Nº 2458 - Novembro de 2006
Pessoa coletiva com estatuto de utilidade pública
As Nações Unidas e o Terrorismo
Tenente-coronel
João Manuel de Andrade Pinto Bessa
1.  Introdução
 
11 Setembro de 2001 - 08H48 - o Boeing 767, voo AA11, da American Airlines com 92 passageiros choca contra o 100º andar da Torre Norte do World Trade Center.
 
09H03, cinco minutos mais tarde, outro Boeing 767, voo 175, da United Airlines choca contra a Torre Sul do mesmo complexo, fazendo-as implodir com cerca de 3 000 mortos. Seguiram-se os voos AA 77, que chocou contra o Pentágono e o voo 93 que caiu na Pensilvânia.
 
 Em directo para todo o mundo, numa cobertura dramática sem prece­dentes, os ataques às torres, mudaram a conjuntura internacional e o seu modo de tentar perceber esse fenómeno chamado terrorismo. A partir desse dia, global e aterrador nos métodos e cobertura.
 
Em 28 de Setembro, o Conselho de Segurança das NU, actuando no âmbito do Capitulo VII da Carta das NU (no que concerne ataques contra o paz e a segurança internacional) emitia a resolução 1373 “reafirmando a sua inequívoca condenação do terrorismo e expressando a sua determinação para prevenir tais actos”.1
 
Fizeram-se milhares de comentários, escritos de opinião, tomadas de decisão por quase todos os Países Ocidentais, teceram-se conjecturas, arran­jaram-se explicações.
 
Mas, para perceber esse fenómeno que afecta toda a Humanidade é necessário tentar ir às suas origens e às diversas etapas até ao séc. XXI, e demonstrar a sua violência em três casos, escolhidos pelo autor, respec­tivamente Madrid, Londres e a missão malograda de Sérgio Vieira de Mello, morto ao serviço das Nações Unidas devido a um atentado terrorista.
 
Para melhor se conseguir uma definição do conceito de terrorismo e as várias interpretações, mais adiante vão ser descritos os vários conceitos desde os EUA e opiniões Ocidentais até às definições usadas pelo Oriente na figura da Convenção Islâmica e da Convenção Árabe sobre o terrorismo.
 
Tratando desse fenómeno o autor descreve quais as posições e como se processa o combate ao terrorismo da parte das Organizações Internacionais Nações Unidas, OSCE, NATO e a EU.
 
Este ensaio terminará com uma abordagem ao futuro e à complexidade das Relações Internacionais no seio das Organizações Ocidentais e Orientais chegarem a um acordo no sentido de a Humanidade conseguir ultrapassar as suas fraquezas em prol de um Mundo mais seguro onde todos possam coexistir em Paz e Segurança.
 
1.1 Origens do Terrorismo e a sua Recrudescência a nível mundial após o 11 de Setembro de 2001
 
Mas antes delas temos que recuar até antes da era Cristã, apontando-se a seita dos sicarii (de sica, pequeno gládio), parte militante do movimento zelota oposto a Roma (66-73 d.C.), como o primeiro grupo terrorista conhecido, empenhado em acções de intimidação e violência selectivo.
 
Já na era Cristã existiu a chamada seita dos Assassinos e que floresceu no tempo de Genghis Khan e, cujas ramificações se estenderam até aos nossos dias imbuídas de um esoterismo que caracteriza as sociedades secretas, e que se poderá afirmar ter sido o precursor do terrorismo.
 
O que é que era e o que é que a caracterizava? Pertencia à seita dos Ismaelitas introduzida por Hassan-bem-Sabbah, os quais eram conhecidos por “batinianos” (do árabe bathui, mistério). Os historiadores persas chamaram-lhes infiéis. Essa seita Ismaelita tinha várias classes, uma das quais era a dos “fedaris” que deviam ignorar os divinos arcanos e obedecer cegamente ao grão-mestre ou velho da montanha.
 
Os assassínios eram sempre perpetrados pelo punhal, única arma que eles usavam com uma mestria assombrosa. Antes do acto, a fim de lhes ser inspirado o espírito de obediência total, Hassan fazia transportar os fedaris, depois de embriagados com haschich, para uns jardins maravilhosos, onde desfrutavam de todos os prazeres num harém para esse fim arranjado.
 
Depois de adormecidos eram transportados para o sítio onde antes estavam, fazendo-lhes o grão-mestre acreditar que lhes tinha sido proporcionado a visão do paraíso, aos que cumprissem a missão que lhes era cometida.
 
Daí que os crimes eram executados com êxito e o executor era morto no momento ou pouco depois.
 
Dos seus crimes sem conta foram também vítimas, cruzadas e príncipes que caíram sob os punhais da seita.
 
O terrível prestígio do Velho da montanha gozou de tal modo que o seu poderio atingiu a Europa Central, obrigando ao pagamento de altíssimos resgates dos vários príncipes, que desse modo salvavam as vidas.
 
Praticaram com êxito inúmeros atentados, incluindo a tentativa de assassínio de Saladino, e mataram o Rei Cruzado de Jerusalém o Conde de Monferrat.
 
Embora os seus sectários partissem para as suas missões na aceitação antecipada da própria morte nunca cometiam suicídio. Bertrand Lewis na sua obra “The Crisis of Islam”…2003: pág 145-146 sublinha que “em dois aspectos, na escolha das armas e na escolha das suas vítimas, os Assassinos eram completamente diferentes dos seus sucessores actuais. A vítima era sempre uma individualidade, um líder político ou religioso altamente colo­cado que era visto como fonte do mal. Ele e apenas ele, era morto. Esta acção não era terrorista no sentido actual do termo, mas antes o que se chama assassinato por objectivo. A arma era sempre a mesma: o punhal. Os Assassinos desdenhavam o veneno, a besta e outras armas que poderiam ser usadas à distância”
 
Existe uma invulgar teoria, que Hassan-bem-Sabbat teria de unir o Oriente e o Ocidente, de fundir no mesmo cadinho o seu sangue e o seu génio, os seus deuses e as suas civilizações.2
 
Enquanto esperavam a sua hora, tornaram-se comerciantes inofensivos na Pérsia, na Ásia Central e na Índia para troca de informações e de poder (…)
 
Maquiavel3 ensinava que é melhor ser temido do que ser amado. O medo é parte indispensável para todo o mecanismo do poder. O medo e o castigo, tanto arbitrário como justo e legal é um factor indispensável para a coesão das sociedades, e não é por acaso que o conceito de terrorismo surge durante a Revolução Francesa de 5 de Setembro de 1793 a 27 de Julho de 1794. O Comité de Salvação Pública, com o decreto de 5 de Setembro, instaurou uma série de duríssimas medidas contra todos aqueles que eram suspeitos de serem inimigos da Revolução. Essas medidas foram eficazes durante um tempo, mas com os excessos provocados terminaram com o assassinato de um dos seus maiores mentores - Maximiliano de Robespierre.4
 
Foi após o Termidor que o conceito de terror (ismo) segundo Nuno Rogeiro5 se materializou depreciativamente, designadamente o Governo pelo medo e arbitrariedade.
 
Na segunda metade do Século XIX e princípios do séc. XX, (1879-1910) assistiu-se ao fenómeno do anarquismo, que foi um desenvolvimento do terrorismo. Sucederam-se vários atentados a personalidades politicas, tais como o Rei Afonso XIII, a Imperatriz da Aústria, o Czar Alexandre II da Rússia.
 
O Arquiduque Francisco Fernando, e nos EUA aos Presidentes Garfield e Mc Kinley, etc. Foi a era a que se chamou ére des attentats.
 
Mas é na década de 60/70 do século XX que o terrorismo vai explodir por toda a Europa. Surgem os movimentos em Itália Brigadas Vermelhas, as Baden Meinhof, na Alemanha, a ETA em Espanha e o IRA na Grã-Bretanha. No aspecto tecnológico vão-se desenvolvendo novos meios, tais como o uso de cartas armadilhadas, granadas lançadas de helicóptero (IRA), mísseis terra-ar (aeroporto de Roma), suspeita de posse de componentes para bombas nucleares (urânio roubado por exemplo).
 
Com o fim da guerra-fria, o terrorismo a quem Walter Laqueur6 designou por “terrorismo pós-moderno” caracteriza-se por uma série de fenómenos novos próprios do início da era que se iniciava.
 
