António da Silveira Peixoto, Capitão e Alferes, conquistador de Tibagi, Paraná, Brasil, ao contrário dos seus conterrâneos, não é geralmente conhecido da generalidade dos escritores e do público. Nasce este ilustre português na freguesia de S.ta Catarina de Castelo Branco, Horta, ilha do Faial, Açores, a 15-2-17371.
Partiu para o Brasil com cerca de 20 anos, onde se estabeleceu em Paranaguá, no Estado de S. Paulo, dedicando-se aos negócios de fazenda e largos haveres «estabelecido com huma loja de Fazendas das melhores da Terra ». Em 17-11-1769, tomou o comando como Alferes de Auxiliares da vila de Paranaguá, duma expedição bandeirante2 nos sertões de Tibaji, Paraná, Brasil, viagem essa marcada por diversos episódios arriscados, em que por mais de uma vez colocou a sua vida em risco, com a missão de explorar o rio Grande do Registo e chegar ao Paraná. Entrando em território espanhol, sem o saber nas cercanias da barra do rio Iguaçu e já em pleno rio Paraná, foi preso por uma força paraguaia de 100 homens, a 20-10-1770, remetido para as Missões e finalmente para Buenos Aires, onde chegou a 29-12-1770. Enquanto esteve preso, os espanhóis tentaram seduzi-lo e oferecer-lhe a patente de Tenente-Coronel com o soldo de 200.000 réis, que este prontamente recusou, afirmando preferir morrer a pegar em armas contra a sua Pátria.
Figura 1 – Localização de Paranaguá, S. Paulo, Brasil.
Apenas conseguiu recuperar a liberdade após 8 anos de cativeiro, e depois da assinatura de paz celebrada entre Portugal e Espanha, em San Ildefonso (1777), conduzindo à sua custa por terra numa longa marcha de 180 léguas, 134 prisioneiros portugueses das guarnições da colónia de Sacramento e de S.ta Catarina. Regressando à capitania de S. Paulo, acabou a sua vida reformado no posto de Sargento-mor (em 1807), não sem antes ter obtido uma carta de brasão de armas a 3-8-1781; conseguiu ainda uma audiência da soberana, a Rainha D. Maria I de Portugal, que o mandou continuar no mesmo posto de Capitão exclamando «que se não podia esperar mais dum vassalo do que ele tem feito»; e de requerer sem sucesso, como Capitão do Regimento de Cavalaria, a mercê do hábito de Cristo com a tença de 200.000 reis, que teve consulta favorável do Conselho Ultramarino e sanção régia da Rainha, mas que nunca lhe foi deferido (1781). O seu imenso esforço de mais dum ano, no comando duma expedição bandeirante armada à sua custa nos vastíssimos sertões de Tibaji no Paraná entre 17-11-1769 a 29-12-1770, de apenas um alferes, doze soldados e dois escravos, arrecadou para a jurisdição da Coroa portuguesa uma área superior a 420 léguas de terreno nos territórios americanos, no tratado de paz de Ildefonso, Espanha, em 1-10-1777, sem que com isto o Erário Público gastasse um só real3.
Figura 2 – Bandeirantes.
Este artigo procura realizar uma biografia de António da Silveira Peixoto (1734-1814), colocando no final uma grelha das linhas da sua carta de brasão de armas (1781) – Ávila, Bettencourt, Silveira e Peixoto, e ainda a descrição da mercê da mesma.
Figura 3 – Carta de brasão de armas concedidas a António Silveira Peixoto (1734-1814), em 3-8-1781.
Foi António da Silveira Peixoto (1734-1814), Fidalgo de Cota de Armas (carta de brasão de armas de D. Maria I de Portugal, de 3-8-1781), escudo esquartelado: no 1º, as armas dos Ávilas, em campo de ouro, treze arruelas de azul em três palas; no 2º, a dos Peixotos, um escudo axadrezado de ouro e azul; no 3º, a dos Silveiras, em campo de prata, três fachas vermelhas; e no 4º, a dos Bettencourt, em campo de prata um leão rompante de negro, armado de vermelho; elmo de prata guarnecido de ouro; timbre o dos Peixotos, que é um corvo marinho de sua cor, com um peixe de prata no bico; e por diferença uma brica vermelha com um farpão de prata)4, bandeirante e conquistador do Tibaji, Paraná, Brasil, Alferes de Auxiliares de Paranaguá (por patente de 1767), Capitão do Regimento de Cavalaria de Voluntários Reais da capitania de S. Paulo (antes de 1794), Capitão de Ordenanças de Infantaria (por patente do governador da capitania de S. Paulo, de 12-1-1770), Sargento-mor por comissão (em promoção de António Manuel de Mello e Castro e Mendonça, Governador e Capitão-General da Capitania de S. Paulo, a 18-8-1801) e Sargento-mor (por despacho do Príncipe Regente D. João, em Mafra, a 6-5-1807), etc., armou à sua custa uma expedição e internou-se nos vastíssimos sertões de Tibaji no Paraná, entre 17-11-1769 e 29-12-1770, conquistando assim, em mais dum ano, 420 léguas de terra, que por este título ficaram a pertencer aos domínios portugueses, no tratado de limites que se celebrou em Santo Ildefonso, Espanha, em 1-10-1777, etc5.
