A Revista Militar sente a obrigação de pôr à disposição dos seus leitores, para fácil consulta, a lei constitucional n.º 3/74, de 14 de Maio de 1974, que define a estrutura; legal em que se apoiará a actividade política do País até à aprovação da nova Constituição Política por uma Assembleia Constituinte, a eleger na primavera de 1975.
A lei constitucional que nos rege actualmente tem, como parte integrante, o Programa do Movimento, das Forças Armadas Portuguesas.
Este facto é por tal forma importante e influi de maneira tão decisiva na vida da sociedade portuguesa que deve apresentar-se ao estudo e à meditação de todos os nossos camaradas.*
Lei n.º 31/74
de 14 de Maio
Considerando que o Movimento das Forças Armadas, em 25 de Abril de 1974, restabeleceu as condições necessárias ao exercício da democracia e à realização da paz social na justiça e na liberdade.
Considerando que, de acordo com o Programa do Movimento das Forças Armadas, importa definir a estrutura constitucional transitória que regerá o País até à entrada em vigor da nova Constituição Política da República Portuguesa:
A Junta de Salvação Nacional decreta, para valer como lei constitucional o seguinte:
ARTIGO 1.º
(Normas Constitucionais)
1. A Constituição Política de 1933 mantém-se transitoriamente em vigor naquilo que não contrariar os princípios expressos no Programa do Movimento das Forças Armadas, cujo texto autêntico se acha transcrito em anexo a esta lei e dela faz parte integrante.
2. Entender-se-a de igual modo revogada a Constituição Política de 1933 em tudo aquilo que for contrariado por disposição da Lei Constitucional n.º 1/74, de 25 de Abril, da Lei Constitucional n.º 2/74, de 14 de Maio, da presente lei ou de futura lei ‘constitucional promulgada no exercício dos poderes assumidos em consequência daquele Movimento e ao abrigo do preceituado neste diploma.
3. As disposições da Constituição Política de 1933 serão interpretadas, na parte em que subsistirem, e a lacunas da mesma serão integradas de acordo com os referidos princípios expressos no Programa do Movimento das Forças Armadas.
ARTIGO 2.º
(Órgãos de Soberania)
Até que iniciem o exercício das suas funções os órgãos que vierem a ser instituídos pela nova Constituição Política, a aprovar nos termos da presente lei, exercerão o poder, além da Assembleia Constituinte, o Presidente da República, a Junta de Salvação Nacional, o Conselho de Estado, o Governo Provisório e os tribunais.
ARTIGO 3.º
(Assembleia Constituinte)
1. À Assembleia Constituinte caberá elaborar e aprovar a Constituição Política.
2. A Assembleia Constituinte deverá aprovar a Constituição no prazo de noventa dias, contados a partir da data da verificação dos poderes dos seus membros, podendo esse prazo ser prorrogado por igual período pelo Presidente da República, ouvido o Conselho de Estado.
3. A Assembleia Constituinte dissolve-se automaticamente uma vez aprovada a Constituição ou decorrido que seja o prazo referido no número anterior devendo, neste segundo caso, ser eleita nova Assembleia Constituinte no prazo de sessenta dias.
ARTIGO 4.º
(Lei Eleitoral)
1. A Assembleia Constituinte será eleita por sufrágio universal, directo e secreto. O número de membros da Assembleia, os requisitos de elegibilidade dos Deputados, a organização dos círculos eleitorais e o processo de eleição serão determinados pela lei eleitoral.
2. O Governo Provisório nomeará, no prazo de quinze dias a contar da sua instalação, uma comissão para elaborar o projecto da lei eleitoral.
3. O Governo Provisório elaborará, com base no projecto da comissão referida no número anterior, uma proposta de lei eleitoral a submeter à aprovação do Conselho de Estado, de modo a estar publicada até 15 de Novembro de 1974.
4. As eleições para Deputados à Assembleia Constituinte realizar-se-ão até 31 de Março de 1975, em data a fixar pelo Presidente da República.
5. A Assembleia Constituinte será convocada dentro de 15 dias após a sua eleição.
ARTIGO 5.º
(Presidente da República)
O Presidente da República é escolhido pela Junta de Salvação Nacional de entre os seus membros, e responde perante a Nação.
