because they lack the potential, but because they are simply ignorant of their leadership role. No one has ever taught them.

(John Adair, 2005: 150)

“…espera-se agora que os militares sejam competentes, não apenas a combater o inimigo, mas também a gerirem conflitos entre cidadãos e clientes num contexto supranacional”.

(Jesuíno, 2000)

Após ter-se refletido sobre os modelos de competências para os militares de elevado potencial e para os líderes de topo da organização militar e terem-se apresentado alguns subsídios para a identificação e avaliação de potenciais candidatos a esse patamar, importa, de seguida, tecer algumas considerações sobre aspetos a ter em atenção na construção de um modelo teórico que apoie a sua formação e desenvolvimento nas perspetivas individual e institucional.

Foi assinalado, anteriormente, que deverá haver uma ligação direta e consequente entre os contextos de atuação, os perfis de competências e os perfis ou modelos de formação. Partindo do pressuposto de que as competências críticas identificadas são as necessárias para lidar com as diversas solicitações e exigências dos vários contextos de atuação em que os militares são chamados a intervir, é necessário, agora, garantir que o modelo de desenvolvimento esteja alinhado com o perfil de competências previamente definido e aplicável aos militares de maior potencial. Este é, estamos conscientes, o primeiro requisito e, também, um dos mais importantes, porque dele dependerá a eficácia do subsistema de formação e desenvolvimento e da operacionalização do modelo global que vier a ser considerado.

Definido que foi o perfil teórico de competências de um militar de elevado potencial, importa agora perceber como deverá ser planeada a sua formação e desenvolvimento ao longo do percurso profissional, respondendo, desta forma, ao terceiro conjunto de perguntas suscitadas inicialmente, o que nos remete para uma matriz formativa concreta e para cuidados particulares:

– Até onde é possível e aconselhável que os militares de elevado potencial sejam sujeitos a ações de formação e desenvolvimento específicas, em contextos particulares, parcialmente diferenciadas dos outros militares?

– Que tipo de referencial de formação deve ser aplicado aos militares com elevado potencial, no sentido da construção das futuras elites militares? Que competências críticas deverão ser criadas e/ou desenvolvidas e que metodologias formativas deverão ser equacionadas?

– Que outras preocupações específicas de desenvolvimento existem em relação às elites militares efetivas?

À semelhança do que foi feito no tópico anterior, começa por fazer-se uma muito breve revisão de literatura, analisando alguns dos pontos mais salientes sobre os quais se deve centrar o debate atual em relação a esta temática, quer em contexto militar, quer num âmbito mais alargado.

Bolt (1997)[26], analisando vários aspetos do atual paradigma de desenvolvimento das chefias nas organizações em geral, faz uma crítica de tipo concetual, que se resume da seguinte forma:

– Considera que a capacidade de liderança não se adquire de uma forma rápida, como quem toma uma receita, antes, terá que ser conseguida por etapas, sob pena de o desenvolvimento não ser equilibrado;

– Critica a tentação de serem desenvolvidas habilidades de liderança através de ações isoladas, postulando, em sentido contrário, que o treino deverá ser contínuo, integrado e de longo prazo;

– Relativamente ao desenvolvimento e à aprendizagem da liderança no exercício de funções, Bolt apresenta igualmente uma perspetiva crítica, designadamente quando se dedica toda a carreira a uma única área funcional, considerando que este tipo de experiências favorece, sobretudo, a aquisição de habilidades de gestão e apenas marginalmente as habilidades de liderança; alega ainda que esta experiência até poderá produzir executivos talentosos, mas acontecerá sempre numa perspetiva técnico-profissional limitada, conduzindo, na expressão do autor, à criação de “executivos unidimensionais”, caracterizados frequentemente por aversão ao risco e com dificuldades em tomar decisões;

– Critica, depois, mais em concreto, os treinos genéricos, desfasados dos problemas reais do Mundo atual, sendo que, como contraponto, sugere a diversidade de experiências e sobretudo a experiência externa, fora do país.

Adair (2005) aborda igualmente a questão da importância da experiência, e fá-lo, até certo ponto, contrariando Kurt Lewin (“não há nada mais prático que uma boa teoria”), porque é a experiência, considera, que conduz ao verdadeiro desenvolvimento profissional. Porém, John Adair reconhece também que, se a experiência não for de qualidade, poderá ter um efeito inverso. Da mesma forma, se, sobre a experiência, não houver capacidade de reflexão, com sentido crítico, sobre a própria atuação, igualmente de pouco servirá dado que a aprendizagem será sempre muito limitada.

Se, na sequência das apreciações críticas de Bolt e de Adair, for analisado (revisto) o atual modelo de desenvolvimento dos militares de carreira das FFAA portuguesas, sobretudo na categoria de Oficial (embora nem sempre explícito), tender-se-á a considerá-lo, na generalidade, como respondendo de forma muito positiva às críticas de Bolt, parecendo, inclusivamente, antecipá-las; senão veja-se:

– Trata-se de um modelo holístico, de desenvolvimento faseado e de longo prazo, projetado ao longo da carreira;

– Integra a formação formal e a aquisição de experiências no desempenho de funções concretas, ocorrendo o desenvolvimento de liderança (se se quiser, de comando, direção e chefia) ao longo do percurso profissional, a partir de diferentes tipologias de funções, no âmbito de cada patamar e em patamares sucessivos de crescente complexidade e responsabilidade;

– Contempla o desempenho funcional, em contexto interno e externo à estrutura orgânica dos ramos e das próprias FFAA, dentro e fora do território nacional, o que foi reforçado com o reforço da participação nas “novas missões” (e.g., apoio à paz; resposta a crises; humanitárias);

– O exercício da profissão militar envolve a gestão de situações de alguma incerteza e de risco efetivo ou pelo menos potencial, sobretudo em campanha, onde a capacidade de tomada de decisão e de ação oportuna é crucial, quer para a obtenção de resultados concretos quer para a sobrevivência e sustentação das forças militares.

