1.1. Época/período
1.1.1 Antiguidade
A Idade Antiga é concebida como o período da História que é contado a partir do desenvolvimento da escrita, pelos sumérios, até a queda do Império Romano do Ocidente, em 476 da era cristã. Neste período, vários foram os teóricos que se destacaram na área da Estretégia. No entanto, dentre vários, os destaques vão para Sun Tzu e Tucídedes. O pensamento desses teóricos se enquadra na corrente continental por acreditarem na exploração do terre- no para derrotar o inimigo, portanto, o continente é a área propícia para se travar combates.
• Sun Tzu (544-496 a. C.)
Grande teorizador chinês, um dos mais antigo dos estrategos. Foi o primeiro a sublinhar os méritos da estretégia indirecta que consiste em fugir e esgotar o adversário, desencorajá-lo e arrastá-lo para falsas pistas através da manipulação da informação. Para ele, a melhor estratégia é atacar a estratégia do inimigo, vencer a luta sem o envolvimento militar.
Foi adepto da Guerra defensiva. Na sua famosa obra, a Arte de Guerra 1, este sublinha que travar cem combates e obter cem vitorias é bom, mas não é o melhor. Imobilizar o exército inimigo sem batalha é excelente. Ele reco- menda a necessidade da utilização de métodos que levem a vitória com um mínimo de custos (a economia das forças constitui a abordagem ideal).
• Tucídedes (460- 400 a. C.)
Fez da sua obra A História da Guerra do Peloponeso uma história científica, e não uma imaginação épica literária – o que era muito comum na época, deixando de lado explicações religiosas para tentar decifrar as acções dos chefes políticos, por exemplo.
Aceitou que a sua sociedade é conflituosa, e que os estados deveriam se preparar para enfrentar esta realidade – as forças armadas devem estar sempre prontas e, dessa forma, criou os alicerces necessários para a teoria realista2 – Morgenthau materializou este objectivo, sendo o poder e interesse nacional as suas variáveis determinantes.
1.1.2 Idade Média
A idade média, caracterizada como turbulenta, testemunhou diversos conflitos e, um dos maiores conflitos do Ocidente, a Guerra dos Cem Anos – protagonizada por Inglaterra e França. Esta idade compreende o período da queda do Império Romano, em 476, até ao ano da tomada de Constantinopla pelo Império Turco Otomano, em 1453. Um período marcado, essencialmente, pela hegemonia da Igreja Católica.
• Flávio Vegécio (Sec. IV)
Na sua obra, Epitoma rei militaris 3, sublinha a necessidade de treinar os soldados frequentemente, adoptar estratégia ordenada, garantir a manutenção de linhas de abastecimento e logística, promover a liderança de qualidade e o uso de táticas para assegurar vantagem sobre o inimigo. No entanto, este não se tem descrito como um processo fácil, a famosa fricção militar de Clausewitz.
Portanto, Vegécio salienta a importância da seleção de bons soldados para a Guerra e, o comandante do exército deve cuidar dos homens sob o seu comando.
• Maurício (569-602)
O pensamento estratégico de Maurício se enquadra na escola continental. Este, como muitos outros, acredita que o continente é zona fértil para se ganhar uma guerra e o exército preparado tirará maior proveito.
Elenca, no seu tratado Strategikon, que a estratégia define-se ANTES do dia da batalha, e ela comporta medidas a tomar no dia da batalha – desde as instruções gerais e máximas, bem como características e tácticas dos diversos povos.
1.1.3 Idade Moderna: Renascimento e Iluminismo
A queda do Império Bizantino representa o marco histórico da Idade Moderna. O período moderno estende-se até 1789 com a Revolução Francesa. Este foi o período caracterizado por uma série de transformações. O continente europeu começou com a Expansão Marítima, que resultou na conquista de outros territórios – África e América (a famosa era dos descobrimentos e o início da primeira onda de Colonização).
• Nicolau Maquiavel4 (1469-1527)
Na sua destacada obra O príncipe, recomenda a necessidade de criação e manutenção de um exército nacional. Maquiavel não concorda com a ideia de manutenção de mercenários, estes podem constituir uma espécie de lesa pátrias.
Defensor da guerra ofensiva, para ele, o fim de uma guerra se firma com a destruição total do inimigo. Doravante, para que se firme a destruição total do inimigo, urge a necessidade da existência de coordenação entre os políticos e os militares, uma desconexão pode ser fatal e abrir uma brecha para a derrota. Portanto, Maquiavel sublinhou que a guerra é uma necessidade justificada, o estado que não opta por guerra dispõe a sua integridade territorial e oferta a sua soberania.
