Acções desenvolvidas pelas Forças Armadas em missões de Paz no quadro da Organização das Nações Unidas (ONU).
Enquadramento
O tema abordado no presente artigo assume presentemente um significado muito especial, quando Portugal, tirando partido do capital de prestígio internacional que possui e da sua colaboração no âmbito das Nações Unidas, assumiu a sua candidatura a membro do Conselho de Segurança. Neste sentido, esta tipologia de participação assume um sentido relevante, como contributo fundamental para o sucesso desta candidatura.
Segundo Marrak Goulding, Operações de Apoio à Paz são “Operações estabelecidas pelas Nações Unidas, com o consentimento das partes interessadas, para ajudar a controlar e resolver os conflitos entre elas, sob comando e controlo da ONU, custeadas colectivamente pelos Estados membros, e integrando pessoal militar e outro, bem como equipamentos fornecidos voluntariamente por aqueles, actuando imparcialmente para com as partes e utilizando a força na mínima extensão necessária.”1
Factualmente “o final da Guerra implicou o regresso à ONU, talvez porque era a única fonte de legitimidade internacional sobrevivente para basear uma resposta aos conflitos que se multiplicavam.”2 Neste pressuposto, o Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU) solicitou ao Secretário-Geral, à época, Boutros Boutros-Gali, que fosse efectuada uma avaliação sobre o papel das Nações Unidas no novo quadro internacional que se vivia. Em 17 de Julho de 1992, Boutros-Gali apresentou o seu relatório, denominado posteriormente como Agenda para a Paz, propondo, em especial, o seguinte:
- Aumentar a capacidade da ONU para responder aos desafios do Mundo.
- Fomentar um racional de coerência na actuação da ONU.
- Completar as missões tradicionais com utilização da força militar.
- Colocar os meios das Forças Armadas à disposição do CSNU.
- Atribuir à ONU forças de reacção rápida (Unidades de Imposição de Paz).
- Fomentar a articulação e a cooperação com as organizações regionais.
Pela sua especial importância realçam-se os mecanismos de Cooperação com as Organizações Regionais assentes nos princípios da primazia da ONU, da definição clara da divisão de tarefas e na coerência de posições das partes quanto aos procedimentos. Esta cooperação desenrola-se com base em consultas, apoio diplomático, apoio operacional, instalação conjunta e operações conjuntas.
Ao longo da sua história as Operações de Apoio à Paz viveram várias fases, sendo de salientar as seguintes:
- Experimental - Entre 1948 e 1967, com a realização de missões de observação e de monitorização de acordos de cessar-fogo;
- Lançamento - Entre 1958 e 1967, quando foram lançadas as primeiras Operações de Apoio à Paz (OAP) com base em unidades militares constituídas e suportadas por uma estrutura militar organizada;
- Estagnação - Entre 1967 e 1973, quando foram interrompidas as operações deste tipo;
- Confirmação - Entre 1973 e 1988, quando foram implementadas 7 OAP;
- Expansão - após 1989, quando se verificou um aumento exponencial das OAP. A ONU assumiu por completo a legitimação, através de mandato, das operações militares de prevenção de conflitos, assumindo um crescente número de participação nas Operações de resposta a crises.
Operações de Apoio à Paz da ONU
As OAP no âmbito das Nações Unidas podem ser realizadas com pleno consentimento das partes em conflito, com um consentimento genérico dessas partes ou impostas, sem consentimento das partes. Todo este tipo de operações se baseia, em termos de legitimação, num Mandato que explicita a Missão, a Estrutura, a Organização e as Regras de Empenhamento da Força.
Surgem assim as seguintes categorias de Operações:3
- Manutenção de Paz - Actividades desenvolvidas com o consentimento das partes em conflito, sob a égide de um organismo internacional, utilizando forças militares, de polícia e civis para a contenção, moderação e fim das hostilidades.
- Imposição de Paz - Actividades desenvolvidas normalmente por forças multinacionais para restaurar a paz numa área de conflito.
- Prevenção de Conflitos - Compreende as actividades destinadas a evitar que os diferendos se agravem alargando-se ou degenerando em conflitos. Podem abranger iniciativas diplomáticas ou o empenhamento de forças.
- Restabelecimento da Paz - Acções diplomáticas conduzidas depois do inicio do conflito, com o objectivo de conseguir condições de resolução de uma maneira pacífica.
