Na sequência de algumas iniciativas lançadas pela Academia Portuguesa da História, Sociedade de Geografia de Lisboa, Comissão Portuguesa de História Militar, Centro de História da Faculdade de Letras de Lisboa e outras, o ano de 2008 vai assistir a alguma actividade académica e editorial que procurará desenvolver novos dados sobre aquele acontecimento que tanto influenciou a vida nacional e, como dizem alguns autores de mérito, terminou o Antigo Regime na Nação Portuguesa.
Muita da historiografia das Invasões Francesas em Portugal ainda se encontra influenciada por paixões interpretativas de comportamentos ocorridos: o comportamento da Coroa e da casa Real onde sobressai a figura do Príncipe Regente, o comportamento das elites portuguesas perante as influências estrangeiradas de França e da Inglaterra, as novas doutrinas trazidas pela maçonaria, o comportamento dos militares perante uma má preparação do Reino para a defesa, as relações dos militares portugueses com os Comandos e tropas inglesas, o comportamento das populações portuguesas perante o invasor e o aliado, o tremendo morticínio causado por invasores e aliados sobre uma população que procurava sobreviver. Se esses comportamentos foram interpretados com paixão, há ainda outros factos que convirá pesquisar objectivamente, agora com novas fontes trazidas por memórias e relatos coevos que têm sido publicadas e com maior individualidade para o carácter específico português das Invasões, diferenciando-o dos relatos globais daquilo que noutras historiografias se designa por Guerra Peninsular.
Na historiografia abundam as fontes sobre os aspectos militares ocorridos, onde assumem relevo as ordens de batalha das forças envolvidas, as descrições de batalhas, as figuras dos comandantes e o comportamento dos combatentes. O Dicionário Bibliográfico da Guerra Peninsular, da autoria de Cristóvão Ayres e editado durante o primeiro centenário das Invasões, tem sido acrescentado com bastantes obras desde então publicadas, muitas de autores ingleses e outros estrangeiros e haveria necessidade de incluir obras de autores portugueses, algumas publicadas e outras a desenvolver.
É esse o desafio que a Revista Militar lança aos seus leitores e aos centros de excelência de investigação, onde assumem relevância a Academia Portuguesa da História, o Centro de História da Faculdade de Letras de Lisboa, o Departamento de Cultura e História do Exército, a Academia de Marinha, a Comissão Portuguesa de História Militar, o Instituto de Estudos Superiores Militares e outros. Há áreas do comportamento (das Juntas de Governo, da influência da Coroa a partir do Brasil, da classe dirigente, dos militares, das populações) que merecem uma investigação interdisciplinar, de forma a repor a verdade sobre interpretações apaixonadas. Deixemos para César o que é de César.
Na área dos assuntos militares relacionados com as Invasões há aspectos demasiado descritivos que ainda não foram convenientemente tratados nos seus aspectos interpretativos: o pensamento militar prevalecente na época onde imperava a doutrina napoleónica de fazer a guerra; os ambientes operacionais distintivos das campanhas na Península Ibérica, onde particularidades do terreno, das condições meteorológicas e das populações lhes conferiram distinção daquilo que se passava na grande planície europeia; a cooperação entre forças regulares e irregulares e os arranjos de comando para essa cooperação; as tecnologias emergentes na arma individual (que garantia a extraordinária pontaria inglesa) e na artilharia que a tornou a arma decisiva da vitória; a evolução da táctica da infantaria do quadrado para as duas linhas.
São estes aspectos a investigar e a interpretar que devem constituir um programa especial de contribuição do Instituto de Estudos Superiores Militares neste ano em que se inicia o segundo centenário de evocação das Invasões Francesas.
A Revista Militar deixa aqui um desafio: Com os votos de um Bom Ano de 2008, ano em que iremos comemorar 160 anos de publicação contínua!
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* Sócio Efectivo da Revista Militar. Presidente da Direcção.