Embora exista um alinhamento muito interessante entre o que preconizam Bolt e Adair e a conceção e operacionalização do atual modelo de desenvolvimento em contexto militar nacional ao nível tático e operacional (em correspondência com as solicitações que para cada caso se colocam aos militares), importa perceber se o mesmo acontece, com igual intensidade, em relação às lideranças de nível estratégico, a que tem acesso somente uma minoria de militares. O que leva a colocar outras duas questões, muito concretas e subsidiárias: (1) a formação formal e o desenvolvimento profissional em contextos concretos, obtidos até ao nível operacional, são condição suficiente para garantirem o sucesso no nível estratégico (?); e (2) que áreas preferenciais devem ser objeto de desenvolvimento face às exigências distintas que se colocam neste terceiro nível?

Dadas as características da organização militar e o tipo de gestão de carreira que lhe serve de “pano de fundo”, considera-se que a matriz formativa a aplicar aos militares de mais elevado potencial para acederem ao topo da organização se apoiará, necessariamente, no modelo de formação e desenvolvimento a que foram sujeitos os militares nos níveis tático e operacional. O que significa que a formação anterior é necessária e essencial, mas não é condição suficiente para o sucesso dos líderes militares no nível estratégico. Até porque muitas das competências identificadas anteriormente para o nível estratégico são apenas desenvolvidas pontualmente nos dois níveis anteriores, dependendo muito das experiências profissionais individuais.

Como resposta às competências críticas identificadas anteriormente, salvaguardando qualquer alteração à atual estrutura concetual de suporte, apresenta-se, a título de exemplo, um esboço (quadro 5) que relaciona as competências a desenvolver com as estratégias de formação e as metodologias de intervenção, cujo objetivo principal é, mais uma vez, suscitar o debate em torno das questões formuladas e constituir uma base para a resolução da questão que está aqui subjacente.

 

Quadro 5 – Metodologias de intervenção e estratégias formativas versus competências a desenvolver

Metodologias de intervenção

Estratégias formativas

Competências a desenvolver

Aulas; Apresentações; Palestras

Expositiva

Conhecimento geral e específico; Conhecimento profissional; Consciência situacional.

Seminários; Simpósios; Painéis; Workshops

Apresentação e Debate

Planeamento e Organização; Consciência situacional; Visão e sentido estratégico; Comunicação escrita e oral; Resolução de Problemas; Gestão da informação; Capacidade de síntese; Autodesenvolvimento.

Pesquisa – preparação – exposição – debate/crítica – conclusões

Discussão Dirigida

Planeamento e Organização; Pensamento Crítico; Criatividade; Inovação; Capacidade de síntese; Comunicação escrita e oral; Controlo emocional; autodesenvolvimento.

Pesquisa/Investigação – planeamento e organização – experimentação/trabalho de campo – elaboração de relatório – prestação de provas públicas

Investigação, Apresentação e Debate

Planeamento e organização; Pensamento Crítico; Pensamento Sistémico; Resolução de Problemas; Capacidade de análise e de síntese; Inovação e criatividade; Gestão da informação; Comunicação escrita e oral; Autodesenvolvimento.

Educação à distância, via internet

E-learning e B-learning

Conhecimento geral e específico; Conhecimento profissional; Planeamento e Organização; Comunicação escrita; Resolução de Problemas; Capacidade de análise e de síntese.

Exercícios CPX; Jogo Tempo; Estudos de Caso

Simulações

Estratégia; Gestão do tempo; Análise e gestão do risco; Resolução de Problemas; Tomada de Decisão; Gestão da informação; Gestão da Mudança e da Complexidade; Capacidade de análise e de síntese.

Observação de Modelos – crítica – prática

Modelação

Identidade e cultura organizacional; Capacidade de análise e crítica; Autodesenvolvimento.

Visitas de estudo; Grupos de investigação e de reflexão; Representações externas; Participação em conferências, painéis e seminários externos

Experiências de campo

Visão e sentido estratégico; Identidade e cultura organizacional; Pensamento Sistémico; Resolução de Problemas; Interculturalidade (consciência cultural); Pensamento Crítico; Criatividade; Inovação; Controlo emocional; Comunicação escrita e oral; Autodesenvolvimento.

Exercício de Cargos de Comando/Chefia; Missões no exterior do TN em ambiente conjunto, combinado e multicultural

Formação em contexto de trabalho (on-the-job training)

Conhecimento profissional geral; Visão e sentido estratégico; Identidade e cultura organizacional; Pensamento Sistémico; Gestão do tempo; Delegação de Competências; Gestão da informação; Tomada de Decisão; Tolerância à incerteza e à ambiguidade; Criatividade; Inovação; Análise e gestão do risco; Resolução de Problemas; Adaptação e flexibilidade; Sentido de direção e controlo de gestão; Interculturalidade (consciência cultural); Controlo emocional; Autodesenvolvimento.

Coaching executivo (ações pessoais e dedicadas a áreas muito concretas que suscitem maior dificuldade); Mentoring

Formação específica

Várias (e.g., Gestão do tempo; Delegação de Competências; Decisão; Capacidade de negociação; Mediação e conflito; Gestão da informação; Resolução de Problemas; Controlo emocional; Pensamento Crítico; Inovação; Pensamento Sistémico).

 

Embora se admita que o leitor mais experimentado e familiarizado com este tipo de terminologia possa não concordar, pontualmente, com o alinhamento apresentado no quadro anterior (por omissão ou por excesso), o exercício que se solicita, neste momento, é outro, sistematizado na seguinte pergunta: Partindo do pressuposto de que o leitor se revê em relação à grande maioria das competências descritas, para aplicação ao nível estratégico da organização militar (ou de uma outra organização em abstrato), em que circunstâncias os planos de formação respetivos comtemplam, explicitamente, estas competências e as mesmas estão associadas a objetivos concretos a atingir com a formação? O desafio é simples: não basta considerar que um dado modelo de formação/desenvolvimento profissional é eficaz na sua generalidade (a partir de uma avaliação global dos resultados alcançados), é necessário explicitar o modelo ao mais ínfimo pormenor, porque só desta forma é possível torná-lo consequente em todas as suas dimensões.

