2010 - A Força Aérea Portuguesa durante as últimas campanhas do Império, 1954-1975
A participação da Força Aérea na Guerra de África (1961-1975)
Antecedentes políticos
Antes de entrarmos na matéria de fundo que será objecto desta apresentação proponho uma muito breve referência ao enquadramento político internacional que nos conduziu à guerra no Ultramar.
Os territórios portugueses em África foram desde o início objecto de disputas, de cobiças, de desafios internos à soberania. Os ataques mais significativos provieram das forças de expansão de outros impérios europeus, no século XIX, e que se prolongaram até ao final da 1ª Grande Guerra, e das tentativas de partilha, a mais importante das quais foi a que se fixou no Acordo de 1913 entre a Inglaterra e a Alemanha.
A corrida à África na lógica imperial europeia da última metade do século XIX, constituiu uma das mais sérias ameaças aos territórios portugueses nesse Continente, o que levou Portugal, país pequeno e periférico, a intensificar a via diplomática, que acabou por convencer Bismarck a convocar o Congresso de Berlim em 1884 - para além de resoluções pontuais de definição de fronteiras, o que o Congresso disse foi que quem quisesse exercer soberania teria que demonstrar que tinha força para isso, que era capaz de manter a autoridade. Em conclusão, as disputas entre potências europeias intensificaram-se, e muitas das campanhas ditas de pacificação enquadravam-se muito melhor na aplicação dos princípios saídos do Congresso. Quem reivindicava direitos sobre determinado território teria que demonstrar, por acções, que o actual detentor dos direitos era inábil em manter a autoridade nesse território. As Campanhas Africanas Portuguesas deste período, que vai até ao final da Grande Guerra, saldaram-se por uma vitória nacional e por momentos de glória para as forças militares portuguesas, embora com custos muito significativos. Mas antes das chamadas campanhas africanas com os meios militares de reforço, ou forças expedicionárias, não deverá ser esquecido o sacrifício de inúmeros portugueses que lutaram nos sertões africanos, em condições de muito maior dificuldade, para manter a bandeira portuguesa a flutuar.
Foi por receio da partilha ilegítima dos territórios portugueses por outras potências, entre outros factores, que Portugal entrou na Grande Guerra, donde saíu com pesadas baixas, mas do lado dos vencedores.
O último ataque, já no século XX, foi o que decorreu das ideias e dos actos relativos à descolonização, muito incentivados pela influência americana, designadamente as propostas do Presidente Wilson em princípios de 1918, e do Presidente Roosevelt em 1941 - as primeiras contidas no documento apresentado ao Congresso Americano relativo à forma de resolução da guerra (os 14 pontos de Wilson), as segundas contidas na célebre Carta do Atlântico.
O ponto quinto de Wilson, ambíguo e generalista, mas de grande eficácia pela forma como foi aproveitado, continha o seguinte:
“A free, open-minded, and absolutely impartial adjustment of all colonial claims, based upon a strict observance of the principle that in determining all such questions of sovereignty the interests of the populations concerned must have equal weight with the equitable claims of the government whose title is to be determined”.
O ponto quinto da Carta do Atlântico era muito mais simplificado:
“All peoples had a right to self-determination”.
Tanto uma como outra destas proposições foi muito contestada na Europa.
As corridas africanas da segunda metade do século XIX não trouxeram só desgraças ou exploração de recursos. Por força da presença europeia, a urbanização foi tendo alguma expressão, a industrialização teve um andamento incipiente, foi-se criando uma pequena burguesia comercial e uma pequena elite intelectual; o ensino foi sendo ministrado a uma pequena parte da população, em especial atravès das missões, alguns africanos começaram a frequentar as universidades europeias e americanas. Daqui resultou que os valores ocidentais foram sendo assimilados, tendo começado a surgir, em núcleos muito restritos, um conceito de Nação Africana, para além da ideia de etnia. E neste contexto, as ideias de libertação nacional, de associação do Estado à Nação, criadas e desenvolvidas no Ocidente, para terem aplicação na Europa, começaram timidamente a serem transpostas para África, por via dos africanos que estudavam no Ocidente e também por via daqueles que tinham sido chamados a servir nas forças militares europeias durante as guerras mundiais.
Desde o final da Segunda Guerra que começaram a surgir movimentos de intelectuais e declarações de políticos propondo a saída dos europeus do Continente Africano, de se proceder à descolonização, com base nos princípios da igualdade racial, do auto governo dos povos e da democracia.
No final da guerra as potências ocidentais perderam poder ao ponto de serem incapazes de sustentar a totalidade dos seus impérios. E foi fundamentalmente esta razão que levou a uma ausência do centro do império, que permitia a agitação dos movimentos emancipalistas e a criação de instabilidade nos territórios, que levou à independência da Índia, em 1947, momento determinante do início da corrida da descolonização.
A Conferência de Bandung em 1955, entre a Ásia e os cinco países africanos, foi outro evento que despertou os movimentos africanos, na sequência da ideia de pan-africanismo nascida nos Estados Unidos da América logo em 1945.
As grandes potências europeias, face ao alastramento destas ideias e na avaliação dos seus factores de poder, criaram a percepção de que os custos resultantes da administração dos territórios e da resolução dos conflitos que neles nasciam, superavam os benefícios económicos e estratégicos, e convenceram-se que seria possível continuar a manter essas vantagens num quadro de influência pós-independência. Nesta visão, a independência seria apenas um pró-forma.
É neste contexto que em 1960 se criaram 20 estados africanos, imediatamente aceites na Organização das Nações Unidas. Esta Organização, muito influenciada pelas posições destes novos estados, apelava às potências administrantes dos chamados territórios dependentes para promoverem o desenvolvimento das populações indígenas, e para estabelecerem as formas apropriadas de auto governo. Muito ràpidamente evoluiu para um apelo à independência - isto é, a Assembleia Geral criou a convicção de que a promoção e desenvolvimento dos povos só poderia ter lugar através da independência política, primeiro a independência depois o desenvolvimento.
Portugal, assim como outros países ocidentais, tinha uma posição diferente.
Em primeiro lugar reivindicava um direito histórico de posse, à semelhança do que tinha feito em relação a outras potências europeias durante a corrida imperial do século XIX.
Em segundo lugar, Portugal invocava o facto de existir muito sangue português derramado em África e por África, como foi o caso das campanhas de pacificação e de luta contra outros ocupantes europeus, assim como o caso do desastre da Grande Guerra.
Em terceiro lugar, Portugal considerava que o espírito que tinha presidido à presença portuguesa em África não se compaginava com os motivos que levaram outras potências a ocupação muito mais recente, insuficiente para um encontro civilizacional mais profundo.