- Consolidação da Paz - Medidas levadas a cabo no seguimento da resolução de um conflito a fim de evitar o retorno das hostilidades.
- Operações Humanitárias - Actividades desenvolvidas com a finalidade de minorar os efeitos negativos dos conflitos na população.
São 63 as OAP que até à data foram efectuadas ou estão em execução no âmbito da ONU:
Na actualidade estão em curso 19 operações da Organização, sendo que só 16 são consideradas de apoio à paz, situando-se as restantes 3 no âmbito das outras operações desenvolvidas no âmbito da ONU, como sejam, entre outras: supervisão de actos eleitorais; apoio ao desenvolvimento de certos países.
Participam nas 16 operações em curso cerca de 107 500 elementos (74 076 militares, 2 397 observadores, 11 484 polícias), as quais estão orçamentadas em 7,08 biliões de dólares. Até à data, as Nações contribuintes para estas operações, sofreram cerca de 1 000 baixas.
Participação Nacional nas Missões da ONU
Conforme refere o Major-General Rodrigues Viana, em termos de legislação nacional o Conceito Estratégico de Defesa Nacional reconhece que a componente militar, Forças Armadas, é um dos instrumentos de afirmação nacional no domínio da política externa e valida a necessidade de dotar o instrumento militar das capacidades necessárias para o desempenho das novas missões no âmbito da diplomacia preventiva.
Ao longo da história recente, Portugal tem mantido uma atenção especial às mudanças no ambiente externo, nomeadamente às que têm implicações no interior do território nacional, efectuando mudanças na política externa e na defesa nacional que garantam a capacidade de resposta nacional para enfrentar as ameaças dela decorrentes.
O Executivo Português cedo considerou fundamental conjugar a actividade diplomática com o instrumento militar, de modo a garantir os melhores resultados na preservação da segurança.
Sem grande margem para dúvidas, poderemos assim afirmar que a participação de Portugal nas OAP corresponde à defesa dos interesses nacionais e ao cumprimento de obrigações para com as organizações de que fazemos parte, nomeadamente no âmbito da segurança e defesa colectiva.
Neste contexto, a participação portuguesa nas OAP decorre do interesse nacional, investimento imprescindível do país, desde que inserido na capacidade económico-financeira nacional. A relação custo - benefício tem um resultado muito positivo, sendo os efeitos conseguidos determinantes para a afirmação de Portugal no Mundo.
Assim, Portugal é hoje um país que contribui activamente para a manutenção e promoção da paz e segurança internacionais, em todos os continentes do mundo.
Num percurso cronológico da participação nacional verificamos que:
- A contribuição nacional para estas missões iniciou-se em 1958, com a participação de seis militares na UNOGIL (United Nations Observation Group in Lebanon), no Líbano.
- Quase 30 anos mais tarde, participámos na verificação do acto eleitoral na Namíbia, UNTAG (United Nations Transition Assistance Group), com 3 militares.
- A participação nacional fez-se de forma esporádica, não tendo sido constituída, à época, uma estrutura sólida e coerente para acompanhar as OAP.
- No ano lectivo de 1985/86 foi pela primeira vez introduzida nos curricula dos cursos ministrados no Instituto de Altos Estudos Militares o ensino das OAP.
- Só no início dos anos 90 a opção política de abandonar o “não intervencionismo” foi materializada, tendo sido assumida uma postura mais activa e empenhada quanto à política externa e de defesa nacional.
- Assim, Portugal aumentou de forma exponencial o seu envolvimento nas OAP, consubstanciando essa postura com opções de política interna e com a materialização da participação nacional nestas operações no Conceito Estratégico de Defesa Nacional.
Portugal surge no Ranking de países participantes em OAP em 40º lugar, sendo o 8º país europeu. Da referência à participação nacional, o quantitativo de 354 elementos inclui militares, forças de segurança e civis, forças no terreno e elementos nos Estados-Maiores e Quartéis-Generais. Inclui igualmente os elementos nacionais no Departamento de OAP na Sede da ONU. Numa primeira análise, a nossa participação poderá ser considerada como pouco significativa, no entanto, se conjugarmos esta participação com a dimensão dos países e das respectivas Forças Armadas, verificamos que o esforço que Portugal desenvolve é muito relevante e significativo. Salienta-se que países com Forças Armadas mais numerosas e com maior dimensão, como os EUA, o Reino Unido e a Rússia, contribuem menos que Portugal, em termos de efectivos.
