Nº 2638 - Novembro de 2021
Pessoa coletiva com estatuto de utilidade pública
Pedro Teixeira, um ilustre português que ajudou a forjar o Brasil
Tenente-coronel PilAv
João José Brandão Ferreira

Introdução

Que o historiador não ouse dizer uma mentira nem esconder uma virtude.”

Cícero (106 aC.-43 aC.)

 

É sabido – mas não suficientemente combatido – como a ignorância sobre o Brasil e nomeadamente a sua História, grassa do lado português, não sendo melhor o que se passa do outro lado do Atlântico relativamente a Portugal. Com a particularidade negativa na parte brasileira, de haver correntes de opinião muito críticas ou desdenhosas da acção dos portugueses em “Terras de Vera Cruz”. Já para não falar das tentativas mais modernas no tempo, de tentar reescrever, desvirtuar e até subverter, toda a História passada. De que a remoção de estátuas é apenas um dos lamentáveis episódios.

Figura 1 – Pedro Teixeira.

 

Ora, em todo este âmbito ocorreu desde sempre uma tentativa de “apropriação” das figuras portuguesas (enquanto tal) que se destacaram no Brasil, antes do “Grito do Ipiranga”, e incorporá-los na História do Brasil – de que não resulta grande mal ao mundo, diga-se – que verdadeiramente só começa “de facto”, a partir de 22 de Setembro de 1822 e “de jure”, após a assinatura do Tratado do Rio de Janeiro, em 29 de Agosto de 1825, em que o Governo de Lisboa reconhece a independência do maior território que tinha feito parte do “Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves”. De saudosa memória. Tratado que deve merecer hoje e sempre, uma leitura atenta.

No que resta de Portugal tem-se, por outro lado, deixado esquecer os feitos dos seus filhos ilustres em terras brasileiras e deixá-los “escorregar” para a esfera brasileira. São os casos do Padre António Vieira; Alexandre e Bartolomeu de Gusmão; o Padre Anchieta, o “Tiradentes”; os Sertanejos e bandeirantes; até os militares que lutaram contra os holandeses, os franceses, os espanhóis e os ingleses, enfim, poetas, escritores, cientistas, missionários, etc., é quase tudo visto como se fossem brasileiros e não portugueses. Parece que o único que escapa é o Pedro Álvares Cabral…

Cedemos, até, os restos mortais de D. Pedro IV (excepção feita ao seu coração que, por doação do próprio, está guardado na Igreja da Lapa, na cidade do Porto), aquando dos 150 anos da Independência Brasileira, a qual quase se confunde com uma “independência portuguesa”… Tudo sob a conduta ávida e rapace do “leão britânico” e os falsos progressismos maçónicos.

E não tenho dúvidas – por razões que não vou expôr – que os ditos restos mortais ficam bem melhor onde estão agora. E o que disse das figuras acima mencionadas também se aplica ao nosso Pedro Teixeira.

 

Antecedentes e enquadramento geopolítico

Resolveram pôr termo às disputas passadas e futuras, e esquecer-se, e não usar de todas as acções e direitos que possam pertencer-lhes em virtude dos referidos Tratados de Tordesilhas, Lisboa, Utreque e da Escritura de Saragoça… reduzindo os Limites das duas Monarquias aos que se assinalaram no presente Tratado.”

Do Tratado de Madrid, de 1750

 

A acção maior de Pedro Teixeira foi a subida do Rio Amazonas desde Gurupá, em 28 de Outubro de 1637, até chegar à cidade de Quito, em 10 de Novembro do mesmo ano. Mas já lá iremos. Este feito foi o melhor trunfo que Portugal, entretanto liberto da suserania Filipina, possuía para reivindicar para si quase toda a enorme bacia Amazónica, que os seus exploradores tinham diligentemente percorrido e desbravado, o que ficou consignado no Tratado de Madrid de 1750, assinado a 13 de Janeiro, também conhecido por Tratado dos Limites. O Tratado de Madrid tem os seus antecedentes mais remotos no Tratado de Tordesilhas de 1494, o qual sucedeu ao Tratado Alcáçovas, de 1479, ratificado em Toledo no ano seguinte. O Tratado de Alcáçovas regulou um número considerável de questões muito importantes, mas para o que nos interessa, estipula que no âmbito das navegações se estabeleceu uma linha imaginária que passava no paralelo das Ilhas Canárias (que esse tratado reconheceu definitivamente como pertencente a Castela); os espanhóis só poderiam navegar a norte dessa linha (e reivindicar as terras eventualmente descobertas) com a salvaguarda dos Arquipélagos da Madeira e Açores, já em mãos portuguesas (Anexo A – Cronologia).