Em quarto lugar Portugal não partilhava as ideias daqueles que entendiam que os custos da manutenção deveriam ser o factor determinante para o abandono, e entendia que deveria assumir a responsabilidade da promoção dos povos no quadro da soberania política existente.
Em quinto lugar, Portugal defendia que os territórios, embora não sendo contíguos à Metrópole faziam parte integrante do território nacional, de acordo com a Constituição da República, e que tinha como desígnio político a manutenção de um território pluricontinental e de uma sociedade multiracial, o que constituia objecto do seu conceito estratégico. Portugal nunca afirmou nas Nações Unidas que tinha colónias, e como tal considerava-se isento de responder aos quesitos postos pela Organização.
Por último havia uma razão pragmática: Portugal entendia que a uma hipotética declaração de independência se seguiria o caos, e que nesta circunstância deveria ser responsável pela segurança das pessoas que residiam nos territórios e aí tinham as suas vidas legitimamente organizadas. O que se passara no vizinho Congo constituia então um exemplo que ilustrava claramente esta posição.
Esta divergência de pontos de vista conduziu a um certo isolamento internacional do regime português, atenuado no entanto pela continuidade das relações normais com alguns paises europeus, e pelo enorme esforço da diplomacia.
Na Assembleia das Nações Unidas Portugal era sistematicamente atacado, num cenário penalizante de guerra de informação; no Conselho de Segurança as coisas não se passavam da mesma forma, apesar da hostilidade americana contra a posição portuguesa no tempo da Administração Kennedy.
Apesar de não se considerar abrangido por esta onda internacional, é evidente que o regime português não se poderia declarar imune a ele. O sistema internacional tinha mudado substancialmente, em virtude do aumento brusco do número de actores e do contexto de guerra fria cada vez mais intenso, e com esta mudança as dificuldades para Portugal deveriam aumentar.
Era um facto conhecido que se iam criando nos territórios portugueses, e no seu exterior, de forma um tanto incipiente, movimentos orientados para a independência desses territórios. Estes movimentos, apoiados e incentivados por uma grande parte da comunidade internacional, passaram a receber também apoio material, em particular armamento, e a desenvolver capacidade militar significativa.
O primeiro movimento criado no Congo para reivindicar a indepência de Angola, tinha o apoio específico dos Estados Unidos da América. Por outro lado, a União Soviética tinha respondido ao apelo de Bandung e apoiava, por princípio, todos os movimentos africanos. Os outros movimentos que se criaram em Angola, e também na Guiné e em Moçambique tinham um apoio muito substancial de uma grande parte das grandes potências, em particular da União Soviética e da República Popular da China.
Perante estes factos, a situação passou a ser tensa nos territórios portugueses, em particular logo a seguir aos acontecimentos no Congo, que envolveu também muitas vítimas portuguesas e obrigou à execução de uma ponte aérea para a sua recuperação para Luanda. A soberania portuguesa passou a ser desafiada com armas na mão, e o confronto militar era inevitável. A decisão política foi no sentido inequívoco de se enfrentar este desafio, e as Forças Armadas assumiram essa missão.
Como é evidente, a política ultramarina teria que ser coerente com os princípios defendidos por Portugal nos aerópagos internacionais e as Forças Armadas deveriam ser preparadas para enfrentar os desafios que se perfilavam no prosseguimento da política definida nas instâncias próprias.
Perante estes factos, a situação passou a ser tensa nos territórios portugueses, a soberania portuguesa passou a ser desafiada com armas na mão, e o confronto militar era inevitável. A decisão política foi no sentido inequívoco de se enfrentar este desafio, e as Forças Armadas assumiram essa missão.
A preparação para a guerra
Importava, fundamentalmente, intensificar a presença militar. No âmbito aeronáutico essa presença era diminuta, por razões da dimensão do Poder Aéreo Nacional na altura.
Na grande reestruturação da Aeronáutica Militar em 1956, onde se passa do conceito de forças aéreas para o conceito de Força Aérea, uma das áreas contempladas dizia respeito à extensão orgânica relativa ao espaço aéreo ultramarino.
Por força destes diplomas legais, foram criadas as Regiões Aéreas, uma abrangendo o território continental, os Arquipélagos dos Açores, da Madeira, de Cabo Verde, e a Guiné; outra que incluia Angola e S. Tomé e Príncipe e outra com sede em Moçambique que incluía, além deste território, os territórios portugueses da Índia, Macau e Timor. Em cada uma destas Regiões estava prevista a constituição de Bases Aéreas, e outras classes de aeródromos, no sentido de garantir uma cobertura total do Império Português, em termos de jurisdição aérea. Levou ainda algum tempo para que os comandos se organizassem e para que os meios fossem destacados para essas remotas paragens; contudo, estavam criadas as condições legais para uma implementação rápida face ao evoluir da situação.
Em 1957 o Subsecretário de Estado da Aeronáutica faz publicar uma Directiva para lançamento das infra-estruturas necessárias às operações aéreas nos territórios ultramarinos portugueses, tanto na previsão da operação local como para apoio das aeronaves em trânsito na sua deslocação inter-teatros.
Em 1958 é efectuada uma visita de inspecção para avaliação da situação por uma equipa chefiada pelo Chefe do Estado-Maior da Força Aérea, e no ano seguinte tem lugar o célebre Exercício Himba.
O exercício HIMBA consistiu numa operação de transporte aéreo militar para verificar rotas e infra-estruturas, escalas possíveis para o trânsito e operação, e numa demonstração de soberania, de presença militar portuguesa em África; foram envolvidos 14 aviões, designadamente 6 Skymaster, 2 C-47 Dakota, e 6 PV-2 Harpoon que voaram da Metrópole até Angola, utilizando aeródromos de escala, ao longo da rota oceânica. Em Angola, sobrevoaram Carmona, Santo António do Zaire, Cabinda, Malange, Henrique de Carvalho e Lobito; foi realizado um grande festival aéreo em Luanda com desfile aéreo e terrestre, lançamento de tropas pára-quedistas, e exercício de tiro ar-solo real, com a assistência de uma multidão entusiasta e orgulhosa da sua Força Aérea. Outros desfiles se realizaram em Sá da Bandeira e Nova Lisboa. Esta acção teve uma importância fundamental do ponto de vista psicológico, junto da população, para além do teste operacional a que se propunha. O exercício deixou no entanto uma marca negativa: um dos C-47 despenhou-se à saída de Lisboa, na foz do Tejo, tendo falecido os 5 tripulantes e os 6 oficiais que nele seguiam em serviço, constituindo as primeiras baixas da Força Aérea nestas novas campanhas africanas - as causas do acidente nunca foram determinadas, estando totalmente fora de hipótese qualquer acção intencional provinda do exterior.