Para as Nações Unidas, as Forças Armadas Portuguesas, além da participação nas Operações de Apoio à Paz, contribuem com tropas e equipamento para o United Nations Stand-by Arrangement System (UNSAS). Este sistema pretende que a ONU disponha de um catálogo de forças, que possa empenhar numa emergência e que possa dispor em situações mais complicadas. Este contributo é permanente, com forças prontas e disponíveis, às quais são atribuídos prazos de prontidão. Actualmente o contributo nacional contabiliza um total de 1 466 militares e 3 navios de guerra.
Em Missões cuja responsabilidade primária de organização e constituição cabe ou coube às Nações Unidas, as Forças Armadas Portuguesas já participaram e/ou participam num total de 22 Missões, em 15 Teatros de Operações. Até à data, a participação portuguesa contempla quase 8 400 militares, integrados em Unidades Navais, Terrestres e Aéreas. Das quais o Exército assegurou: dez unidades de escalão batalhão, doze unidades de escalão companhia três destacamentos; militares que integraram ou integram os estados-maiores das forças das Nações Unidas nos diversos teatros, observadores militares em Angola, Ex-Jugoslávia, Macedónia, Saara Ocidental, Timor-Leste, Croácia e Burundi; supervisores em processos eleitorais em Angola, África do Sul e Namíbia e apoio na formação de forças para o desempenho de operações de apoio à paz.
Em simultâneo, as Forças Armadas ocupam permanentemente cargos na Organização, com a colocação de oficiais no Departamento de Operações de Apoio à Paz das Nações Unidas (DPKO), em Nova Iorque. Fruto do empenhamento nacional na candidatura a membro do CSNU, Portugal tem incrementado a candidatura a cargos no DPKO.
Actualmente, 154 militares portugueses estão destacados fora do território nacional ao serviço da ONU, em 3 Continentes: Europa; África e Ásia.
Sendo a participação nas OAP no âmbito da ONU um acontecimento sinusoidal, em termos de empenhamento, encontramo-nos num período de baixo empenhamento militar fruto das limitações de recursos que se vivem na actualidade e em resultado das opções de política externa.
Em Angola, as Forças Armadas e particularmente o Exército, em 1992 e entre 1995 e 1999, inclusive, participaram com quase 1 200 militares na UNAVEM II (United Nations Angola Verification Mission); UNAVEM III e MONUA (Missão de Observadores das Nações Unidas em Angola).
Participaram na supervisão das eleições presidenciais e legislativas angolanas que se realizaram em Setembro de 1992 com o apoio da UNAVEM II. Da delegação portuguesa, constituída por 18 elementos, quatro eram oficiais do Exército.
A assinatura do Protocolo de Lusaka, em 20 de Novembro de 1994, permitiu que fossem considerados válidos os Acordos de Bicesse, assinados em Lisboa, a 31 de Maio de 1991. Consequentemente, a ONU iniciou de imediato o planeamento de uma nova operação de paz que iria iniciar-se em Fevereiro de 1995 - a UNAVEM III.
Nesta operação, Portugal participou com observadores militares, elementos para a estrutura de comando e estado-maior da força, incluindo o Chefe do Estado-Maior do QG/UNAVEM III, uma Companhia de Transmissões e uma Companhia Logística.
A Companhia de Transmissões n.º 5 (CTm 5), constituída por 101 militares, localizada em Belas (Luanda), para além de permitir o apoio do comando e controlo da força, providenciava, caso fosse necessário, apoio na exploração às comunicações triangulares ONU - Governo de Angola - UNITA. Para o efeito instalou centros de comunicações no QG da Força e nos QG regionais.
A Companhia de Logística n.º 6, constituída inicialmente por 111 e posteriormente por 205 militares, ficou aquartelada no Huambo e detinha dois destacamentos no Lobito e em Luanda (Viana). Efectuou transportes em proveito dos QG regionais da Força, conduziu operações de terminal portuárias e aeroportuárias em Viana e Lobito e foi responsável por todas as colunas de reabastecimento com saída de Viana.
Face às permanentes violações do cessar-fogo entre as partes em conflito, em Junho de 1997, data em que deveria terminar, a Missão da UNAVEM III foi dada como concluída e substituída pela MONUA, tendo como finalidade promover a reconciliação nacional e consolidar a implementação do processo de paz.
