Nº 2604 - Janeiro de 2019
Pessoa coletiva com estatuto de utilidade pública
Editorial
General
José Luiz Pinto Ramalho

Esta Edição da Revista Militar tem dois especiais significados: um, por constituir o primeiro número de 2019, dando início a um novo programa editorial, aprovado em Assembleia Geral para o corrente ano, e outro, de distinta relevância, por materializar um período de 170 anos de publicação ininterrupta da nossa Revista. Temos uma história que decorre da reflexão de muitos militares e também de alguns civis, sobre o que, do ponto de vista militar, se passou no país e no mundo, em termos de evolução do pensamento, das doutrinas, dos avanços tecnológicos, não esquecendo a história e as preocupações e desafios que, no âmbito nacional, se foram colocando às nossas Forças Armadas.

Mas este percurso editorial constitui também a responsabilidade, quer para os atuais corpos sociais quer para os seus Sócios Efetivos e Assinantes de não deixar morrer um projecto iniciado por um conjunto de militares que constituíram esta Revista Militar, progressivamente qualificada como não tendo fins lucrativos, ser considerada de interesse público e que, de acordo com os seus Estatutos, sempre foi um espaço de liberdade do pensamento militar, independente, orientado pelo interesse na eficiência e eficácia do instrumento militar, pela defesa do interesse nacional e pela dignificação da Instituição Militar.

A nossa Revista esteve sempre presente numa reflexão desapaixonada, desde a sua fundação, sobre os grandes acontecimentos em que as Forças Armadas foram chamadas a participar, na Europa, no Oriente e em África e, também na modernidade, no pós-segunda Guerra Mundial, na participação na OTAN, igualmente na discussão enformadora dos documentos fundamentais que definem a estratégia de defesa nacional. Foi igualmente um espaço de reflexão e proposta, relativamente às reformas das Forças Armadas e das opções que nesse domínio têm vindo a ser tomadas.

As Mensagens enviadas à Revista Militar pelo Ministro da Defesa Nacional, pelo Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas, pelos Chefes dos Estados-Maiores da Força Aérea, da Marinha e do Exército, e pelo Comandante Geral da Guarda Nacional Republicana, que a Direção muito agradece, constituem um estímulo para prosseguir, com empenho e denodo, uma atitude construtiva e crítica sobre a realidade da defesa nacional e do seu instrumento militar, assim como da conjuntura estratégica nacional e internacional, envolvendo todos os nossos Sócios, Assinantes, Leitores e Visitantes do nosso “site”, para continuarmos o legado dos Fundadores, recordando e homenageando assim todos os que nos antecederam.

Iniciamos o ano de 2019 numa conjuntura estratégica internacional com desafios importantes para a paz e estabilidade internacional. A situação emergente da Síria, fruto de um maior controlo do território pelas forças governamentais e protagonismo da Rússia, a par da saída dos EUA; uma maior liberdade de ação da Turquia relativamente aos Curdos e eventuais ideias expansionistas de anexação de território sírio por aquele país; o diferendo da Rússia com a Ucrânia e a problemática das sanções económicas que envolvem a Europa; as questões do Médio Oriente, envolvendo a Palestina, o Irão e Israel e, mais uma vez, o problema nuclear; os desenvolvimentos, que se esperam positivos, do entendimento entre as duas Coreias e os EUA, mas que não impedem as intenções armamentistas do Japão e não favorecem o desanuviamento das tensões territoriais dos mares do sul da China a par da postura deste país relativamente ao assunto, para além da sempre relação difícil com Taiwan.

É também um ano em que, do ponto de vista económico, os EUA continuam uma fase de contínuo crescimento, se assiste a uma desaceleração por parte da China, à Índia a entrar para o clube dos dez países com maior crescimento, com 7,6%, e a Europa, debatendo-se com um crescimento residual, continuando a lidar com os efeitos de uma crise económica que tarda a dissipar-se e cuja situação se poderá agravar, quer com o modo como o BREXIT se irá concretizar quer com as eleições para o Parlamento Europeu e a respetiva configuração final, fruto do crescimento do populismo nos partidos europeus e da redução de lugares, de 751 para 705, pela saída do Reino Unido.

Estaremos também confrontados com a política dos EUA relativamente ao “espaço cósmico”, aos desenvolvimentos do recentemente criado Space Command e ao impulso de investimentos na NASA, em que os seus novos horizontes incluem o regresso à Lua e a intenção de atingir Marte; paralelamente, são previsíveis os avanços tecnológicos no domínio da Inteligência Artificial e das potencialidades da ICT (Information and Communication Technology) e as suas implicações na estratégia militar; nestes domínios surgem como novos competidores, para além da Rússia, a China e a Índia.

Mas 2019 será também o ano do 70º aniversário da OTAN, onde coexistem quatro “irritantes” discordâncias no diálogo entre aliados: a posição dos países membros, com fortes correntes populistas, que criticam a atual postura estratégica da Aliança; a diversidade de perceção da ameaça, em que os membros do norte a configuram na Rússia e os do sul enfatizam as preocupações ligadas à imigração e a instabilidade no norte de África; a atitude e comportamento político da Turquia e a ação militar, de sua iniciativa, que vai desenvolvendo no norte da Síria, nos territórios curdos e o tipo de relações que vai desenvolvendo com a Rússia; os EUA de Trump, o alheamento das missões da OTAN e permanente crítica aos aliados europeus, a sua insistência no cumprimento dos gastos com a Defesa em 2%, até 2024, em paralelo com a sua sugestão provocatória, de que o número deveria ser de 4%, com as implicações que isso representaria para as economias europeias. Cabe ainda a questão de como se poderá desenvolver o conceito europeu da PESCO, neste ambiente político-militar.

Em termos nacionais, para além dos compromissos que assumimos relativamente a algumas questões anteriormente referidas, mantêm-se os problemas relativos à escassez de efetivos, à disfunção de uma estrutura superior militar que não respeita a especificidade e dimensão dos Ramos e que provoca constrangimentos no normal desenvolvimento de Carreiras e acesso à hierarquia de topo, as questões relacionadas com o apoio social e na saúde, aos militares e seus familiares, decorrente da situação do HFAR e do IASFA e de uma forma mais abrangente a forma como tem sido materializado o reconhecimento institucional da importância e respeito pela Condição Militar. Este é também o ano em que irá ser aprovada a Lei de Programação Militar que, pelo que se conhece, é desequilibrada no que se refere à atribuição de Programas estruturais, designadamente em relação ao Exército e em que os investimentos parecem favorecer mais as preocupações da economia sectorial nacional, estaleiros e o “cluster aeronáutico”, do que as efetivas necessidades operacionais.

Resta à Direcção da Revista Militar desejar a todos os Sócios Efetivos, aos Assinantes, Colaboradores, Leitores, Visitantes do nosso “Site” e aos nossos Apoiantes, um Bom Ano de 2019.

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2019-05-24
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General

José Luiz Pinto Ramalho

Nasceu em Sintra, em 21 de Abril de 1947, e entrou na Academia Militar em 6 de Outubro de 1964. 

Em 17 de Dezembro de 2011, terminou o seu mandato de 3+2 anos como Chefe do Estado-Maior do Exército, passando à situação de Reserva.

Em 21 Abril de 2012 passou à situação de reforma.

Atualmente exerce as funções de Presidente da Direção da Revista Militar e de Presidente da Liga da Multissecular de Amizade Portugal-China.

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by CMG Armando Dias Correia