A Força Aérea construiu em Angola quinze pistas principais, em Moçambique catorze, na Guiné cinco, para além de grandes ampliações e melhorias nas existentes naquela data e que eram em número reduzido.
Para além da estrutura orgânica e da construção das infra-estruturas mínimas que permitiriam a dotação subsequente dos meios, haveria que estudar ou avaliar que tipo de guerra se iria enfrentar e qual deveria ser o sistema de forças aéreas mais adequado, dentro das limitações existentes a vários níveis.
Foi assumido que se iria operar num cenário de supremacia aérea, pelo que não foi considerada a questão da defesa aérea e do combate aéreo. Não foi inicialmente considerada a possibilidade de utilização de armas anti-aéreas pelo inimigo, previsão que não veio a materializar-se, pois é sabido que nos três teatros o inimigo desenvolveu uma capacidade significativa nesta área, como iremos referir.
Em todo o caso, foram ainda instalados alguns radares de campanha, na Guiné e em Angola, para vigilância meteorológica e para apoio de tráfego, mas relativamente obsoletos e com baixa prontidão. Existiam ainda radares de artilharia que no caso da Guiné faziam a vigilância do espaço aéreo e transmitiam a informação para o centro de operações aéreas.
Um outro princípio adoptado foi de que se tratava de uma questão interna, não se prevendo operações fora do território nacional, nem meios especificamente adequados a esse tipo de missão.
À partida esteve fora de questão a aquisição de meios altamente sofisticados, devido principalmente às restrições de natureza económica, embora a natureza dos meios não tivesse sido muito diferente da utilizada por outros países ricos em experiências do mesmo tipo.
O sistema de forças planeado no inicio da década de cinquenta no âmbito da ajuda mútua, aprovado pelo Ministro da Defesa, não seria de considerar, justamente porque a ajuda para este efeito não seria possível, por razões políticas. Aliàs, esse plano foi abandonado ou reorientado para as necessidades de missão em África.
Por outro lado, foi reconhecido que seria necessária uma força de dissuasão credível, com a dimensão apropriada: foi este princípio que levou ao destacamento de aviões de combate, como foi o caso do avião F-84G para Angola, e posteriormente para Moçambique, do avião F-86F para a Guiné, entretanto regressado por imposição americana e substituido pelo avião FIAT G-91, também destacado para Moçambique, e de aviões de patrulhamento marítimo, como foi o caso do avião P2V5 para Angola e Guiné e do avião PV2 para Angola e posteriormente para Moçambique. Uma componente muito importante neste cenário estratégico era a componente de transporte, não só da ligação da Metrópole com os teatros ultramarinos, mas também da ligação dentro de cada teatro - de início a frota existente de C-54 e DC-6 satisfazia as necessidades para a ligação inter teatros (os C-54 estavam ao serviço desde 1947, fornecidos ao abrigo da ajuda mútua, e que atingiram um total de 16 aeronaves colocados na Base Aérea nº 4 nos Açores; os DC-6 foram adquiridos à PANAM em 1961 num total de 10, tendo ficado baseados em Lisboa; tanto os C-54 como os DC-6 viriam a ser abatidos em 1978); depois esta capacidade foi acrescida com a aquisição de 2 Boeing 707 em 1969 (alienados em 1976) que tiveram uma exploração exemplar reconhecida a nível internacional; para as ligações intrateatro e para o transporte médio foram utilizados os aviões Dakota existentes no inventário e foram adquiridos aviões NordAtlas a França.
O avião convencional de ataque e de apoio de fogo que teve maior aplicação em todos os teatros foi o avião T-6 armado, adquirido a França, a partir da Argélia, e à Alemanha. Para o transporte ligeiro e posto de comando volante foi inicialmente utilizado o avião AUSTER, fabricado em Portugal, nas OGMA, e posteriormente o DO-27 adquirido na Alemanha. Já na fase final da guerra entraram ao serviço aviões B-26 em Angola. Outros tipos de meios aéreos foram ainda utilizados sem expressão significativa. O meio aéreo mais utilizado e com maiores sucessos em termos de apoio às operações terrestres foi o helicópetro, em especial o Allouette III (O Allouette 2 teve uma exploração operacional pouco significativa, e o SA330 só tardiamente foi adquirido).
Na fase final da guerra foram adquiridos 32 aviões Cesna FTB 337, SuperSkymaster, na versão armada, mas os aviões só foram recebidos em Dezembro de 1974. Foram igualmente adquiridos nesse período 24 AVIOCAR CASA 212 para transporte médio e também recebidos já depois da guerra em finais de 1974, princípios de 1975.
Não existia, antes do início da guerra, doutrina aérea específica para este tipo de operações, aplicando-se a doutrina aérea geral em vigor, que foi sendo sucessivamente aditada com especificações próprias do emprego do poder aéreo nos vários contextos, através de normas de execução permanente promulgadas em cada Teatro, e que, curiosamente, foram convergindo para uma certa uniformidade.
A fonte inicial de recolha de experiências foi a Força Aérea Francesa, em particular os ensinamentos colhidos na guerra da Argélia e também na Indochina. Pierre Closterman foi convidado a vir a Portugal em 1960 tendo tido vários contactos e proferido uma conferência na Academia Militar sobre o emprego do Poder Aéreo em guerra subversiva. A experiência britânica, em particular o conflito na Malásia, considerado como um caso de sucesso das forças clássicas em guerra de guerrilha, foi igualmente estudada e tida em consideração. A fonte tradicional, a Força Aérea Americana, não dispunha à altura nem de experiência específica sobre guerra subversiva nem de doutrina particular sobre esta matéria, como é sabido.
A primeira acção de subvelação teve lugar em Angola, na Baixa do Cassange em Janeiro de 1961. Tratou-se de uma acção tumultuosa, de afrontamento às autoridades civis e militares, de ameaças à integridade de pessoas e bens. Esta acção foi neutralizada por uma força militar, a 4ª Companhia, e pelos meios aéreos, designadamente aviões Auster e PV2, em cerca de duas semanas.
Em Fevereiro dá-se um ataque concertado a vários pontos em Luanda, entre os quais as tentativas de assalto às prisões, à emissora de rádio, ao comando da polícia móvel, o assassínio de polícias, e a partir de 15 de Março dá-se o genocídio em várias sanzalas do Nordeste angolano, onde perderam a vida cerca de sete mil pessoas, sendo mil de origem europeia.
Se dúvidas existissem quanto à intervenção militar nos territórios ultramarinos, este facto hediondo não deixou margem para a passividade ou para a negociação pacífica. É assim que começam as operações militares que iriam durar até 1975. Com estes actos, toda a hipotéctica negociação pelo diálogo tornou-se cada vez mais longínqua.