Aos portugueses ficou reservado a navegação para sul (visando o monopólio do Golfo da Guiné) e o caminho livre para se chegar ao fim de África e a passagem para a Índia e o Reino de Prestes João. A primeira viagem de Cristóvão Cólon, em 1492/3, veio pôr tudo isto em causa. De facto, as terras em que este navegador afirmou ter tocado (e disso deu conhecimento em primeira mão a D. João II, quando se encontrou com ele em Vale do Paraíso, em Março de 1493), violavam o Tratado de Alcáçovas, facto que levou o Rei português a reivindicar as terras descobertas para si, desde logo mandando preparar uma esquadra para delas tomar posse. O que não mereceu a concordância dos Reis Católicos, acolitados pelo Papa Borgia, Alexandre VI. Estes eventos deram origem a negociações que se arrastram duramente até que se chegou a um acordo que levou ao novo Tratado de Tordesilhas, em 7 de Junho de 1494.

A divisão então feita e que regulava as futuras navegações entre portugueses e espanhóis (já que as restantes potências europeias ou asiáticas, nunca o aceitaram), ficavam divididas algo revolucionariamente, deve acrescentar-se, por uma linha de meridiano – que na altura não se sabia calcular com exactidão – tendo daí saído a célebre linha que dividia a terra de polo a polo e se situaria a 370 léguas a Oeste do Arquipélago de Cabo Verde. O que estivesse para Oeste pertencia a Espanha e o que se situasse a Este, seria para Portugal.

Ora esta linha apenas compreendia uma “fatia” do actual Brasil, passando o meridiano a Sul, na foz do Rio da Prata (curiosamente “descoberto” por um português, ao serviço dos monarcas espanhóis, Juan Diaz de Solis), o que desde logo levantou controvérsia dada a importância geopolítica da área e as imprecisões existentes na determinação da longitude. A situação foi respeitada por ambas as coroas, até que as Cortes de Tomar legitimaram Filipe II a cingir a Coroa Portuguesa.

Figura 2 – O Meridiano de Tordesilhas.

 

Tal facto permitiu que os portugueses passassem a circular livremente a oeste da linha de Tordesilhas, um imenso território praticamente desconhecido, e ainda nas possessões originalmente espanholas. Os habitantes destas possessões no continente sul-americano tinham, por outro lado, muito mais dificuldades em caminhar para norte ou oeste por falta de efectivos e não haver riquezas conhecidas que lhes suscitassem o interesse e, sobretudo, por causa dos obstáculos geográficos existentes.

Ora desde a Restauração do trono em mãos portuguesas devido à Aclamação do oitavo Duque de Bragança, como D. João IV, os territórios entretanto explorados foram ficando em mãos nacionais por ocupação efectiva e “direito consuetudinário, por usucapião”. A excepção foi a fronteira Sul do Brasil, nomeadamente aquela perto do Rio da Prata que foi objecto de conflitos e reivindicações constantes. Sobretudo, a chamada Colónia do Sacramento, fundada em 1680, e que se encontra na margem esquerda do Rio da Prata, frente a Buenos Aires. Entre esta data e a saída da presença política dos portugueses do Brasil, contei em dez o número de vezes que esta cidade mudou de mãos!

Era porém fundamental estabelecer limites definitivos na Amazónia e é neste âmbito que se inscreve a viagem de Pedro Teixeira, que representa uma verdadeira epopeia e tornou o Brasil um todo geopoliticamente coerente.

Figura 3 – Porta de Armas na muralha da Colónia do Santíssimo Sacramento.

