A recente globalização, entendida como processo de transposição das fronteiras do Estado-Nação nos domínios da economia, das culturas e da comunicação-informação, entre outros, tem merecido inúmeras reflexões sob variadas perspectivas. Duas dessas reflexões assumem relevo nos meios internacionais de discussão: a circulação de produtos de novas economias emergentes em espaços económicos com regras consolidadas, mas que aceitaram regras de comércio internacional e a fixação de pessoas de diferentes culturas em sociedades abertas e onde o processo de aculturação não se tem verificado. Uma e outra têm levantado questões de identidade nacional e de segurança nacional.
Perante fenómenos sociais e políticos novos, tais como as supernacionalidades e as infranacionalidades face ao tradicional conceito de Estado-Nação, levanta-se de novo a questão da identidade nacional, forçadamente esquecida na segunda metade do século passado, especialmente na Europa, devido ao problema dos nacionalismos exagerados e suas consequências. Mas na Europa de hoje, que procura uma identidade política e social além do espaço económico já conseguido, toda a gente sabe que existem mais identidades nacionais do que Estados e noutros espaços geoestratégicos a questão de definir quem somos e o que nos distingue parece merecer atenção para descobrir quais os nossos interesses e o que é que nos ameaça.
Face a novas ameaças à segurança - nacional, regional e global - para as quais as respostas não têm merecido consensos, há quem procure no avivar das identidades nacionais, agora num mundo globalizado onde os alertas e avisos sobre exageros são facilmente detectáveis, um novo modelo para reforçar defesas contra essas ameaças. Antes de querer transformar os outros talvez seja melhor voltar a acreditar no que nos distingue. Polémico? Mas o que é que não é polémico quando se procuram modelos para uma sociedade nova, de uma segunda modernização na Europa e primeira para outras partes do mundo, e onde ideias força do passado recente se esgotaram?
Uma obra recentemente publicada e de autor que já nos habituou a um pensamento profundo e polémico1, retoma o problema da identidade nacional, na importância e substância de que hoje se reveste numa sociedade complexa como é a sociedade dos Estados Unidos da América. Obra que nos leva a meditar sobre como os Portugueses entendem, nos dias de hoje, a questão da sua identidade nacional. Que importância lhe dão? O que entendem como factores distintivos da sua identidade?
Numa História longa de séculos e num espaço geográfico com um único vizinho a partir do século XVI, que materializou essa vizinhança como a fronteira terrestre mais extensa na Europa de um Estado só com outro Estado, a substância da nossa identidade nacional tem sido largamente tratada. A complementar os estudos de Jorge Dias a necessitar de actualização, aguardamos a investigação anunciada de António Barreto para tentarmos perceber aquilo que nos distingue de outras identidades. Esperemos que ao fatalismo e à recentemente propagandeada falta de competitividade, encontremos algo que nos entusiasme para sair da depressão já reconhecida em estudos internacionais. E, acima de tudo, tentar perceber o que nos une e o que nos divide, além dos novos clientelismos que artificialmente têm sido criados na recente vida portuguesa.
Estamos a precisar de algo que mobilize o nosso esforço colectivo para nos sentirmos Portugueses, avivando os valores, os sentimentos e o orgulho nacionais tão esquecidos e tão subalternizados perante internacionalismos que parece dominarem o pensamento de quem nos dirige. Ser Português deveria constituir tema de reflexão nos nossos programas educativos e o símbolo da nossa identidade nacional, a Bandeira Nacional, deveria merecer mais permanente atenção, reiterando um sentimento que se evidenciou durante o Euro 2004 ou no auxílio a Timor-Leste em 2000.
Vivemos tempos difíceis de identidade nacional, com consequências imprevisíveis para a nossa segurança nacional. Algo tem de ser feito para unir os Portugueses, restaurando a sua confiança num destino comum e terminando com a vivência a fingir que temos vindo a percorrer.
* Sócio Efectivo da Revista Militar. Presidente da Direcção.
1 HUNTINGTON, Samuel P, WHO ARE WE? America’s Great Debate, ed. The Free Press, UK.2005.