Definidas as áreas preferenciais a desenvolver e as formas de intervenção, devem, depois ser escolhidos os conteúdos concretos que terão que ser introduzidos e pormenorizados os contextos formativos. Estando em causa o desenvolvimento de competências muito específicas (embora, simultaneamente, sejam, na sua maioria, consideradas transversais ao mesmo patamar hierárquico), a este nível, não parece ser suficiente recorrer exclusivamente à formação tradicional, surgindo, supletivamente, outras metodologias de intervenção menos cartesianas, como é visível no quadro 5 (meramente a título de exemplo).

Num outro registo e no que concerne à terminologia a utilizar, Adair (2005) reconhece que, quando se trata de quadros de topo das organizações, os termos ‘curso’ e ‘treino’ deverão ser substituídos, com vantagem, respetivamente, por ‘seminários’ ou ‘conferências’ e ‘desenvolvimento’. Esta terminologia parece socialmente mais aceitável, designadamente perante colaboradores e entre pares ao mais alto nível, embora se admita que, em substância, seja uma falsa questão ou, pelo menos, uma questão de relevância limitada. Surgem, assim, em contexto militar nacional, termos como: ‘seminário de harmonização’ e ‘workshop’ (em vez de ação de formação); ‘auditor’ (versus aluno ou discente); entre muitos outros. O que importa, verdadeiramente, e o que está em causa, é garantir a adesão das pessoas e fazê-las entender que os conteúdos e as respetivas reflexões sobre os mesmos terão efeitos muito positivos no desempenho profissional futuro.

Um outro aspeto sobre o qual haverá que refletir diz respeito à profundidade da formação/desenvolvimento, devendo ser assumido, concetualmente, cada vez mais, uma “ação por medida”, consoante as necessidades efetivas, o que implica uma avaliação prévia dos principais gaps de competências de cada militar em relação ao respetivo referencial e, consequentemente, uma intervenção adequada, preferencialmente diferenciada de outros militares cujas necessidades sejam também substancialmente diferentes. Uma outra alternativa poderá passar por ações de desenvolvimento conjunto, orientadas para a partilha de conhecimentos e experiências em grupo, com benefícios para todos os intervenientes, admitindo-se redundâncias (caso sejam estritamente necessárias) para alguns dos intervenientes. A decisão que sobre esta questão vier a ser tomada influenciará, posteriormente, os contornos da sua intervenção no terreno.

Uma das marcas distintivas do contexto militar, extensível a outras realidades, é a aplicabilidade do modelo de gestão de carreiras de Schein (1978)[27], o qual reflete, explicitamente, uma perspetiva tridimensional de progressão profissional. Para além da tradicional mobilidade vertical (progressão por promoção), Edgar Schein refere-se a movimentos em direção ao “centro” de influência organizacional e a um deslocamento horizontal caraterizado por uma mobilidade interfuncional (figura 12).

 

Fonte: Adaptado de Schein (1978, p. 39)

Figura 12 – Modelo de carreira para o contexto militar.

 

A conjugação entre estas três dimensões de carreira, traduzidas em processo de formação profissional, corresponde a uma formação híbrida em contexto de trabalho vulgarmente designada por desenvolvimento “em espiral” ascendente (helicoidal), a partir da ocupação de cargos e do desempenho de funções diferenciados em cada patamar hierárquico e entre patamares sucessivos. Este tipo de desenho de desenvolvimento de carreira é reconhecido e defendido por muitos militares dos ramos das FFAA portuguesas, particularmente em relação ao Exército, dado o tipo de missões e, sobretudo, por materializar a melhor solução para o desenvolvimento das lideranças de topo da organização militar. Só uma perspetiva híbrida de mobilidade interfuncional durante o percurso profissional permitirá obter uma visão integrada e sistémica da organização militar, preparando os oficiais para os cargos de maior responsabilidade. Este modelo deverá ser aplicado, sobretudo, aos militares de elevado potencial, não obstante possa ser utilizado para a gestão do desenvolvimento de carreira da generalidade dos militares[28].

 

 

4. Gestão de competências aplicada aos militares de elevado potencial

“If you are in the top strategic leadership role in an organization, you own the problem of selecting and developing the business leaders it needs, not just for today but also for tomorrow.”

(Adair, 2005, p. 160)

“A gestão por competências dá um maior destaque à competência tanto na selecção dos colaboradores como no planeamento da estratégia organizacional, proporcionando [às organizações] maior produtividade, a criação de um ambiente participativo e motivador, a orientação para os resultados, maior competitividade, equipas e gestores mais comprometidos e fortes (…).”

(Ceitil, 2007, p. 116)

 

Uma última questão a que haverá que responder, para fechar o circuito e concluir a reflexão em torno da formação e desenvolvimento das elites militares, refere-se ao tipo de gestão que deve ser posta em prática tendo como motivo de intervenção os militares de elevado potencial e as próprias elites militares, e que se preconiza que seja por competências.

– Que tipo de gestão deverá ser posta em prática em relação aos militares de elevado potencial e às futuras elites militares?

– Quais as razões que poderão justificar uma gestão diferenciada em relação aos restantes militares?

– Que entidades deverão participar nesta gestão e que responsabilidades caberão a cada uma?

Antes de responder a estas questões é necessário circunscrever o âmbito do conceito de gestão de competências (anteriormente apresentado) para efeitos desta reflexão. Será considerado o sentido mais amplo do conceito, abrangendo todo o processo de gestão de recursos humanos, por competências, resumido na figura 13 e alicerçado em quatro perspetivas diferentes e complementares – obtenção, desenvolvimento, avaliação e carreira – as quais, por sua vez, têm como tema central orientador os perfis de competências. Este é um modelo integrado das várias dimensões discutidas neste artigo em torno do desenvolvimento das elites militares.

 

Fonte: Elaborado pelo autor

Figura 13 – Modelo Integrado de Gestão de Recursos Humanos por Competências.

 

Este modelo integrado de gestão, agora sugerido, é operacionalizado por intermédio de fluxos, processos e instrumentos específicos de gestão de recursos humanos, os quais permitirão um balanceamento equilibrado entre as várias perspetivas. As componentes transversais e específicas do perfil de competências cruzam-se com as perspetivas funcional e comportamental, sendo concretizadas e aferidas a partir de atividades e tarefas concretas – este é, metodologicamente, o ponto central de uma adequada gestão de recursos humanos por competências. Todos os processos de recursos humanos e as respetivas práticas deverão girar à volta desta conceção.