ARTIGO 6.º
(Posse do Presidente da República)
O Presidente da República assume as suas funções no dia em que for designado e toma posse perante a Junta de Salvação Nacional, usando a seguinte declaração de compromisso: Juro, por minha honra, garantir o exercício de todos os direitos e liberdades dos cidadãos, observar e fazer cumprir as leis, promover o bem geral da Nação e defender a independência da Pátria Portuguesa.
ARTIGO 7.º
(Competência do Presidente da República)
Compete ao Presidente da República:
1.º Vigiar o cumprimento das normas constitucionais e das restantes leis;
2.º Presidir à Junta de Salvação Nacional e ao Conselho de Estado;
3.º Nomear os membros do Governo Provisório de entre os cidadãos portugueses que sejam representativos de grupos e correntes políticas ou sejam independentes, mas se identifiquem com o Programa do Movimento das Forças Armadas, e exonerá-los;
4.º Convocar o Conselho de Estado;
5.º Convocar e presidir ao Conselho de Ministros, quando o julgar conveniente;
6.º Marcar, de harmonia com a lei eleitoral, a data das eleições dos Deputados à Assembleia Constituinte;
7.º Convocar a Assembleia Constituinte e abrir a sua sessão;
8.º Prorrogar, se necessário, a sessão da Assembleia Constituinte, nos termos do n.º 2 do artigo 3.º;
9.º Representar a Nação e dirigir a política externa do Estado, concluir acordos e ajustar tratados internacionais, directamente ou por intermédio de representantes, e ratificar os tratados depois de devidamente aprovados;
10.º Exercer a chefia suprema das forças armadas, nos termos da lei;
11.º Indultar e comutar penas;
12.º Declarar, ouvido o Conselho de Estado, o estado de sítio, ‘com suspensão, total ‘ou parcial, das garantias constitucionais, em um ou mais pontos do território nacional, no caso de agressão efectiva ou iminente por forças estrangeiras ou no de a segurança e a ordem pública serem perturbadas ou ameaçadas;
13.º Promulgar e fazer publicar as leis constitucionais e as resoluções emanadas do Conselho de Estado, bem como os decretos-leis e os decretos regulamentares, e assinar os restantes decretos. Os diplomas mencionados neste número que não sejam promulgados, assinados e publicados segundo nele se determina são juridicamente enexístentes.
ARTIGO 8.º
(Regime de referenda)
1. Os actos do Presidente da República devem ser referendados pelo Primeiro-Ministro e pelo Ministro ou Ministros competentes, sem o que serão juridicamente inexistentes.
2. Não carecem de referenda:
a) A nomeação e exoneração dos membros do Governo Provisório;
b) A mensagem de renúncia ao cargo;
c) A promulgação das leis constitucionais e das resoluções do Conselho de Estado.
3. Salvo o disposto no número anterior, devem ser referendados por todos os Ministros os decretos-leis e os decretos que hajam de ser promulgados ou assinados pelo Presidente da República, se uns e outros não tiveram sido aprovados em Conselho de Ministros.
ARTIGO 9.º
(Constituição da Junta de Salvação Nacional)
1. A Junta de Salvação Nacional é composta por sete militares, que para o efeito receberam mandato do Movimento das Forças Armadas.
2. O exercício das funções de membro da Junta prefere ao de qualquer outro cargo.
3. No caso de cessação, por parte de qualquer membro da Junta, das respectivas funções, o Conselho de Estado designará o novo membro no prazo de quinze dias após a verificação do respectivo evento.
ARTIGO 10.º
(Competência da Junta de Salvação Nacional)
Compete à Junta de Salvação Nacional:
1.º Vigiar pelo Programa do Movimento das Forças Armadas e das leis constitucionais;
2.º Escolher de entre os seus membros o Presidente da República, o Chefe e Vice-Chefes do Estado-Maior-General das Forças Armadas, o Chefe do Estado-Maior da Armada, o Chefe do Estado-Maior do Exército e o Chefe do Estado-Maior da Força Aérea;
3.º Designar, em caso de impedimento do Presidente da República, qual dos membros desempenhará interinamente as suas funções.