Por sua vez num artigo escrito em 19967 surge na Declaração da frente Islâmica para a Jihad 8 contra Judeus e Cruzados o seguinte texto: “Matar os Americanos e os seus aliados, tanto civis como militares, é o dever individual de cada Muçulmano apto, em todos os países onde isso é possível, até que as Mesquitas de Aqsa e de Haram sejam libertadas do seu jugo, e até que os seus exércitos, despedaçados e de asas cortadas abandonem todas as terras do Islão, incapazes de ameaçar os muçulmanos(…)”.
 
Do teor desta declaração começa o grande problema da compreensão do fenómeno terrorismo, o qual tem um significado de base completamente oposto ao modelo ocidental. O qual se reflecte como adiante se provará no seio das Nações Unidas e do seu Conselho de Segurança.
 
No seguimento dos acontecimentos do 11 de Setembro de 2001, os Estados Unidos, os Ingleses e com pequenas contribuições de outros membros da NATO desencadeiam a primeira etapa contra o terrorismo no Afeganistão em 8 de Outubro de 2001, para acabarem com o regime dos Talibans, que davam guarida aos guerrilheiros da Al-Qaida.
 
Em 18 de Março de 2003, os EUA iniciam a ofensiva contra o Iraque. A justificação era de que o governo de Saddam Hussein detinha e produzia armas de destruição maciça, e as alegadas relações com a Al-Qaida e Osama Bin Laden. Este conflito trouxe um novo esforço para a paz no mundo e reforço da determinação e influência dos EUA.
 
Face a esses acontecimentos, qual a actuação das Nações Unidas e do Conselho de Segurança?
 
Essencialmente e no rescaldo do 11 de Setembro de 2001, a resolução 1373 de 28 de Setembro, reafirmava a inequívoca condenação do acto e reafirmava a continuação do combate ao terrorismo.
 
Essa resolução confirmou o Comité Contra Terrorismo, aprovada pelos 15 membros do Conselho de Segurança.
 
Foi pacífica essa resolução? No rescaldo do 11 de Setembro de 2001, sim sem dúvida.
 
Mas, continuava por haver uma clara definição e um consenso alargado sobre o terrorismo.
 
 
2.  Atentados Terroristas
 
2.1 Madrid 2004
 
Logo a seguir, em 11 de Março de 2004, acontecem os ataques terroristas em Madrid.
 
A resolução 1530 do Conselho de Segurança desse mesmo dia, reafirmando os princípios e propostas da Carta das NU e em particular a resolução 1373 (2001) de 28 de Setembro, condenava em termos muito fortes os ataques levados a efeito pela ETA, no qual tinham sido perdidas muitas vidas, exprimia a sua profunda simpatia e condolências ao povo e Governo de Espanha, e insistia para com todos os Estados de acordo com as suas obrigações assumidas com a resolução 1373 (2001) para que cooperassem activamente nos esforços para trazer à justiça todos os autores, organizadores e responsáveis dos ataques terroristas, e exprimia a sua reforçada determinação para combater todas as formas de terrorismo de acordo com as suas responsabilidades expressas na Carta das NU.
 
Há que realçar que nas investigações que se iniciaram, se tornou evidente que os ataques não tinham sido da autoria da ETA mas apontavam seriamente ao envolvimento da Al Qaida.
 
2.2 Londres 2005
 
Em 7 de Julho de 2005, quatro explosões abalam Londres. Às 8h50 três bombas explodem com uma diferença de 50 segundos em três carruagens do metropolitano. Uma quarta bomba explodiu num autocarro às 9h47 na Praça Tavistock. Total de mortos: 56 incluindo os terroristas e 700 feridos. Foi o atentado mais mortífero em Londres desde a 2ª Guerra Mundial.
 
O momento não foi escolhido por acaso. Estava a decorrer em Londres o primeiro dia da 31ª Cimeira do G 8. O Reino Unido tinha há pouco iniciado a Presidência do Conselho da União Europeia.
Mas as NU empenhadas como estavam na reconstrução do Iraque, tinham sofrido um sério atraso:
A resolução 1611 do Conselho de Segurança desse mesmo dia, reafirmando as propostas e os princípios da Carta das NU, e em particular as resoluções 1373 (2001) de 28 de Setembro de 2001 e 1566 (2004) de 8 de Outubro de 2004, condenava sem reservas os ataques terroristas em Londres no dia 7 de Julho, e considerava todos os actos terroristas como uma ameaça à paz e segurança; exprimia a sua mais profunda simpatia e condolências às vítimas dos ataques e às suas famílias, assim como ao povo e governo do Reino Unido;
Insistia com todos os Estados, de acordo com as suas obrigações à luz da resolução 1373 (2001), para cooperarem activamente nos esforços para encontrarem e trazerem à justiça os organizadores e responsáveis por aqueles actos bárbaros; e exprimia a sua máxima determinação para combater o terrorismo, de acordo com as suas responsabilidades ao abrigo da Carta das Nações Unidas.
 
Comparando as duas resoluções designadamente 1530 (2004) e a 1611 (2005), constatamos que ambas traçam uma série de intenções a serem seguidas, mas que na prática não deixam de serem somente uma carta de intenções vinculativas aos Estados mas sem a eficácia necessária que deveriam ter, o que demonstra uma das fragilidades das NU nos dias de hoje, face aos acontecimentos terroristas.
 
 
3.  Sérgio Vieira de Mello; A sua Missão e Morte ao Serviço das NU
 
Em Maio de 2003, o diplomata brasileiro Sérgio Vieira de Mello foi nomeado para representante do Secretário-Geral da ONU - Kofi Annan - no Iraque, inicialmente por um período de quatro meses.
 
Mas quem era Vieira de Mello? Nascido em 1948, foi um diplomata onusiano e cidadão cosmopolita, que dedicou 34 anos da sua vida ao serviço das NU. Era filho de um diplomata que acompanhou em várias missões pelo mundo. Estudou na Universidade de Paris, na Sorbonne, onde se licenciou e tirou o mestrado em filosofia, tendo a seguir feito o doutoramento e em 1985, o doutoramento em letras e ciências humanas.
 
Entrou na ONU em 1969, ainda a estudar. Passou a maior parte da sua carreira trabalhando nas NU para refugiados em Genebra e em operações humanitárias no Bangladesh, Sudão, Chipre, Moçambique e Peru. Em 1991, Conselheiro político sénior das forças das NU no Líbano. Director do departamento regional para a Ásia e Oceânia. Entre 1991 e 1996, como Enviado Especial do Alto-Comissário ao Camboja. Mais tarde Representante especial do Secretário-Geral Kofi Annan no Kosovo. De Novembro de 1999 a Maio de 2002, exerceu o cargo de Administrador Transitório da ONU em Timor-Leste, e em 12 de Setembro de 2002 foi nomeado Alto-Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos. Posteriormente, em Maio de 2003, foi indicado por Kofi Annan para ser seu Representante Especial durante 4 meses no Iraque.
 
Sérgio Vieira de Mello foi um dos homens que obtiveram êxito e visibilidade no cenário internacional. O carácter humanista da sua formação, associados ao, seu enorme talento para as negociações e a defesa da democracia mesmo em situações adversas, foram factores chaves do sucesso das suas iniciativas.9
 
O seu modelo de actuação assente nos princípios da independência e da imparcialidade, era o diplomata Sueco Dag Hammarskold (1905-1961) Secretário-Geral das NU morto em missão de paz no Congo (1961).10
 
A sua tarefa era a de coordenar a ajuda humanitária internacional e de reconstrução no Iraque assim como prestar assistência ao povo iraquiano em coordenação com os Estado Unidos e o Reino Unido. Para além disso, trabalhava com as potências ocidentais para restabelecer as instituições nacionais e internacionais, com vista a facilitar o processo que levaria à formação de um governo reconhecido internacionalmente.
 
Entre as suas funções estava também a reconstrução das infra-estruturas fundamentais e a promoção do regresso dos refugiados, reconstrução económica, respeito pelos direitos humanos, a reforma judicial, segundo a resolução aprovada pelo Conselho de Segurança.
 
Como era a situação no Iraque quando Vieira de Mello é nomeado como representante do Secretário-Geral? Essencialmente de ambiente de guerra civil, e de insurreição popular habilmente conduzida por movimentos terroristas nomeadamente a Al-Qaida de Osama Bin Laden, segundo fontes do Pentágono.
 