A estratégia militar orientou-se segundo as seguintes vertentes: destruir a capacidade militar inimiga, isolar o inimigo das populações aliciando-as para a causa portuguesa, penalizar ou desestabilizar aquelas que apoiavam o inimigo, criar condições para o desenvolvimento económico, social e político.
As operações aéreas em Angola
Por altura dos acontecimentos na Baixa do Cassange, o único aeródromo militar em Angola era o de Luanda, a Base Aérea nº 9. Os meios aéreos aí estacionados eram 11 PV2, 7 aviões de transporte NORDATLAS, 4 aviões ligeiros DO-27, 4 BROUSSARD e alguns T-6G (destinados ao AB3, como adiante veremos). Nesse mês de Janeiro de 1961, os aviões PV2 fizeram 38 missões operacionais, e idêntico número em Fevereiro, repartidas por acções de ataque independente, ataque em apoio próximo de forças terrestres e de populações, reconhecimento aéreo e evacuação sanitária. Naturalmente, a área de operações era a Baixa do Cassange. Os NORDATLAS efectuaram 19 missões em Janeiro e 34 missões em Fevereiro, em transporte de pessoal e de carga.
No final do ano de 1960 tinham sido destacados para Carmona, 4 aviões ligeiros Auster, utilizados em acções de reconhecimento visual, posto de controlo volante, transporte de carga, evacuação sanitária, aterrando em pistas improvisadas. Durante os acontecimentos na baixa do Cassange estas 4 aeronaves voaram cerca de 200 horas de voo, o que significa que a zona foi sobrevoada durante quase todo o período diurno, detectando movimentos de grupos sublevados, orientando as forças no terreno de forma muito primária, dada a inexistência de comunicações ar/terra, fornecendo víveres, munições às forças e aos elementos civis sitiados, fazendo as ligações possíveis. Em 6 de Fevereiro duas destas aeronaves são destacadas para Malange em realização do mesmo tipo de actividade aérea.
Desde meados de 1960 que vinha sendo construido o aeródromo do Negage, situado a cerca de 150 milhas a Nordeste de Luanda. Em 7 de Fevereiro de 1961 tem aqui lugar a primeira aterragem de um Auster e de um NORD, embora as instalações do aeródromo, particularmente o quartel, só tivessem ficado concluidas em Setembro desse ano. Este aeródromo militar, já legalmente constituido do anterior, tinha recebido a designação de AB3.
Como já referimos, em 15 de Março de 1961 tem início uma ofensiva brutal, por parte de vagas humanas armadas de catanas e canhangulos, contra povoações e fazendas de agricultores, nos distritos do Zaire, Uige e Cuanza Norte, em especial Quibaxe, Vista Alegre, Aldeia Viçosa, Quitexe, Quicabo, Nova Caipemba, Nambuangongo, Zalala, Quibala, Bessa Monteiro, Madimba, Canda, M’bridge, Buela e outras. Os rebeldes mataram milhares de pessoas, todas civis, incluindo mais de um milhar de brancos. Muitos destes locais foram ocupados pelos atacantes, com fuga da população residente. Noutros locais a população conseguiu resistir e ficar, constituindo autênticos redutos permanentemente ameaçados, sem possibilidade de fuga e tentando sobreviver. Esta acção criou pânico em toda a região, o que originou um êxodo quase completo dos residentes, mesmo daqueles que ainda não tinham sido ameaçados.
Aviões ligeiros, civis e militares, procederam ao transporte das pessoas apavoradas em fuga, concentrando-as no aeródromo do Negage, donde se procedeu a uma ponte aérea para Luanda de cerca de 3.500 pessoas, essencialmente com aviões NordAtlas.
Em 16 de Março chega a Luanda, via aérea, a primeira companhia de pára-quedistas. O dispositivo terrestre é reforçado com forças provindas da Metrópole e são lançadas operações de grande envergadura nas zonas afectadas.
Nestas operações de cerco e recuperação de posições, como foi o caso da operação Pedra Verde, da operação de assalto a Nambuangongo, e das operações na serra da Canda e em Sacandica participaram as unidades aéreas da Base Aérea nº 9 em Luanda, e do Aeródromo Base nº 3 no Negage.
A Esquadra de PV2 (ESQ 91) efectuou 56 missões operacionais em Março e 88 em Abril, com uma média mensal de 60 horas de voo por piloto atribuído. A Esquadra de NORD (ESQ 92) executou 92 missões em Março e 103 missões em Abril, com uma média mensal de 45 horas por piloto atribuido.
Este esforço de voo iria aumentar num crescendo até Novembro de 1961 - os PV2 voaram cerca de 3.000 horas nesse ano, e o número mensal de missões foi-se aproximando da centena (em Julho); os NORD voaram no mesmo período 2.600 horas (até ao final do ano transportaram cerca de 29.000 passageiros e cerca de três mil e quinhentas toneladas de carga).
Na última quinzena de Março chegaram ao aeródromo do Negage, voando de Luanda, 4 aviões T-6G armados, que já dispunham de equipamento rádio para o contacto com as forças de superfície, em frequência modulada.
Estes números foram aumentando progressivamente e no final do ano já se encontravam neste aeródomo base 15 T-6G e 9 DO-27. No mês de Março os aviões T-6 executaram 22 missões operacionais, 72 em Abril e 103 em Maio (valor mais elevado do ano) sendo a maior parte em acções de reconhecimento armado. Foram executadas 11 acções de apoio aéreo próximo em Abril e 25 em Maio. Os aviões DO-27, que em Abril e Maio eram apenas 4, efectuaram 96 missões em Abril e 161 em Maio, com uma média de cerca de 50 horas/piloto atribuido/mês; em Abril os pilotos de DO-27 eram 13, em Julho 18 e em Novembro 22. A frota de T-6G efectuou até final do ano de 1961, 1.867 horas de voo, e a frota de DO 27 efectuou 3.254 horas de voo no total desse ano. Todos os pilotos colocados no Aeródromo Base estavam qualificados em mais do que uma aeronave, para suportar este esforço de voo a que a Unidade era solicitada, em situação de emergência. Estes números dão-nos uma ideia do progresso da dotação de meios neste Aeródromo Base; naturalmente que, ao mesmo tempo que estes meios aéreos e respectivo pessoal de operação e manutenção iam chegando à Unidade, iam-se estabelecendo os fluxos logísticos necessários à sua sustentação.
Em Agosto de 1961 entram em cena dois outros tipos de meios aéreos: o F-84G integrado na ESQUADRA 93 e o helicóptero AL II na Esquadrilha de Transporte e Reconhecimento, constituindo-se depois a ESQUADRA 94, ambas da Base Aérea nº 9.