À semelhança da UNAVEM III, a MONUA compreendia militares portugueses que integraram a estrutura de comando e estado-maior da Força, incluindo o Chefe do Estado-Maior do QG/MONUA, observadores e polícias militares, um Destacamento Sanitário (DSan) composto por 63 elementos, a CTm 5, entretanto reduzida para 91 elementos, a CLog 6, igualmente reduzida (100 militares).
A missão do DSan 7, integrado na estrutura sanitária territorial, garantiu o apoio sanitário de nível 2+ aos efectivos da MONUA e aos funcionários civis da ONU. Ou seja, tinha capacidade para realizar todo o tipo de intervenções cirúrgicas de emergência, ainda que com algumas limitações; prestar cuidados intensivos e facultar internamento até 10 camas; coadjuvar na evacuação terrestre de indisponíveis entre as várias estruturas sanitárias montadas; assegurar apoio radiológico e laboratorial às situações de emergência e realizar consultas nas áreas de clínica médica, cirurgia geral, ortopedia e medicina dentária.
Em Moçambique, O Batalhão de Transmissões n.º 4 (BTm 4), do Exército, desempenhou a sua missão integrado na ONUMOZ (Operação das Nações Unidas em Moçambique), entre Maio de 1993 e Dezembro de 1994. Com um efectivo médio de 290 militares, com três Companhias de Transmissões (CTm), instaladas na Matola/Maputo (apoio ao Quartel-General da Missão e ao QG da Região Sul), na Beira (apoio ao QG da Região Centro) e em Nampula (apoio ao QG da Região Norte), assegurou a ligação entre o comandante da força, os três QG regionais e todas as forças dos diversos países que se encontravam no terreno. Militares portugueses integraram ainda o QG da Missão, perfazendo, ao todo, 463.
Em Timor-Leste, em Setembro de 1999, o Conselho de Segurança das Nações Unidas determinou a criação da INTERFET (International Force in East Timor), com a missão de restaurar a paz e a segurança no País, como consequência da situação no território se ter deteriorado após a realização da consulta popular, que votou a favor da independência.4
Face a inexistência de qualquer administração civil efectiva, para 2000, as Nações Unidas legitimam a continuação da Missão da Organização no Pais, através da UNTAET (United Nations Transitional Administration in East Timor). Esta Administração foi responsável pela administração global de Timor-Leste, incluindo poderes nas áreas legislativa, executiva e judicial, sendo constituída, entre outras, por uma componente militar denominada “Peace Keeping Force” (PKF), cuja missão passava por apoiar a manutenção de um ambiente seguro em Timor-Leste.
O Contingente Português era inicialmente constituído por cerca de 1 000 militares dos 3 Ramos das Forças Armadas. Durante algum tempo pela Fragata “Hermenegildo Capelo” da Marinha e por um Destacamento de C-130 da Força Aérea, a operar a partir de Darwin, na Austrália. O Exército, para além da chefia do Estado-maior da PKF, exercida por dois oficiais generais, entre Dezembro de 2000 a Maio de 2002, deteve o Comando de um dos Sectores (Central) e integraram ainda a UNTAET com uma Força Conjunta (Unidade Escalão Batalhão, a 3 ou 4 Companhias), com um efectivo médio de 700 homens, onde se incluía uma companhia de fuzileiros. Directamente dependente do Comando da PKF esteve ainda um Destacamento de Helicópteros Ligeiros da Força Aérea e um Destacamento de Operações Especiais do Exército. O contingente português, em termos quantitativos foi o 2º mais volumoso, logo a seguir ao australiano.
A missão da UNTAET terminou com a independência de Timor-Leste, em 20 de Maio de 2002.
Com a finalidade de apoiar a estabilização do novo país, providenciando o apoio à segurança externa e à integridade do território, por deliberação do Conselho de Segurança da ONU foi constituída uma nova missão, a UNMISET (United Nations Mission in Support of East Timor).
À data, Abril de 2002, o dispositivo da PKF já tinha sofrido diversas alterações, entre as quais a supressão dos sectores, passando o batalhão português a depender directamente do Comandante da PKF.
Durante a UNMISET (2002-2005), Portugal ainda:
- Assumiu a chefia dos observadores militares do Grupo de Observadores Militares das Nações Unidas (UNMOG), até Maio de 2004;
- Integrou militares no Grupo Militar de Ligação;
- Participou com uma equipa de operações de terminal, que integrou a célula de controlo de movimentos.
