Tem lugar, hoje, a realização dos VIII Encontros da Revista Militar, prevista no Plano de Atividades para o ano de 2016; este evento constitui uma atividade muito significativa para a Direção da Revista Militar, pela oportunidade que representa para o debate de ideias com outras Instituições, este ano, não só nacionais como também estrangeiras.
A Direção da Revista Militar agradece a Vossa presença nestes VIII Encontros, uma vez mais, levado a cabo com o Departamento de História da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, uma parceria que se tem revelado extremamente enriquecedora e estimulante, pelos Temas que em conjunto decidimos abordar. O nosso agradecimento à Universidade de Lisboa, pela disponibilização destas magníficas instalações para a realização destes Encontros.
Como Tema deste ano escolhemos a União Europeia e considerámos que debater as suas Relações Estratégicas, com os grandes polos de poder mundial, de facto ou emergentes e aqueles que constituem claros desafios à estabilidade mundial e ao desejado desenvolvimento, poderia atingir três grandes objetivos: que expectativas, nos vários domínios, existem relativamente à ação estratégica da UE; como é que a mesma é avaliada e vista do exterior, em termos de relações de poder; e, ainda, quais são as linhas de orientação estratégica da União em relação a esses poderes.
Pensou-se, igualmente, que o momento não poderia ser mais oportuno; estamos ainda a digerir os efeitos e a interrogarmo-nos quanto às verdadeiras consequências do BREXIT e, também, antes da Cimeira de Bratislava foram evidentes as diferentes prospetivas quanto à evolução futura da União Europeia, evidenciando uma clivagem entre a Europa do Norte e a do Sul, em termos de perceção social, económica e, ainda, no domínio da segurança.
Durante aquele período, assistimos a alinhamentos diversos: primeiro, a reunião da Alemanha com a França e a Itália; depois, o anúncio do encontro dos países fundadores da União; a realização da conferência dos países de Visegrado, procurando a Hungria assumir a sua liderança e tendo como tema central a questão dos refugiados; a reunião de Atenas, com os países do Sul, pondo a ênfase da discussão na crítica das políticas de austeridade sobre os efeitos sociais, no emprego e na recuperação das economias, políticas essas tão defendidas pela Alemanha, pelos países nórdicos e pelo Eurogrupo.
As conclusões anunciadas no final da Cimeira informal de Bratislava e a marcação de nova cimeira para março de 2017, quando a UE comemora o 60º aniversário do Tratado de Roma – seu documento fundador –, não disfarçam a ausência de uma liderança política consistente da União, incluindo a postura da Alemanha que, para além de continuar a gerar desconfianças internas, manifesta-se de forma errática e, por que não dizê-lo, de forma inconsequente, deselegante, roçando a arrogância e percecionando mal a sua real dimensão estratégica, como aconteceu no recente episódio da eleição do Secretário-geral das Nações Unidas.
Paralelamente a esta situação e às diferentes perspetivas políticas internas, no domínio social, económico, estrutural e também político e no quadro da segurança, onde sobressai o terrorismo e a crise dos refugiados, os órgãos fundamentais da União, o Conselho, a Comissão e o Parlamento, vivem um tempo de pausa, de indecisão e de linhas de autoridade difusas, fruto de processos eleitorais que se aproximam, incluindo referendos em diversos países membros e do crescimento de sentimentos anti-europa, a par do reforço do populismo e da extrema-direita.
Na realidade, não se afiguram tranquilos, do ponto de vista político, os tempos que se seguem; aproximam-se as eleições na Áustria, na França e na Holanda, países onde os partidos de extrema-direita vêm subindo nas sondagens, caso do Partido da Frente Nacional francês e dos Partidos da Liberdade, nos outros dois países, para além da ameaça de referendos sobre a permanência na UE e a incerteza política que se continua a viver na Espanha; também a situação futura na Itália e as implicações desta, numa reforma estrutural da União.
Conforme Martin Schulz refere, são necessárias estruturas sólidas e coerentes que “mantenham sob controlo, os demónios do Século XX (ou seja, o xenofobismo e o radicalismo) e preservem as políticas de integração e de acolhimento”, demónios que têm crescido na Alemanha, com o Partido da Alternativa, e com as políticas anti-imigração, aprovadas pela Hungria, pela Dinamarca e também pela Suécia, em contradição com as diretivas europeias em vigor.
Também a Comissão não tem contribuído para o reforço da coesão interna, fruto de uma atitude muito assertiva e dinâmica, relativamente às Regras, quando isso toca aos aspetos económicos e financeiros, designadamente em relação aos países do Sul da Europa, acenando com sanções e cortes de fundos estruturais, mas muito flexível ou apática, quer em relação à situação do Deutsche Bank quer às práticas que ferem os princípios que constituem os pilares do projeto europeu, no que se relaciona com a Hungria e Dinamarca e, de uma forma geral, com os países do grupo de Visegrado, relativamente à questão dos refugiados, e com a Polónia, a Bulgária e a Estónia a declararem só receberem migrantes cristãos.