 

A vida extraordinária de Pedro Teixeira

Tomo posse destas terras e sítios em nome de el Rey Felippe IV Nosso Senhor pela Coroa de Portugal...”

Pedro Teixeira (quando passou a margem esquerda do Rio do Ouro, a 15 de Agosto de 1639)

 

Quando esta viagem de Pedro Teixeira teve início, em 28 de Outubro de 1637, este militar e explorador já tinha ampla experiência e conhecimento da vida no Brasil. De facto, tinha desembarcado na “Terra Brasilis”, em 1607, ido do Portugal europeu. Da sua vida anterior pouco se sabe, tirando o facto de ter nascido em Cantanhede, mas não é seguro o ano em que tal ocorreu, variando os autores entre 1570, 1578 e 1585.

O investigador brasileiro, Coronel Cláudio Moreira Bento dá-o como sendo de família nobre, moço fidalgo da Casa Real e cavaleiro da Ordem de Cristo, tendo ainda casado com D. Ana Cunha, filha do Sargento-Mor Diogo de Campos Moreno, na Vila da Praia, nos Açores (sem data).

A historiadora brasileira Anete Costa Ferreira, talvez a pessoa que mais investigação tenha feito sobre Pedro Teixeira, acrescenta-lhe um segundo casamento com Catharina de Bettencourt, algures na Amazónia de quem teve uma única filha. Mas há poucas fontes a corroborar estes dados. Sabe-se, porém, que, no Brasil, Pedro Teixeira não terá deixado os seus créditos por mãos alheias. Começou por participar, sob o comando de Jerónimo de Albuquerque, na campanha para expulsar os franceses de S. Luís do Maranhão, no litoral nordeste do Brasil, tendo, em 19 de Novembro de 1614, defendido o Forte da Natividade, em Guaxinguba, de um ataque gaulês. Tendo estes sido expulsos, em 1615, logo no Natal desse ano, integrou uma expedição comandada pelo Capitão Francisco Caldeira Castello Branco, que deixou São Luís por via marítima, a fim de fundar Belém, após 18 dias de viagem.

Figura 4 – “Terra Brasilis”, Carta de Pedro Reinel e Lopo Homem, 1519.

 

Em 7 de Agosto de 1616, o Alferes Pedro Teixeira, entretanto promovido a Tenente, foi nomeado para punir um navio holandês, o que fez dois dias depois, comandando uma força de um oficial, 20 soldados e um número indeterminado de guerreiros tupinambás. O navio foi rendido e incendiado, tendo Pedro Teixeira saído ferido na refrega. Por esta acção foi promovido a Capitão, em 28 de Agosto de 1618. Fez parte de uma junta governativa de três membros que governou Belém, após a deposição de Castello Branco, a qual ficou reduzida a ele, em 1620.

Em 1622, construiu uma estrada que ligava Ourém, no Pará, a Viana, no Maranhão. Em 1625, comandou uma expedição para destruir o Forte Mandiutuba, nas imediações do Rio Xingu, construído pelos holandeses. Atacou o forte à frente de 50 soldados e 700 índios e conquistou-o.

Idêntica missão esperava-o em 1625, mas agora relativamente a um forte inglês (o Forte Torrego), tendo-o tomado, a 24 de Outubro, e morto o seu comandante. Para vingar esta acção, o capitão inglês Robert North, atacou com dois navios, em 10 de Julho de 1632, o Forte de Gurujá onde se encontrava Pedro Teixeira, tendo o ataque inglês sido repelido.

 

A grande expedição

Curiuá-Catu, ou seja, o homem branco bom”.

Nome com que os indígenas que o acompanharam chamavam a Pedro Teixeira

 

Os antecedentes próximos do grande feito de Pedro Teixeira estão relacionados com a chegada ao Forte de Gurupá no Pará, em Janeiro de 1637, de dois frades e seis soldados espanhóis e alguns índios, esfarrapados e mortos de fome. A sua história tinha algo de fantástico, pois tinham partido de Quito, rio abaixo, tendo sido atacados por índios conhecidos como “cabeludos”, na Amazónia Equatorial, tendo a maioria dos membros da expedição sido mortos.

