O Direito Internacional Público
1. Introdução
O sistema Internacional, nas últimas décadas está em constante mutação, desde a queda do muro de Berlim, passando pelos ataques terroristas de 11 de Setembro de 2001 em “New York” e de 11 de Março de 2004 em Madrid.
O direito Internacional Público, que tem por objecto o ordenamento jurídico do sistema internacional, consequentemente também está permanentemente em construção e em evolução, para fazer face às constantes mudanças do Contexto Internacional. Estas mudanças têm obrigado a que o sistema internacional se ajuste e consequentemente se procedam a alterações conceptuais necessárias e significativas.
Um dos Objectivos deste trabalho é o de mostrar como conceitos abstractos e aparentemente separados estão interligados e interagem entre si.
O outro dos objectivos deste trabalho é apresentar a Convenção de Genebra aos alunos do Curso do Centro de Medicina Aeronáutica, englobada no ordenamento jurídico internacional.
2. Evolução do Conceito de Estado - Evolução do Conceito de Soberania.
O Conceito de Estado foi inicialmente introduzido por Maquiavel tendo Hobbes e Rousseau, posteriormente, introduzido o conceito de Democracia e Locke e Montesquieu o conceito de separação de poderes e garantia de direitos individuais.
“De igual modo na ‘história do Estado’, há um primeiro momento de máxima concentração e unificação do poder, que corresponde à teorização do Estado ditatorial (neste sentido, vejam-se as concepções de autores tão diferentes como Maquiavel, Bodin, Hobbes e Rousseau); e um segundo momento em que o “Estado se sente já suficientemente “forte” para ir à procura do Homem, para estabelecer uma organização política que seja o garante da liberdade e dos direito individuais dos cidadãos, através do expediente técnico da separação dos poderes” que corresponde à teorização liberal (e que encontra a sua expressão entre outros, nas obras de Locke e Montesquieu).
O Estado liberal surge, portanto, como o resultado da conjugação desta duas visões antagónicas, destes dois “momentos da história do Estado”. Recorrendo mais uma vez à metáfora, poder-se-ia dizer que ele é fruto das contribuições teóricas dos autores que ironicamente podemos designar como os ‘quatro pais do Estado’, ou, melhor dizendo, ‘dois pais’ (Hobbes e Rousseau, que representam o elemento viril da teorização do Estado) e ‘duas mães’ (Locke e Montesquieu, que representam o elemento feminino da concepção do Estado)”1.
Os Estados foram desde a sua concepção o “actor único” do sistema internacional, tendo na última metade do século XX começado a perder essa primazia, e aos poucos a ceder terreno, para outras organizações supra nacionais que aos poucos o estão substituindo, consequentemente outros actores (supra nacionais) estão a assumir o papel que o Estado desempenhou no Contexto Internacional.
Bodin introduziu o conceito de Soberania que sinteticamente podemos definir como um Estado uma bandeira, um território e o poder de cunhar moeda.
O Conceito de Estado como actor único do Sistema Internacional a par do conceito de Soberania evoluiu, podendo os Estados Membros da União Europeia (UE) ser considerados um exemplo, um paradigma desta evolução. Na UE os Estados Membros estão constante e voluntariamente, cedendo parcelas da sua “soberania” tendo inclusive transferido para esta Organização Internacional o poder de cunhar moeda.
No tratado de Roma estabeleceu-se a Comunidade Económica do Carvão e do Aço, que deu origem à CEE comunidade de países baseada na livre circulação de pessoas e bens, em Maastricht a CEE deu origem a uma União Política designada por União Europeia (UE), e em Dublin, após ratificação por todos os Estados Membros, a UE passa a ter uma Constituição.
Alvin Toffler no livro “ Guerra e anti Guerra” desenvolve uma tese baseada na economia para explicar a evolução do mundo, iniciando-a no feudalismo, passando pelo Estado Nação, até chegar às Organizações Supra Nacionais e Globais.
A tese, baseada na necessidade de abolição das taxas aduaneiras aos produtos e consequentemente na necessidade de se abolirem fronteiras entre os territórios (desde as fronteiras dos territórios dos Senhores Feudais até às fronteiras dos Estados, preconizando mesmo que no futuro o comércio mundial venha a ser livre), é um pouco redutora pois é desenvolvida no pressuposto de que a Economia é o factor, se não único, o mais importante e determinista na evolução do Mundo.