A determinação de necessidades de recursos humanos (perspetiva da obtenção), no caso particular deste artigo, a identificação de militares de elevado potencial com vista a ocuparem os cargos mais elevados da organização, ao nível estratégico, o seu desenvolvimento profissional (perspetiva do desenvolvimento), as colocações e rotações nos cargos e funções, e as promoções (perspetiva da carreira) são, assim, realizadas numa ótica de gestão de e por competências, preferencialmente integrada numa lógica de gestão por objetivos.

De acordo com os objetivos estratégicos e operacionais, e para cada subsistema – obtenção, desenvolvimento, avaliação e carreira –, deverá, depois, ser definida a respetiva lista de boas práticas a seguir. Para além disso, na linha do preconizado por Ceitil (2007, p. 179), é importante perceber que a operacionalização de um “programa de gestão de talentos” implica a adesão a um processo de mudança organizacional, cujos “fatores críticos de sucesso” a garantir serão:

– Empenhamento da gestão de topo, conduzindo a uma perceção de ‘prioridade’;

– Reforço da cultura de exigência e de aceitação do reconhecimento dos melhores desempenhos;

– Partilha de informação, comunicando de forma aberta;

– Eventual disponibilidade de mais recursos, essencialmente numa fase de arranque.

A opção por um tipo de gestão diferenciada em relação aos restantes militares, em coerência com os fundamentos anteriormente apresentados, parece justificar-se, em primeira instância, pela natureza do próprio modelo de formação e desenvolvimento já definido para os militares, admitindo-se como natural uma utilização dos melhores talentos em cargos e funções mais desafiantes e de maior responsabilidade organizacional – esta opção permitirá ainda reforçar e complementar adequadamente a formação destes militares e, com maior probabilidade, obter melhores desempenhos individuais e, consequentemente, também resultados organizacionais superiores. Depois, a gestão diferenciada permitirá, mais facilmente, confirmar, de facto, ao longo da carreira (em vários momentos e funções distintas), se o ‘elevado’ potencial é real e transversal a vários cargos (se existe um valor elevado e consistente) ou se foi meramente pontual no desempenho de um cargo muito concreto – o que significa que esta possibilidade funciona igualmente como um mecanismo de autorregulação da própria gestão, nas diferentes perspetivas anteriormente enunciadas. Por último, é necessário salvaguardar a “permeabilidade” do modelo, de forma a permitir a entrada de novos militares, cujo potencial apenas foi (será) revelado mais tarde, bem como a saída de outros, que se tenham mostrado desmotivados e/ou cujos desempenhos posteriores tenham refletido baixas performances ou lacunas pouco admissíveis. Esta “propriedade” do modelo é essencial à sua credibilização, transparência e retorno institucional. Tal como noutras organizações, está em causa a identificação e o aproveitamento dos melhores elementos e, naturalmente, a obtenção dos melhores proveitos para a Instituição Militar.

Entretanto, importa notar que, parcialmente e de forma implícita, esta diferenciação na gestão de recursos humanos já existe nos ramos das FFAA portuguesas, pela aplicação dos respetivos sistemas de avaliação de mérito (absoluto e relativo), quer para efeitos de progressão na carreira quer de seleção para a atribuição de alguns cargos, dentro e fora da estrutura orgânica dos ramos e das FFAA. Porém, a questão central é que esta gestão não é feita, de uma forma integrada, com base em competências, nem tão pouco foi ainda assumido, de um modo suficientemente explícito, a necessidade de constituir, para efeitos de gestão, separadamente, um grupo de militares de maior talento e potencial.

Para que este passo seja dado sem sobressaltos, e possam ser realizadas as potenciais vantagens, algumas delas já referidas, é necessário analisar, como contraponto, o eventual impacto negativo que tal medida poderá acarretar, prevenindo efeitos contrários ao que realmente se pretende, sob pena de as desvantagens suplantarem as vantagens, designadamente, a nível institucional ou socioprofissional. Entretanto, para ajudar a perceber qual deverá ser o caminho a seguir, é necessário esclarecer alguns aspetos chave:

– Qualquer gestão por competências induz, intrinsecamente, este tipo de diferenciação, embora os seus limites e efeitos devam ser previstos e/ou modelados pela organização;

– Por sua vez, a diferenciação deverá ser cruzada com o sistema de gestão de carreiras e/ou percursos profissionais existentes de cada ramo (se e até onde for necessário este ser reformulado), ou seja, a identificação dos talentos poderá acontecer em cada tipologia de carreira e a sua gestão poderá permitir, pontualmente ou de forma generalizada, transições inter-carreiras; ou, em alternativa, considerar a carreira militar, no âmbito da categoria de oficial, como um todo, optando por avaliações de pormenor em determinados pontos de decisão transversais ao longo do percurso profissional;

– Em qualquer dos casos, as decisões devem ser participadas e personalizadas, com apoio de aconselhamento organizacional; consequentemente, admite-se que um militar de elevado potencial não tenha, necessariamente, que integrar, no futuro, o grupo das elites militares – o que importa, no âmbito da gestão por competências, é detetar o mais cedo possível os melhores talentos e encaminhá-los para a(s) área(s) de maior qualificação e conforto e, consequentemente, para a tipologia de carreira mais adequada profissionalmente.

Admitindo como possível e desejável esta diferenciação ao nível da gestão, importa, ainda, apontar quem deverá (ou poderá) ser envolvido na gestão de competências (enquanto processo ou sistema), definindo, para o efeito, as correspondentes responsabilidades. Em primeiro lugar, considera-se que a definição do modelo concetual, bem como a sua pilotagem e regulação, deverão ser centralizadas num número muito reduzido de militares, sob as diretas orientações (eventualmente delegadas) do respetivo Chefe de Estado-Maior do ramo. No entanto, outras entidades deverão participar no apoio à gestão dos diversos subsistemas integrantes, designadamente na identificação/deteção dos melhores talentos, na avaliação do seu potencial e, posteriormente, participarem também no acompanhamento da sua formação e desenvolvimento de carreira, com base em referenciais previamente elaborados.