O avião F-84G, cedido ao abrigo da ajuda mútua, que tinha sido abatido ao inventário da Força Aérea Portuguesa, na Metrópole, em 1961, iria ser aproveitado para missões de reconhecimento na fronteira Norte, para intercepção de eventuais reabastecimentos das forças rebeldes, e detecção de corredores de infiltração, para missões de interdição ou ataque independente, para apoio de fogo às forças de superfíficie. Para além das metralhadoras de .50 polegadas, internas, dispunha de estações externas onde poderiam ser suspensos diversos tipos de armamento, como foguetes de 2.75 e de 5 polegadas, bombas de 50 e de 200 quilos e de 250, 500 e 750 libras. No final de Agosto já estavam prontos 5 aviões (transportados via marítima de Lisboa, com montagem em Luanda), com 7 pilotos atribuidos que executaram no total 44 acções nesse mês; no mês seguinte este valor passou para 139 acções, sendo 66 de apoio próximo, 14 de reconhecimento, 8 de patrulhamento da fronteira Norte, 29 de ataque independente e 22 de outra natureza, como por exemplo, voos de teste, de demonstração, de treino ou de presença.A partir de Outubro ficaram prontos 11 aviões. De sublinhar que a taxa de prontidão da frota foi de 80% em Agosto, 77% em Setembro, 66% em Outubro, 82% em Novembro e 90% em Dezembro de 1961, números que impressionam para uma frota previamente “extinta” por ter atingido o fim do seu ciclo normal de vida.
Fundamentalmente, a ESQUADRA 93 constituia-se como elemento dissuasor importante, não só no plano interno como no plano internacional, para além da acção directa relevante, dado o seu poder de fogo. Quando estalou a guerra em Angola surgiu a notícia de que estariam disponíveis para oferecerem os seus serviços à guerrilha, aviadores estrangeiros que, com pequenas aeronaves poderiam atacar objectivos de grande importância, escapando-se incólumes para santuários próximos, em países vizinhos - como não existiam meios de defesa aérea, designadamente meios de cobertura radar e interceptores, e como tais aviões não necessitariam de grandes infraestruturas para operar, poderiam constituir-se como armas poderosas, em especial contra o Poder Aéreo. Esta notícia não se veio a confirmar em Angola, mas o avião F-84 poderia ter sido o meio mais adequado para se opôr, em certa medida, a esta ameaça.
Uma das primeiras preocupações da Força Aérea foi a de estabelecer um plano de comunicações. Estabeleceu-se um serviço fixo em grafia, SSB, que ligava o Comando da Região Aérea com NEGAGE, MAQUELA, CABINDA e TOTO, e um serviço móvel de Aeronáutica em HF que ligava os postos acima referidos com algumas aeronaves que dispunham deste tipo de receptores; nos aeródromos foram montadas as torres de controlo a operar na banda do VHF. Todas as aeronaves, à excepção do F-84, do NORD e do C-54, foram equipadas com VHF/FM para contacto com as forças de superfície. As únicas ajudas rádio à navegação eram radio faróis instalados nas bases principais. Foi instalado um radar em Negage, relativamente obsoleto.
A actividade aérea neste período continuou no ritmo já referido, não só na participação nestas operações mas também em acções de presença e de apoio logístico a militares e civis noutras áreas de Angola. Fora das zonas onde ainda não existia presença de forças militares portuguesas, a Força Aérea actuava de forma independente, sem necessidade de coordenar a sua acção, dentro da estratégia definida a nível superior, quer através do reconhecimento e patrulhamento, quer por acções de ataque quando os objectivos se consideravam importantes.
A declaração de estabilidade em finais de Setembro de 1961 não significou obviamente o fim das operações militares. O regime político classificou a partir de então as operações como operações de polícia, por razões de estratégia política internacional, mas na realidade elas foram operações de guerra, na forma de guerrilha. Como se referiu, só o Norte da Província foi atingido por esta onda de violência, que era dirigida a partir do Congo.
A diferença fundamental na situação militar foi na forma de actuação das forças rebeldes: na primeira fase, entre Março e Setembro, traduziu-se por massacres de civis, com armas brancas e canhangulos, em que as forças rebeldes se movimentavam em terreno descoberto contra as populações e forças militares, em grandes massas humanas fanatizadas. Era relativamente fácil detectar as movimentações destas hordas pelo reconhecimento aéreo, ou detectar sinais suspeitos de ataque iminente, assim como era possível conter o seu avanço com acções aéreas de fogo, intimidatórias. Na fase que se seguiu o inimigo dissimula-se na mata e actua por emboscada às colunas militares, por acções de flagelação contra os quartéis, sendo muito mais difícil a sua detecção; as forças inimigas em presença passam a ter um carácter militar, com preparação política e técnica, e começam a utilizar armamento terrestre mais sofisticado - em vez das catanas e canhangulos, passsaram a ter armas automáticas, minas e morteiros, deixando de atacar as populações para atacarem as nossas forças, segundo a técnica do bate e foge, infiltrando-se na mata, difícil de penetrar pelas forças militares convencionais. Contudo, têm outro tipo de dificuldades: a aderência da população, muito alheada da motivação ideológica ou política, que na sua maioria quer paz, e a necessidade de se reabastecerem do outro lado da fronteira criando corredores de infiltração com um mínimo de pontos fixos ou rotas determinadas indispensáveis, mas detectáveis.
Conforme se referiu, as acções aéreas eram muito orientadas para o reconhecimento visual, para o reconhecimento armado, para o ataque contra pequenos alvos muito bem localizados e acerca dos quais se dispunha de informação quanto à existência de guerrilheiros, para o apoio fogo directo às forças terrestres, para além das acções de apoio logístico em benefício das forças militares e de civis. De realçar as missões de assalto com helicópteros, a partir da chegada dos ALIII, e tropas especiais, com apoio de fogo dado pelo T-6, pelo PV2, pelo F-84, e pelo helicanhão (tiro lateral com canhão de 20 mm). A acção de pistagem foi também executada com helicópteros e pára-quedistas, que consistia na descoberta e seguimento de trilhos ao longo das infiltrantes do Norte, e que conduzia à detecção, aprisionamento ou ataque de grupos guerrilheiros em acções de reabastecimento.
Em Angola existiu apenas uma base aérea, a B.A. nº 9, durante todo o período da guerra até 1975. Existiam dois aeródromos-base, um em Negage, o AB nº 3, constituido logo em 1961, como vimos, outro em Henrique de Carvalho, o AB nº 4, guarnecido mais tarde. Foi legalmente constituído um terceiro, o AB 10 em Serpa Pinto, mas que nunca teve actividade significativa. Para além destas infraestruturas principais existiam ainda aeródromos de manobra (AM) e aeródromos de recurso. Dependente da BA 9 existia o AM 95 em Cabinda; do AB 3 dependiam os AM 31 em Maquela do Zombo, AM 32 no Toto, AM 33 em Malange; do AB 4 dependiam o AM 41 em Portugália, o AM 42 no Camaxilo, o AM 43 no Cazombo e o AM 44 no Luso. Os aeródromos de recurso eram os da N, Riquinha, do Cuito do Canavale, de Gago Coutinho, Cacolo e Teixeira de Sousa, entre outros.