As autoridades locais decidiram enviar estes homens ao Maranhão, a fim de serem ouvidos pelo Governador Jácome Raimundo de Noronha, que tinha sido empossado em 9 de Outubro de 1636. Este Governador e Capitão do Maranhão-Grão Pará, ao ouvir a descrição da viagem e seus objectivos e o desejo de regressarem ao Peru, oferecendo-se como guias, apercebeu-se da grande oportunidade de poder alargar a soberania portuguesa à maior parte da bacia amazónica. Deste modo, escolheu Pedro Teixeira – que nomeou Capitão-Mor e General de Estado – para realizar a expedição, outorgando-lhe plenos poderes. Esta escolha não foi certamente estranha ao facto de Teixeira ser um militar experiente, conhecedor da região, estar familiarizado com o rio e selva amazónica e ainda dominar a língua Tupi.

Do regimento entregue pelo governador, constavam as seguintes instruções:

– Reconhecer com detalhe o rio Amazonas até Quito;

– Escolher os locais ao longo do rio adequados para serem fortificados;

– Assegurar as boas relações com as populações indígenas que encontrassem;

– Fundar uma povoação, aquém dos índios Omagas (entre os rios Napo e Juruá), que marcasse os limites da soberania portuguesa;

– Abrir uma “carta de prego”, para abrir no regresso, após ultrapassar o território dos Omagas.

Pedro Teixeira escolheu para seu Segundo Comandante o Coronel Bento Rodrigues de Oliveira e um conjunto de militares experientes (Anexo B – Militares que integraram a expedição) para a expedição. Para treinar homens e equipamentos saiu de Belém a 5 de Fevereiro de 1637 e seguiu pelo rio Pará, Baía de Guajará até Canapijó, até à Vila de Cametá e, por último, Gurupá, onde ultimou os preparativos para a viagem. A expedição compreendia cerca de 70 canoas (sendo 45 de grandes dimensões, necessitando de 20 remadores cada), 70 soldados portugueses e cerca de 1.200 índios (entre guerreiros e remadores) que se faziam acompanhar de muitas mulheres e filhos, o que perfazia um total de cerca de 2.000 pessoas.

Pedro Teixeira partiu de Gurupá em 28 de Outubro de 1637 (o Anexo C refere as principais etapas da expedição). Em 3 de Julho de 1638, Pedro Teixeira chega à confluência dos rios Napo e Aguarico (chamado rio do ouro pelos portugueses) na actual fronteira entre o Peru e o Equador. Daí seguem para Quito, passando pelo Rio Payamino (a 15 de Agosto) e Baeza (14 de Outubro), chegando àquela cidade no início de Novembro. Todo desse caminho foi feito de mula, a cavalo ou a pé.

Figura 5 – Expedição de Pedro Teixeira.

 

No dia 10 de Novembro, Pedro Teixeira é recebido em audiência pelo Governador do Peru a quem entregou uma informação sobre a viagem e respectivo roteiro para ser oferecido ao Vice-Rei do Peru, D. Luís Jerónimo de Cabrella e Bobadella. A expedição teve o condão de incomodar as autoridades peruanas ao ponto de nomearem dois padres (Frei Christobal d’Acuna e Frei André de Artieda), para seguirem na viagem de regresso acompanhando Pedro Teixeira e anotarem tudo o que fossem testemunhando. O mesmo se passou em Madrid, ao ponto de se entender que o Conselho das Índias punisse Jácome de Noronha por ter ordenado a expedição à revelia das autoridades espanholas. Mas Filipe IV não foi do mesmo parecer. Após três meses de permanência em Quito, a 16 de Fevereiro de 1639, Pedro Teixeira deu início à viagem de regresso.