António da Silveira Peixoto, nasceu na freguesia de S.ta Catarina de Castelo Branco, Horta, ilha do Faial, Açores, a 15-2-1737. Saiu da casa paterna muito novo a tentar fortuna, visto que seus pais tinham escassos recursos. Não se sabe quando terá emigrado com destino ao Brasil, mas para, em 1769, fazer-se rico e já ter grande casa é porque terá embarcado por volta dos 20 anos. Estabelece-se, então, com negócio de fazendas e largos haveres na vila de Paranaguá «estabelecido com huma loja de Fazendas das melhores da Terra», nos termos da carta de 15-11-1770, dirigida ao Conde Oeiras por D. Luís António de Sousa Botelho Mourão, Morgado de Mateus.
Figura 4 – Vista geral de Paranaguá, estado de S. Paulo, Brasil.
Teve aí opulenta casa, mas arruinou-se ao serviço do descobrimento e reconhecimento dos vastíssimos sertões de Tibaji, nos quais o Governo português se mostrava muito interessado, por se supor que existiam aí vastos recursos minerais6.
Figura 5 – Sertões de Tibaji, Paraná, Brasil
De qualquer forma, contava 32 anos quando, em 1769, tomou o comando da expedição como bandeirante aos sertões do Tibagi.
Silveira Peixoto foi chefe de uma das muitas expedições exploradoras, em meados do século XVIII, que entraram nos então «Sertões de Tibaji» 7, considerável e opulenta zona da parte ocidental do Estado actual do Paraná, ladeado pelos rios Paranapanema e Iguaçu e extremada ao fundo pelo rio Paraná. Com o intuito de descortinar as «as espaçosas matas do Tibagy », de cujas riquezas corriam notícias, o Morgado de Mateus organizou várias expedições armadas, com a mira de devassar aqueles sertões.
Assim temos as expedições sob o comando do Tenente Domingos Lopes Cascais, a 5-12-1768; do Capitão de Auxiliares da freguesia de S. José, Estêvão Ribeiro Baião, a 20-6-1769, composta de gente de Curitiba, S. José e Campos Gerais; do Capitão de Auxiliares da vila de Iguape, Francisco Nunes, a 12-8-1769, com gente da mesma vila e de Cananêa, seguida, dezasseis dias depois, pela do Tenente Bruno da Costa Filgueiras, que passando do rio Putinga ou Pitinga para o Registo (Iguaçu), foi ter aos campos de Apotrebu (Patribú), donde regressou temendo, se prosseguisse a jornada, passar pelas missões castelhanas.
Em seguida a estas expedições, provavelmente por escolha ou sugestão do Tenente-Coronel, Afonso Botelho de S. Payo e Sousa e pelas prometidas mercês, aprontou-se uma expedição sob o comando do Capitão António da Silveira Peixoto, Alferes de Auxiliares da vila de Paranaguá, a 17-11-1769, que tinha como missão explorar o rio Grande do Registo e chegar ao Paraná8.
Figura 6 – Rio Iguaçu com a sua confluência com o Paraná.
A expedição bandeirante confiada a Silveira Peixoto compunha-se de dois grupos ou esquadras com 85 praças. Partiram estes dois grupos do porto da Conceição da Caiacanga do rio Pitinga (ou Upetinga), afluente da margem esquerda do rio do Registo (Iguaçu)9: uma, a 17-11-1769, sob o comando imediato de Silveira Peixoto, composta de 7 canoas, e outra aparelhada de 9 canoas, no dia 28-11-1769, dirigida pelo Tenente de Artilharia de Auxiliares, Manuel Telles de Bettencourt.
Figura 7 – Bandeirante do século XVIII. Figura 8 – Bandeirantes.
Desta viagem, deixou António da Silveira Peixoto dois roteiros minuciosos, a contar de 18 de Dezembro de 1769 até Outubro do ano de 1770. Enviou as últimas notícias do porto que denominou de N. S.ra da Luz, barra ou do rio Chopim ou do rio de S.to António Guassú que, por equívoco, cuidou ser o rio Morombas ou Canoas10.