3. Evolução do Conceito de Guerra - Definição da Guerra
Segundo Clausewitz a “Guerra é a continuação da política e da diplomacia por outros meios”. “Vemos que a Guerra não é só um acto político, como também um autêntico instrumento político, uma continuação do comércio político, um modo de levar o mesmo a cabo, mas por outros meios” 2.
Na concepção Clausewitziana, a Guerra é um conceito maniqueísta sendo definida pela ausência da Paz. Desde Clausewitz até aos nossos dias a Guerra, e consequentemente a sua conceptualização, evoluíram a par das constantes evoluções do Mundo e a par da evolução de outros conceitos que serviram de informadores a Clausewitz aquando da elaboração da sua magistral tese expressa no livro “ Da Guerra”.
As novas concepções de guerra divergem da teoria de Clausewitz, que pressupunha que a guerra tinha que ser efectuada entre Estados, e que entre estes tinha que haver uma declaração formal de guerra. É interessante, para vermos a evolução do conceito da Guerra apresentarmos a última definição que recentemente encontrámos no livro “The Law of War”.
“War is thus a struggle by armed force of certain intensity between groups of a certain size, consisting of individuals who are armed, who wear distinctive insignia and who are subjected to military discipline under responsible command” 3.
Nesta definição não se fala de Estados, nem do falhanço da diplomacia, pois as mais recentes guerras são feitas entre grupos armados e são na generalidade inter étnicas, ao invés de serem realizadas entre Estados.
4. Tipos de Guerra
A seguir vamos tentar sistematizar os mais importantes tipos de “Guerras” que tiveram lugar na História do Mundo, num sentido lato e não no sentido clássico, conforme expresso no “Espectro da Guerra” do Manual de Campanha e Operações do Exército Português.
Antes da definição do Estado - Idade Média
- Guerras de Conquista
A reconquista Cristã de Portugal, que foi feita em colaboração com os “Cruzados”, nomeadamente na Conquista de Lisboa é exemplo deste tipo de guerra.
- Guerras entre Senhores Feudais, para conquista territorial, afirmação de poder entre outros interesses.
Depois da definição de Estado
- Guerras entre Estados - Principados
“O Príncipe” obra-prima de Maquiavel, foi escrito tendo em vista ensinar ao Príncipe a arte de Governar e consequentemente de fazer a Guerra.
A Guerra entre os Estados foi durante séculos, na Europa, a predominante tendo influenciado todos os pensadores da “Guerra”. Esta Guerra entre Estados pressupunha sempre uma declaração prévia formal de Guerra.
- Guerras Mundiais. (entre a maioria dos Estados do Mundo Ocidental e do Japão).
- Guerra Fria (entre os dois blocos, NATO e Pacto de Varsóvia, sendo que todas as guerras existentes no mundo eram tutoradas por um dos blocos).
- Guerras de Libertação (“Partisans” na 2ª Guerra Mundial, e movimentos de libertação colonial na década de sessenta do século XX).
- Guerras Civis.
• Guerras Civis (americana e espanhola).
• Guerras Civis (Inter-étnicas) normalmente deflagram em outras civilizações distintas da Ocidental aonde há completa ausência do Estado.
- Guerra contra o Terrorismo
A primeira dificuldade com que as Organizações Internacionais e supra nacionais se deparam é em encontrar uma definição clara e consensual de “terrorismo”, que não seja susceptível de deixar dúvidas nem confusões. Até nem a ONU nem a NATO nem a UE, até ao actual momento, conseguiram definir terrorismo.
Na NATO existe um conceito de luta contra o terrorismo expresso no documento NATO MC 472 e um CONOPS MCM-069-03.
“There is no convenient definition of terrorism and it may be useful to attempt to define the concept for the purpose of the drawing a line between terrorism and war, a line which initially may not be too clear” 4.
Com o terrorismo deixou de haver fronteiras entre a ameaça externa e interna pois uma ameaça externa pode-se materializar num acto terrorista interno. O terrorismo selecciona criteriosamente os seus alvos que podem ser militares e não militares, com o objectivo de espalhar o pânico e o terror. Os terroristas não se pautam por princípios éticos, nem se regem por convenções.
- “Pre emptive wars”
O conceito de “Pre emptive war” que nos parece actual e abrangente é:
“A War is thus started in the belief that, because of acute danger, action provides the only safe route” 5.
Este conceito de “Pre emptive war” foi, como sabemos, experimentado no Iraque.