ARTIGO 11.º
(Funcionamento da Junta de Salvação Nacional)
1. Até à sua dissolução, a Junta de Salvação Nacional considerar-se-á em reunião permanente.
2. As deliberações da Junta serão tomadas por maioria absoluta do número legal dos membros que a compõem.
ARTIGO 12.º
(Composição do Conselho de Estado)
1. Constituem o Conselho de Estado:
a) Os membros da Junta de Salvação Nacional;
b) Sete representantes das forças armadas;
c) Sete cidadãos de reconhecido mérito, a designar pelo Presidente da República.
2. Os membros do Conselho de Estado referidos na alínea b) do número anterior serão investidos pelo Presidente da República, de acordo com as designações feitas pelo Movimento das Forças Armadas, não podendo estes ser colocados, sem prévio consentimento do Conselho de Estado, em situações que impeçam o exercício efectivo das suas funções.
3. O exercício das funções do Conselheiro de Estado, por parte dos membros referidos na alínea b) do n.º 1, prefere aos de quaisquer outras.
4. No caso de morte, renúncia ou impossibilidade física permanente de qualquer dos membros do Conselho de Estado referidos nas alíneas b) e c) do n.º 1 deste artigo, o Presidente da República designará o novo membro no prazo de quinze dias após a verificação do respectivo evento.
ARTIGO 13.º
(Competência do Conselho de Estado)
1. Compete ao Conselho de Estado:
1.º Exercer os poderes constituintes assumidos em consequência do Movimento das Forças Armadas até à eleição da Assembleia Constituinte;
2.º Sancionar os diplomas do Governo Provisório que respeitem:
a) A eleição da Assembleia Constituinte;
b) A definição das linhas gerais da política económica, social e financeira;
c) Ao exercício da liberdade de expressão de pensamento, de ensino, de reunião, de associação e de crenças e práticas religiosas;
d) A organização da defesa nacional e à definição dos deveres desta decorrentes;
e) A definição do regime geral do Governo das províncias ultramarinas;
3.º Vigiar pelo cumprimento das normas constitucionais e das leis ordinárias e apreciar os actos do Governo ou da Administração, podendo declarar com força obrigatória geral, mas ressalvadas sempre as situações criadas pelos casos julgados, a inconstitucionalidade de quaisquer normas;
4.º Autorizar o Presidente da República a fazer a guerra, se não couber o recurso à arbitragem, ou esta se malograr, salvo o caso de agressão efectiva ou iminente de forças estrangeiras, e a fazer a paz;
5.º Pronunciar-se sobre a impossibilidade física do Presidente;
6.º Pronunciar-se em todas ais emergências graves para a vida da Nação e sobre autos assuntos de interesse nacional sempre que o Presidente da República o julgue conveniente.
2. Os diplomas que Conselho de Estado não Presidente da República devem ser sancionados poderão ser promulgados sem que a sanção tenha pelo pelo sido concedida.
ARTIGO 14.º
(Constituição e formação do Governo Provisório)
1. O Governo Provisório é constituído pelo Primeiro-Ministro, que poderá gerir os negócios de um ou mais Ministérios, e pelos Ministros, Secretários e Subsecretários de Estado.
2. O Primeiro-Ministro e os Ministros são nomeados e exonerados pelo Presidente da República.
3. Os Secretários e Subsecretários de Estado são nomeados pelo Presidente da República, sob proposta do Primeiro-Ministro.
4. As funções dos Secretários e Subsecretários de Estado cessam com a exoneração do respectivo Ministro.
5. Poderá haver Ministros sem pasta que desempenhem missões de natureza específica e exerçam funções de coordenação entre Ministérios ou quaisquer outras que lhes sejam delegadas pelo Primeiro-Ministro.
ARTIGO 15.º
(Responsabilidade política do Governo Provisório)
O Governo Provisório é responsável politicamente perante o Presidente da República.
ARTIGO 16.º
(Competência do Governo Provisório)
1. Compete ao Governo Provisório:
1.º Conduzir a política geral da Nação;
2.º Referendar os actos do Presidente da República;
3.º Fazer decretos-leis e aprovar os tratados ou acordos internacionais;
4.º Elaborar os decretos, regulamentos e instruções para a boa execução das leis;
5.º Superintender no conjunto da administração pública;
6.º Elaborar a lei eleitoral.