Em Maio de 2005, após ser dado por terminado o mandato da UNMISET, foi criada a UNOTIL (United Nations Office in Timor-Leste). Nesta Missão, organizada em duas componentes, uma de natureza policial e outra militar, as Forças Armadas (Exército) participaram nesta última com conselheiros para a instrução militar.
Solicitado pelas autoridades de Timor, em Agosto de 2006, o Conselho de Segurança decide constituir a UNMIT (United Nations Integrated Mission in Timor-Leste), organizada com uma componente militar de dimensão inferior à polícia civil, onde as Forças Armadas participam com observadores.
Durante oito anos, as Forças Armadas Portuguesas participaram nas Missões das Nações Unidas em Timor-Leste com meios navais, aéreos e terrestres. Deste ultimo Ramo, através da colocação de militares nos comandos e estados-maiores das forças, com observadores militares, oficiais de ligação, conselheiros e, conjuntamente com a Marinha, com oito unidades escalão batalhão.5 No total, a participação portuguesa atingiu um efectivo na ordem dos 6 000 militares.
Salienta-se que, tal como noutros teatros, também em Timor, as capacidades sobrantes de engenharia, apoio sanitário e transporte foram utilizadas em prol da melhoria da qualidade de vida das populações.
No Líbano, em 1958, e como já referido anteriormente, as Forças Armadas estiveram presentes na UNOGIL com observadores militares.
Em Agosto de 2006, o Governo Israelita e o Governo Libanês ratificaram a Resolução do Conselho de Segurança das Nações Unidas que previa reforçar a presença da Organização no Líbano, para controlo da cessação de todos os actos hostis. Assim “nasceu” a UNIFIL (United Nations Interim Force in Lebanon). Esta “Missão”, está autorizada a “tomar todas as medidas necessárias”, podendo inclusive recorrer ao uso da força, para respeitar o mandato, cabendo-lhe genericamente, entre outras tarefas: monitorizar a suspensão das hostilidades; garantir o reconhecimento aéreo da linha da fronteira entre o Líbano e Israel; verificar e relatar infracções (…).
Desde Novembro de 2006 que as Forças Armadas Portuguesas participam na Missão com militares no Estado-Maior da Força e com uma Unidade de Engenharia (até à data, 4 unidades escalão companhia, perfazendo 579 militares), com a missão de conduzir tarefas de construção em apoio das unidades da UNIFIL em toda a Área de Operações; estar preparada para apoiar a liberdade de movimentos e apoiar as Forças Armadas do Líbano, a população civil e as actividades humanitárias, de acordo com as directivas do Comandante da Força.
Sob os auspícios da ONU, as Forças Armadas, através do Exército, associaram-se ainda a outras Missões da Organização, nas quais não tendo forças constituídas, participaram com militares nas funções de observador militar, de supervisor em processos eleitorais e em apoio da formação de diversos contingentes para emprego em operações de apoio à paz.
Portugal participou com observadores militares nas seguintes operações:
- Na MINURSO (Mission des Nations Unies pour le Referendum dans le Sahara Occidental), desde 1996 até Fevereiro de 2002. Nesta Missão, Portugal deteve ainda o comando da componente militar, entre Abril de 1996 e Junho de 1997, através de dois oficiais generais do Exército.
- Na UNPROFOR (United Nations Protection Force), entre Março de 1992 e Agosto de 1996 (já na vigência da “Implementation Force” (IFOR)), integrando as equipas de observadores militares da ONU na Ex-Jugoslávia. Salienta-se ainda que durante o mandato da UNPROFOR, militares do Exército desempenharam funções na área do Serviço de Saúde (equipas médico-cirúrgicas nacionais inseridas numa unidade hospitalar das Forças Armadas Francesas; no QG da UNPROFOR, com um oficial médico do Exército desempenhado as funções de “Chief Medical Officer”).
- Na ICFY (International Conference on the Former Yugoslavia)6, ainda na Ex-Jugoslávia, um oficial do Exército desempenhou a missão de observador, fiscalizando a acção da polícia.
- Na UNMOP (United Nations Mission Observers in Prevlaka), para resolução do conflito nesta Província da Croácia, com seis observadores militares ao longo de sete anos, entre Março de 1995 e Setembro de 2001.
- Na UNPREDEP (United Nations Preventive Deployment Force), de Janeiro de 1996 a Março de 1999, com a permanência de um oficial como observador militar, com a tarefa de monitorizar e reportar quaisquer actividades junto à fronteira da antiga República Jugoslava da Macedónia.