Não se trata, portanto, de avaliar meramente os desempenhos nos cargos, mas de perspetivar o potencial para efeitos de ocupação de cargos futuros cujos perfis mais se adequam aos perfis dos ‘candidatos’, quer para o desempenho de funções ao longo do percurso profissional quer, posteriormente, para a ocupação de cargos de maior complexidade e responsabilidade no topo da hierarquia. Poderão ser envolvidos outros militares, com responsabilidades de chefia ao nível das unidades, estabelecimentos e órgãos (U/E/O) dos ramos, por serem quem mais de perto pode avaliar, aconselhar e apoiar o seu desenvolvimento. Supletivamente, poderá existir um mentor de carreira para um conjunto limitado de oficiais, à semelhança de modelos de FFAA de outros países. O papel concreto destes elementos e a sua relação com o órgão central de gestão[29] são outros aspetos que terão que ser bem definidos e regulados[30].

A finalizar, deixa-se ainda uma breve súmula do que poderão ser algumas vantagens da gestão de recursos humanos por competências (adaptado e aumentado, a partir de Ceitil, 2007, pp. 116-118):

– Dá um maior destaque à competência, quer ao nível da seleção das pessoas quer do planeamento da estratégia organizacional para a área da GRH;

– Induz a uma maior produtividade e orientação para os resultados, onde os esforços deverão ser sobretudo centrados;

– Ajuda a proporcionar a criação de um ambiente social mais motivador e conduz a um maior envolvimento e compromisso das equipas e das chefias;

– Exige uma maior ligação e alinhamento entre sistemas formativos e necessidades funcionais concretas;

– Proporciona uma melhor compatibilidade entre os requisitos dos cargos/funções e os perfis de competências dos indivíduos;

– Facilita a análise e proporciona uma melhor gestão ao nível da mobilidade funcional e geográfica dos indivíduos e, consequentemente, melhora o apoio ao subsistema de desenvolvimento profissional na vertente da formação em contexto de trabalho;

– Proporciona aos militares uma adaptação mais fácil à heterogeneidade da organização, quer em termos de tipologias de cargos quer de contextos de atuação;

– Permite respostas adequadas à função certificadora, interna e/ou externamente considerada;

– Facilita a construção dos instrumentos de avaliação e a operacionalização desta função (sobretudo na vertente desempenho), na medida em que assenta essencialmente em comportamentos observáveis;

– Permite detetar mais facilmente os pontos fortes e os pontos fracos (gaps de competências) dos indivíduos e, consequentemente, programar com maior propriedade os planos de formação e desenvolvimento;

– Facilita a ação integrada da gestão de recursos humanos ao nível dos diferentes subsistemas de gestão;

– Permite aumentar a eficácia e a eficiência da gestão de recursos humanos como um todo, desde o planeamento à execução.

 

 

Corolário

Ficou explícito anteriormente que a “criação” de elites militares se traduz num processo longo, abrangente e variado, que começa com a deteção dos melhores talentos e termina com a certificação do desenvolvimento global e preparação específica para o nível da liderança estratégica, este inscrito no topo da organização. A perspetiva da gestão de recursos humanos por competências permite, de forma holística e integrada, percecionar o funcionamento dos diferentes subsistemas e pilotar todo o processo, centralizando-o em termos de conceção e de regulação, embora possa, e deva, ser descentralizado na sua execução.

Quanto ao subsistema de formação e desenvolvimento de líderes militares ele é sumativo e cumulativo, apoiado num modelo formal inicial de tipo ‘banda larga’, a que se juntam, durante determinados momentos da carreira, ações de formação de média e curta duração, o que significa, de uma forma abreviada, que alterna conteúdos transversais com conteúdos específicos. Mas o modelo não é meramente sumativo e cumulativo. Dada a volatilidade dos contextos, a diversidade de situações novas, ele é também substitutivo, em termos da aquisição e aplicação de novas competências, “substituindo” as antigas porque se tornaram ineficazes face à nova realidade. Esta convicção (ou pressuposto) induz, nos militares, a necessidade de uma aprendizagem contínua, aberta e inovadora, e uma aposta crescente no autodesenvolvimento. A aquisição sucessiva de experiências diferenciadas, em situação de trabalho, em cada patamar hierárquico e em várias áreas funcionais (vulgo, percurso profissional em espiral/helicoidal), complementa e torna mais robusto o modelo em vigor.

O atual modelo de desenvolvimento de oficiais tem demonstrado ser capaz de resolver, com qualidade, a generalidade das solicitações que se têm colocado aos militares aos níveis tático e operacional, dentro e fora do território nacional, em contexto conjunto, combinado e multicultural. De facto, o atual processo de aquisição de competências em vigor, ou melhor, de conhecimentos e capacidades (dado que o paradigma assenta sobre outros pressupostos), não obstante a necessidade de merecer a introdução de melhorias pontuais, tem provado até certo ponto a sua “adequabilidade”, a avaliar pelas realizações internas e fora do Território Nacional (TN) e pelos encómios que frequentemente os oficiais e as forças militares portuguesas em geral têm recebido de altas entidades estrangeiras.

No entanto, a questão da preparação de líderes de topo da organização, a formação e desenvolvimento de elites militares, para assumir a mais alta direção, parece apresentar ainda outros contornos e merece, por isso, uma reflexão mais profunda, não sendo suficiente o percurso sumativo e diferenciado que foi objeto de análise, ainda que se releve a sua importância e imprescindibilidade, como base, para o patamar estratégico. Exigem-se, cumulativamente, a detenção de outro tipo de competências, transversais e/ou específicas, consideradas necessárias ao sucesso organizacional. E estas “novas” competências, distintivas, só pontualmente são desenvolvidas a partir do atual modelo de formação e desenvolvimento dos militares de carreira em cada ramo das FFAA portuguesas, estando muito dependente da experiência profissional de cada indivíduo.