5. Outras Operações que não de Guerra
Intervenções de Ingerência humanitária
O conceito de Intervenção de Ingerência Humanitária foi elaborado pela ONU, quando Boutros Gali era Secretário-geral da Organização, como consequência dos inúmeros conflitos que deflagraram no Mundo após a queda do muro de Berlim. «Ces Guerres, en Afrique et en ex Yougoslavie, ont provoqué de tels crimes de guerre que le devoir d´ingérence humanitaire est né. La communauté internationale (ONU; UE; OTAN) a alors décider d´intervenir militairement non plus pour « gagner » une guerre mais pour l´ arrêter et pour protéger les populations menacées. Ces nouvelles missions entraînèrent des adaptations très importants dans l´instruction et l´entraînement des unités opérationnelles terrestres» 6.
«L’Intervention militaire au nom du droit d‘ingérence humanitaire est le seul type de conflit nouveau depuis 1945. Avec de nouvelles missions, dont celle de «conquérir» la population locale»7.
Em todas as Organizações Internacionais a que pertencemos houve que elaborar e adoptar conceitos e doutrinas estratégicas, operacionais e tácticas. No caso nacional toda a doutrina foi adaptada e elaborada pelo Instituto de Altos Estudos Militares (IAEM) tendo sido designada como “Outras operações que não de Guerra”. A Doutrina nacional foi elaborada em consonância com a Doutrina da ONU, NATO e UEO (Missões de Petersberg).
Os cenários de intervenção da UEO eram a Separação de Partes pela Força, a Prevenção de Conflitos e as Humanitarian Actions (SOF; CP; HA). Estes cenários foram adoptadas pela UE, tendo sido para fazer face a estes cenários que as Capacidades da União Europeia têm estado a ser desenvolvidos, no âmbito do Helsinki Headline Goal.
Conflitos armados - outras hostilidades
As Fronteiras entre guerras, conflitos e crises, são muito difusas sendo difícil e quem sabe inútil tentar conceptualizar.
“Ultimately, attempting to make a distinction between war and armed conflict is not really fruitful since is not a question of type but of scale and degree” 8.
6. Guerras convencionais - Conflitos assimétricos
Nas Guerras convencionais que marcaram o século XX um dos contendores estabelecia várias linhas defensivas, aproveitando o terreno, atrás do qual se defendia ou se lançava um contra-ataque, enquanto outro dos contendores lançava um ataque com o objectivo de conquistar objectivos em profundidade capazes de desarticular o sistema defensivo do outro. Neste tipo de combates as Forças em presença equivaliam-se de uma forma geral em meios tecnológicos, sendo o sucesso de um dos contendores alcançado por aquele que melhor utilizasse os princípios da Guerra.
Neste tipo de guerra dado que as munições e bombas utilizadas eram “cegas”, eram admitidos danos colaterais, podendo alguns desses reflectirem-se sobre áreas hospitalares, desde os postos de socorros a hospitais.
As intervenções dos EUA no Iraque e da NATO na ex-Jugoslávia demonstraram uma clara superioridade tecnológica dos Estados Unidos e dos Aliados, que praticamente paralisa o inimigo durante a fase do Conflito Armado. Essa superioridade/supremacia deu origem a um novo conceito definido por Conflitos Assimétricos. Nestes conflitos a maioria das munições utilizadas são de alta precisão evitando que haja danos colaterais, em hospitais e outros estabelecimentos de prestação de cuidados de saúde. « Depuis de la fin de la guerre de 1940-1945, les guerres interétatiques classiques ou encore symétriques sont devenues extrêmement rares. Une guerre entre deux puissances significatives apparaît même de plus en plus inimaginable tant les gains d´une victoire éventuelle semble de plus en plus dérisoires par rapport aux risques encourus» 9.
Qualquer Conflito Assimétrico que se desenrole no Mundo tem que ter em conta a fase pós colapso do poder estabelecido, sendo a Cooperação Civil Militar (CIMIC) essencial no início do processo de Estabilização. O restabelecimento das administrações locais, regionais e centrais é de vital importância para o sucesso de qualquer Campanha. O tratamento de civis e o restabelecimento dos serviços nos hospitais é essencial nesta fase do Conflito, podendo algumas acções de Cooperação ajudar inclusivamente no relacionamento da população civil com os militares presentes no terreno.
Os médicos militares portugueses destacados em missão ao serviço das unidades militares destacadas, têm dado consultas à população civil e inclusive já têm evacuado crianças para Portugal com o fim de serem operadas e tratadas no Hospital Militar Principal.