As sabotagens dos sistemas de abastecimento de água, energia e de estruturas da indústria de petróleo, atrasavam os esforços da reconstrução do Iraque e causavam biliões de dólares de prejuízos. Paul Bremer, administrador americano no Iraque, afirmava então que o clima que se vivia não era de molde a estar optimista sobre a pacificação do território.
 
No dia 19 de Agosto de 2003, às 16h30 um carro bomba atingia o Hotel Canal, onde estava situada a sede das NU. Resultado: Sérgio Vieira de Mello que fica gravemente ferido morre horas depois, tendo conseguido através do seu telemóvel dar indicações do sucedido.
 
Resultado do atentado: 15 mortos e dezenas de feridos. 15 dias antes um atentado semelhante tinha matado 17 pessoas na Embaixada da Jordânia em Bagdad.
 
Os relatos dos sobreviventes do ataque ao Hotel Canal são elucidativos do dramatismo e da violência da explosão. Forças do Exército americano e do serviço de resgate das NU chegaram rapidamente ao local.
 
Fred Eckhard porta voz da ONU afirmava que “a explosão foi uma tragédia pessoal e um atraso político para a missão da ONU no Iraque”, mas o Conselho de Segurança no comunicado logo após o atentado declarava que “o atentado não quebrará a vontade da comunidade internacional em ajudar a população iraquiana(…)”.
 
Em 20 de Agosto de 2003, na 4811ª Reunião do Conselho de Segurança, o seu Presidente fazia a declaração condenando inequivocamente o ataque terrorista ao Quartel-General das NU em Bagdad e consequentemente à comunidade internacional, assim como os seus elementos terroristas e a necessi­dade imperiosa de os trazer à justiça. Mais à frente, o Conselho de Segurança, enaltecia veementemente todos aqueles que tinham perdido a vida ou ficado feridos, e muito particularmente o seu alto representante, Sérgio Vieira de Mello. Reafirmava também o respeito imperativo por todos aqueles que trabalhavam na organização no sentido de lhes ser dado em todas as circunstâncias a segurança adequada.
 
O Conselho de Segurança, reafirmava a sua determinação na assistência ao povo Iraquiano para a construção da paz e da justiça e, na determinação das NU em continuar as operações, e que não será intimidada por tais ataques.
 
 
4.  Conceitos Diversos de Terrorismo e Interpretações Consequentes
 
 
Pela complexidade e compreensão do fenómeno terrorista, existem vários conceitos a seguir: o mais elementar, segundo João Vieira Borges11 é o ataque indiscriminado a inocentes e a tentativa de introduzir o medo e o terror na vida quotidiana”.
 
Já para Mónica Santos (IPRIS, 30Set05) “é uma estratégia indirecta de luta não convencional, que recorre à ameaça ou uso premeditado de violência sobre civis, militares ou bens, propagando um clima de terror com o intuito de coagir o opositor de agir de acordo com os seus fins políticos, revestidos por motivações que podem não ser políticas”.
 
A Rand Corperation no “The New Age of Terrorism” afirma que o terrorismo tornou-se mais sangrento, menos dependente de Estados responsáveis, desenvolveu novos meios de organização, adaptou e explorou as novas tecnologias de comunicação, envolve campanhas globais e tem tido impacto estratégico. Nenhuma destas novas tendências permite fazer previsões ou extrapolar. É o terrorismo global numa aldeia global.
 
Os Estados Unidos da América utilizam três definições, designadamente o Departamento de Estado, Departamento da Defesa e FBI, de acordo com os interesses das respectivas instituições:
O primeiro afirma que o terrorismo consiste no uso premeditado da violência executada contra alvos não-combatentes por agentes sub-nacionais ou clandestinos, habitualmente destinada a influenciar uma audiência. Esta definição visa alargar o objectivo dos terroristas a militares que não estejam em combate, tal como aconteceu com o ataque ao USS Cole no Yemen em 2000.12
Já para o Departamento de Defesa Americano, o terrorismo é o uso calculado da violência ou da ameaça da violência contra indivíduos ou propriedades, para infundir o medo, com a intenção de intimidar governos ou sociedades com o fim de perseguir objectivos que geralmente são políticos, religiosos ou ideológicos.13 A terceira definição é aquela que é usada pelo FBI (Federal Bureau of Investigation), em que diz que é o uso ilegal da força ou violência contra pessoas ou para intimidar ou coagir um governo, população civil, com a intenção de alcançar objectivos políticos ou sociais.
Esta definição, muito semelhante à anterior, introduz uma nova variante dos fins terroristas, que são os objectivos sociais.
 
Michael Walzer (A Guerra em debate, pág 145) afirma que o Terrorismo é a matança deliberada de pessoas inocentes, aleatoriamente, a fim de espalhar o terror entre toda a população e forçar a mão dos seus dirigentes, diferencia o Terrorismo de Estado como a matança deliberada de pessoas inocentes, aleatoriamente, a fim de espalhar o terror e tornar impossível a oposição política, e introduz ainda o conceito de Terrorismo de Guerra, como “a matança de civis em tão grande escala que o governo é obrigado a render-se”, dando o exemplo de Hiroshima, mas que tem sido seguido ao longo do Séc XX e agora no Séc XXI.
 
No Counter-Terrorism Committee, Pág 17, o israelita Boaz Ganor, define o terrorismo como uma forma de luta violenta na qual a violência é deliberadamente usada contra civis, de modo a atingir objectivos políticos. Baseia esta definição em três elementos: a essência da acção (a forma da violência); os objectivos (que são sempre políticos); o objectivo da violência (civis).
 
Mas já Walter Laqueur 14 explica o terrorismo como “o uso de ameaça ou o uso da violência como um meio de combate, ou uma estratégia para conseguir certos objectivos, e pretende infundir nas vitimas um estado de medo, que é impiedoso e se encontra à margem de toda a regra humanitária, … e a propaganda é um factor essencial da estratégia terrorista”.
 
Nesta definição, Lacqueur realça a importância que tem para o terrorista a publicidade das suas acções como ferramenta para conseguir os seus fins, ignorando quaisquer normas humanitárias.
 
A Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO) define o Terrorismo utilizando uma fórmula intermédia das outras que consiste “no uso ou ameaça do uso ilegal da força ou da violência contra pessoas ou propriedades com a intenção de condicionar ou intimidar os governos ou sociedades para conseguir objectivos políticos, religiosos ou ideológicos”.
 
E porque estamos na União Europeia, em 2001 o Conselho da UE propôs detalhar uma série de acções que poderiam estar incluídos no conceito de agressão terrorista. Acções ou actos intencionais, que pela sua natureza e contexto, podem atingir seriamente um País ou uma organização internacional - tal como se define agressão em termos nacionais - cometidas com o propósito de intimidar seriamente a população, persuadir de forma determinante um governo ou organização internacional para levar a cabo ou omitir determinada acção, ou desestabilizar seriamente ou destruir a política constitu­cional ou económica, ou as estruturas sociais do País ou Organização internacional.15 A redacção deste texto foi objecto de imensas discussões no sentido de se conseguir unanimidade, provocadas por interesses de alguns sectores de excluírem da definição as propostas anti-globalização e determinadas actuações de grupos ecológicos.
 
As definições acima descritas, não fogem muito da definição empírica do terrorismo. As interpretações são muito semelhantes e quase que se tocam nas intenções. Mas existem outras também importantes, mas que divergem pela formulação que lhes é dada pelos princípios aparentemente contraditórios para o pensamento político Ocidental.
 
Refiro-me à sessão extraordinária da Conferência Islâmica dos Primeiros-Ministros sobre o terrorismo levada a efeito em Kuala Lumpur, na Malásia, de 1 a 3 de Abril de 2002. Nessa reunião, o Dr Mahatir Mohamad Primeiro-Ministro da Malásia abriu a conferência com um discurso no qual realçou a gravidade do terrorismo, a importância de o definir e a necessidade da cooperação para o combater. Rejeitou as ligações do terrorismo com o Islão e Muçulmanos. Sublinhou ainda a resistência às ocupações estrangeiras como um acto legítimo.
 
Estas linhas que sublinhei são extraordinárias pelo que contêm. Nelas consubstanciam todas as contradições do mundo actual na sua vertente Ocidente versus Oriente. Não se trata aqui do conflito das civilizações de Samuel Huntington, mas de algo mais profundo que passa por uma falta de consenso entre as partes, que se prevê cada vez mais incontornável.
 