2. Os actos do Governo Provisório que envolvam aumento de despesas ou diminuição de receitas são sempre referendados pelo Ministro da Coordenação Económica.
ARTIGO 17.º
(Colegialidade do Gabinete)
1. Os Ministros do Governo Provisório definirão em Conselho as linhas de orientação governamental, em execução do Programa do Movimento das Forças Armadas.
2. A execução da orientação política definida em Conselho para cada Ministério será assegurada pelo respectivo Ministro.
3. Ao Primeiro-Ministro caberá convocar e presidir ao Conselho de Ministros e coordenar e fiscalizar a execução da política definida pelo Conselho.
ARTIGO 18.º
(Exercício da função jurisdicional)
1. As funções jurisdicionais serão exercidas exclusivamente por tribunais integrados no Poder Judicial.
2. Não é permitida a existência de tribunais com competência específica para o julgamento de crimes contra a segurança do Estado.
3. Exceptuam-se do disposto no n.º 1 os tribunais militares.
ARTIGO 19.º
(Forças Armadas)
1. A estrutura das forças armadas é totalmente independente do estrutura do Governo Provisório.
2. A ligação entre as forças armadas e o Governo Provisório é feita através do Ministro da Defesa Nacional.
ARTIGO 20.º
(Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas)
O Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas tem categoria idêntica à do Primeiro-Ministro, sucedendo-lhe imediatamente na hierarquia da função pública.
ARTIGO 21.º
(Chefes dos estados-maiores dos três ramos das forças armadas)
Os chefes dos estados-maiores dos três ramos das forças armadas desempenharão todas as funções que correspondiam, até 25 de Abril de 1974, às dos Ministros das pastas militares, com excepção das de natureza exclusivamente civil, que transitarão para o Governo Provisório.
ARTIGO 22.º
(Conselho Superior de Defesa Nacional)
1. Haverá um Conselho Superior de Defesa Nacional, com a atribuição de concertar a política e a acção de defesa nacional.
2. O Conselho Superior de Defesa Nacional é presidido pelo Presidente da República e dele fazem parte o Primeiro-Ministro, o Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas, os Ministros da Defesa Nacional, Negócios Estrangeiros, Coordenação Económica e Coordenação Interterritorial e os chefes dos estados-maiores dos três ramos das forças armadas.
3. Quando o entender, o Presidente da República pode convocar outros Ministros, Governadores-Gerais ou Governadores de províncias ultramarinas e outras entidades que, pelas suas funções, tenham directa interferência nos assuntos relativos à defesa nacional.
ARTIGO 23.º
(Governadores-Gerais e Governadores de províncias ultramarinas)
Os Governadores-gerais e os Governadores de Províncias ultramarinas têm, na hierarquia da função pública, categorias idênticas, respectivamente, às de Ministros e de Secretários de Estado.
ARTIGO 24.º
(Vigência)
1. A presente lei entra imediatamente em vigor.
2. As leis constitucionais a que se refere o artigo 1.º deste diploma caducarão logo que a nova Constituição seja aprovada e promulgada e tomem posse os titulares dos órgãos que sejam previstos nela.
Visto e aprovado pela Junta de Salvação Nacional em 14 de Maio de 1974.
Publique-se.
O Presidente da Junta de Salvação Nacional, ANTÓNIO DE SPÍNOLA.
Programa do Movimento das Forças Armadas Portuguesas
Considerando que, ao fim de treze anos de luta em terras do ultramar, o sistema político vigente não conseguiu definir, concreta e objectivamente, uma política ultramarina que conduza à paz entre os Portugueses de todas as raças e credos;
Considerando que a definição daquela política só é possível com o saneamento da actual política interna e das suas instituições, tornando-as, pela via democrática, indiscutidas representantes do Povo Português;
Considerando ainda que a substituição do sistema político vigente terá de processar-se sem convulsões internas que afectem a paz, o progresso e o bem-estar da Nação:
O Movimento das Forças Armadas Portuguesas, na profunda convicção de que interpreta as aspirações e interesses da esmagadora maioria do Povo Português e de que a sua acção se justifica plenamente em nome da salvação da Pátria, fazendo uso da sua força que lhe é conferida pela Nação através dos seus soldados, proclama e compromete-se a garantir a adopção das seguintes medidas, plataforma que entende necessária para a resolução da grande crise nacional que Portugal atravessa:
A – Medidas imediatas
1 – Exercício do poder político por uma Junta de Salvação Nacional até à formação, a curto prazo, de um Governo Provisório Civil.