Saiu a sua expedição, como se disse, do porto da Conceição no rio do Registo (Iguaçu), achando-se um mês depois no rio e barra de Pitinga, afluente da margem esquerda daquele outro e daqui, após uma pausa de alguns dias para se refazer e socorrer outra expedição que o procedeu, retomou caminho, chegando a 20-12-1769 ao porto do Salto, onde lançou os primeiros fundamentos de uma povoação, a que deu o nome de N. S.ra da Vitória (hoje União ou União da Vitória).
Figura 9 – Vista geral de União da Vitória, Paraná, Brasil.
Depois, separando-se do grosso da gente e apenas na companhia de 1 alferes, 12 soldados e 2 escravos, durante 10 meses e vencendo grandíssimas dificuldades opostas pelo Iguaçu, abriu, Peixoto, caminho por espaço de 400 léguas até à barra do Paraná, pela embocadura do Iguaçu.
Os dois Tenentes, Bruno da Costa Felgueiras e Manuel Telles de Bettencourt, que o acompanharam na viagem morreram de desastres nas cachoeiras. Assim escrevia mais tarde o Morgado de Mateus, a 13-11-1770, «Tendo lidado hum anno, com as grandissimas difficuldades do dito rio (Iguassú), abriu caminho franco por espaço de 400 légoas enthé a sua barra (no Paraná), onde se acha ainda vivo, mas cortado nos trabalhos e achaques. Os dous tenentes Bruno da Costa e Manoel Felix Bittencourt, que o acompanharam na sua viagem, morreram de desgraças nas caxoeiras, ajudando a vencer as difficuldades desta empresa ». E concluía por pedir a El Rei de Portugal «para o capitão Silveira, que se acha vivo, o soldo por toda a vida, com a merce de habito, pago tudo pela Real Fazenda »11.
Tendo Silveira Peixoto entrado em território espanhol ao fim de três meses, nas cercanias da barra do rio Iguaçu e já em pleno rio Paraná sem o saber, deu com «tres botes e varias canôas com cem homens Espanhoes e Indios, com uma ordem do Governador para (…) lhe fazer entrega dos Indios e tudo o mais e que (se) retirasse das terras do seu comando». Foi isto mesmo que relatou Silveira Peixoto «grande novidade por me parecer andava no rio do Registo (Iguassú), e vendo que estava no Paraná, não puz a menor duvida (…) voltei». Mas, de regresso, foi preso e levado à presença de Don Pedro José Soares Figueiredo Sarmento, Governador espanhol do Sacramento, a 20-10-1770, que lhe pôs dois pares de grilhões aos pés e sentinela à vista no dia seguinte (21-10), tratamento igualmente dispensado ao Alferes António da Costa, que o acompanhava e apoderou-se de todas as armas que trazia, pólvoras e balas, fora muitas canoas, dois escravos e o resto da fazenda destinada aos índios. Assim agrilhoado, foi remetido ao cabo de 8 dias com os demais prisioneiros para as Missões, onde permaneceu 40 dias, sendo finalmente embarcado para Buenos Aires, Argentina, ali chegando a 29-12-1770, «No fim de oito dias ordenou-me que montasse a cavallo com toda a minha gente, e nos remeteu escoltados para Buenos-Aires, com os grilhoes, marchando 180 leguas ate o salto do Uruguay, onde foram os soldados atacados de bexigas, ficando cinco em perigo de vida. Aqui estivemos quarenta dias, sem nunca nos tirarem os grilhoes, e embarcamos, chegando aqui em Buenos Ayres a 29 de dezembro de 1770 (…)». Durante o seu duro cativeiro, veio a falecer por maligna o alferes António da Costa, a 22-3-1771, «O meu Alferes com estes apertos deu-lhe huma malina, durou onze dias e em dia 22 de Março se deu á terra; e estou só, não tenho com quem falar (…)». Entregue aos maus-tratos de um cárcere duro, embalde reclamou por carta, de 16-4-1771, para o governador da colónia de Sacramento, a fim de obter o relaxamento da prisão ou resgate12.
Figura 10 – Rio Tibaji, próximo da Ponta Grossa.
Quando foi preso, os espanhóis e o governador quiseram-lhe oferecer a patente de Tenente-Coronel com 200.000 réis de soldo, caso passasse ao serviço de Espanha para combater Portugal. Preferiu morrer, a pegar em armas contra a sua Pátria. Esta resolução heroica dissuadiu o governador espanhol, que respeitou, por fim, a vida do ilustre português, seu prisioneiro.