- Na UNMIK (United Nations Interim Administration Mission in Kosovo), desde Novembro de 2004, com um oficial general do Exército Português que chefia a Missão e desde Julho de 2005, com um oficial como “Military Liasion Officer”.
- Na ONUB (Observateurs des Nations Unies au Burundi), entre Agosto de 2004 e o fim de 2005, na verificação do cessar-fogo, monitorização e observação do desarmamento, desmobilização, reintegração e acantonamento de forças rivais, na monitorização e investigação do tráfico de armas e no apoio ao processo eleitoral e na verificação de situações de violação dos direitos humanos.
Na Supervisão de processos eleitorais, os militares portugueses integraram as seguintes operações:
- Na UNTAG, entre Outubro e Novembro de 1989, com três oficiais do Exército com a missão de supervisionar as eleições na Namíbia.
- Na UNOMSA (United Nations Observer Mission In South Africa), em 1993, integrando o núcleo das Nações Unidas para preparação do processo eleitoral, após o fim do “apartheid” na África do Sul.
Verificou-se ainda a participação de militares nacionais no apoio à formação de outras forças:
- Na ONUCI (Operation des Nations Unies en Cote D’Ivoire), em 2003, para apoiar a formação das forças da “Economic Community of West African States”, que se encontravam na Costa do Marfim com a finalidade de impor a paz na região, monitorizando o acordo de tréguas estabelecido entre os rebeldes e o governo.
- Na UNMIL (United Nations Mission in Libéria), em Outubro e Novembro de 2003, um militar português fez parte de uma equipa de instrução da ONU na preparação de um Batalhão da República da Guiné-Bissau para aquela operação.
Recentemente, foi decidida a participação das Nações Unidas na Republica Central Africana e no Chade. A Resolução do Conselho de Segurança que cria a MINURCAT (United Nations Mission in the Central African Republic and Chad), onde as Forças Armadas têm desde Maio deste ano um oficial como oficial de ligação, é essencialmente, de índole policial. Ainda assim, salienta-se que a mesma Resolução autoriza a operação da União Europeia, a EUFOR/TCHAD, com a finalidade de estabilizar a situação na região, proteger as populações e permitir a distribuição da ajuda humanitária aos refugiados/deslocados. Nesta, Portugal participa com dois oficiais no Estado-Maior do QG Operacional da Operação (Mont Valérien-Paris) e já participou com um Destacamento Aéreo com uma aeronave C-130, entre Março e Maio deste ano.
Síntese Conclusiva
Sobre as características intrínsecas dos portugueses quanto ao contacto com outros povos muito havia a dizer, no entanto, neste tipo de operações, torna-se por demais evidente a nossa vocação natural para o estabelecimento de pontes entre as pessoas.
No quadro da ONU temos dado continuidade à missão que temos desempenhado ao longo da nossa história multissecular e que nos tem facultado um considerável capital de simpatia.
Sendo uma opção estratégica nacional o crescente empenhamento nas OAP, este tem permitido obter excelentes resultados quanto ao prestígio internacional e à nossa afirmação externa.
Na sequência da nossa história, Portugal tem mantido uma afirmação universalista como directriz de política externa. No quadro da nossa afirmação e tendo como referencial a candidatura nacional ao CSNU, temos mantido e mesmo incrementado a nossa participação nas OAP da ONU e na sua estrutura de Manutenção de Paz.
Como afirma o General Pinto Ramalho (CEME), “ (…) a prática do respeito pelos valores da Paz, da Solidariedade e da Segurança; a observância do Direito Internacional e a aplicação das medidas interventivas prescritas na Carta das Nações Unidas, bem como a solidariedade politico-estratégica com aqueles que vêm posta em causa a sua existência como entidades políticas autónomas, são valores para os quais a nossa decisão e prática têm que ser indiscutíveis.”7
A participação das Forças Armadas nas OAP no âmbito das Nações Unidas teve incidências organizacionais, ao nível das missões que desempenham, na estrutura das Forças, na atribuição de recursos e reequipamento, na doutrina e na Formação dos militares. Entretanto, foi criado um Centro Nacional de OAP que é responsável pela formação específica dos militares e pela reunião de lições aprendidas nas diferentes participações nacionais.