A escolha do Presidente e Vice-Presidente será feita pela própria Junta.
2 – A Junta de Salvação Nacional decretará:
a) A destituição imediata do Presidente da República e do actual Governo, a dissolução da Assembleia Nacional e do Conselho de Estado, medidas que serão acompanhadas do anúncio público da convocação, no prazo de doze meses, de uma Assembleia Nacional Constituinte, eleita por sufrágio universal directo e secreto, segundo lei eleitoral a elaborar pelo futuro Governo Provisório;
b) A destituição de todos os governadores civis no continente, governadores dos distritos autónomos nas ilhas adjacentes e Governadores-Gerais nas províncias ultramarinas, bem como a extinção imediata da Acção Nacional Popular.
1) Os Governos-Gerais das províncias ultramarinas serão imediatamente assumidos pelos respectivos secretários-gerais, investidos nas funções de encarregados do Governo, até nomeação de novos Governadores-Gerais, pelo Governo Provisório;
2) Os assuntos correntes dos governos civis serão despachados pelos respectivos substitutos legais enquanto não forem nomeados novos governadores pelo Governo Provisório;
c) A extinção imediata da DGS, Legião Portuguesa e organizações políticas da juventude. No ultramar a DGS será reestruturada e saneada, organizando-se como Polícia de Informação Militar enquanto as operações militares o exigirem;
d) A entrega às forças armadas de indivíduos culpados de crimes contra a ordem política instaurada enquanto durar o período de vigência da Junta de Salvação Nacional, para instrução de processo e julgamento;
e) Medidas que permitam vigilância e contrôle rigorosos de todas as operações ‘económicas e financeiras com o estrangeiro;
f) A amnistia imediata de todos os presos políticos, salvo os culpados de delitos comuns, os quais serão entregues ao foro respectivo, e reintegração voluntária dos servidores do Estado destituídos por motivos políticos;
g) A abolição da censura e exame prévio;
1) Reconhecendo-se a necessidade de salvaguardar os segredos dos aspectos militares e evitar perturbações na opinião pública, causadas por agressões ideológicas dos meios mais reaccionários, será criada uma comissão ad hoc para contrôle da imprensa, rádio, televisão, teatro e cinema, de carácter transitório, directamente dependente da Junta de Salvação Nacional, a qual se manterá em funções até à publicação de novas leis de imprensa, rádio, televisão, teatro e cinema pelo futuro Governo Provisório;
h) Medidas para a reorganização e saneamento das forças armadas e militarizadas (GNR, PSP, GF, etc.):
i) O contrôle de fronteiras será das atribuições das forças armadas e militarizadas enquanto não for criado um serviço próprio;
j) Medidas que conduzam ao combate eficaz contra a corrupção e especulação.
B – Medidas a curto prazo
1 – No prazo máximo de três semanas após a conquista do Poder, a Junta de Salvação Nacional escolherá, de entre os seus membros, o que exercerá as funções de Presidente da República Portuguesa, que manterá poderes semelhantes aos previstos na actual Constituição.
a) Os restantes membros da Junta de Salvação Nacional assumirão as funções de Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas, Vice-Chefes do Estado-Maior-General das Forças Armadas, Chefe do Estado-Maior da Armada, Chefe do Estado-Maior do Exército e Chefe do Estado-Maior da Força Aérea e farão parte do Conselho de Estado.
2 – Após assumir as suas [unções, O Presidente da República nomeará o Governo Provisório Civil, que será composto por personalidades representativas de grupos e correntes políticas e personalidades independentes que se identifiquem com o presente programa.