A partir dos tempos tumultuosos do ano de 1961, as operações militares em Angola entraram numa fase de rotina, na Zona de Intervenção Norte, no sentido em que assumiram uma caracterização própria da guerrilha, com controlo do território por parte das nossas forças.
Surgiram entretanto outros movimentos, o MPLA e a UNITA, e o movimento inicial UPA evoluiu para FNLA. Por razões de natureza política, as forças destes movimentos deslocaram-se para leste, cerca de cinco anos depois das operações iniciais no Norte, o que forçou à criação da Zona de Intervenção Leste (ZIL) que abrangia os distritos da Lunda e do Moxico. A partir de 1966 as forças portuguesas passaram a confrontar os três movimentos nesta ZIL, o que obrigou a um redirecionamento do esforço. O AB 4 foi reforçado com 6 PV2, dos quais 2 estavam destacados em permanência no Luso, e em 1968 já dispõe de 1 avião Bechcraft 45, de 11 T-6G e 11 DO27 que voavam cerca de 300 horas por mês, no total.
A frota de helicópetros Allouette III, que havia chegado em 1963, atingiu em 1972 o seu valor máximo de 29 unidades que efectuavam cerca de 4.500 horas de voo por ano, sempre organicamente atribuida à BA9, mas com destacamentos por várias bases do teatro de operações, em acções de transporte de assalto, de apoio de fogo e de evacuação sanitária.
Em 1970 chegam ao teatro de operações 5 helicópteros SA-330, PUMA, integrados na ESQUADRA 94 mas a operar no Leste; no ano seguinte a frota é reforçada com mais 1 helicópetro deste tipo. Até fins de 1973 efectuaram em média cerca de 1.200 horas de voo por ano. Estes helicópetros estiveram destacados em Moçambique, no AB 7, num total de 3 em 1973 e de 5 em 1974.
Entre 1963 e 1966 esteve destacado na BA 9 para patrulhamento, um avião P2V5 que efectuou 1.064 horas de voo em 508 missões no primeiro ano, 1.083 horas de voo em 162 missões no ano seguinte, e 200 horas de voo e 39 missões no último ano de destacamento.
No início das operações aéreas esteve destacado em Angola um avião Skymaster com a missão primária de lançamento de pára-quedistas e transporte geral dentro do teatro. Para além destas missões executou voos de reconhecimento na fronteira norte para detecção de infiltrações, ao longo dos rios Zaire e Cuando. Ao final de poucos meses regressou à Metrópole para a execução das missões de transporte inter-teatros.
Para além da reorientação do esforço com o surgimento da guerra a Leste, o dispositivo altera-se ligeiramente, com maior activação dos aeródromos já mencionados, com a introdução da frota de B-26, em número de 4 aeronaves, em Outubro de 1972, e com o abate dos aviões F-84 em Novembro seguinte.
O Aerodromo de Manobra do Luso passa a ser o centro das operações aéreas, com PV2, T-6, DO27 e ALL III, ali estacionados ou baseados no AB 4.
As operações assumiram um carácter de rotina e as forças armadas portuguesas procuravam desarticular o dispositivo inimigo, que sofria muitas dificuldades no terreno, de vária ordem - a primeira das quais terá sido a falta de união entre os três movimentos. A batalha pelo desenvolvimento continuava em toda a Província, agora que estavam atingidas as condições de segurança necessárias.
As operações aéreas na Guiné
A guerra na Guiné apresentou características muito diferentes das da guerra em Angola, pela forma como foi iniciada, pela forma de organização da guerrilha e pelas características geográficas do território. A prova de vida do movimento rebelde foi igualmente dada por um facto relativamente espectacular, traduzido na vandalização da infra-estrutura turística na praia de Ponta Varela, no Norte, que levou ao abandono da sua exploração. Antes tinha ocorrido uma campanha panfletária intensa, em vários pontos do território, numa altura em que ainda existia uma organização muito incipiente dos vários movimentos rebeldes. Ainda no ano de 1961, no dia 21 de Julho, ocorreu um ataque a S. Domingos de que resultaram 4 feridos; em Janeiro de 1963, tem lugar um outro ataque agora em Tite, frente a Bissau, com uma baixa militar. O esforço do movimento rebelde foi inicialmente orientado para a sua organizacão interna, para a formação de quadros, para o recrutamento de combatentes, para a sua implantação no terreno, para a endoutrinação ideológica, para o treino militar, para o isolamento de algumas zonas cortando as vias terrestres de acesso, com minas e abatizes; nos primeiros anos da sua existência a manifestação da guerrilha não foi muito visível do exterior. As acções violentas forma diminutas. Ao contrário do que aconteceu em Angola, aqui existia apenas um movimento; logo a seguir à fase inicial de sublevação, o Partido Africano para a Independência da Guiné e de Cabo Verde, que inicialmente tinha outra designação, anulou outros movimentos com menos apoio internacional, que entretanto se haviam constituido, e passou a ter posição hegemónica. Para além do PAIGC apenas sobreviveu a FLING embora com uma fraca expressão.
O dispositivo aéreo na Províncía era pouco menos que rudimentar, no início de 1961, consistindo de um pequeno número de aviões T-6G e AUSTER. Perante a situação de potencial insegurança, a Força Aérea destacou para Bissau 8 aviões F-86F e o respectivo armamento. O “ferry” destas aeronaves, que consistiu uma operação importante com algum risco, iniciou-se em 15 de Agosto de 1961, utilizando a base espanhola de Gando, nas Ilhas Canárias, e o aeródromo do Sal no arquipélago de Cabo Verde, e sendo apoiada por aviões P2V5, C-54 e DC-6 e por navios da Armada, para apoio à navegação, busca e salvamento e transporte de equipamento de apoio. No planeamento desta missão consideraram-se três hipóteses para pontos de apoio intermédios: Porto Santo - Canarias - Sal; Monte Real - Canárias - Sal; e em voo directo do Montijo para o Sal. Para todas as hipóteses estava prevista a utilização dos quatro depósitos externos de combustível do avião, configuração nunca experimentada do anterior; na última hipótese (voo directo para o Sal) considerava-se a ejecção mandatória dos quatro depósitos em voo, depois de consumido o combustível, com a última parte da rota a ser voada a 42.000 pés de altitude. No final do estudo optou-se pela segunda hipótese, com trânsito pelas Canárias, que era a solução mais eficiente.