Vejamos pois algumas partes da declaração final da Conferência Islâmica de Kuala Lumpur:
Rejeitam todas as tentativas de ligação ao Islão e Muçulmanos, visto que o terrorismo não tem qualquer associação com qualquer religião, civili­zação ou nacionalidade.
Condenam inequivocamente todos os actos de terrorismo internacional em todas as formas e manifestações, incluindo terror de estados, independentemente de motivos, autores e vítimas, visto que o terrorismo coloca uma série ameaça à paz e segurança, e é uma grave violação dos direitos humanos.
Reiteram as principais posições à luz da Carta das Nações Unidas no que concerne a legitimação da resistência à agressão estrangeira e à luta para a libertação nacional e auto-determinação dos povos sob ocupação colonial ou alheias. Nesse contexto, sublinham a urgência para um consenso internacional sobre a definição de terrorismo, a qual diferenciará as lutas legítimas dos actos terroristas.
Rejeitam quaisquer tentativas para ligarem os Estados Islâmicos e a resistência libanesa com o terrorismo, a qual constitui o impedimento para o combate global contra o terrorismo.
 
Esta afirmação pelo seu teor é extraordinária na cláusula onde afirmam o compromisso no combate contra o terrorismo internacional, em conformidade com os princípios da Carta das Nações Unidas, Direito Internacional e relevantes convenções internacionais. Estas incluem as relevantes implementações do Conselho de Segurança das Nações Unidas, particularmente a resolução 1373.
 
Ora essa resolução (1373) é exactamente aquela que foi emitida no pós 11 de Setembro, feita propositadamente em consequência dos ataques desse dia aos EUA! Mas mais curiosa pelos temas que aborda conceptualmente aceites pela comunidade internacional é a Convenção Árabe do Terrorismo que foi levada a efeito no Cairo em Abril de 1998, e que foi adoptada pelos Ministros do Interior e da Justiça dos Países Árabes. É um documento com 42 artigos, subdivididos em várias áreas de intervenção e de prevenção contra os actos terroristas e cujo preâmbulo diz que “desejando promover a cooperação mútua na eliminação de crimes terroristas, os quais posicionam uma ameaça à segurança e estabilidade das Nações Árabes e põem em perigo os seus interesses vitais” e “estando empenhados no Pacto da Liga dos Estados Árabes, na Carta das Nações Unidas, e em todas as outras convenções e instrumentos nos quais os Países envolvidos nesta convenção fazem parte”.
 
Afirmando o direito dos povos de combater as ocupações estrangeiras e agressões por quaisquer que sejam os meios incluindo luta armada, com o fim de libertar os seus territórios e assegurar os seus direitos à autodeter­minação, e independência e preservar a integridade territorial de cada País Árabe, de acordo com as anteriores propostas e princípios da Carta das Nações Unidas e das suas resoluções”.
 
Na parte 1, Art 1, o Terrorismo é definido como qualquer acto ou ameaça de violência, quaisquer que sejam os seus motivos ou propósitos, que surjam por iniciativa própria ou colectiva, procurando semear o pânico entre os povos causando-lhes danos, ou colocando as suas vidas, liberdades ou segu­rança em risco, ou procurando causar prejuízos no ambiente, instalações públicas ou privadas, ou ocupando ou apoderar, ou procurando expor ao perigo recursos nacionais. Mas em 12 de Agosto de 2005, no âmbito da 6ª. Comissão da Assembleia-Geral, encarregada de chegar a um consenso sobre a definição de terrorismo na Convenção Geral contra o Terrorismo Interna­cional, que consta do documento A/59/894 desse dia, no Anexo 1 é dito que algumas delegações fizeram notar a necessidade de distinguir actos de terrorismo da legítima luta dos povos pela autodeterminação, acrescentando ainda uma sugestão para incluírem o conceito do Terrorismo de Estado na definição de terrorismo.
 
Nessas negociações surgiram vários Países com diferentes entendimentos do conceito. Assim, havia Estados do Médio Oriente - Síria e Irão - que se opõem à existência de Israel e que o acusam de “terrorismo de Estado”, acusando-o ainda de fomentar actividades terroristas no mundo Ocidental.
 
Outros Estados do Médio Oriente - Jordânia ou Egipto - seguem uma politica de aceitação da existência de Israel e tentam pela via negocial, levar à criação de um estado da Palestina.
 
Já Israel, é um Estado em conflito com os seus vizinhos e frequentemente acusado de terrorismo. Defronta-se quase permanentemente com grupos terroristas como o Hamas (actualmente no poder e não reconhecido por Israel), com a Hezbollah, com a Jihad Islâmica para a libertação da Palestina (Ansar Allah, facção Shaqaqi).
 
Vêm depois os Países Asiáticos, Sri Lanka, Índia com ligações ao grupo Harakar Ansar, da Caxemira, (alvo à dias de um violento atentado no caminho de ferro e a Indonésia com vários atentados levados a efeito pela Al-Qaida.
 
Os membros Asiáticos do Conselho de Segurança das NU tal como a Federação Russa, com os problemas da Chechénia onde existem vários grupos de resistência islâmica, incluindo seguidores de Dudayev, e Shamil Bashayev (este último morto em Julho passado).
 
Já a China, outro Estado Asiático membro do Conselho de Segurança das NU, tem problemas internos de terrorismo, tal como os separatistas Uighur do Xinjiang e especialmente da “Frente de Libertação do Turquestão Oriental”, incluída na frente de grupos de resistência anti-chinesa, conhecida como “Tujue Leste”.16
 
Do exposto, acima descrito, as divergências dos conceitos situam-se ao nível da clara separação entre os actos terroristas e os crimes de guerra. Segundo João Vieira Borges, para os Países ligados ao Islão ou para os pequenos Países, os actos desse cariz desencadeados em território ocupado por outras potências (direito de resistência) situam-se na esfera de guerra de guerrilha e por isso devem ser julgados como crimes de guerra. A maioria daqueles Estados considera que os actos e acções desencadeados por Estados como Israel e os EUA, devem ser considerados como Estados Terroristas.
 
Existem também movimentos de libertação que muitas vezes desenca­deiam ataques terroristas, e que confrontam Estados, os quais porque os consideram terroristas, usam de todos os meios ao seu alcance para os combater sendo um dos exemplos mais actuais a Rússia com a questão da Chechénia.
 
No campo Ocidental, a Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO) define o terrorismo, na sua publicação AAP-6, como o uso ou ameaça de uso ilegal da força ou da violência contra pessoas ou bens com a intenção de condicionar ou intimidar governos ou sociedades para conseguir objectivos políticos, religiosos ou ideológicos.
 
Por outro lado o Conselho da União Europeia em 27 de Dezembro de 2001, descreve como actos terroristas, uma série de acções que podem estar incluídas no conceito de agressão terrorista, tais como acções ou actos intencionados, que pela sua natureza se podem incluir no conceito de agressão terrorista.
 
Acções ou actos intencionais, que pela sua natureza e contexto, podem prejudicar seriamente um País ou uma Organização Internacional, cometidos com a intenção de intimidar a população, persuadir de forma determinante um governo ou organização internacional para levar a cabo determinada acção, ou desestabilizar/destruir a política fundamental, constitucional ou económica, ou as estruturas sociais de um País ou Organização Internacional.
 
A OSCE na sua estratégia para tratar das ameaças à segurança e estabilidade no séc XXI, em Dezembro de 2003 afirma que o terrorismo é uma das mais importantes causas da instabilidade na questão da segurança, e conti­nuará sendo a ameaça para a paz e estabilidade e para o poder do Estado, particularmente através da sua capacidade para utilizar métodos assimétricos para evitar os sistemas de segurança e defesa tradicionais. Não há justificação para o terrorismo qualquer que este seja, declara a OSCE no seu documento.
 
Por fim, a definição académica de terrorismo aceite pelas Nações Unidas, foi adaptada por de Alex P. Schmid 17 onde afirma que dada a complexidade e diversidades de perspectivas que existem sobre o terrorismo, não é possível definir adequadamente com uma só definição, sobre o que ocorre com o uso de violência ou a sua ameaça, a que se chama de terrorismo. O terrorismo é um método de reiterada acção violenta inspirada na angústia, utilizado por pessoas, grupos ou Estados de forma clandestina, por razões idiossincrásicas, criminosas ou políticas, por meio das quais - a diferencia do assassinato - o objectivo imediato da violência não é o objectivo final.
 