A 15 de Agosto, atinge o Rio do Ouro (antigo Aguarico), abrindo então a “carta de prego” e declara: “tomo posse destas terras e sítios em nome de El Rey Felippe IV Nosso Senhor, pela Coroa de Portugal, se houver quem a dita posse contradiga ou tiver embargo, que lhe pôr, que ali está o escrivão da dita jornada e descobrimento, que lhes recebe, por ou quanto ali vinhão religiosos da Companhia de Jesus por ordem da Real audiência de Quito, e porque é terra remota e povoada de muitos índios, não houve por eles, nem por outrem, quem lhe contradissesse a dita posse”. Colocou um padrão e fundou a povoação de Franciscana, em memória dos franciscanos mortos pelos “índios cabeludos”. O auto de posse foi assinado no dia seguinte por todos os que estiveram presentes à cerimónia. A 12 de Dezembro de 1639, Pedro Teixeira chegou a Belém, após dois anos e dois meses de ali ter partido. Foi recebido por todas as autoridades e muito povo que lhe fez muitas homenagens.

Em S. Luís do Maranhão fez entrega, ao Governador Bento Maciel Parente, dos dados comprovativos da viagem realizada. Tendo em conta os seus serviços, Pedro Teixeira é nomeado Governador e Capitão-Mor do Pará, em 28 de Fevereiro de 1640, cargo que desempenhará até 26 de Maio de 1641. Durante este período foi agraciado pelo Rei Filipe IV (III de Portugal) com o título de Marquês de Aquella Branca.

Figura 6 – Catedral da Sé de Belém do Pará, onde está sepultado Pedro Teixeira.

 

Pedro Teixeira acalentava o desejo de retornar à sua Cantanhede natal, mas acabou por falecer a 6 de Junho de 1641, tendo sido sepultado na Capela de Nossa Senhora das Graças, sita no interior do Forte do Castelo. No século XVIII os seus restos mortais foram transferidos para a Catedral da Sé de Belém, onde se encontram sobre o altar-mor.

Pedro Teixeira tem sido homenageado de diversas formas no Brasil, tendo várias estradas, navios e ruas com o seu nome. A Literatura, a Escultura, a Pintura e o Cinema também o distinguiram. E é altamente considerado no Exército Brasileiro.

Tal contrasta com o que se passa em Portugal onde a sua figura é praticamente desconhecida.

Figura 7 – Estátua a Pedro Teixeira, em Cantanhede.

 

Existe apenas uma rua no Restelo com o seu nome (e por empenhamento de um brasileiro) e uma estátua sua, na terra natal, Cantanhede. As Forças Armadas Portuguesas, na prática, ignoram-no.

 

Conclusão

Nada nas conquistas de Portugal é mais extraordinário do que a conquista da amazónia”

Joaquim Nabuco, Direitos do Brasil, 1949

 

Não sei avaliar se Joaquim Nabuco tem razão, mesmo se estivesse a referir-se apenas à acção dos portugueses na América do Sul. Mas é possível que a Expedição de Pedro Teixeira – figura que nem sequer conhecemos em Portugal, com o título de “General” – represente a maior viagem de exploração feita num rio a nível mundial; calcula-se que terá percorrido cerca de 10.000 km de rios e caminhos. Representando, sem dúvida, um “golpe geopolítico” de larguíssimo alcance. Não é por acaso que o Almirante e Historiador Max Justo Guedes considera que “A expedição de Pedro Teixeira é sem dúvida o segundo maior feito da nossa História”. Presumo que quisesse dizer História Luso-Brasileira…

Certo é que permitiu juntar ao Brasil (que era pertença da Coroa Portuguesa, nunca é de mais recordar) o seu maior território: um rio com cerca de 7.000Km e uma bacia (amazónica) de outros tantos quilómetros quadrados, perfazendo um total de quatro milhões de Km2 de extensão. Um rio que nasce nos Andes a 5.170 m de altitude e banha, hoje em dia, sete países: Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Peru e Venezuela. A Amazónia possui ainda 50 mil Km2 de rios navegáveis, que são considerados como estradas naturais e cujo uso constitui o menor impacto ambiental. No total, a Amazónia brasileira soma a incrível dimensão de 4.8 milhões de km2!

Foi a expedição de Pedro Teixeira e o seu acto de posse, mais tarde usado como “utis possidetis”, que permitiu a Portugal reivindicar a posse de toda a região, quando das negociações do Tratado de Madrid de 1750, que finalmente regulou (o que não se veio a revelar definitivo) as fronteiras entre portugueses e espanhóis, no continente sul-americano, pondo assim fim a alguns conflitos existentes. Nomeadamente, o derivado das últimas acções militares no “Prata”, entre 1735 e 1737 e que envolveu, sobretudo, a Colónia do Sacramento e seu termo.