Estes aviões começaram de imediato a executar acções de soberania com sobrevoo de todo o território, patrulhamento de vias de comunicação, fluviais e terrestres, demonstração de presença no ar, constituindo-se como uma força de dissuasão de grande importância.
Entretanto o dispositivo terrestre vai-se ampliando, sem que as operações de instalação das forças, feitas com grande precaução, tenham colocado sérias dificuldades, para além dos problemas relacionados com os obstáculos, minas e armadilhas colocados nos respectivos acessos. Numa área relativamente pequena, de cerca de 32.000 quilómetros quadrados, plana, coberta de floresta em grande parte, cortada por inúmeros rios, braços de mar e canais, foram constituidas mais de oitenta bases de forças terrestres, cujo número continuou a aumentar, e construidas mais de setenta pistas para a operação de aviões ligeiros. Ao contrário desta riqueza em aeródromos alternantes para os aviões ligeiros, os aviões F-86F operaram durante toda a sua permanência, até meados de Outubro de 1964 (retirados do teatro por imposição americana), a partir de Bissau, sem a existência de um aeródromo alternante ou de emergência; o avião G-91 que substituiu o F-86, mas só em 1967, utilizava ocasionalmente a pista do Gabu, para extensão do seu raio de acção em operações no Leste e Sudeste, e os aviões de transporte intermédio utilizavam regularmente as pistas de Farim, Bafatá e Gabu.
A primeira acção aérea de ataque real ocorreu a 4 de Abril de 1963, como acção de demonstração e de intimidação, traduzida na execução de tiro real para uma faixa de terreno junto a uma povoação que o inimigo isolara. O acto que dera origem a tal acção fora a colocação da bandeira do PAIGC e o alvejamento de um avião AUSTER com armas ligeiras a partir da tabanca de DarSalame. Imediatamente a seguir inicia-se uma série de bombardeamentos contra alvos, que eram localizações geográficas precisas onde havia indicações de presença inimiga, selecionados ao mais alto escalão militar. Na fase mais avançada do conflito os alvos eram selecionados a partir do reconhecimento fotográfico e visual, sistematicamente efectuado de acordo com os dados de Intelligence provenientes do Comando Chefe.
No início das operações militares, existia o Aeródromo Base nº 2 na dependência directa da Zona Aérea de Cabo Verde e Guiné (ZACVG). Com a evolução das operações militares, e o aumento de meios aéreos, este aeródromo passou a ter o estatuto de base, com a designação de Base Aérea nº 12, constituindo a única unidade base do território, durante todo o período da guerra. Farim, Bafatá, Gabu, Aldeia Formosa e Cufar eram pistas preparadas com comprimento da ordem dos 700 metros. Os pequenos campos de aviação tinham um comprimento mínimo da ordem dos 400 metros.
Dada a dimensão do território, a condução das acções aéreas era totalmente centralizada, e só em circunstâncias muito específicas, e raras, se constituíram comandos avançados temporários, assim como destacamentos de meios aéreos.
De início, as frotas existentes eram de T-6G e AUSTER, sendo este substituído pelo DO-27 durante o ano de 1964. A evolução da frota foi no sentido de se estabilizar (1970) nos seguintes tipos e quantitativos: 21 helicópteros AL III, 24 DO-27, 3 C-47, 12 FIAT G-91, 18 T-6G, 3 NORDATLAS. O efectivo médio de pilotos era da ordem de 35, cada um qualificado em mais do que um tipo de aeronave. Com este volume de meios, a BA 12 efectuava entre 20 a 30 saídas por dia, com valores de pico superiores, em condições de grande frequência de operações militares. A título de exemplo refira-se que em 1969 a BA 12 voou 17.751 horas de voo, no cumprimento de 8.275 acções aéreas, sendo cerca de 36% de transporte, 28% de evacuação sanitária, 13% de posto de controlo em voo, 11% de ataque independente preplaneado, 6% de reconhecimento visual, 3% de ataque em apoio próximo e 3% de acompanhamento de forças de superfície (colunas terrestres ou comboios fluviais). O avião que mais voava era o DO-27 logo seguido do AL III e do T-6; o FIAT G-91 voava cerca de 1.200 horas de voo por ano, com um tempo médio por saída da ordem dos 35 minutos. Por determinados períodos, em função da situação operacional, era destacado para Bissau um P2V5 que se encontrava no Sal em destacamento permanente, para acções de bombardeamento, em especial bombardeamento nocturno.
Em 1972 a Base Aérea nº 12 efectuou 15.404 horas de voo, sendo a Unidade da Força Aérea que mais voou; em 1973 realizou 14.625 horas de voo, ou seja, cerca de menos 779 horas.
A Base desenvolveu uma capacidade notável, em termos de reconhecimento fotográfico, utilizando o C-47, o DO-27, e o FIAT G-91 com equipamento diferente, o que permitia montar vários mosaicos da área de operações, actualizados, de acordo com as necessidades operacionais e com capacidade de resposta muito curta. A exploração dos relatórios de informações do Comando Chefe em cima deste mosaico, facilitava a identificação de locais suspeitos que eram a seguir confirmados pelo reconhecimento visual. Este processo permitia a elaboração de um ficheiro de alvos credível e de uma ordem de batalha actualizada. O reconhecimento visual era, sempre que possível, feito de forma sistemática, obedecendo a um plano, sem associação directa à realização de operações, e sem prejuizo de acções inopinadas na sequência de exploração de notícias.
A guerrilha, que estava bem armada e que tinha uma capacidade operacional elevada, para a sua missão, actuava normalmente de forma muito dissimulada, através de emboscadas, ataques a quartéis, normalmente a grande distância com artilharia, e ataques próximos contra forças militares e contra populações que não lhes eram afectas. As bases mais importantes da guerrilha situavam-se no exterior, junto à fronteira, constituindo-se como santuários. Por raras vezes o inimigo actuou de forma quase convencional; nessas circunstâncias ficava muito exposto à acção aérea, especialmente em áreas de menor cobertura florestal.
