Nº 2628 - Janeiro de 2021
Pessoa coletiva com estatuto de utilidade pública
Do Fim da Guerra Fria a Trump e à COVID-19

Do Fim da Guerra Fria a Trump e à COVID-19

Major-general Carlos Branco

 

O Major-general Carlos Branco tem uma vasta experiência em assuntos político-militares e relações internacionais, granjeada em cerca de 10 anos ao serviço de diversas organizações internacionais. Destacam-se as suas comissões na NATO (no Estado-Maior Internacional, em Bruxelas), no conflito da antiga Jugoslávia (no Gabinete de Operações dos observadores militares das Nações Unidas, em Zagreb) e no Afeganistão (onde que foi porta-voz do Comandante da Força NATO). Presentemente, já na situação de Reserva, é investigador do IPRI e investigador associado do IDN.

Militar muito ativo e interventor, publicou recentemente um livro que titulou “Do Fim da Guerra Fria a Trump e à Covid-19”, pelas Edições Colibri, que compila cerca de sete dezenas de artigos, por si publicados em revistas, jornais e blogues, sobre acontecimentos da política internacional, ocorridos entre o fim da Guerra Fria e o ano de 2020.

O autor, no preâmbulo do seu escrito, expressou assim o seu objetivo:

– “Com este trabalho pretendo proporcionar ao leitor análises de acontecimentos internacionais marcantes, alternativas àquelas proporcionadas pela designada Comunicação Estratégica, que tem moldado as narrativas oficiais no Ocidente”.

Trata-se uma obra importante para o estudo da história recente das relações internacionais e para uma melhor compreensão da envolvente estratégica e político-militar do nosso tempo. Embora analisando acontecimentos que decorreram nas últimas três décadas, o período mais densamente tratado, corresponde ao da presidência de Donald Trump. Artigos que incorporam um pensamento moldado pelo seu empenhamento de anos em organizações internacionais, em posições privilegiadas em termos de observação das condicionantes da tomada de decisão.

Utiliza uma linguagem académica, própria do ramo de conhecimento e da investigação que vem desenvolvendo, quando se pronuncia sobre os contornos históricos, político-militares e jurídicos das relações internacionais, influenciada pelos fundamentos do pensamento neorrealista estruturalista que abraçou e vem seguindo. Neorrealismo que encara o mundo como ele efetivamente é e não de uma forma idealista, onde o poder é o instrumento por meio do qual os Estados garantem a sua sobrevivência, num sistema de natureza anárquica, baseado numa estrutura hierarquizada de acordo com as potencialidades de cada um. Estudos e investigações levadas a cabo pelo autor, de forma arcadiana e livre que bem ficou espelhada na dedicatória que apresenta no início desta sua obra:

“A todos os que prezam o pensamento independente e autónomo. Levantam dúvidas e abominam o carreirismo e a subserviência”.

Carlos Branco dividiu o seu livro em várias partes, que se distinguem pelos diversos tempos e por distintos espaços:

– Na primeira parte, “O mundo 30 anos depois do fim da Guerra Fria”, analisa os problemas da ordem liberal internacional (criada em 1990, quando se passou para um sistema unipolar, com os EUA como Estado dominante) e o regresso à competição geoestratégica.

– Na segunda parte, “A grande estratégia de Trump e a hegemonia americana”, trata de dissecar a postura confrontacional dos Estados, o multilateralismo, o inevitável embate entre os EUA e a China, bem presente nas posições face à tecnologia 5G, a aproximação da Rússia e da China (o novo eixo do mal) e o mundo pós-Covid.

– Em seguida, com o título “A Europa e a Defesa”, trata de temas como a Política Comum de Segurança e Defesa, a cooperação com os EUA, o projeto de um Exército Europeu, o controlo de armamento na Europa, o Brexit e a defesa europeia, a Rússia e os desafios da NATO ao perfazer 70 anos, a convivência com a China, etc.

– Na quarta parte epigrafada “Conflitos ao redor da Europa e no mundo”, elabora um apanhado da conflitualidade mundial, na Bósnia e no Kosovo, o caos da Líbia, o conflito ucraniano, a crise na Venezuela, o futuro incerto da Argélia, a situação em Hong-Kong, as tensões entre os EUA e o Irão, as convulsões do Iraque e da Síria, o regresso da Rússia a África, a insurreição no norte de Moçambique, a estratégia para o Afeganistão, etc.

– Finalmente, na parte que o autor designou por “O mundo que aí vem?”, numa análise prospetiva e interrogativa, demanda se a China se tornará a potência hegemónica e exportará o seu modelo social e político, se os EUA manterão a liderança, dada a sua resiliência e imensidão de recursos e do futuro da China face à guerra comercial e à redução do tráfico internacional. E ainda as questões da relocalização de empresas até agora instaladas na China, do futuro relacionamento da UE/China/EUA, da redução do consumo de hidrocarbonetos e da disputa entre a Rússia e a Arábia Saudita e da relevância das Instituições internacionais (ONU, G7, G20, UE, etc.)

Aqui chegados, voltando ao tema do livro, resta mencionar que o autor entende que os Estados-Nações estão para ficar e no último parágrafo brinda-nos com uma previdente esperança, afirmando:

“Há que ter em conta que são os humanos que implementam as ideologias e nem sempre o seu comportamento reflete o espírito daquelas. A batalha pela democracia e libertação do homem vai prosseguir, é permanente e infindável. Todos os dias se ganha e perde um pouco”.

Redigida numa linguagem a todos acessível, mesmo quando trata de questões técnicas ligadas à complexidade das relações internacionais, assumindo algumas certezas, mas sobretudo interrogações sobre o futuro da humanidade, esta obra tem ainda por matriz o ser humano, empenhado na defesa do pensamento independente, livre e autónomo.

Criteriosamente apresentado, num volume de 206 páginas, fica este livro à disposição dos leitores interessados, constituindo um valioso contributo para a reflexão que se impõe sobre o futuro de todos nós.

A Revista Militar agradece a oferta de “Do Fim da Guerra Fria a Trump e à Covid-19” e felicita o Major-general Carlos Branco e as Edições Colibri.

 

Major-general Manuel de Campos Almeida

Vogal Efetivo da Direção da Revista Militar

Major-general
Manuel António Lourenço de Campos Almeida
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