No quadro da segurança e defesa torna-se ambíguo conciliar a proposta franco-alemã de criação de um Quartel-General da UE para responder e acompanhar as missões militares, sob sua égide, proposta essa apadrinhada por Juncker, apontando prazos de concretização para dezembro deste ano, levantando uma vez mais a interrogação quanto à intenção da criação do Exército Europeu, defendido pela Alemanha e com a rejeição do Reino Unido e outros países membros, onde julgo se continua a incluir Portugal; proposta difícil de entender e articular com a assinatura da Declaração Conjunta UE-OTAN, em 8 de julho de 2016, no seguimento da Cimeira de Varsóvia, onde se apela à cooperação e à sinergia de procedimentos com vista à melhoria das capacidades militares dos países membros, numa relação inequívoca que reforce as capacidades estratégicas da Aliança e, em particular, a relação transatlântica.
Continua a não ser pacífico também, no interior da UE, o acordo efetuado com a Turquia, sobre o controlo e retenção dos refugiados, pela sua atitude de permanente chantagem, quanto à problemática dos Vistos e acordos de associação, um país em que, para além disso, o governo de Erdogan conduz uma “Purga” que, de acordo com a imprensa internacional, prende mais de 8000 militares e polícias e afasta das suas funções, por decreto com base em suspeitas de ligação a Gulen, mais de cem mil cidadãos, militares, polícias, funcionários públicos, juízes, académicos, professores, jornalistas, pilotos comerciais e outros e invadindo também, as atividades económicas privadas, fechando empresas e confiscando bens, estimados à data em mais de quatro mil milhões de dólares; purga essa, segundo a Revista Time, de setembro, se estende agora à minoria curda, pretendendo suspender 14000 professores, por suspeita de ligações ao PKK (Partido dos Trabalhadores Curdos), tudo isto sem que as instituições europeias formulem qualquer crítica.
Em termos estruturais, a UE tem de reafirmar e praticar os fundamentos e princípios constitutivos do projeto europeu, em que os valores da solidariedade, da subsidiariedade, do respeito pelos direitos humanos, pela liberdade e pelas identidades e pela afirmação das soberanias nacionais e das suas instituições democráticas, sejam um reforço e a expressão de uma coesão política, económica e social, que potencie a afirmação política, económica e no domínio da segurança, no contexto da Comunidade Internacional.
E neste ambiente internacional coexistem desafios, para os quais a UE tem de ter respostas próprias, seja no combate ao terrorismo internacional, seja na resolução da crise dos refugiados, ou ainda no combate à pobreza e à exclusão social, dentro e fora do espaço europeu, na promoção do desenvolvimento económico, na resposta às dívidas soberanas e à situação da Banca, que ameaçam a estabilidade e competitividade do Euro; só uma UE coesa e solidária poderá ser o interlocutor internacional com os grandes poderes que os europeus entendem poder ser.
Estão em cima da mesa acordos com grandes espaços económicos, que devem, em primeiro lugar, merecer a aprovação interna, fruto da transparência dos mesmos e do conhecimento das suas múltiplas implicações, em todos os domínios, o que infelizmente não tem sido o caso, como sejam: o do CETA, acordo de comércio livre com o Canadá, em discussão desde 2009, e o TTIP, com os EUA, em negociações desde 2013 e, na atualidade, também dependente do resultado das eleições americanas.
Constituem igualmente questões desafiantes no contexto internacional a situação na bacia sul do Mediterrâneo e no Médio Oriente, em particular na Síria e as suas implicações na crise dos refugiados, a situação na Ucrânia e na Geórgia, assim como as sanções à Rússia, a situação no Golfo da Guiné e a livre circulação de bens e ativos energéticos naquela área, as relações com a China, com a Índia e o Japão, mas também com o MERCOSUL e com a América Latina.
Mas para conhecermos a realidade dessas e outras situações, temos hoje connosco, nos vários Painéis, um conjunto de Conferencistas nacionais e estrangeiros, verdadeiros especialistas, a quem a Direção da Revista Militar muito agradece a disponibilidade para participarem nestes Encontros, assim como aos Moderadores, que irão conduzir e estimular os Debates que sinceramente desejamos possam ter lugar.
Numa das próximas edições da Revista Militar é intenção da Direção, à semelhança do que aconteceu nos Encontros anteriores, dedicar um dos números à divulgação de todas as Comunicações que hoje irão ser apresentadas.
Esperamos que os VIII Encontros da Revista Militar atinjam a finalidade pretendida, se transformem numa manhã e numa tarde interessantes e agradeço, por último, a Vossa Atenção.
Nasceu em Sintra, em 21 de Abril de 1947, e entrou na Academia Militar em 6 de Outubro de 1964.
Em 17 de Dezembro de 2011, terminou o seu mandato de 3+2 anos como Chefe do Estado-Maior do Exército, passando à situação de Reserva.
Em 21 Abril de 2012 passou à situação de reforma.
Atualmente exerce as funções de Presidente da Direção da Revista Militar e de Presidente da Liga da Multissecular de Amizade Portugal-China.