Conseguiu apenas libertar-se oito anos depois, após a assinatura do tratado de San Ildefonso, a 1-10-1777. Este acordo de 25 artigos foi ratificado a 10 e 11 de Outubro, respectivamente, em Lisboa e Madrid, constituindo o prólogo do Tratado de Pardo, que veio a ser assinado a 11-3-1778, pondo termo ao diferendo de fronteiras austrais da colónia de Sacramento entre as duas nações ibéricas. Com este convénio, além da libertação dos presos de ambos os países (artigo 8º), estabeleceram-se os limites territoriais. Os espanhóis mantiveram a colónia e a região dos Sete Povos das Missões, que depois passou a compor grande parte do estado do Rio Grande do Sul e do Uruguai, ou seja, acesso à navegação dos rios da Prata e Uruguai e às terras adjacentes nas suas margens setentrional e meridional (artigo 3º); em troca, reconheceram a soberania dos portugueses sobre a margem esquerda do rio da Prata, cederam pequenas faixas fronteiriças para compensar as vantagens obtidas no sul e devolveram a ilha de S.ta Catarina, ocupada poucos meses antes, ou seja, Portugal recebia os direitos de navegação e entrada no rio Grande de S. Pedro, com o domínio da parte meridional até ao arroio Tahim (artigo 4º)13.
António Silveira Peixoto lutara e sofrera como um honrado patriota, deteriorando a sua saúde, como também por via desta empresa se arruinara dos bens e fortuna que amealhara. Mesmo na prisão, teve o engenho de subornar sentinelas e de mandar vir, por mais de uma vez de sua casa, quase todo o cabedal que possuía, e com ele expedir emissários, levando notícias suas e revelações sobre os planos dos espanhóis, aos governadores e generais. Por fim, ainda à sua custa, logo que solto, conduziu por terra numa longa marcha de 180 léguas, 134 portugueses das guarnições da colónia de Sacramento e de S.ta Catarina, que se encontravam prisioneiros como ele «que assim mesmo conseguira comprar sentinellas para mandar vir de sua casa, por differentes vezes, quasi todo o grande cabedal que então possuia e com elle vencera dar parte aos nossos Governadores e Generaes de todos aquelles então nossos inimigos (…) que com o resto do dinheiro e credito, tinha conduzido por terra, na longa marcha de 180 leguas de sertão a 134 Portuguezes, que se achavam prisioneiros das guarnições de Colonia e Santa Catarina (…)».14
Logo que recuperou a liberdade recolheu-se então ao Paranaguá, arruinado nos seus haveres e na sua saúde, não conseguindo dos governantes portugueses o interesse e o prémio que merecia.
Vindo a Lisboa, requereu e obteve uma audiência da soberana, a Rainha D. Maria I de Portugal, que o mandou continuar no mesmo posto de Capitão, exclamando que «não se podia esperar mais de um vassalo do que ele tem feito»15.
Em 1781, Silveira Peixoto, requeria, como Capitão do Regimento de Cavalaria de Voluntários Reais da Capitania de S. Paulo, a mercê do hábito de Cristo com a tença de 200.000 reis em atenção aos seus serviços obrados na mesma capitania. Teve consulta favorável do Conselho Ultramarino em 20-10-1781, com a imediata sanção régia da Rainha. Apesar da consulta favorável do Conselho Ultramarino e da reconfirmação da Rainha, não lhe foi passada a carta do hábito de Cristo16.
Em Julho de 1794, António Silveira Peixoto, Capitão Agregado à Legião de Voluntários Reais da Companhia da capitania de S. Paulo, requereu licença, para outra vez ir à Corte «afim de tratar de varias pendências», não se sabendo se chegou a realizar esse intento.
A 13-5-1801, o Capitão-General de S. Paulo, António Manuel de Melo e Castro e Mendonça, propôs ao Príncipe Regente D. João, Silveira Peixoto para o posto reformado de Sargento-mor: «para Sargento-Mór reformado com o soldo de Capitão de Cav.a que actualmente recebe, o Capitão António da Silveira Peixoto. Este Official sendo Cap.m de Milicias, passou para Capitão de Aventureiros, e foi ás expedições do Sertão no anno de 1767 (aliás 1769), onde sendo aprizionado pelos Hespanhois e mettido em prisões, mereceu depois, em contemplação aos seus serviços, ser agregado á Legiam dos Voluntarios Reaes, sem que as molestias adquiridas pelos anos e mao tratamento da prizão lhe permitissem passar a effectivo; e porque não se acha em estado de continuar no Real Serviço de Vossa Alteza Real, em que conta 30 a 35 annos; e pede a sua reforma, o proponho para ella, na forma das leis». Esta proposta não teve efeito imediato, e apenas seis anos depois, em 15-4-1807, o Conselho Ultramarino deferiu esta pretensão, sendo ractificado pelo Príncipe Regente D. João, em Mafra, a 6-5-1807, que «conformando-se com o parecer do Conselho: Hei por bem reformar o Supplicante no Posto de Sargento Mor com o soldo por inteiro desta Patente»17.