7. A ONU
A ONU é a Organização legitimadora de todo o Sistema Internacional e consequentemente garante do Direito Humanitário, à ONU cabe o papel central das relações internacionais é ela que é responsável e que tem que zelar pelo Primado do Direito nas Relações Internacionais.
As resoluções do Conselho de Segurança legitimam as intervenções que a Comunidade Internacional tem que realizar tendo em vista dirimir conflitos, sendo na ONU e consequentemente no Conselho de Segurança, que tem que ser centrada a estratégia de resolução dos conflitos a nível Mundial.
Na ONU existem actualmente alguns problemas, dos quais vamos referir os dois mais importantes:
- A formação do Conselho de Segurança, onde só têm assento os representantes dos países vencedores da Segunda Guerra Mundial, facto que não parece ter sentido no actual contexto internacional.
- A total ausência de Força Militar para poder efectuar operações. A ONU está sempre dependente da boa vontade de alguns Estados, e organizações multinacionais para poder realizar qualquer tipo de intervenção militar.
• Em termos de Forças a ONU só dispõe de um catálogo de Forças que os Países voluntariamente ofereceram para a Organização, de uma Brigada Designada por SHIRIBRIG, “ Multinational Stand by High Readiness Brigade for United Nations Operations” que foi estabelecida em 1996 como uma “Non–standing multinational Brigade at high readiness based on the United Nations Stand by alone”.
• A União Europeia está actualmente a desenvolver uma Capacidade designada por “Battle Group” para primariamente colocar à disposição da ONU com prioridade para África.
8. As Convenções de Genebra
Introdução
As convenções de Genebra foram adoptadas em 12 de Agosto de 1949 e os seus protocolos adicionais em 8 de Junho de 1977.
“As Convenções de Genebra de 1949”, foram aprovadas numa situação histórica bem determinada e pensadas para conflitos Internacionais semelhantes ao de 1939/1945, com grandes unidades e movimentos de invasão e ocupação militar, acompanhados de ataques a grandes objectivos estratégicos. É notória a insuficiência dos normativos constantes do Artº 3º comum (Convenções de Genebra de 1949) e do GP II, para abranger toda a tipologia dos conflitos modernos de natureza não internacional. Note-se que nalguns dos conflitos modernos e no chamado combate ao terrorismo, as Forças Armadas são usadas em missões de natureza interna”10.
“A Cruz Vermelha Internacional recebeu o mandato” “para promover e difundir os princípios humanitários constantes das Convenções e para verificar e alertar para os abusos cometidos. Difundir o conteúdo das Convenções pelos Membros das Forças armadas, através da educação e da integração na formação militar dos princípios humanitários, e tendo em conta os níveis de responsabilidade é tarefa fundamental” 11.
Muito embora as últimas convenções de Genebra tenham sido elaboradas após a segunda Guerra Mundial e os seus Protocolos adicionais em 1977, os conceitos de Guerra tenham evoluído muito desde essa data, o espírito da lei mantém-se, ou seja, as convenções foram feitas tendo em vista, proteger e salvaguardar os direitos dos Civis, dos Doentes, Feridos, Náufragos e dos Prisioneiros de Guerra, nas guerras e nos conflitos armados, devendo por isso ser sempre postos em prática, mesmo em caso de dúvida “ in dubis pro réu”. No entanto, parece-nos, que actualmente há necessidade de se adaptarem as Convenções de Genebra às novas realidades e ao novo Contexto Internacional.
As convenções de Genebra inserem-se no âmbito do Direito Humanitário e na sua essência destinam-se a estabelecer regras específicas para salvaguardar os direitos relativos a:
- Tratamento de civis
- Tratamento de feridos, doentes e náufragos
- Grupos de protecção especiais:
• Mulheres e Crianças
• Jornalistas
• Pessoal civil ligado à defesa
• Pessoal Médico
• Pessoal Religioso
• Prisioneiros de Guerra
• Detidos
Neste caso específico, vamo-nos referir exaustivamente ao tratamento dos feridos doentes e náufragos e ao Pessoal Médico como Grupo de Protecção Especial.
Tratamento dos feridos doentes e náufragos
As convenções de Genebra, “The Four So Call Red Cross Conventions” estenderam a protecção aos doentes, feridos e náufragos, e os protocolos adicionais definiram cada um destes estados, tendo em vista definir claramente quem deveria ser objecto deste tratamento especial. O Protocolo adicional estabelece que esta categoria de pessoal protegido não pode ser sujeita a mutilações, transplantes, experimentações biológicas, assim como à morte ou tortura.