Necessitamos continuar a lembrar e honrar Pedro Teixeira, à semelhança do que foi feito, em 2018, na Academia da Marinha e pela extraordinária evocação, feita na prática, pelo Dr. António Carrelhas e sua equipa, que seguiram os passos de Pedro Teixeira, em 2014 e 2015, o que deu origem a um livro. Está na altura de fazer de Pedro Teixeira patrono de um dos cursos da Academia Militar e de pedir ao Brasil para que os seus restos mortais regressem á Pátria-mãe e à sua terra de Cantanhede, cumprindo-se assim o seu último desejo.

 

Bibliografia

Livros

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Cortesão, Jaime, “Alexandre de Gusmão e o Tratado de Madrid” Vol. I-V, Livros Horizonte, Lisboa, 1984.

Cruz, Miguel Dantas da, “Um Império de Conflitos, o Conselho Ultramarino e a Defesa do Brasil”, Instituo de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, Maio de 2015.

Ferreira, Anete Costa, “Grandes Enigmas da História de Portugal”, Vol. III, Ésquilo, Lisboa, Nov. 2011.

Fonseca, Luís Adão da, “A Diplomacia Luso-Castelhana na segunda metade do século XV. O Tratado de Tordesilhas”.

Guerreiro, Inácio, “O Tratado de Santo Ildefonso de 1777”; “Encontros e Desencontros Ibéricos”, Chaves Ferreira – Publicações, S.A./Lunwer J. Editores, Outubro, 2006.

Macedo, Jorge Borges de, “História Diplomática Portuguesa Constantes e Linhas de Força”, Instituto de Defesa Nacional, Lisboa, 1987.

Nogueira, Franco, “As Crises e os Homens”, Ática, Lisboa, 1971.

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Serrão, Joel e outros, “Dicionário da História de Portugal, Vol. VI”, Figueirinhas, Porto.

Jornais e Revistas

“Pedro Teixeira era lunático e megalómano mas deu a Amazónia ao Brasil”, Armei, Gustavo e Saraiva, Sérgio, Jornal Público, de 26 de Outubro de 2014.

Botelho, José Francisco e Muller, Andrães, “Colónia do Sacramento, a Cidade Portuguesa na América que não é parte do Brasil”, Aventuras da História, 23/10/2017.

Conferências

Ferreira, Anete Costa, “Pedro Teixeira e a Definição da Fronteira da Amazónia, em comemoração dos 380 anos da viagem do navegador português no Rio Amazonas”, Academia de Marinha, 18 de Setembro de 2018.

Internet

https://doi.org/10.1590/SO103-40142002000200005 (1 de Outubro de 2020).

https://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Pedro_Teixeira_(militar)&oldid=59321116
(1 de Outubro de 2020).

https://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Francisco_de_Sousa&oldid=58951966 (30 de Outubro de 2020).

https://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Raposo_Tavares&oldid=59403284 (3 de Outubro de 2020).

https://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Bandeirantes&oldid=59659006 (3 de Outubro de 2020).

www.ahimtb.org.br (30 de Outubro de 2020).

O Portal da História, História de Portugal, “Tratado de Madrid de 1750” (15 de Outubro de 2020).

https://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Tratado_de_Madrid(1750)&oldid=59375521 (18 de Outubro de 2020).

www.retig.igeo.utrj.br/index.php/conteudo/cartografia (10 de Novembro de 2020).

https://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=longitude&oldid=58310180 (8 de Novembro de 2020).

http://historialuso.an.gov.br (8 de Novembro de 2020).

https://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=tratado_do_rio_de_janeiro_(1825)&old
id=59204270
(10 de Novembro de 2020).

www.portalsaofrancisco.com.br (8 de Novembro de 2020).

https://pt.wikipedia.org/wiki/juan_diaz_de_solis (6 de Novembro de 2020).

https://pt.wikipedia.org/wiki/colonia_do_sacramento (6 de Novembro de 2020).