O nível estratégico da tomada de decisão recorre, menos do que os restantes níveis, à estatística e aos referenciais históricos para a gestão das novas situações; e, em contraponto, socorre-se cada vez mais da prospetiva e das técnicas de cenarização, dado que os problemas a resolver no futuro poderão ser substancialmente diferentes e mais complexos do que aqueles com que as FFAA se confrontam atualmente. Face à natureza da mudança do contexto externo e à multiplicidade e diversidade de cenários e situações concretas de atuação, exige-se por parte dos líderes de topo da organização militar novos quadros mentais capazes de promover maior consciência situacional, mais proatividade e melhores decisões. No futuro, aos mais elevados níveis da organização, a capacidade de avaliar o contexto, de definir uma visão, de tomar decisões e de gerir a mudança serão competências mais importantes e críticas do que quaisquer outras, técnicas ou específicas. Daí ter-se destacado, na proposta de perfil de competências para as elites militares, estas dimensões, admitindo que as restantes, duma forma ou de outra, tiveram já o seu desenvolvimento até aí, durante o percurso de carreira, ou poderão vir a ser adquiridas mais facilmente.

A questão da deteção e desenvolvimento, em contexto militar, dos melhores talentos – militares de potencial mais elevado – deve ser tida como uma fase incontornável de todo este processo de preparação de líderes para o topo da organização. Para além da determinação dos momentos mais adequados, a identificação desses talentos deverá basear-se em instrumentos de avaliação fidedignos, e transparentes, que não deixem grande margem para dúvidas, tendo sido sugerida a sua aplicação a partir da observação (avaliação) ao longo de períodos mais ou menos extensos e durante o desempenho de cargos/funções diferenciadas. Há que garantir que se trata de formas de atuação consistentes e não de meros comportamentos ocasionais e contingentes, devendo, por isso, a avaliação ser sistemática e confirmatória e ocorrer durante um lapso de tempo suficientemente alargado. Desta forma, reduzir-se-á substancialmente a probabilidade de erro. Por outro lado, o referencial a construir para a identificação e avaliação dos melhores talentos deverá ser corporizado num verdadeiro instrumento de avaliação do potencial e não apenas de avaliação do desempenho ou meramente de medição do mérito profissional expresso até a um determinado momento. Solicitações e exigências diferentes exigem, geralmente, metodologias e instrumentos diferentes.

Mas a questão chave não está tanto na identificação dos militares de maior potencial, o que acabará por acontecer, de uma forma mais ou menos natural, embora se reconheça que, frequentemente, ocorre um pouco tarde no percurso profissional, o que, por sua vez, dificulta uma adequada gestão dos recursos humanos em relação a estes militares e o respetivo retorno para a organização. A verdadeira questão, por estranho que possa parecer, é processual e procedimental, residindo na elaboração de referenciais adequados e sua operacionalização, traduzida na capacidade que a organização poderá ter, ou não, para proceder a um acompanhamento e a uma avaliação e aconselhamento sistemáticos.

Num outro sentido, os cursos/estágios que preparam para os últimos postos da carreira militar seguem, na generalidade, um paradigma excessivamente tradicional. Existe a convicção de que, para o nível estratégico, a aquisição de competências críticas distintivas requer a adoção de um novo modelo formativo, pelo menos complementar, que proporcione outra abertura a essas competências. Ao longo do texto deixaram-se, a título de exemplo, alguns elementos para esta reflexão.

Como preparar, então, as futuras elites militares para a tomada de decisão em condições de exiguidade de tempo e de informação limitada, para a gestão e mediação de conflitos ao nível de topo da organização, para a administração de orçamentos exíguos e complexos, para o desempenho de cargos de alta direção em contexto multicultural, para um tipo de gestão por objetivos e orientação para os resultados, para a construção de uma visão holística clara e definição de linhas funcionais de orientação para os comandos/chefias subordinados, para a comunicação em larga escala, para a tolerância à ambiguidade, para lidar em simultâneo com várias tipologias de problemas e para antecipar e gerir a mudança, para tratar com o nível político e com os ambientes conjuntos e combinados?

A dimensão processual merece-nos ainda outros considerandos. Dependendo, a construção de competências, de um processo contínuo, ao longo do percurso profissional e em contexto de trabalho, mas também fora do contexto profissional direto, em ambiente não formal e informal, antes de aplicar o modelo formativo a cada militar, preparando-o para o nível estratégico, importa fazer um diagnóstico de necessidades de aquisição e/ou desenvolvimento de competências, determinando igualmente o nível em que as competências se manifestam. O que equivale a considerar que, antes da aplicação dos conteúdos e metodologias formativas, será imprescindível comparar o portefólio de competências individual com o perfil de competências previamente definido para os líderes de topo e, a partir daí, aplicar o perfil de formação e desenvolvimento de competências nas áreas e na amplitude em que for necessário para cada caso[31]. O que significa ainda que o desenvolvimento profissional para acesso a este patamar deverá ser, sobretudo, de aplicação individual e por medida, dada a previsível variabilidade dos portefólios dos militares que ascenderão aos cargos de maior responsabilidade. Há que refletir, depois, como esta intenção deverá ou poderá ser operacionalizada. Uma coisa é essencial a este exercício: assume-se que a organização militar deverá transitar da lógica da gestão de carreiras para uma lógica de gestão de percursos profissionais, personalizados, tendo sempre por base um modelo de competências.

Considera-se ainda que a gestão de competências aplicada aos militares de elevado potencial, tal como deverá acontecer com a gestão de competências dos restantes militares, globalmente considerada, obriga a uma mudança de paradigma ao nível da gestão de recursos humanos. A conceção, em si mesmo, integra duas perspetivas distintas: (1) em sentido lato, a gestão de competências destes militares permitirá pensar em colocações seletivas e, com grande probabilidade, em desempenhos superiores; e (2) em sentido restrito, a gestão de competências pode ser percecionada como um processo holístico e cíclico de gestão dos percursos profissionais dos melhores talentos, mas que, simultaneamente, permitirá administrar todas as fases do processo de gestão de recursos humanos – recrutamento, formação/desenvolvimento pessoal e profissional, avaliação, aplicação e retenção, rotação/substituição, recrutamento de novos talentos, e assim sucessivamente. O perfil de competências estará subjacente a todas as fases, servindo-lhes de referencial.