A Identidade do pessoal ferido, doente ou náufrago que pertença a uma das facções beligerantes assim como de todo o pessoal que está ao abrigo da protecção especial conferida pelas Convenções de Genebra, quando detidos ou presos por uma das facções, deve ser transmitida à Cruz Vermelha Internacional. “The identity of all sick, wounded and shipwrecked, as well as of the dead, must be ascertained and relevant information transmitted to the Information Bureau of the ICRG in Geneva” 12.
Há obrigações, segundo as Convenções de Genebra, designadas como positivas de dever de procurar e recolher e tratar do pessoal combatente da facção oposta que esteja nas condições referidas.
A Doutrina Logística do Exército Português e em especial a que se refere à Evacuação Sanitária tem em linha de conta as exigências estabelecidas pela Convenção de Genebra relativas ao tratamento de feridos e doentes.
A utilização da eventual disponibilidade de Assistência Médica como forma de coacção para obter informações dum ferido é proibida, quer ao abrigo das Convenções de Genebra, quer de todo e qualquer procedimento ético e moral dos quais os elementos das Forças Armadas de qualquer país devem fazer apanágio.
Na recente Guerra do Iraque houve um oficial americano que perante um ferido adversário, utilizou a assistência médica como forma de o coagir a responder a um breve interrogatório como condição prévia para ser assistido.
Grupos de Protecção Especial
• Pessoal Médico
Os hospitais e as unidades médicas estão protegidos contra ataques não podendo ser designados como alvos.
O pessoal médico que trabalhar em hospitais e unidades médicas, incluindo os administradores hospitalares, membros das Forças Armadas a prestar serviço em unidades médicas, membros da Cruz Vermelha, outros voluntários e pessoal médico civil, estão sujeitos a protecção especial garantida pela Convenção de Genebra e seus Protocolos adicionais.
Ao pessoal médico não é aplicado o estatuto de Prisioneiro de Guerra embora possa ser mantido em Campos de Prisioneiros de guerra com o objectivo de tratar dos Prisioneiros com prioridade para os feridos e doentes das Forças Armadas do seu país.
O pessoal médico capturado no mar também deve ser respeitado e protegido podendo continuar a exercer as suas funções pelo tempo que for considerado necessário.
Todas as instalações médicas e unidades móveis de tratamento (ambulâncias e outros) também estão protegidas por esta convenção.
O Protocolo Adicional I faz uma menção muito específica às realidades e técnicas aeronáuticas:
Os Protocolos adicionais à Convenção de Genebra “ont un immense mérite: ils tiennent largement compte des exigences de la médicine et des réalités opérationnelles e techniques de l´aéronautique dans le temps ou nous vivons” 13.
O Protocolo I está relacionado com o transporte de feridos e doentes por meio aéreo, tendo em vista estabelecer o balanço entre as exigências humanitárias e o medo legítimo das partes envolvidas nos conflitos armados de qualquer sobrevoo pode ter um objectivo militar. Neste protocolo é estabelecida a necessidade de obtenção de consentimento prévio, de uma das partes em conflito, para o sobrevoo do seu território por uma aeronave que transporte feridos. O protocolo referido ainda permite que um terceiro país (neutro) efectue voos humanitários para transporte de feridos.
• Prisioneiros de Guerra
A falta de uma definição clara sobre o que é o terrorismo, e consequentemente sobre quem deve ser considerado terrorista, pode levar a que a decisão sobre a aplicação ou não do estatuto de Prisioneiros de Guerra aos combatentes presos em combate nos mais recentes teatros de Operações, fique ao “livre arbítrio” do vencedor.
Os “Talibans” presos em Guantanamo como consequência da Guerra contra o terrorismo no Afeganistão, não são considerados pela administração Bush como Presos de Guerra, mas sim como Terroristas, facto que implicou que até à data de 28 de Junho de 200414, estivessem presas cerca de duas mil pessoas sem culpa formada sem direito a defesa e sem que lhe fosse atribuída nenhuma garantia.
A Administração Bush dos EUA não aplicou também aos presos na Prisão Iraquiana de “Abu Graid” as garantias dadas nas Convenções de Genebra, sujeitando os Presos Iraquianos às mais diversas torturas e sevícias. “En un Informe, Donald Rumsfeld se declara a favor de mantener los encarcelados en posturas entresantes” 15.