Pode-se afirmar de uma maneira mais simplista, que o terrorismo consiste na ameaça do uso da força para se conseguir um objectivo político.
 
Já Koffi Annan na Assembleia-Geral em Dezembro de 2004, definiu o Terrorismo como “O terrorismo constitui qualquer acção que vise matar ou afectar seriamente civis desarmados ou não combatentes, com o objectivo de intimidar a população ou compelir a acção de qualquer Estado ou Organi­zação Internacional”.
 
Kofi Annan, evita falar sobre terrorismo de Estado, adiantando que não cabe às Nações Unidas determinar se os Estados podem ou não ser reconhecidos culpados de terrorismo, mas simultaneamente que a luta contra o terrorismo se deve fazer respeitando os direitos humanos e o primado do direito.
 
Essa posição do Secretário-Geral enferma das precariedades das situações internacionais, onde fica patente o quão difícil é chegar-se a um consenso em que os actores intervenientes não se conseguem entender, optando por uma tomada de posição que seja inócua na sua aplicação prática.
 
A actual situação no diferendo de Israel com o Hezbollah é um reflexo bem evidenciado da falta de capacidade do Conselho de Segurança chegar à emissão de uma simples resolução que tarda a surgir, e pior ainda na falta de uma vontade da comunidade internacional em iniciar as diligências para a composição de uma força multinacional18.
 
Como se vê dos vários conceitos acima indicados, constata-se que um dos principais problemas que se depara às organizações internacionais no momento de estabelecerem políticas de coordenação para a luta contra o terrorismo são de facto as diferentes concepções que cada uma delas tem sobre o terrorismo. As causas dessas diferenças são equacionadas por Rafael Calduch Cervera,19 professor catedrático das Relações Internacionais na Universidade Complutense de Madrid, as quais resume do seguinte modo: “quando nos referimos ao terrorismo ligamo-lo a uma série de fenómenos todos eles caracterizados pela sua dimensão conflituosa e violenta, ainda que os parâmetros diferenciadores sejam tão numerosos e significativos como as opiniões comuns que se possam apreciar nas suas manifestações. Talvez esta seja uma das razões que explicam a quantidade e variedade de definições de terrorismo que tenham sido formuladas e que tornem muito difícil a tarefa de se proceder a uma percepção rigorosa deste fenómeno”.
 
 
5.  As Organizações Internacionais na Luta Contra o Terrorismo
 
5.1 As Nações Unidas
 
Nas Nações Unidas, existem mais de 12 convenções e protocolos internacionais contra o terrorismo e muitas das resoluções do Conselho de Segurança abordam aquele problema, mas como já atrás foi referido, não existe uma definição comum do fenómeno, sendo o maior problema a pretensão dos Países Islâmicos de distinguirem o terrorismo da luta dos povos contra a ocupação e pela sua livre determinação.
 
A ideia do terrorismo ser um problema pontual desapareceu há muito. Cada vez mais é maior o conhecimento que por detrás de qualquer acto terrorista, existe uma rede terrorista internacional que o apoia a nível preparatório, financeiro, material, logístico e informativo.
 
Para responder a estas ameaças, as Organizações Nacionais não bastam: têm que coexistir com outros Governos e Organizações Internacionais tais como as Nações Unidas que tratam desse fenómeno desde a sua constituição em 1948. Em Setembro de 1972, no seguimento dos atentados dos Jogos Olímpicos de Munique, a Assembleia das Nações Unidas incluiu na sua agenda um programa sobre as medidas a tomar para prevenir o terrorismo internacional e o seu estudo, as quais levaram à criação em Dezembro de 1972, do Comité Especial sobre o Terrorismo Internacional, que se foi desenvolvendo ao longo dos anos através das informações e Resoluções do Conselho de Segurança abordando os temas do terrorismo Internacional.
 
As resoluções 1269/99 do Conselho de Segurança e a 52/110 da Assembleia-Geral sobre “medidas para eliminar o terrorismo internacional” evidenciavam a dificuldade de se obter uma resposta conjunta no combate ao terrorismo. Com os acontecimentos do 11 de Setembro e no seguimento da resolução 1373 de 28 de Setembro de 2001, foi decidido estabelecer um Comité contra o terrorismo (Counter-Terrorism Committee), para verificar a aplicação da citada resolução, tendo posteriormente saído a resolução 1377 de 12 de Novembro, a qual fazia um apelo a todos os Países para que intensificassem os seus esforços para eliminarem o terrorismo internacional. Em Agosto de 2002, o Grupo de trabalho das NU sobre o terrorismo elaborou uma informação com várias considerações nas quais concluíam que as NU não estavam nas melhores condições para actuarem com dinamismo em ope­rações destinadas a eliminarem grupos terroristas, anteciparem-se a ataques terroristas ou desenvolverem técnicas de colheita de informações. Duvidavam pois, do sucesso das NU em matéria de contra-terrorismo.
 
Consideravam no entanto que as Nações Unidas deveriam concentrar os seus esforços no combate ao terrorismo nas áreas em que a Organização dispõe da legitimidade internacional derivada do seu carácter Universal.
 
A contribuição das NU deveria aplicar-se em três áreas: no estabelecimento das normas, nos direitos humanos e nas comunicações. A cooperação entre as NU e outros Organismos deveria ser mais sistemática, e deveria garantir um maior grau de coordenação e coerência interna.
 
Finalizava a informação com 31 recomendações nas áreas da dissuasão, direitos humanos, medidas preventivas, cooperação, coordenação e coerência das Nações Unidas. A consequência desta informação foi o Counter-Terrorism Committee ter sido reforçado na sua vertente operacional, o qual integra 15 membros do Conselho Geral, coordenando as actividades nacionais e internacionais contra o terrorismo, aconselha os Estados nas obtenções de capacidades específicas e vigia o cumprimento da resolução 1373.
 
Tem tido um certo êxito no restabelecimento global contra o terrorismo, embora não disponha de uma lista de organizações terroristas nem possa impor sanções.
 
No documento “Um Mundo mais seguro” aprovado em Dezembro de 200420 são enunciadas as medidas a tomar para uma estratégia na luta contra o terrorismo:
A Dissuasão, que procura remediar as causas do terrorismo ou os factores que o facilitam, com medidas para promover os direitos sociais e políticos, o Estado de Direito e a reforma democrática.
Pôr fim à ocupação e atender às principais reivindicações políticas, lutar contra a delinquência organizada, reduzir a pobreza e desemprego e evitar a desintegração dos Estados.
 
Medidas para contrariar o extremismo e a intolerância, através da educação e a promoção do debate público.
 
O desenvolvimento de melhores instrumentos de cooperação mundial na luta contra o terrorismo, inserida num espectro jurídico que respeite as liberdades civis e os direitos humanos, a partilha da informação confidencial quanto possível, e as medidas de interdição no que respeita aos controles financeiros.
 
O fortalecimento da capacidade estatal para impedir as actividades de recrutamento e operações dos grupos terroristas, assim como o controle de materiais perigosos e a protecção da saúde pública.
 
Aos Estados-membros que ainda não tivessem ratificado o documento deveriam assinar e ratificar as 12 convenções internacionais contra o terrorismo, assim como as recomendações sobre o seu financiamento.
 
O Conselho de Segurança após consulta dos Estados afectos, deverá estender a competência executiva do Counter-Terrorism Committtee ao exer­cício de uma função de coordenação da assistência prestada por Estados a outros nas questões militares, policiais e o controle das fronteiras com o fim de aumentar a capacidade interna no combate ao terrorismo.
 
Para ajudar os Estados a cumprir as suas obrigações no campo do combate ao terrorismo, as Nações Unidas deverão estabelecer um fundo financeiro para a formação, que dependerá da Direcção executiva do Committee.
 
O Conselho de Segurança deverá elaborar um programa de sanções predeterminadas para os Estados que não cumpram as resoluções do Conselho de Segurança relativas ao combate ao terrorismo. E por último, a Assembleia-Geral deverá concluir rapidamente as negociações para se conseguir uma Convenção geral relativa ao terrorismo.
 