A participação em OAP é assim um meio de aumentar a capacidade de influência e a afirmação nacional no seio da Comunidade Internacional. Neste quadro, o vector militar tem servido para apoiar e materializar a política externa do Estado, tornando-se na actualidade num dos seus principais meios. Garante-se assim o prestígio, a visibilidade externa e o peso internacional de Portugal.
Segundo o General Valença Pinto, Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas, “desde a sua fundação que em Portugal a Instituição Militar tem estado intimamente ligada ao nosso percurso colectivo e à afirmação nacional nos quadros regional e global.
A qualidade insuperável do desempenho dos militares nacionais tem contribuído de uma forma ímpar para o prestígio e a afirmação de Portugal na cena internacional e para a paz, a segurança, a estabilidade e a melhoria do nível de vida das populações dos países em que essas operações se têm desenrolado.
Com um desempenho internacionalmente reconhecido, Os militares portugueses têm ombreado com os mais exigentes critérios de avaliação operacional, o que é motivo de orgulho para as Forças Armadas e para o País.
É pois da mais elementar justiça reconhecer que as Forças Armadas são um factor de sucesso, num Portugal moderno e internacionalmente competitivo.”8
Referências bibliográficas:
Participação portuguesa em OAP - Projecto de Investigação, Fundação Mário Soares (Dez06)
Segurança Colectiva - A ONU e as OAP, Victor Rodrigues Viana (Edições Cosmos e IDN - 2002)
Operações de Apoio à Paz, IAEM (Jan96)
Paz e Cooperação, Defesa Nacional (Jul05)
O Exército nos caminhos da Paz; EME; 1989-2005
Exército Português em Timor-leste 2000-2004, Exército Português (Out04)
O Exército e a cooperação militar bilateral e multilateral. Contribuições para a política externa de Estado Português. Major Infª Soares Pires; TILD CEM 2004-2006, IAEM
www.un.org (DPKO)
* O presente artigo tem por suporte conceptual o referenciado no projecto de investigação da Fundação Mário Soares (refª bibliográfica 1), no livro “Segurança Colectiva - A ONU e as Operações de Apoio à Paz” do MGen Rodrigues Viana (refª bibliográfica 2), no TILD do Maj Inf Soares Pires (refª bibliográfica 7) e no Manual de OAP do IAEM (refª bibliográfica 3). Os dados apresentados constam nas diferentes publicações do Exército (refª bibliográfica 4,5 e 6), no site do DPKO da ONU (refª bibliográfica 8) e no projecto de investigação da Fundação Mário Soares (refª bibliográfica 1).
__________
** Coronel de Infantaria, mestre em Estratégia. Desempenha funções de Assessor Militar do General Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas.
*** Tenente-Coronel de Infantaria. Desempenha funções de 2º Comandante do Regimento de Infantaria Nº 3.
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1 In Viana, MGen Victor Rodrigues; “Segurança Colectiva - A ONU e as Operações de Apoio à Paz”; Edições Cosmos, Instituto de Defesa Nacional, Lisboa 2002, pp 104.
2 In Viana, MGen Victor Rodrigues; Op. Cit.; pp. 81, citando o Professor Adriano Moreira in “Teoria das Relações Internacionais”; Almedina, Coimbra; 1996.
3 Operações de Apoio à Paz, IAEM, pp. 3-1 e 3-2.
4 Entretanto, em Junho de 1999, já tinha sido constituída a UNAMET (United Nations Assistence Mission in East Timor) destinada a preparar a referida consulta popular.
5 Unidades conjuntas do Exército e da Marinha, em média com um efectivo de 700 militares, dos quais fez parte uma companhia de Fuzileiros, com um efectivo médio de 150 militares.
6 Missão conjunta da ONU e da Comunidade Económica Europeia com o objectivo de verificar, por um período de cem dias, a veracidade das acusações de que Milosevic era alvo, designadamente de alimentar o esforço de guerra na auto proclamada República Sérvia da Bósnia-Herzegovina. Apenas estavam autorizadas a passagem de mercadorias consideradas de ajuda humanitária provenientes da “United Nations High Commissioner for Refugees”, nomeadamente artigos de vestuário, alimentação e material sanitário.
7 In Viana, MGen Victor Rodrigues; Op. Cit.; pp. 324
8 Discurso proferido por ocasião da condecoração dos Estandartes Nacionais da 1ª e 2ª Companhia de Comandos do Centro de Tropas Comando, que participaram na Força Nacional Destacada no Afeganistão. BEJA.