9. Conclusões
Na primeira parte do trabalho pensamos ter demonstrado como os conceitos de Estado de Soberania e de Guerra, estão interligados e interagem entre si, e que estão em constante evolução e mutação.
Para alguns conceitos, nomeadamente terrorismo, crise, conflito, após várias buscas, não nos foi possível apresentar uma definição clara e objectiva, por inexistência da mesma, embora todos nós tenhamos uma percepção, do que estes termos realmente significam.
Noutros tempos menos conturbados foi mais fácil chegar-se a definições e conceitos aparentemente indiscutíveis e dogmáticos, que a diversidade e constante mutação do sistema internacional actualmente não permitem.
A apresentação da Convenção de Genebra, englobado no ordenamento jurídico internacional, constituiu o objectivo deste trabalho.
A terminar refere-se o Art 47º da Convenção de Genebra, que preconiza que se deve incluir o estudo da convenção nos programas de ensino de militares, facto que pensamos ter concretizado.
10. Bibliografia
“Da Guerra”, autor Clausewitz, Edições Livros de Bolso da Colecção Europa América nº 330.
“Em busca do acto administrativo perdido”, autor Professor Doutor Vasco Manuel Pascoal Dias Pereira da Silva, ed. do autor, Lisboa 1995.
“The Law of War,” autor Ingrid Detter, edições Cambridge University Press Second Edition.
“Direito Humanitário e Conflitos Modernos”; autor Major General Manuel António Lourenço de Campos Almeida, in Revista Militar de Janeiro de 2003.
AAVV, “La Vanguardia”, Jueves 24 Junio 2004.
AAVV, Le Soldat du 21 Siécle: un guerrier de la paix, Lieutenent General Francis Briquemont La Libre Belgique Samedi 29,Dimanche 30 et Lundi 31 Mai 2004.
AAVV, Texto Electrónico das Convenções de Genebra.
* Tenente-Coronel de Infantaria com o Curso de Estado-Maior. Actualmente colocado no Estado-Maior General das Forças Armadas, Divisão de Planeamento Estratégico.
_____________
1 SILVA, Vasco Manuel Pascoal Dias Pereira da, Em busca do acto administrativo perdido, Ed. do autor, Lisboa 1995, p. 15.
2 “Da Guerra” Clausewitz Edições Livros de Bolso da Colecção Europa-América nº 330, p.46.
3 The Law of War; autor Ingrid Detter Second Edition Cambridge University Press, p. 26.
4 The Law of War; autor Ingrid Detter Second Edition Cambridge University Press, p. 22.
5 The Law of War; autor Ingrid Detter Second Edition Cambridge University Press, p. 56.
6 AAVV, Le Soldat du 21 Siécle: un guerrier de la paix, Lieutenent General Francis Briquemont La Libre Belgique Samedi 29,Dimanche 30 et Lundi 31 Mai 2004, p. 25.
7 AAVV, Le Soldat du 21 Siécle: un guerrier de la paix, Lieutenent General Francis Briquemont La Libre Belgique Samedi 29,Dimanche 30 et Lundi 31 Mai 2004, p. 25.
8 The Law of War; autor Ingrid Detter Second Edition Cambridge University Press, p. 20.
9 AAVV, Le Soldat du 21 Siécle: un guerrier de la paix, Lieutenent General Francis Briquemont La Libre Belgique Samedi 29,Dimanche 30 et Lundi 31 Mai 2004, p. 25.
10 Direito Humanitário e Conflitos Modernos; autor Major General Manuel António Lourenço de Campos Almeida, in Revista Militar de Janeiro de 2003.
11 Direito Humanitário e Conflitos Modernos; autor Major General Manuel António Lourenço de Campos Almeida, in Revista Militar de Janeiro de 2003.
12 The Law of War; autor Ingrid Detter Second Edition Cambridge University Press, p. 322.
13 The Law of War; autor Ingrid Detter Second Edition Cambridge University Press, p. 325.
14 O Supremo Tribunal de Justiça Americano em 28 de Junho de 2004 considerou que todos os presos em Guantanamo têm direito a defesa em tribunal, contrariando a decisão da Administração Bush sobre esta matéria. Este caso prova que os EUA são um estado de direito, onde existe separação de poderes.
15 AAVV “La Vanguardia”, Jueves 24 Junio 2004, p. 3.