 

 

ANEXO A

CRONOLOGIA SOBRE PEDRO TEIXEIRA

– 1570, 1580 ou 1587 – Nasce em Cantanhede (Portugal). É dado como casado, em data indeterminada, com D. Ana Cunha, filha do Sargento-Maior Diogo de Campos Moreno, na Vila da Praia (Açores).

– 1607 – Chega ao Brasil. No ano seguinte, está no Recife, a fim de colaborar na expulsão dos holandeses.

– 1614 – A 19 de Novembro, defende o Forte da Natividade, em Guaxinguba no Maranhão, de um ataque dos franceses.

– 1615 – Então alferes, participa numa expedição à Foz do Rio Amazonas (S. Luiz do Maranhão), sob o comando de Francisco Caldeira Castello Branco.

– 1616 – A 12 de Janeiro, as embarcações da expedição ancoraram na baía de Guajará, onde se fundou o Forte do Presépio, núcleo inicial da futura cidade de Belém, e capital do Estado do Pará. Descobre, mais tarde, os rios “Tapajós”, “Negro”, “Bravo” e “Madeira”. A 7 de Março, uma expedição é enviada por terra a São Luís para levar notícias da fundação de Belém, retornando por via marítima com reforços. A 7 de Agosto, o agora Tenente Pedro Teixeira foi nomeado para punir um navio holandês à frente do Alferes Gaspar F. Macedo, 20 soldados e muitos guerreiros tupinambás. A 9 de Agosto, o navio foi atacado, sendo incendiado e capturada a artilharia. Pedro Teixeira é ferido no combate.

– 1618 – A 28 de Agosto, é promovido a Capitão. Após a deposição do Capitão Castello Branco, integra uma junta governativa de três membros, que, em 1620, ficou reduzida à sua pessoa.

– 1622 – Recebe a missão de construir uma estrada a ligar Ourém, no Pará, a Viana, no Maranhão.

– 1625 – Luta contra os holandeses aquartelados no Forte Mandiutuba, sito no Rio Xingu. Com 50 soldados e 700 índios atacou o Forte que era comandado pelo Capitão Nikolaus e conquistou-o, após dura refrega.

– 1626 – Subiu o Rio Tapajós.

– 1627 – Frei Vicente do Salvador, na sua “História do Brasil”, destacou a acção de Pedro Teixeira.

– 1629 – A 24 de Outubro, expulsou os ingleses, conquistando o Forte Torrego, tendo morrido o seu comandante.

– 1632 – A 10 de Julho, o Capitão Robert North subiu o Amazonas com dois navios, para vingar a morte do seu conterrâneo e atacou o Forte de Gurupá, onde se encontrava Pedro Teixeira, mas saiu derrotado.

– 1637 – Com início em 25 de Julho, chefiou uma expedição que partiu de Belém com cerca de 2.000 pessoas, que subiu o Amazonas até ao Peru. O seu destino final foi Quito, no actual Equador. Fundou a Povoação de Franciscana na confluência do Rio Napo com o Rio Aguarico (ver Anexo C).

– 1640 – Em reconhecimento dos seus serviços, foi agraciado com o cargo de Capitão-Mor da Capitania do Grão-Pará, tendo tomado posse em 28 de Fevereiro. Recebe o título de Marquês de Aquella Branca, outorgado por Filipe III de Portugal.

– 1641 – Morre em Belém (Brasil), a 4 de Junho, ficando sepultado na Capela de Nossa Senhora da Graça. No século XVIII, os seus restos mortais foram transladados para a Sé Catedral de Belém, onde se encontra sob o altar-mor.