• Carl Von Clausewitz5 (1780-1831)
Nasceu em Burg, uma cidade da Alemanha, foi um militar do Reino da Prússia, ocupou o posto de General. Clausewitz possui uma definição trinitária da Guerra (Borges, s/a: 35):
1. A violência original, o ódio e animosidade.
2. A Guerra é um jogo das probabilidades e do acaso (o nevoeiro da guerra).
3. A sua natureza está subordinada à política.
Clausewitz descreve a guerra como violência, movida por ódio e envolvi- mento de comportamentos animalescos. Quando se vai à guerra espera-se violência, não se vai para guerra com espírito de irmandade. Ademais, a guerra é um jogo das probabilidades, as circunstâncias da mesma podem mudar o seu rumo, por isso ela deve ser considerada de uma arte e não ciência.
Para o autor da obra Da Guerra 6, a sua obra mais destacada, a natureza da guerra está inteiramente subordinada à política. Concorda com este pensamento o escritor Garcia (2017:240), que escreve a definição mais clássica de Clausewitz, a guerra não é somente um acto político, mas um verdadeiro instrumento político, uma continuação das relações políticas, uma realização destas por outros meios. Não se pode separar a Guerra da política, pois ela é a continuação da política.
Portanto, para Clausewitz, a Estratégia Militar é o emprego de batalhas para obter o fim da Guerra. À pala disto, escreve Paret (1986:3) Strategy is the use of armed force to achieve the military objectives and, by extension, the political purpose of the War.
Ademais, Clausewitz, à semelhança de Maquiavel e Jomini, pertecem à corrente da Guerra Ofensiva.
• Barão de Jomini (1779-1869)
Interessado pela táctica e prática da guerra, escreve Compêndio da arte da guerra, no qual ele defende a necessidade de concentração da força para travar uma batalha decisiva. Bem como atribui um lugar fundamental a logística, a manobra e ao abastecimeneto que determinam em larga medida o êxito das operações militares.
1.1.4 Idade Contemporânea
O período Contemporâneo está inserido na divisão da História como o período que tem início com a Revolução Francesa, em 1789, e vai até a actualidade. Este foi o período de diversas mudanças profundas – um período marcado por revoluções, subversão do equilíbrio europeu, diplomacia, nacionalismos, conflitos e grandes guerras mundiais.
• Liddell Hart (1885-1970)
O seu pensamemto estratégico enquadra-se na Escola continental. Ele apoia a estratégia defensiva, à semelhança de Sun Tzu.
Para Hart, a estratégia é a luta de vontades entre adversários. Defendeu a guerra limitada, como aquela que objectiva cansar o inimigo e não aniquilá-lo, com intuito de enfraquecer a resistência do inimigo. Nesses moldes, o objectivo da guerra é, essencialmente, alcançar a paz e não semear outras mágoas que podem fazer surgir outras guerras. Por isso, Hart pregava, no que diz respeito à tática, ampla utilização dos ataques noturnos e das acções indirectas, além da máxima mobilidade dos blindados.
Hart visualizava a guerra do futuro como aquela guerra que será mecanizada, com operações de forças altamente móveis, e para isto elaborou o primeiro manual da força mecanizada. Propunha mudanças no conceito de defesa, enfatizando a defesa móvel e o contra-ataque, através do emprego de forças blindadas. Defendia o fim da conscrição universal e a criação de um exército profissional, pequeno, bem treinado e dotado de equipamentos modernos, aptos para operar em qualquer Teatro de Operações, defendendo os interesses da Inglaterra.
• Lawrence Freedman (1948)
Defensor da escola continental, na sua obra The Transformation of Strategic Affairs, escreve “strategy is about choice. It depends on the ability to understand situations and to appreciate the dangers and opportunities they contain, (2006; p. 9).
Para Freedman, a estratégia é uma questão de escolha e ela depende da habilidade de entender as circunstâncias, e um bom estratego é aquele que é capaz de reparar os lados e sabe o que fazer para alcançar os seus objectivos. Como procede ele, The most talented strategists are able to look forward, to imagine quite different and more benign situations from those that currently obtain and what must be done to reach them,(Idem).
• Alfred Mahan (1840-1914)
Foi precursor da Escola da Estratégia Naval7, tendo enaltecido o poderio naval como elemento geoestratégico num conflito.
Escreve David (2001: 179), a estratégia consiste em dominar os oceanos, em dispor de pontos de apoio geostratégicos e em projectar uma concentração de forças navais tal que as mesmas possam repelir todo inimigo que possa fazer sombra a esse controlo dos mares. Na sua obra A influência do poder Marítmo na História, o almirante Mahan defendeu que a estratégia consiste em dominar os mares, oceanos e torná-los um ponto geoestratégico no combate contra os inimigos. E a missão de uma frota de guerra é de, inteiramen- te, destruir os navios inimigos.