Nos últimos anos, terá residido em S. Paulo, vindo a falecer na freguesia da Sé, a 5-12-1814, com testamento, onde cita sua filha D. Antónia de Sousa, nascida da união (ou casamento?) com Maria Josefa de Jesus (* no estado de S. Paulo, Brasil cerca de 1747 – ) e citada no testamento de seu pai18.
Nasceu este ilustre bandeirante em Castelo Branco, Horta, ilha do Faial, Açores a 15-2-1737, e morreu na Sé, S. Paulo, Brasil a 5-12-1814, com testamento.
António Ferreira de Serpa, seu biógrafo define-o da seguinte maneira: «Singularmente grande é esta figura de António da Silveira Peixoto, calcada nos moldes dos heróis, cujos feitos esmaltam a história de Portugal. Abandonando os seus grandes haveres ei-lo a caminho do sertão, á frente de 100 homens, e onde arrasta perigos sem conta: umas vezes os elementos enfurecidos, – outras a hostilidade de tribos selvagens e bárbaras e ainda em luta com as feras. É verdadeiramente épica a façanha de, logo que avançou sessenta léguas, deixar o grôsso das forças que comandava e seguir ávante apenas com um alferes, dôze soldados e dois escravos, diminutos elementos para conquistar, como de facto conquistou, em trêse meses, quatrocentas e vinte léguas de terreno que, por êste título, se declarou ficarem pertencendo à coroa portuguesa no tratado de paz que posteriormente se celebrou com a Espanha, sem com isto o erário público gastar um só rial, «porque matava e comia as mesmas feras de que se devia refujiar. Incomunicável numa estreita prisão, carregado de ferros, «por mais de 8 annos, conseguiu subornar as sentinelas, para mandar vir de sua casa bastante dinheiro e assim poder avisar os governadores e generais portugueses dos planos dos espanhóis, governadores e generais que não empregavam o menor esforço por o libertarem do cativeiro!Feita a paz, é ainda com o resto do seu dinheiro e crédito que conduz por terra, na larga marcha de cento e oitenta léguas, a 130 portugueses, das guarnições da Colónia do Sacramento e de Santa Catarina, que se encontravam prisioneiros. E ao homem que assim procedeu, ao patriota que tudo sacrificara: fortuna, saúde e vida, nem ao menos se pagavam os seus soldos, sob o pretexto de falta de dinheiro, nem a venera da Ordem de Cristo pendeu ao peito de tão grande português. E poude êle, sem o auxílio pecuniário do Estado, executar a grandiosa emprêsa de conquistar um imenso território com o qual acrescentava na América os domínios da sua pátria! Vindo a Lisboa, obteve uma audiência da soberana, a Rainha Dona Maria I, que o mandou continuar no mesmo pôsto de capitão! Com razão exclama: «que se não podia esperar mais de um vassalo, do que ele tem feito»19.
1. MANUSCRITAS E NÃO PUBLICADAS
1.1. Arquivo Nacional da Torre do Tombo:
– Cartório da Nobreza, Processo de Justificação de Nobreza de António Silveira Peixoto, Maço 17, n.º 4.
1.2. Arquivo Regional dos Açores:
A) Registos Paroquiais:
– Castelo Branco, Horta, ilha do Faial, Açores:
• Baptismos (1706-1736), TIF. 189, fl. 192, TIF. 199-200, fl. 202 e 202 v.º, TIF. 216, fl. 217 v.º, TIF. 235, fl. 237 v.º.
• Baptismos (1777-1804), TIF. 64, fl. 63.
• Casamentos (1711-1809), TIF. 33, fl. 32 v.º.
– Cedros, Horta, ilha do Faial, Açores:
• Baptismos (1700-1708), TIF. 62, fl. 7 v.º
• Casamentos (1687-1719), TIF. 38, fl. 40 v.º e 41.
2. FONTES SECUNDÁRIAS
2.1. Imprensa:
– Archivo de S. Paulo, Vol. XXIV, p. 127.
– Diário Popular, de S. Paulo, Brasil, n.º 8205, ano XXVI de 25-4-1910.
– Diário Popular, de S. Paulo, Brasil, n.º 8206, ano XXVI de 26-4-1910.
3. MONOGRAFIAS
BAENA, Visconde Sanches de – Archivo Heráldico-Genealogico, Lisboa: Thipographia Universal, 1872, n.º 335.
Bandeirante (O) António da Silveira Peixôto, conquistador de Tibaji, S. Paulo, [s.n.], 1807.
CARNEIRO, David – Afonso Botelho de São Payo e Souza, Curitiba: Litero-Tecnica, 1986.
FORJAZ, Jorge e António Ornelas Mendes – Genealogias das Quatro Ilhas – Faial, Pico, Flores e Corvo, Lisboa: DisLivro Histórica, 2009.