Não obstante o reforço que mais recentemente tem sido feito pelos ramos das FFAA, até agora, tem sido mais fácil identificar militares, na última fase da carreira, já com algumas das competências críticas adquiridas, relegando para segundo plano o exercício da deteção de talentos em momentos anteriores, o que significa que a Instituição prescinde do seu acompanhamento, formação específica e aconselhamento, efetivo e dirigido, ao longo do percurso profissional de um modo sistemático, assumindo, em sentido oposto, todo o ónus que decorre de uma escolha tardia. Como será no futuro?

Como dispõem os diversos manuais de liderança do Exército dos EUA (e.g., de 1999 e 2006), uma das principais tarefas do líder sénior é criar outros líderes, agindo diretamente sobre o potencial dos colaboradores e proporcionando as melhores condições para o seu desenvolvimento. Neste sentido, as atuais chefias militares, sobretudo aos mais elevados patamares hierárquicos, terão responsabilidades no processo de construção das elites militares do futuro.

E como irá processar-se essa “construção”? É preferível continuar a deixar que as circunstâncias, o acaso e os mecanismos já existentes, alguns menos apropriados, produzam, indiretamente, a seleção dos “mais aptos”, ou será mais importante assumir que as FFAA portuguesas devem ter uma intervenção direta, mais ativa e mais explícita no desenvolvimento das elites militares, adotando, para este efeito, um modelo específico e eventuais mecanismos complementares?

Deixamos estas perguntas à reflexão do leitor, que fazemos acompanhar com uma afirmação final:

THERE’S NO USE WAITING AROUND WHEN IT COMES TO CULTIVATING TOMORROW’S LEADERS.” (Weinstein, Margery. Training. Sep2006, Vol. 43 Issue 9, pp.11-11)

 

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* Este artigo resulta de uma integração de vários trabalhos de investigação conduzidos pelo autor e insere-se num projeto de investigação inscrito no Centro de Investigação de Segurança e Defesa do IESM/IUM.

** Subdiretor do centro de Investigação de Segurança e Defesa do IESM/IUM. Investigador integrado do CISDI. Sócio Efetivo da Revista Militar. Membro do Instituto Humanidade e Desenvolvimento.

 


[1] WEBER, George B. (1997). Desenvolvendo os Líderes de Amanhã. In HESSELBEIN, Frances; GOLDSMITH, Marshall; BECKHARD, Richard. O Líder do Futuro. Visões, Estratégias e Práticas para uma nova Era. Peter F Drucker Foundation, 3ª edição. Tradução de Cynthia Azevedo. São Paulo: Futura. George B. WEBER era, à data, Secretário-geral da International federation of Red-Cross and Red Crescent Societies.

[2]  Pelo referido, o objeto de estudo é delimitado à categoria de oficial, a única que poderá ascender ao nível de topo da organização.

[3]  READY, Douglas A.; CONGER, Jay A.; HILL, Linda A. (2010). Are You a High Potential? Harvard Business Review. June 2010. (Sublinhado nosso)

[4]  Primeira sistematização, resultante de várias leituras, contactos informais, experiência profissional e reflexão.

[5]  QUINN, Robert E. (1984). Applying the Competing Values Approach to Leadership: Toward an Integrative Framework, In J. G. Hunt.; D. M. Hosking, C. A.; Schriesheim & R. Stewart (Eds.), Leaders and Managers: International Perspectives on Managerial Behavior and Leadership. New York: Pergamon.

[6]  Entre 1984 e 2004, o modelo de Quinn reflete uma atualização conceptual, em linha com o contexto de investigação do momento, deixando de referir-se exclusivamente aos “papéis” do líder e passando a incluir também no léxico o conceito de “competências” aplicadas à gestão e à liderança.

[7]  HUNT, James G.; PHILLIPS, Robert L. (1991). Leadership in Battle and Garrison: A Framework for Understanding the Differences and Preparing for Both. In Handbook of Military Psychology. Editado por Renven Gale A. David Mangeldorff, John Wiley & Sons Ltd, pp. 411-429.

[8]  “Valores competitivos”, na tradução da 3ª edição de Quinn et al. (2004). Considera-se que, mais que competitivos, eles são contrastantes e também complementares como sugerem os autores.

[9]  Em 2008, o autor do presente artigo elaborou um estudo, a partir de uma amostra de militares do Exército português, baseado nos modelos de Quinn e de Hunt e Phillips onde, utilizando gráficos concêntricos, foram comparados os oito papéis do comandante/líder militar com referência a três situações (contextos) padrão: situação de paz, operações de apoio à paz e combate). O estudo foi publicado na Revista Militar, embora, face à sua dimensão, foi dividido em duas partes e editado em dois números (Santos, 2008a e 2008b). O estudo integral pode ser consultado em: http://www.revistamilitar.pt/artigopdf.php?art_id=297; ou http://www.revistamilitar.pt/artigopdf.php?art_id=331.

[10]  QUINN, Robert E. et al. (2004). Competências gerenciais: princípios e aplicações. Tradução de: Cristina de Assis Serra (da 3ª ed. – Becoming a Master Manager). Rio de Janeiro: Elsevier Editora, Ltda.

[11]  FM 6-22 (2006). Army Leadership. Competent, Confident, and Agile. Field Manual. Headquarters. Department of the Army. Washington, DC, 12 October 2006.

[12]  SILVA, Andrade et al. (2006). Das Competências à Excelência: Modelo de Competências do Oficial do Exército oriundo da Academia Militar. 1ª Parte: Capitães e Subalternos. CPAE e AM. 12 de janeiro de 2006.

[13]  O estudo completo poderá ser consultado em SANTOS, Lúcio A. Barreiros dos (2014). Subsídio para um Referencial de Competências destinado ao Exercício da Liderança em Contexto Militar. Cadernos do IESM, Maio 2014, nº 1 [Em linha]. Pedrouços: IESM. Disponível em: http://www.iesm.pt/cisdi/caderiesm/Cadernos%20do%20IESM%20N_1.pdf.