• Giulio Douhet (1869-1930)
É considerado como o expoente da Escola da Estratégia Áerea8. Na sua obra O dominio do ar, ele elenca que para a vitória de uma estratégia militar ofensiva é preciso o controlo do ar. A doutrina de Douhet do bombardeio estratégico implicava acertar a terra natal do inimigo; suas cidades, indústrias e comunicações. O ataque contra as infraestruturas do inimigo, as suas cidades – deixará o inimigo desmotivado abrindo espaço para a aniquilação e derrota desta força. Portanto, a força área poderia com isto reduzir sua disposição e capacidade para a luta. Neste sentido, o avião constituiria a arma estratégica suprema e uma panaceia para as operações terrestre, (DAVID, 2001:179).
Para o general Italiano Douhet, o futuro das guerras poderiam ser ganhas ou perdidas no ar. A força aérea comandaria o ataque e o conjunto das forças terrestres seriam simplesmente defensivas.
Este estudo apresenta os contributos de Teóricos de Estratégias na doutrinação dos Estudos Estratégicos, desde a Antiguidade clássica à Contemporaneidade. E certamente que estes pertenceram à diversas escolas de pensa- mento. No entanto, a Escola continental definiu e substanciou a existência das outras escolas.
Desde a Antiguidade Clássica, estratégia era a arte de conduzir um exército, podendo também significar, em termos mais gerais, a arte de comando. Mais tarde, já no período medieval do Império Bizantino e até ao século X, o termo strategos continuou a ser usado para designar aquele que ocupava o primeiro lugar no exército, liderando-o. No Renascimento, o interesse pela antiguidade e pelos textos dos clássicos levou ao aparecimento de alguns escritos que podem ser enquadrados no campo da estratégia. É o caso de Nicolau Maquiavel.
Por sua vez, no século das Luzes, o século XVIII, dois acontecimentos históricos serviram de pano de fundo a um renovado interesse por esta área do conhecimento humano. O primeiro, foi a Guerra dos Sete Anos (1756- 1763), que marcou a ascensão da Prússia ao estatuto de grande potência europeia. O segundo, foi a Revolução Francesa de 1789, durante a qual surgiu, pela primeira vez, o recurso à conscrição, ou seja, a exércitos nacionais formados por cidadãos. Um marco incontornável neste âmbito é o trabalho do general prussiano Carl von Clausewitz, Da Guerra (1832), uma espécie de Bíblia da Estratégia. Trata-se de uma obra usualmente considera- da uma referência obrigatória do pensamento estratégico-militar ocidental. Uma tentativa de descobrir os princípios, forças e tendências que orientam a guerra, de compreender as funções da violência nos relacionamentos entre os Estados, e especular sobre o seu uso racional e bem-sucedido.
BORGES, João Vieira (s/a). O Pensamento Estratégico Português – Contributos séc. (XVI-XIX).
DAVID, Charles-Philippe (2001). A GUERRA E A PAZ: Abordagens Contemporâneas da Segurança e da Estratégia. Lisboa: Instituto Piaget.
FREEDMAN, Lawrence (2006). The Transformation of strategic affairs. Adelphi Paper 379. Oxford: Oxford University Press.
GARCIA, Francisco Proença (2017). A guerra e a Estratégia Revisitadas.
JADIR, Viera (2015). A ARTE DA GUERRA: e as dez táticas mais eficazes da Antigui- dade. Florianópolis.
PARET, Peter (1986). MAKERS OF MODERN STRATEGY – from Machiavelli to the nuclear age. Princeton University Press. New Jersey.
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1 O seu tratado militar, A Arte da Guerra, composto por 13 capítulos de estratégias militares, tornou-lhe uma referência pela sua abordagem directa e práctica.
2 Baseado na ideia de que a tendência de dominar é componente de toda associação humana, e a luta pelo poder na política internacional não é um acidente histórico.
3 Traduzido por Compêndio Militar, um tratado que aborda a ciência da guerra e princípios militares.
4 Escola Continental.
5 IDEM.
6 Da Guerra (Vom Kriege) é a obra de Clausewitz, que apresenta a visão acerca do papel e a utilização da força armada.
7 Ela visa o controlo dos mares como meio de garantir a sobrevivência e a prosperidade de uma potência comercial e imperial.
8 Defende que o controlo do espaço do ar dita o sucesso de uma estratégia militar.
Mestrando em Relações Internacionais Defesa e Segurança, na Academia Militar Marechal Samora Machel.