A Europa e a África são dois continentes com relações históricas que, nos tempos actuais, mais os afastam do que os aproximam. Os europeus, na sua diversidade, criaram diferentes percepções de África, passando pela ignorância, o fascínio ou o receio. Os africanos, na sua solidão e desespero, e com passados recentes de experiências coloniais de memórias diversificadas, se por um lado procuram na Europa caminhos de segurança e de estilos de vida que anseiam, por outro lado favorecem no seu seio culturas que, esperam, nada tenham a ver com os seus passados de colonizados. A Europa e os europeus continuam destinos preferidos dos africanos, mas a China, a Rússia, a Índia e o Brasil são já hóspedes preferidos de África e outros vão batendo à porta.
A Cimeira União Europeia-África, anunciada pela Presidência Portuguesa para o próximo mês de Dezembro, com todas as dificuldades de percurso que a diplomacia portuguesa, com realismo e determinação tem procurado ultrapassar mantendo-se fiel ao seu objectivo, não irá eliminar as tensões psicológicas que se criaram, mas poderá contribuir para um relacionamento pragmático de interesse mútuo entre os dois continentes.
O pragmatismo dos factos mostra que a África vive problemas de má governação, de fome, de doença, de isolamento, de ambiente e de migrações populacionais que ofendem a dignidade e os direitos humanos. Há locais de África mais isolados e afastados da civilização do que há meio século. É urgente o auxílio a África. O mesmo pragmatismo mostra-nos uma Europa dividida quanto a concepções fundamentais para um destino comum, como sejam a organização e funções do Estado, sistemas económicos e modelos sociais ou postura e resposta face a situações e ameaças que crescentemente afectam a sua segurança. Uma Europa com insuficiências estruturais conjunturalmente agravadas, como sejam as populacionais e energéticas, limitam a capacidade material da Europa poder auxiliar a África. Com modelos de produção de riqueza em dificuldades para satisfazer necessidades sociais cada vez mais exigentes, a Europa tem diminuído os seus auxílios financeiros para o desenvolvimento em Africa e iniciativas lançadas há anos, tais como o Diálogo Norte-Sul, pouco evoluíram para lá das intenções.
Os esforços desenvolvidos por Portugal para a Cimeira anunciada têm de merecer o apoio de europeus e africanos. Portugal tem experiência de grande parte de África, foi o primeiro País europeu a chegar ao continente e o último a deixá-lo. Da nossa vivência ficaram boas e más experiências. Lembrando as boas podemos falar da aculturação prosseguida, da política de posse de terras praticada que não deixou traumas, da cooperação civil-militar na resolução de conflitos, nos planos de desenvolvimento expeditos, sem grandes e sofisticados investimentos, que satisfizeram necessidades básicas da população como foram a alimentação, o abastecimento de água, a saúde, a educação.
A Europa deve pensar a África em termos de tarefas simples e urgentes. Continuar a ver populações a arriscar a vida para obter lenha para poder cozinhar não deve ser aceite como uma fatalidade sem solução. Todo o esforço de Portugal para eliminar a indiferença de europeus deve ser apoiado. Pretender abandonar problemas de fundo com questões entre personalidades não nos parece bom caminho para a África e para a Europa.
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* Sócio Efectivo da Revista Militar. Presidente da Direcção.