GAYO, Felgueiras – Nobiliário de famílias de Portugal, Braga: Pax, 1938.
GRANDE Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, Vol. XX, Lisboa-Rio de Janeiro: Editorial Enciclopédia Limitada, [s.d.].
Kobelinski, Michel – Heroísmos, sedições e heresias: A construção do ufanismo e do ressentimento nos sertões da capitania de São Paulo (1768-1774) [Tese de Doutoramento em Historia e Sociedade pela Faculdade de Ciências e Letras de Assis – UNESP – Universidade Estadual Paulista], Assis, 2008.
LIMA, Jacinto Manso de – Famílias de Portugal, Biblioteca Nacional, Reservados.
LIMA, Manuel de Oliveira; préf. M. E. Martinenche; avant-propos M. José Veríssimo – Formation historique de la nationalité brésilienne: série de conférences faites en Sorbonne, Paris: Garnier, [1911].
LIMA, Marcelino – Anais do Município da Horta – Ilha do Faial, Famalicão: Grandes Oficinas Minerva, 1940.
LIMA, Marcelino – Famílias faialenses (Subsídios para a história da ilha do Faial), Horta: Tipgrafia Minerva Insulana, 1922.
MENDES, António Ornelas e Jorge Forjaz – Genealogias da ilha Terceira, Lisboa: DisLivro Histórica, 2007 e 2011.
MONTE, Vanessa Martins do – Correspondências paulistas: as formas de tratamento em cartas de circulação pública (1775-1865) [Tese de Doutoramento em Filologia e Língua Portuguesa pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de S. Paulo], S. Paulo, 2013.
MORAIS, Cristóvão Alão de – Pedatura Lusitana (Nobiliário de famílias de Portugal), Porto: Livraria Fernando Machado, 1943.
NÓBREGA, Artur Vaz Osório da – Peixotos – Subsídios para a sua genealogia, Braga, 1973.
SERPA, António Ferreira de – O bandeirante António da Silveira Peixoto, conquistador de Tibaji, Coimbra: Imprensa da Universidade, 1915, Volume 4 – n.º 1 (1915), pp. 680-698 e Volume 5 e 6 – n.º 1 (1916 e 1917), Coimbra: Imprensa da Universidade, 1917, pp. 173-189, 411-440 e 441-443.
SERRÃO, Joaquim Veríssimo – História de Portugal, Vol. VI, Lisboa: Verbo, 1982.
ZÚQUETE, Afonso E.M. – Armorial Lusitano, Lisboa: Editorial Enciclopédia Lda, 1961.
Figura 11 – Carta de brasão de armas concedido a António Silveira Peixoto (1734-1814) em 3-8-1781.
Dona Maria, por graça de Deus, Rainha de Portugal e dos Algarves daquem e dalém mar em Africa, Senhora da Guiné e da conquista, navegação e comercio da Etiópia, Arabia, Pérsia e da índia, &. Faço saber aos que esta minha carta de brasão de armas, de nobresa e fidalguia virem, que Antonio da Silveira Peixoto, natural da Ilha do Fayal, me fez petição dizendo que, pela sentença de justificação de sua nobresa a ela junta, proferida pelo meu desembargador corregedor do Civel da Corte e Casa da Suplicação, o Doutor Caetano de Castro Padrão, sobrescrita por Francisco Xavier Morato Broa, do mesmo juizo e pelos documentos nela incorporados, se mostra que ele é filho legitimo do Capitão Manuel de Avila Peixoto e de sua mulher Dona Margarida Josefa; neto, pela parte paterna, do Capitão Jorge Gularte da Silveira e de sua mulher Dona Maria de Faria; e pela materna do alferes Lourenço Pereira e de sua mulher Maria de Béthencourt, os quais seus pais, avós e mais ascendentes, que foram pessoas muito nobres, legítimos descendentes das famílias dos apelidos Avilas, Peixotos, Silveiras e Béthencourt, que neste Reino são fidalgos de linhagem, cota de armas e de solar conhecido, e como tais se trataram á lei de nobresa, com cavalos, armas e criados, servindo no politico e no militar os postos e logares mais distintos do Governo, sem que, em tempo algum, cometessem crime de lesa-majestade divina ou humana.