5.2 OSCE - Organização para a Segurança e para a Cooperação na Europa
 
A OSCE, é hoje vista como um parente pobre das Organizações multilaterais de Segurança.21 As suas estruturas permanentes assentam num Secreta­riado com escasso poder de iniciativa, vocacionado para a gestão adminis­trativa e para a montagem logística de operações de limitada dimensão, e no plano político, totalmente subordinado à orientação das Presidências anuais.
 
Nos acontecimentos pós 11 de Setembro de 2001, a OSCE, a sua Presidência estava adstrita a Portugal, que desde logo se viu forçada a proceder a uma readaptação criada pelo 11 de Setembro, procurando potenciar a visibilidade e a utilidade efectiva da organização no esforço colectivo, liderado pelas Nações Unidas. Para isso, elaborou, em 4 de Dezembro de 2001 em Bucareste, a sua proposta de acção para o combate ao terrorismo, que recorreu a medidas a aplicar a curto e médio prazo, com o fim de estabelecer um objectivo geral de acções a serem levadas a efeito pelos Estados-membros para combater o terrorismo, respeitando a legislação internacional.
 
Pretende com isso, expandir as actividades existentes que contribuam para o combate ao terrorismo, facilitando a interacção entre os Estados. Ao promover medidas de prevenção na luta contra o terrorismo, tais como a transparência nos sistemas nacionais do mercado sobre a importação e exportação de armas, no intercâmbio de informação e ratificação por parte dos Estados-membros nas convenções de limitação de armas convencionais.
 
A OSCE criou também estruturas específicas para o combate ao terrorismo, tais como a Unidade de Acção contra o terrorismo (ATU - Action against terrorism Unit) com a finalidade de estudar as deficiências das capacidades antiterroristas dos Estados-membros. Esta unidade está integrada no secre­tariado e proporciona informações e aconselhamento.
 
Em Dezembro de 2003, criou a chamada CTN (Counter Terrorism Network), que proporciona as ligações entre as delegações dos Estados-membros, individualidades nacionais reconhecidas na área e a própria ATU.
 
A OSCE tal como as Nações Unidas rege-se mais pela adopção de medidas preventivas, do que por medidas coercivas. Mas sendo uma Organização que é composta por 55 Países para além dos EUA e Canadá, mas limitada nos seus meios, não se espera muita coisa em termos futuros, devendo ser a sua missão a de manter presença nos processos do combate ao terrorismo através de normas, directivas e coordenação, e principalmente o envolvimento activo nos processos de desarmamento e resolução das crises como o tem feito na Bielorrússia, Ucrânia e Moldava e no Cáucaso (Geórgia e Arménia/Azerbeijão).
 
5.3 NATO
 
O Terrorismo não é um tema novo para a NATO, mas foi com os acontecimentos do 11 de Setembro que a obrigou a um novo desenvolvimento no que respeita à definição de objectivos e de novas medidas para tratar das novas ameaças à segurança. Em finais de 1981, os Ministros dos Negócios Estrangeiros da Aliança, reconheciam que apesar do terrorismo ser objecto de estudo e prevenção da parte de outras organizações, era no entanto necessário combatê-lo a um nível mais elevado entre os governos aliados, tendo em conta o elevado número de actos terroristas contra lideres políticos dos Países aliados. (O Papa João Paulo II, Reagan, Sadat etc.) A NATO fez então pela primeira vez, uma declaração política de adopção de medidas específicas para uma acção colectiva eficaz contra os actos terroristas. Mais tarde na Declaração de Halifax de 1998, voltava a reiterar que o terrorismo constituía uma grave ameaça para a segurança. Os Países aliados reafirmaram a necessidade de intensificar o combate ao terrorismo em todas as suas formas, de onde quer que viesse, e vincaram a necessidade de uma maior cooperação internacional a todos os níveis.
 
Mas as opiniões públicas não ligaram muito à declaração de Halifax, nem mesmo os aliados tomaram consciência da ameaça terrorista que se avizi­nhava, e nem mesmo depois do ataque de 11 de Setembro, quando se pôs a questão da aplicação do art 5º do Tratado de Washington, verificou-se que não houve consenso porquanto os Aliados não definiram qual o alcance dos atentados às Torres, não tendo dado consequentemente o tratamento qualificado ao atentado, e consequentemente apesar dos EUA terem invocado o art 5º, não foi aplicado.
 
Curiosamente, o Conceito Estratégico da Aliança aprovado pelos Chefes de Estado e do Governo em 24 de Abril de 1999, dizia que apesar de reconhecerem que seria improvável uma agressão convencional em larga escala, aquela ameaça pairava a longo prazo. Afirmavam ainda que os riscos militares tais como a proliferação de armas de destruição maciça nucleares, químicas e biológicas, a difusão à escala mundial de tecnologias para a produção de armas, e os riscos não militares tais como movimentos incontroláveis das populações, a perturbação de fluxos de recursos vitais e os actos de terrorismo, sabotagens ou crime organizado, são difíceis de prever.
 
No Comunicado de Washington “Uma aliança para o séc. XXI” publicado em Abril de 1999, as ameaças são referidas, com a diferença de que no Conceito Estratégico da Aliança, considera que o terrorismo deve ser com­batido porque é uma “grave ameaça para a paz, segurança e estabilidade que poderá pôr em risco a integridade territorial dos Estados”, enquanto que o segundo (Comunicado de Washington) considera-o simplesmente um risco.
 
Mas já na Cimeira de Praga em Novembro de 2002, a NATO, reconheceu o combate ao terrorismo como uma nova missão, concluindo que a luta contra o terrorismo recai sobre os Estados-membros, sendo os objectivos da NATO ajudá-los na dissuasão, defesa, intercepção e protecção face às ameaças terroristas vindas do exterior, sempre que for necessário.
 
O documento contempla quatro áreas de actuação, respectivamente o anti-terrorismo, que trata de um conjunto de medidas defensivas para reduzir a vulnerabilidade de forças, pessoas e bens, partilha de informações, ajuda na vigilância aérea e naval. A segunda medida - gestão das medidas - que visa atenuar os efeitos destrutivos dos ataques terroristas, intervindo com especialistas na guerra nuclear e biológica. A terceira área refere-se ao contra-terrorismo - que trata das acções ofensivas de cariz militar que vão desde a dissuasão à resposta contra ataques ou ameaças de grupos terroristas e seus apoiantes. E por último, a cooperação militar - que aborda um conjunto de medidas para incrementar a coordenação de esforços entre as Organi­zações internacionais e os Países Aliados.
 
Na Cimeira de Istambul em Junho de 2004 é reconhecida a determinação da NATO em combater o terrorismo de todas as formas, em conformidade com as normas internacionais e os princípios da Carta das NU, traduzindo-se na partilha de informação entre as Nações, resposta rápida aos pedidos de ajuda para protecção contra ataques terroristas, aumentar a vigilância do tráfego marítimo do Mediterrâneo.
 
Estas medidas têm sido levadas a efeito, por exemplo na Grécia nos Jogos Olímpicos, no Afeganistão com a liderança da Força de Assistência e Segurança.
 
Segundo a doutrina NATO é preferível dissuadir ou prevenir os ataques terroristas do que enfrentar as suas consequências, apesar de qualquer acção a empreender na luta contra o terrorismo requeira a aprovação prévia de todos os Estados-membros. É no entanto indiscutível a liderança da NATO no campo militar contra o terrorismo, entre as organizações internacionais. A sua componente militar tem uma estrutura de comando que lhe permite planificar qualquer acção de contingência em qualquer cenário, realizando exercícios e manobras conjuntas, impulsionando o desenvolvimento das novas tecnologias. A sua Força de Reacção Rápida (NRF Nato Response Force) poderá ter no futuro, missões concretas no combate ao terrorismo.
 
De facto, a NATO contém doutrina, planos específicos e estruturas concretas para o combate ao terrorismo, mas deverá obter uma convergência real sobre os dois vectores que existem no seu seio, isto é o vector bélico liderado pelos EUA que consiste na estratégia de usar medidas preventivas e ofensivas, sendo a função principal destinada à componente militar.
 
A maior parte dos Países Europeus preferem o vector da eliminação das causas, em cuja estratégia se apoia em medidas preventivas e defensivas, na certeza de que se não pode derrotar o terrorismo enquanto se não eliminarem as causas que o originam, e para isso deverão preferir-se medidas políticas, económicas, policiais e sociais ao uso dos meios militares.
 