[14]  “Estes dois últimos eixos constituem uma extensão da diretriz clássica das teorias da liderança, em que se preconiza uma dupla orientação do líder: para as pessoas (“relacional”) e para as tarefas (“funcional”).” (Santos, 2014, p. 95)

[15]  GARDNER, Howard (2008). Cinco mentes para o futuro: as capacidades cognitivas que pode conquistar e desenvolver para ter sucesso (título original: Five Minds for the Futur, 2006). Lisboa: Actual Editora.

[16]  Embora o autor designe como cognitivas as competências que enumera, considera-se que se trata apenas de uma sistematização diferente, mais abrangente, na medida em que parecem integrar outras tipologias de competências.

[17]  Foram escolhidas estas três competências críticas, porque as consideramos as mais importantes do Grupo II para o nível estratégico da organização militar.

[18]  ADAIR, John (2005). How to grow leaders: The seven key principles of effective leadership development. London: Kogan Page Limited.

[19]  Neste caso, trata-se de um recrutamento interno, facilitando as tarefas de identificação, acompanhamento e aconselhamento ao longo da carreira/percurso profissional nas FFAA.

[20]  Julga-se que a aposta poderá recair sobre um perfil aberto, suficientemente transversal, que se concretize num número de competências críticas relativamente reduzido, podendo ter-se como referência o modelo sugerido nas figura 7, 9 ou 10 ou, ainda, um modelo descritivo, mais simples, do género do decálogo apresentado, embora formalizado a partir de metas e indicadores operacionalizáveis.

[21]  Tal como aconselha o conceito de competência: Newlon (2004) define competência (competency) como “…a cluster of knowledge, skill, ability, or attitude [KSAA] an individual must possess or obtain (or circumstances that must exist) in order to perform one or more tasks in a particular job context”. O autor descreve ainda os constructos elementares do conceito: Knowledge describes a body of information, usually of a factual or procedural nature, applied directly to the performance of a function/task; Skill describes a present, observable competence to perform a learned act (could be motor, psychomotor, and/or cognitive); Ability describes a general more enduring capability an individual possesses at the time when he/she begins to perform a task; Attitude describes an internal state that influences an individual’s choices or decisions to act in a certain way under particular circumstances.” (Newlon, 2004). Para mais informação consultar: SANTOS, Lúcio A. Barreiros dos (2014). Subsídio para um Referencial de Competências destinado ao Exercício da Liderança em Contexto Militar. Cadernos do IESM. [Em linha]. Pedrouços: IESM. Maio 2014, nº 1. Disponível em: http://www.iesm.pt/cisdi/caderiesm/Cadernos%20do%20IESM%20N_1.pdf.

[22]  Sobretudo, depois de alguns anos no desempenho de funções neste patamar hierárquico.

[23]  Referimo-nos à sua génese, em que a “pedra de toque” eram as promoções e, sobretudo, as que ocorressem por escolha (e.g., a Capitão-tenente/Major e a Capitão-de-mar-e-guerra/Coronel). O acesso a Oficial General ou a progressão neste patamar não é, na generalidade, adequadamente regulada pelos instrumentos em apreço.

[24]  Note-se que não se está aqui a fazer qualquer tipo de juízo de valor sobre os atuais sistemas de avaliação em relação aos motivos para que foram criados; não é, de todo, disso que trata este artigo.

[25]  CEITIL, Mário (2007). (Organizador) Gestão e desenvolvimento de competências. Lisboa: Edições Sílabo. ISBN: 972-618-409-6.

[26]  BOLT, James F. (1997). Desenvolvendo Líderes Tridimensionais. In O Líder do Futuro – Visões, Estratégias e Práticas para uma Nova Era. Peter F. Drucker Foundation. 3ª ed.. Tradução de: Cynthia Azevedo. São Paulo: Editora Futura.

[27]  SCHEIN, Edgar H. (1978). Career dynamics: matching individual and organizational needs. California: Addison-Wesley.

[28]  Embora o modelo de Schein (1978) possa ser aplicado de uma forma transversal, ele é sobretudo efetivo em relação às carreiras de matriz vertical, caraterizadas por uma grande mobilidade funcional e geográfica, e típicas de uma vertente marcadamente de comando, direção ou chefia. O mesmo não acontece exatamente com carreiras de tipologia mais horizontal (e.g., carreiras técnicas), em que estes tipos de mobilidade são substancialmente menos importantes no desenvolvimento profissional.

[29]  Este órgão, já formalmente constituído, terá a responsabilidade de acompanhamento, aconselhamento e apoio à gestão dos percursos profissionais dos militares em apreço, podendo assumir a atual estrutura (em alguns casos relativamente recente) ou serem introduzidas adaptações ao atual modelo.

[30]  Sousa et al. (2006, pp. 170-171) consideram que “o aconselhamento de carreira consiste num processo que permite que os indivíduos utilizem os seus recursos para gerir as suas carreiras”. Referindo-se a Mayo (1991), definem as seguintes etapas: (1) saber qual é o percurso de carreira mais indicado para um dado colaborador (com base em interesses, gostos, o que sabe fazer bem/melhor versus os requisitos/exigências dos perfis do percurso definido/escolhido; (2) saber qual é o objetivo (real) a atingir versus o período temporal estimado para o efeito; (3) saber qual o gap entre as competências detidas num determinado momento e as que deverá ter para atingir o objetivo definido; (4) saber que experiência é necessária e como poderá ser obtida; e (5) saber qual o percurso alternativo a seguir, caso o plano inicial não funcione.

[31]  Este processo de “desenvolvimento de competências” de carreira deverá funcional como um verdadeiro “development centre” em cada ramo das FFAA ou como um todo, detetando de forma sistemática os pontos fortes e fracos dos oficiais, as lacunas de formação/desenvolvimento e prevendo a aquisição das competências em falta, a partir de conteúdos formativos/treino específico e correspondentes metodologias de ensino-aprendizagem, a proporcionar em momentos chave.

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2016-12-06
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Coronel Tirocinado

Lúcio Agostinho Barreiros dos Santos

Subdiretor do Centro de Investigação e Desenvolvimento do Instituto Universitário Militar (CIDIUM); Coordenador editorial das linhas editoriais do IUM (Revista de Ciências Militares – revista científica integralmente bilingue (PRT e UK), com revisão por pares em sistema de duplo anonimato.

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