Pelo que me pedia ele suplicante, por mercê, que, para a memoria de seus progenitores se não perder, e claresa de sua antiga nobresa, lhe mandasse dar minha carta de brasão de armas das ditas famílias, para delas também usar na forma que as trouxeram e foram concedidas aos ditos seus progenitores, e vista por mim a dita sua petição, sentença e documentos, e de tudo me constar que ele é descendente das mencionadas famílias e lhe pertence usar e gosar de suas armas, segundo o meu regimento e ordenação da armaria, lhe mandei passar esta minha carta de brasão delas na forma que aqui vão brasonadas, divisadas e iluminadas com cores e metais, segundo se acham registadas no livro do registo das armas da nobresa e fidalguia destes meus Reinos que tem Portugal meu principal Rei de Armas, a saber: um escudo esquartelado; no 1.º quartel as armas dos Avilas, que são, em campo de ouro, treze arruelas de azul em tres palas. No 2.º quartel, as armas dos Peixotos, que são, escudo xadrezado de ouro e azul. No 3.º, as dos Silveiras, em campo de prata, tres fachas vermelhas. No 4.º as armas dos Béthencourt, que são em campo de prata um lião rompente de negro, armado de vermelho. Elmo de prata, aberto, guarnecido de ouro. Paquife dos metais e cores das armas. Timbre o dos Peixotos, que é um corvo-marinho de sua cor, com um peixe de prata no bico e por diferença uma brica vermelha com um farpão de prata. O qual escudo e armas poderá trazer e usar o dito António da Silveira Peixoto, assim como as trouxeram e usaram os ditos nobres, e antigos fidalgos, seus antepassados, em tempo dos Senhores Reis, meus antecessores e com elas poderá entrar em batalhas, campos, reptos, escaramuças e exercitar todos os mais actos licitos da guerra e da paz. E assim mesmo as poderá trazer em seus firmais, anéis, sinetes e divisas, pô-las em suas casas, capelas e mais edifícios e deixá-las sobre sua própria sepultura e finalmente se poderá servir, honrar, gosar e aproveitar delas em tudo e por tudo, como á sua nobresa convém. Com o que quero e me praz que haja ele todas as honras, previlegios, liberdades, graças, mercês, izensões e franquesas que hão e devem haver os fidalgos e nobres de antiga linhagem, e como sempre de todo usaram e gosaram os ditos seus antepassados: pelo que mando aos meus desembargadores, provedores, ouvidores, juizes e mais justiças de meus Reinos e, em especial, aos meus Reis de Armas, Arautos e Passavantes, e quaisquer outros oficiais e pessoas a quem esta minha carta fôr mostrada e o conhecimento dela pertencer que em tudo lha cumpram e guardem e façam cumprir e guardar como nela se contem, sem duvida nem embargo algum que em ela seja posto, porque assim é minha mercê.
«A Rainha, nossa Senhora, o mandou por Antonio Rodrigues de Lião, professo na ordem de Cristo, Cavaleiro Fidalgo de sua Casa Real e seu Rei de Armas de Portugal. Frei Manuel de Santo Antonio e Silva, da ordem de Sam Paulo, a fês em Lisboa aos 3 dias do mês de Agosto do ano do Nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo, de 1781. E eu Bernardo José Agostinho de Campos, escrivão de nobresa a fis escrever: Portugal, Rei de Armas Principal, Antonio Rodrigues de Lião. E eu Bernardo José Agostinho de Campos que a fis registar – Bernardo José Agostinho de Campos»
Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Cartório da Nobreza, Livro III, fls. 18 a 19 v.º.
____________________________________
1 cf. Marcelino Lima – Famílias faialenses (Subsídios para a história da ilha do Faial), Horta: Tipografia Minerva Insulana, 1922, pp. 99-101 e Jorge Forjaz – Genealogias das Quatro Ilhas – Faial, Pico, Flores e Corvo, Lisboa: DisLivro Histórica, Vol. I, Bettencourt, p. 2009, p. 382.
2 cf. Oliveira Lima, descreve as dificuldades porque passavam os bandeirantes nas suas explorações: «Tais explorações não se realisavam pacificamente: luctava-se contra os selvagens que se viam perseguidos nas choças onde se haviam refugiado; luctava-se contra os elementos, contra a natureza. Esta ultima pugna não era a menos trabalhosa. Póde-se bem imaginar tudo quanto se necessitava de intrepidez e de vigor, para se afastar por pequenos grupos, dos logares habitados, subir montanhas cobertas de vegetação emaranhada, expôr-se a naufragios, em rios onde não faltavam rapidos (cataratas) e escolhos, defender-se das onças, das serpentes, das flexas dos Indios, sem nenhum dos recursos modernos, sem roupas para mudar, quaisi sem armas e sem provisões, tendo a certeza de encontrar similhantes feroses e a duvida de achar a riqueza ambicionada (…)», in Manuel de Oliveira Lima; préf. M. E. Martinenche; avant-propos M. José Veríssimo – Formation historique de la nationalité brésilienne: série de conférences faites en Sorbonne, Paris: Garnier, [1911], p. 70.
3 cf. Marcelino Lima, op. cit., pp. 99-101.