 

ANEXO B

MILITARES QUE INTEGRARAM A EXPEDIÇÃO DE PEDRO TEIXEIRA

– Coronel Bento Rodrigues de Oliveira, Segundo Comandante

– Capitão Bento da Costa, Piloto-Mor

– Capitão Pedro da Costa Favela, Cartógrafo

– Capitão António de Azambuja, Mestre de Campo

– Sargento-Mor Filipe de Matos Corim, Mestre

– Capitães de Infantaria Pedro Baião de Abreu, Inácio de Gusmão e Domingos Pires da Costa

– Alferes Fernão Mendes Gago, Bartholomeu Dias de Matos e António de Oliveira

– Ajudante Maurício de Heliarte

– Sargentos Diogo Rodrigues e Domingos Gonçalves

– Manuel de Matos Oliveira, Almoxarife

– Agostinho das Chagas, Capelão Capuchinho

– Frei Domingos de Brieda, Capucho, Assistente Religioso e Guardião do Convento de Santo António

– Seis soldados espanhóis que serviam de guias e tinham descido o rio, meses antes

Nota: Faziam ainda parte da expedição 70 militares portugueses e cerca de 1200 índios (entre remadores e guerreiros), muitos deles acompanhados de mulheres e filhos. No total, perfaziam cerca de 2000 pessoas. Fizeram-se transportar em 70 canoas (das quais 45 de grandes dimensões). É provável que tal número seja superior, dada a quantidade de gente envolvida.

 

ANEXO C

PRINCIPAIS ETAPAS DA EXPEDIÇÃO DE PEDRO TEIXEIRA

– 1637, 5 de Fevereiro – Sai de Belém, segue pelo Rio Pará e Baía do Guarujá até Canapijó. Passa o Marajó e atinge a Vila de Caneta. Nesta vila, adquire algumas canoas, rumando em seguida para Gurupá, onde ultima os preparativos da expedição.

– 1637, 28 de Outubro – Parte de Gurupá.

– 1637, 3 de Dezembro – Foi avistado no alto Amazonas um arquipélago que foi baptizado de “Ilhas das Areias”, situado aquém do Rio Madeira, que bifurca com o Amazonas.

– 1638, Janeiro – É descoberto o Rio Negro, onde, mais tarde, a cerca de 1,5 Km, se ergueria a cidade de Manaus.

– 1638, Janeiro/Fevereiro (dia indeterminado) – Descobre uma ilha a que chama “Santa Luzia”. Oferece, na altura, presentes aos indígenas.

– 1638, 27 de Fevereiro – Enfrenta uma revolta de índios da expedição que se rebelam por causa da dureza da viagem (é preciso remar contra a corrente), esta revolta é dominada a bom termo.

– 1638, 3 de Julho – Chega à confluência do Rio Napo e Aguarico, na actual fronteira entre o Peru e o Equador. Encontra-se aí com o Coronel Bento de Oliveira, que o aguardava e juntos seguem até ao Aguarico (mais tarde, chamado “Rio de Ouro”, pelos portugueses).

– 1638, 15 de Agosto – Chega a Payanimo, afluente do Napo. Daí para a frente prossegue a cavalo, mula ou a pé.

– 1638, 14 de Outubro – Passa por Baeza, atravessando por uma povoação castelhana, junto à aldeia de Pujas.

– 1638, início de Novembro – Chega a Quito e assiste a uma missa no Santuário de Nossa Senhora de Guápulo, em agradecimento pelo êxito da viagem.

– 1638, 10 de Novembro – É recebido em audiência pelo Governador Peruano, a quem entrega documentação, a fim de ser oferecida ao Conde de Chinchon, D. Luís Jerónimo de Cabrella e Bobadella, Vice-Rei do Peru.

– 1639, 16 de Fevereiro – Inicia o regresso escolhendo o caminho mais curto, via Archi doma, descendo as margens do Rio Napo.

– 1639, 15 de Agosto – Atinge o Rio de Ouro, abrindo a ‘carta de prego’ que lhe fora confiada por Jácome de Noronha. Faz a tomada de posse de todas as terras até esse ponto, em nome do Rei Filipe IV (III de Portugal), para a Coroa Portuguesa, coloca um padrão e funda a povoação de Franciscana. O acto de posse foi transcrito no dia seguinte pelo Escrivão da Expedição, João Gomes de Andrade e assinado pelos demais presentes na cerimónia.

– 1639, 12 de Dezembro – Chega a Belém, dois anos e dois meses depois de lá ter partido. Foi recebido em apoteose.

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2022-03-30
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Tenente-coronel PilAv

João José Brandão Ferreira

Sócio Efetivo da Revista Militar.

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