3 – Durante o período de excepção do Governo Provisório, imposto pela necessidade histórica de transformação política, manter-se-á a Junta de Salvação Nacional, para salvaguarda dos objectivos aqui proclamados.
a) O período de excepção terminará logo que, de acordo com a nova Constituição Política, estejam eleitos o Presidente da República e a Assembleia Legislativa.
4 – O Governo Provisório governará por decretos-lei, que obedecerão obrigatoriamente ao espírito da presente proclamação.
5 – O Governo Provisória, tendo em atenção que as grandes reformas de fundo só poderão ser adoptadas no âmbito da futura Assembleia Nacional Constituinte, obrigar-se-á a promover imediatamente:
a) A aplicação de medidas que garantam o exercício formal da acção do Governo e o estudo e aplicação de medidas preparatórias de carácter material, económica, social e cultural que garantam o futuro exercício efectivo da liberdade política das cidadãos;
b) A liberdade de reunião e de associação. Em aplicação deste princípio será permitida a formação de «associações políticas», passíveis embriões de futuros partidos políticos, e garantida a liberdade sindical, de acordo com lei especial que regulará o seu exercício;
c) A liberdade de expressão e pensamento sob qualquer forma;
d) A promulgação de uma nova Lei de Imprensa, Rádio, Televisão, Teatro e Cinema;
e) Medidas e disposições tendentes a assegurar, a curta prazo, a independência e a dignificação do Poder Judicial;
1) A extinção das «tribunais especiais» e dignificação da processa penal em todas as suas fases;
2) Os crimes cometidos contra ‘o Estada da novo regime serão instruídos por juízes de direito e julgados em tribunais ‘Ordinárias, senda dadas todas as garantias aos arguidos. As averiguações serão cometidas à Polícia Judiciária.
6 – O Governo Provisório lançará os fundamentos de:
a) Uma nova política económica, posta ao serviço do Povo Português, em particular das camadas da população até agora mais desfavorecidas, tendo como preocupação imediata a luta contra a inflação e a alta excessiva da custo de vida, o que necessariamente implicará uma estratégia antimonopolista;
b) Uma nova política social que, em todos os domínios, terá essencialmente como objectivo a defesa dos interesses das classes trabalhadoras e o aumento progressivo, mas acelerado, da qualidade da vida de todos os Portugueses.
7 – O Governo Provisório orientar-se-a em matéria de política externa pelos princípios da independência e da igualdade entre os Estados, da não ingerência nos assunto internos dos outros países e da defesa da paz, alargando e diversificando relações internacionais com base na amizade e cooperação:
a) O Governo Provisório respeitará os compromisso internacionais decorrentes dos tratados em vigor.
8 – A política ultramarina do Governo Provisório, tendo em atenção que a sua definição competirá à Nação, orientar-se-à pelos seguintes princípios.
a) Reconhecimento de que a solução das guerras no ultramar é política, e não militar;
b) Criação de condições para um debate franco e aberto, a nível nacional, do problema ultramarino;
c) Lançamento dos fundamentos de uma política ultramarina que conduza à paz.
C – Considerações finais
1 – Logo que eleitos pela Nação a Assembleia Legislativa e o novo Presidente da República, será dissolvida a Junta de Salvação Nacional e a acção das forças armadas será restringida à sua missão específica de defesa da soberania nacional.
2 – O Movimento das Forças Armadas, convicto de que os princípios e os objectivos aqui proclamados traduzem um compromisso assumido perante o País e são imperativos para servir os superiores interesses da Nação, dirige a todos os Portugueses um veemente apelo à participação sincera, esclarecida e decidida na vida pública nacional e exorta-os a garantirem, pelo seu trabalho e convivência pacífica, qualquer que seja a posição social que ocupem, as condições necessárias à definição, em curto prazo, de uma política que conduza à solução dos graves problemas nacionais e à harmonia, progresso e justiça social indispensáveis ao saneamento da nossa vida pública e à obtenção do lugar a que Portugal tem direito entre as Nações.
O Presidente da Junta de Salvação Nacional, ANTÓNIO DE SPÍNOLA.
Trata-se, de facto, de um documento fundamental – de uma autêntica fonte de História.
L. da C. P.
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* Revista Militar, n.º 7 – julho de 1974, pp. 297-315.