4 cf. Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Cartório da Nobreza, Processo de Justificação de Nobreza de António Silveira Peixoto, Maço 17, n.º 4. Refira-se que este armigerado, usa as armas Silveira e Ávila do Continente e não as dos Açores.
5 cf. Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, Vol. XX, Lisboa-Rio de Janeiro: Editorial Enciclopédia Limitada, [s.d.], pp. 872-873; Visconde Sanches de Baena – Archivo Heráldico-Genealogico, Lisboa: Thipographia Universal, 1872, n.º 335, p. 85; António Ferreira de Serpa – O bandeirante António da Silveira Peixoto, conquistador de Tibaji, in Revista da Universidade de Coimbra, Volume 5 e 6 – n.º 1 (1916 e 1917), Coimbra: Imprensa da Universidade, 1917, pp. 411-414; e Jorge Forjaz, Vol. I, Bettencourt, § 3, n,º 7, p. 38.
6 cf. António Ferreira de Serpa, op. cit., Volume 5 e 6 – n.º 1 (1916 e 1917), p. 420 e Diário Popular, de S. Paulo, Brasil, n.º 8205, ano XXVI de 25-4-1910.
7 cf. O grande sertão do Tibagi foi chamado assim vulgarmente pelos Paulistas, por ficar para além deste rio, principiando junto ao Registo de Curitiba, corre do Sul para o Norte, sendo então habitado por muitos povos gentílicos e com muitas vilas, cidades a arrais espanhóis, sendo afamado pelas riquezas que alguns habitantes Paulistas descortinavam. Como tal, já em 26-1-1765, Sebastião José de Carvalho e Melo, então Conde de Oeiras, ordenava ao Vice-Rei-Conde da Cunha, que fornecesse aos Paulistas os meios necessários para conquistar aquele vasto território, in António Ferreira de Serpa, op. cit., Volume 5 e 6 – n.º 1 (1916 e 1917), p. 421.
8 cf. Michel Kobelinski – Heroísmos, sedições e heresias: A construção do ufanismo e do ressentimento nos sertões da capitania de São Paulo (1768-1774) [Tese de Doutoramento em Historia e Sociedade pela Faculdade de Ciências e Letras de Assis – UNESP – Universidade Estadual Paulista], Assis, 2008, p. 187. Na obra deste autor, as datas das partidas das expedições de António Silveira Peixoto e de Manuel Telles de Bettencourt, são diferentes das que indico, a 1ª, a 16-10, e a 2ª, a 28-10-1769, pp. 175 e 186.
9 cf. O rio Tibagi ou Iguaçu, também chamado rio do Registo e rio Grande, corre para noroeste a desaguar no Paranapanema que, a seu turno, desemboca no Paraná, cerca de 80 quilómetros acima da barra do Ivahi, in Archivo de São Paulo, Vol. XXIV, p. 127.
10cf. Diário Popular, de S. Paulo, Brasil, n.º 8205, ano XXVI de 25-4-1910; António Ferreira de Serpa, op. cit., Volume 5 e 6 – n.º 1 (1916 e 1917), p. 422; e Michel Kobelinski, op. cit., pp. 175 e 187.
11cf. António Ferreira de Serpa, op. cit., Volume 5 e 6 – n.º 1 (1916 e 1917), p. 423; e Diário Popular, de S. Paulo, Brasil, n.º 8206, ano XXVI de 26-4-1910.
12cf. António Ferreira de Serpa, op. cit., Vol. V-VI, n.º 1, 1916-1917, p. 184.
13cf. Joaquim Veríssimo Serrão – História de Portugal, Vol. VI, Lisboa: Verbo, 1982, pp. 298-300.
14cf. António Ferreira de Serpa, op. cit., Vol. V-VI, n.º 1, 1916-1917, p. 413.
15cf. António Ferreira de Serpa, op. cit., Vol. V-VI, n.º 1, 1916-1917, p. 414.
16cf. António Ferreira de Serpa, op. cit., Vol. V-VI, n.º 1, 1916-1917, p. 414.
17cf. António Ferreira de Serpa, op. cit., Vol. V-VI, n.º 1, 1916-1917, p. 418.
18cf. Marcelino Lima, op, cit., p. 422; Jorge Forjaz, op. cit., Vol. I, Bettencourt, § 3, n,º 7, p. 385; e Vanessa Martins do Monte – Correspondências paulistas: as formas de tratamento em cartas de circulação pública (1865-1775) [Tese de Doutoramento em Filologia e Língua Portuguesa pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de S. Paulo], S. Paulo, 2013, p. 95.
19cf. António Ferreira de Serpa, op. cit., Vol. V-VI, n.º 1, 1916-1917, pp. 418-419.
Mestre em Ciência Política e Relações Internacionais pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa.
Documentalista e bibliotecário do sector audiovisual.