5.4 União Europeia
 
Na sequência dos ataques do 11 de Setembro, a União Europeia dez dias após o Conselho Europeu depois da sua reunião extraordinária do dia 21 de Setembro, declarava que “o terrorismo é um verdadeiro desafio para a segurança da Europa e do Mundo, e que o combate ao terrorismo se converterá no objectivo prioritário da União Europeia”. Foi também aprovado o Plano de Acção que incorpora a política europeia para combater o terrorismo, o qual consiste em reforçar a cooperação policial e judicial entre os Estados-membros, fomentar o intercâmbio da informação, ampliar o âmbito da cooperação na segurança aérea, proporcionar o desenvolvimento de instrumentos internacionais legais, com o fim de impedir o financiamento do terrorismo, inclusive a coordenação da acção global da União Europeia na luta contra o terrorismo.
 
No Conselho Europeu informal em 21 de Outubro desse mesmo ano, foi aprovada uma Declaração sobre o “seguimento dos atentados do 11 de Setembro e a luta contra o terrorismo”, onde se dava conta das acções empreendidas e que realçava a necessidade de se realizarem determinadas acções, destacando-se a definição comum do terrorismo, e a aprovação formal de uma Directiva contra o branqueamento de capitais e aprovação de propostas sobre a segurança aérea. Também referia a necessidade de intensificar a cooperação entre os serviços encarregados do combate ao terrorismo, designadamente, a Europol, os serviços de informação, a polícia e autoridades judiciais, de modo a permitir um estabelecimento de uma lista de organi­zações terroristas ainda nesse ano.
 
Apesar dos avanços obtidos no combate ao terrorismo, as missões militares a serem desenvolvidas pela União Europeia eram as mesmas que as descritas pelas “missões de Petersberg”, as quais não incluíam a luta contra o terrorismo. Assim, foi dado um primeiro passo na Convenção de Sevilha, para a reformulação daquelas missões.
 
Mas, em 12 de Dezembro de 2003, com o documento “Uma Europa segura num mundo melhor” apresentado por Javier Solana, iria dar lugar à Estratégia Europeia de Segurança, a qual daria pela primeira vez na História da União Europeia um marco doutrinal em questões de segurança.
 
Essa Estratégia Europeia de Segurança, constitui um elemento essencial para compreender as missões das forças militares da União Europeia, referindo o terrorismo como uma das principais ameaças à segurança, juntamente com a proliferação das armas de destruição maciça, os conflitos regionais, a decomposição dos Estados e o crime organizado. Considera que nenhuma destas ameaças é meramente militar e que não pode atacá-las com meios militares, mas sim com outros instrumentos próprios como Serviços de Informações, Policiais e Judiciais.
 
Se já se tinha avançado bastante na sequência do 11 de Setembro, os ataques terroristas de 11 de Março de 2004 em Madrid, vieram a fazer que se dessem passos muito grandes na matéria, como em 25 de Março de 2004, o Conselho Europeu em Bruxelas emitiu a “Declaração da luta contra o terrorismo” onde os Estados-membros se comprometiam entre outras coisa a reforçar a cooperação existente, os controles de fronteiras, impedir o financiamento do terrorismo e melhorar a cooperação internacional.
 
Dessa declaração destacam-se dois itens muito importantes, tratando o primeiro da solidariedade contra o terrorismo que consiste no compromisso político dos Estados-membros e aderentes actuarem conjuntamente contra os actos terroristas, o segundo22 o compromisso dos Estados-membros mobilizarem todos os seus esforços de que disponham incluindo meios militares para prevenir ameaças terroristas em qualquer território da União Europeia, protecção das Instituições democráticas e das populações civis de possíveis atentados, e proporcionar assistência a um Estado-membro em caso de atentado.
 
Com os ataques perpetrados em Londres em 7 de Julho de 2005, o Conselho para além das declarações de 13 de Julho condenando veementemente os actos, preparou uma estratégia da União Europeia num documento que apresenta um compromisso estratégico da União para “lutar contra o terrorismo à escala mundial, respeitando simultaneamente os direitos humanos, e tornar a Europa mais segura, permitindo aos seus cidadãos viver num clima de segurança e justiça.23
 
Dos expostos, acima descritos, está provado que a União Europeia dispõe de doutrina, procedimentos e organização para o combate ao terrorismo, e tal como a NATO, o seu papel é ajudar os Estados-membros na luta contra o terrorismo, sendo as suas decisões transformadas em recomendações e pelos Estados-membros adoptada pelas suas legislações nacionais.
 
A União Europeia tem uma visão estratégica global do combate ao terrorismo, dispondo de excelentes meios para a acção contra-terrorista, decidindo criar medidas defensivas nos seus próprios territórios e começando a ter capacidades para a luta contra o terrorismo que lhe permitirão levar a cabo o papel de actor internacional.
 
 
6.  Conclusões
 
 
Não é fácil para o autor chegar a uma conclusão optimista quanto a consciência o pede.
 
O Terrorismo transnacional global constitui uma ameaça global que exige como resposta uma estratégia global, em que tomam parte todos os actores numa perspectiva multilateral e multinacional, com destaque para os EUA, mas sempre em conjunto com as outras Organizações Internacionais.
 
Sabendo que o terrorismo se alimenta essencialmente dos “media” para difundir globalmente as suas acções espectaculares, cujo paradigma são os ataques às torres no 11 de Setembro de 2001, cujos actos foram vistos por toda a Humanidade graças à CNN (as câmaras das Tvs já estavam no local aquando do segundo ataque), no momento em que os Estados determinarem que os seus órgãos de Comunicação não publicitem abusivamente as filmagens, intervenções e fotografias dos actos terroristas (como Londres em 2005), então poderemos ter uma certeza que os terroristas pensarão duas vezes antes de provocarem atentados, visto que a visibilidade será quase inexistente.
 
Mas são e serão as Nações Unidas que pela sua legitimidade universal a quem vão caber as grandes mudanças na Paz e na Guerra neste século XXI.
 
Essencialmente a estratégia aconselhada às Nações Unidas de dissuadirem grupos de descontentes, de negarem a grupos ou indivíduos os meios para levar a cabo todos os actos terroristas, e implementar a cooperação internacional na luta contra o terrorismo, tem uma certa eficácia, mas rodeada de cautelas no sentido de estarem atentas a não darem apoio incondicional a todas as medidas adoptadas em nome do contra-terrorismo.
 
Assim deverão as acções das Nações Unidas seguir três vias, respectivamente, nos Direitos Humanos, na Justiça e na Comunicação.
 
Só desse modo, as Nações Unidas como Organização que integra 191 Países pode aproveitar as vantagens que são o seu carácter Universal, o alcance mundial das suas opiniões e actuações, a legitimidade internacional que as Nações Unidas desfrutam e a credibilidade do seu Secretário-Geral.
 
É inegável que as Nações Unidas já melhoraram muitíssimo na tomada de consciência da gravidade do problema do terrorismo, se bem que os resultados não tenham sido satisfatórios até ao momento. O fenómeno da globalização do terrorismo coloca as Nações Unidas como o órgão adequado para tratar daquele tema, providenciando a todos os Países uma área legal internacional, no respeito das soberanias nacionais para se poder levar a cabo uma cooperação internacional na eliminação do terrorismo. Essa cooperação deve levar em conta a eliminação das raízes com que alguns membros pretendem justificar o terrorismo. Pela resolução 1566, as NU deverão empreender acções para eliminar as barreiras culturais, económicas e sociais que dividem a nossa sociedade.
 
A luta contra a pobreza deverá ser uma das metas que as Nações Unidas deverão fixar, visto que os grandes desequilíbrios económicos são justificados por alguns Estados-membros como uma das causas do terrorismo. O controle dos meios de financiamento dos movimentos, sendo o narcotráfico uma das maiores ameaças e o seu combate deverá incluir medidas para o reduzir.
 
O Terrorismo é a maior ameaça à sociedade actual, e as acções das Nações Unidas pautaram-se pela adopção de resoluções que não têm carácter vinculativo, mas somente apelativo.
 
Os acontecimentos do 11 de Setembro, ocasionaram que o Conselho de Segurança aprovasse por unanimidade uma ampla série de medidas para combater o terrorismo.
 
Do êxito das acções do Comité contra o Terrorismo para verificar o cumprimento das resoluções e obrigações dos Estados tentando dissuadir grupos descontentes de adoptarem práticas terroristas, fomentar a cooperação internacional sempre no respeito dos direitos humanos e da justiça, e conseguirem a resolução do conflito do Médio-Oriente (no momento actual talvez o maior desafio que se depara às Nações Unidas pela sua complexidade) dependerá o futuro dessa Organização tão extraordinária que tem sido o símbolo da procura da Paz e da Segurança mundial.
 
A reforma em curso das NU é um objecto primordial, começando pela alteração dos membros permanentes do Conselho de Segurança. O estatuto da sua génese está completamente diferente na actualidade. Outros países emergiram e tornaram-se actores internacionais com importância tal como Alemanha, Japão, Índia, Nigéria, Brasil. Samuel Huntington refere que num mundo civilizacional seria ideal que cada civilização tivesse pelo menos um lugar no Conselho de Segurança. A União Europeia deveria ter um lugar próprio em vez da Inglaterra e França. Cada uma das civilizações teria assim um lugar de membro permanente, dando lugar ao multilateralismo num mundo global como o de hoje e não unilateralista que tem sido dominante.
 
Porque o terrorismo nunca esmorece, o combate terá que ser cada vez mais sofisticado, contínuo, e cooperativo, e não há melhor exemplo do que as as Nações Unidas, que têm desempenhado com imensa competência as administrações transitórias civis das NU, muitas vezes chamadas operações de paz com base no Capítulo VII da Carta, como por exemplo Camboja, Croácia, Kosovo e Timor-Leste, também na luta contra o terrorismo terá de desempenhar um papel mais relevante.
 
O Secretário-Geral Kofi Annan afirmou que as Nações Unidas deveriam ter a coragem de reconhecer que, se existem objectivos comuns, também existem inimigos comuns. Resta saber se se conseguirá obter consenso relativamente à forma - que deveria ser comum - de combater esses inimigos.
 
Nunca deveremos esquecer as admiráveis palavras de Boutros-Ghali quando na Agenda para a Paz em 1992 disse ….”As Nações Unidas são a expressão de um nobre e corajoso ideal. Chegou o momento de todos os povos e nações da Organização, assim como todos os homens e mulheres que nela trabalham, aproveitarem esta oportunidade perante o futuro”.
 
Isso passava-se em 1992! Hoje, com as nuvens cinzentas a pairarem no horizonte, com as dezenas de conflitos regionais sem resolução à vista, com o mundo muito mais global e complexo, cheio de assimetrias, o combate com sucesso ao terrorismo será o maior desafio que às Nações Unidas será cometido, com a ajuda de todos os povos e das Organizações Internacionais, irmanados no desejo de viverem num mundo com paz e segurança.
 
 
Bibliografia
 
BESSA, João Pinto, (2001) - As Nações Unidas e a Paz - Revista Militar Jan/Fev2001.
BORGES, João Vieira, (2006) - O Terrorismo Transnacional e a Estratégia - IDN
Terrorismo: razões da ausência de um conceito comum, Newsletter Abril06.
CESEDEN, (2005) - Las Organizaciones Internacionales y la lucha contra el terrorism.
FERRO, MÓNICA, (2004) - A Organização das Nações (2006) Construção de Estados Unidos, Universidade Técnica de Lisboa.
GUEDES, Armando Marques, (2005) - O Pensamento Estratégico Nacional: que Futuro IDN.
HUNGTINGTON, Samuel P. - O Choque das Civilizações, Gradiva.
MATHIEU, Raphael, (2005) - La Lutte contre les Terrorismes, Centre d’Études de Defense.
MARSHALL, George, (2006) - Terrorism: Its Nature, Definition, and Trends.
MOREIRA, Adriano, (2004) - Terrorismo, Gradiva.
RIBEIRO, Manuel de Almeida - A Organização das Nações Unidas, Almedina.
ROGEIRO, Nuno, (2002) - A Guerra em Paz, Hugin.
WAYNE, E. Anthony, (2006) - Internacionalização do combate, Journal USA.
www.un.org/Docs/sc/committees/1373/.
www.onuportugal.pt
www.oic-oci.org/english/fm/11-extraordinary/final.htm
www.unhchr.ch/html/hchr/cv.htm.
www.unorg/terrorism/sc.htm
http://pt.wikipedia.org/wiki/Jihad
A/C.6/60/L.6 General Assembly
Resolutions 1373 (2001) 1526 (2004) 1530 (2004) 1611 (2005)
 
_____________
 
 
*      Tenente-Coronel do QTS. Presta serviço no Museu Militar, Curso de Mestrado em Relações Internacionais, Auditor de Defesa Nacional “2000”.Os meus agradecimentos ao Prof Dr Nuno Canas Mendes a quem devo a orientação deste trabalho, ao Gen Salazar Braga e Cor Vieira Borges pelas suas sugestões, ao meu Director, Cor Ribeiro de Faria, por ter sancionado a prestação do CPEN ao autor, e à D. Ermelinda Ferreira pela ajuda na composição informática do trabalho.
 
_____________
 
 1 Counter-Terrorism Committee.
 2 “Marco Pólo espião de Veneza” Jean Lartéguy.
 3 Nicolau Maquiavel “O Príncipe” (1469-1527).
 4 Maximilian Robespierre (1724-1794) tinha a alcunha de o Incorruptível.
 5 Nuno Rogeiro A Guerra e Paz-Cap.II.
 6 Walter Laqueur - Terrorism, Boston, 1977, pag. 149 150.
 7 “Post Modern Terrorism”, em Foreign Affairs, Set/Out96.
 8 http://pt.wikipedia.org/wiki/Jihad; “Jihad” significa “exercer esforço máximo” podendo também ser entendida como “luta” cuja ideia essencial é a de se combater em “Guerra Santa”, interna, mediante vontade pessoal de se buscar e conquistar a “fé perfeita”. O Alcorão descreve duas formas de “Jihad”: Uma, a “Jihad Maior”, é descrita como uma luta do indivíduo consigo mesmo, pelo domínio da alma; e a outra: a “Jihad Menor”, é descrita como “uma Guerra Santa” que os muçulmanos são obrigados a travar contra aqueles que são inimigos do Islão. De acordo com o sociólogo sírio-alemão especialista no Islão, ele próprio um muçulmano sunita, Bassam Tibi, o fenómeno do fundamentalismo islâmico é uma forma de oportunismo político de alguns grupos, que se aproveitam da noção de Jihad, desvirtuando o Islão para torná-lo um factor de acção política em proveito próprio.
 9 HHTPpt, wikipedia.org/wiki/SÃ@rgio_Vieira_de_Mello.
10 João Pinto Bessa em “AS NU E A PAZ” 2001.
11 O Terrorismo Transnacional e a Estratégia - Revista Nação e Defesa, Setembro 2006.
12 USA Department of State: “Patterns of global terrorism 2003”, Abril 2004.
13 Dod Directive 12/2000 USA Department of Defense.
14 Laqueur, Walter. No End to War: Terrorism in the 21st Century (Excerpts). N.Y & London: Continuum, 2003, pp.11-29.
15 Council of the European Union: Council Common Position on Combating Terrorism, 27Dec2001.
16 Nuno Rogeiro, Guerra e Paz, Pag. 820.
17 Political Terrorism: A Research Guide to Concepts, Theories, date Bases and Literature, pág. 70.
18 Na realidade, depois da conclusão deste trabalho, em 25 de Agosto de 2006, o Conselho de Segurança das NU, emitiu a resolução 1701, que determina o imediato cessar-fogo e retirada gradual de Israel e do Hezbollah do Sul do Líbano, tendo autorizado o envio de 15 000 soldados de uma força de paz das Nações Unidas (UNIFIL).
19 La incidência de los atentados del 11 de Septiembre en el terrorismo internacional.
20 Documento A/59/565 da Assembleia-Geral das NU.
21 Seixas da Costa - Uma segunda opinião.
22 Declaração do Conselho Europeu contra o terrorismo, Bruxelas 25/26 Março de 2004.
23 HHTP://EUROPA.EU/GENERALREPORT/PT/2005/RG82.HTM.
 
Gerar artigo em pdf
2006-12-10
1215-0
14128
243
Avatar image

Tenente-coronel

João Manuel de Andrade Pinto Bessa

REVISTA MILITAR @ 2024
by COM Armando Dias Correia