Em todos os teatros de operações o domínio do ar era absoluto, na medida em que a guerrilha não dispunha de meios aéreos. Contudo, desde o início a guerrilha procurou contrariar a acção aérea, através de artilharia anti-aérea. No caso da Guiné, verificaram-se várias fases na modalidade de acção anti-aérea. De início era feito tiro de forma indiscriminada contra todas as aeronaves militares (houve um caso ou outro contra aeronaves civis), com armas individuais. A seguir surgiram as armas instaladas em tripé de calibre 7,62 mm. Depois as armas de calibre 12,7 mm. As primeiras só eram efectivas a curta distância, quando a aeronave estava denunciada e voava a baixa altitude. As segundas produziam maiores efeitos mas eram facilmente visíveis do ar, na medida em que normalmente se situavam em clareiras e o disparo era visivel do ar com relativa facilidade. A seguir a este período inicial em que parecia que todas as armas permaneciam apontadas às aeronaves, notou-se uma ausência de qualquer actividade anti-aérea em todo o teatro, o que terá certamente resultado de directiva geral nesse sentido, na medida em que tal actividade denunciaria a presença da guerrilha no terreno. Depois desse período, a guerrilha adoptou armas mais poderosas, as quádruplas ZPU-4 soviéticas de 14,5 mm, colocadas em espaldões apropriados, em zonas onde pretendia demonstrar a sua inexpugnabilidade, inclusive no que dizia respeito ao espaço aéreo - não é de crer que essa demonstração tivesse produzido os resultados pretendidos, apesar da propaganda inimiga em sentido contrário, na medida em que tal dispositivo continuava a ser vulnerável, por ser facilmente detectável e ficar sujeito ao ataque aéreo. Ao longo de todo este período foram atingidas várias aeronaves, incluindo tripulantes, mas não se registou nenhum caso fatal. Por exemplo, em 1966 foram atingidos 8 DO, 6 T-6, 1 ALII, 2 G-91 e 1 C-47; em 1967 5 DO, 5 T-6, 3 ALIII e 2 G-91. O caso mais grave ocorreu em 1968 quando um G-91 foi abatido, tendo-se ejectado o piloto, com sucesso, saindo ileso.
Voltou-se de novo ao silêncio de armas anti-aéreas por um dado período, no fim do qual se voltou a observar nova ofensiva, a que se seguiu nova paragem - da parte da guerrilha importava perturbar a actividade aérea, dado que ela constituia o elemento de desiquilíbrio no desenrolar da guerra, mas é de supor que a utilização da arma anti-aérea lhe trazia demasiados riscos. E é no fim destes ciclos, de activação/desactivação que surge o míssil superfície-ar Strella em 1973, com resultados muito significativos num espaço de tempo muito curto, de 23 de Março a 6 de Abril. O primeiro avião abatido foi um FIAT G-91 no corredor do Guilege, no Sul, em que o piloto se ejectou, tendo sido recuperado no dia seguinte; o segundo abate foi também 1 G-91 cerca de Madina do Boé, no centro leste; o terceiro, também G-91 ocorreu cerca de Pirada no norte leste em que o piloto foi recuperado; a seguir foi abatido um T-6 cerca de Guidage, no norte com abate do piloto, e imediatamente após foi abatido um DO, com dois pilotos, na mesma área, não sobreviventes. Isto significa que o míssil teve uma distribuição por quase todo o território; segundo algumas fontes, terão sido adquiridos cerca de mil mísseis, não existindo indicação do número de elementos que receberam instrução neste tipo de arma. A versão deste míssil apresentava no entanto uma vulnerabilidade: tinha limitações técnicas no lançamento, o que condicionava o seu envelope eficaz (a muito baixa altitude era pouco eficaz, e o seu alcance rondava os 10.000 pés em altitude), e produzia muito fumo o que permitia a detecção do local do disparo e o subsequente ataque. Em face das contramedidas adoptadas deixaram de se verificar mais abates, apesar da continuidade dos disparos. Em todo o caso, a sua introdução no teatro alterou substancialmente a forma de operação dos meios aéreos e criou um forte sentimento de insegurança. Contudo, o esforço de voo total não foi significativo, apesar da quase descativação da frota T-6; durante todo o ano de 1973 realizou-se 95% do total voado em 1972, não sendo evidente que esta quebra de 5% se tenha ficado a dever exclusivamente ao efeito Strella.
As operações aéreas em Moçambique
A guerra em Moçambique apresentou igualmente características particulares, diferentes das de Angola e das da Guiné.
Os três movimentos originais, formados em 1960 e 1961 (MANU - Moçambique African National Union; UDENAMO - União Democrática Nacional de Moçambique; UNAMI - União Nacional Africana de Moçambique Independente) tinham bases regionais e motivações diferenciadas. Apesar das diferenças entenderam haver alguns pontos comuns pelo que se fundiram na FRELIMO em 1962. Dentro da nova frente assim criada manifestaram-se desde o início discordâncias entre os seus elementos quanto à estratégia a seguir; enquanto alguns propunham um ataque à capital ou aos centros do poder estabelecido, outros optavam por incitar os camponeses contra os colonos portugueses, enquanto outros defendiam uma luta de guerrilha prolongada e de desgaste, de acordo com as tácticas e técnicas comunistas. Foi esta última facção que venceu - os rebeldes prepararam um plano de revoltas em todo o território. Isto não teve sucesso imediato por várias razões, a mais importante das quais terá resultado do facto da FRELIMO dispor de uma força de combate muito pequena e pouco conhecida dentro da província - a maioria da população não estava mentalizada para a independência, nem para o seu alcance pela via violenta. Quando a Tanzânia começou a facultar santuários dentro do seu território a situação alterou-se. Isto permitiu que o núcleo original da força armada, cerca de 250 combatentes no total, tivesse sido expandido gradualmente. Os primeiros elementos tiveram o seu treino militar na Argélia. O reconhecimento da FRELIMO pela Organização dos Estados Africanos, e o apoio material, diplomático e em armamento fornecido principalmente pela União Soviética e pela China, alterou substancialmente as condições permitindo uma maior implantação no terreno.
Em 24 de Agosto de 1964 é assassinado com arma branca um missionário no planalto dos Macondes, atribuindo-se a esta acção motivação ideológica e a sua autoria a elementos rebeldes de uma organização muito pouco conhecida. Um mês depois (25 de Setembro de 1964) tem lugar o ataque a um posto administrativo e quartel de Mueda, agora de iniciativa da FRELIMO. Estes factos criaram insegurança no Norte da Província, em especial no distrito de Cabo Delgado, o que obrigou a um dispositivo militar específico para contrariar esta ameça.
Após o período inicial (1964/1965) a FRELIMO, com o forte apoio da tribo dos Macondes, que se estendia para além da fronteira, começou a criar bases no interior da província, nos distritos de Cabo Delgado e Niassa, divulgando a nível internacional que tinha estabelecido áreas libertadas da jurisdição portuguesa.
Até 1967 a FRELIMO não pôde penetrar em áreas a sul destes distritos, altura em que a actividade da guerrilha era limitada a incursões de curta distância com pequenos grupos, dado existirem apenas um pequeno número de elementos a viver em permanência no território controlado pelas forças portuguesas. Os ataques eram normalmente lançados de bases no estrangeiro, junto à fronteira, e os combatentes regressavam depois do ataque.
Em 1964 as forças portuguesas aumentaram o seu dispositivo. Entre 1964 e 1966, quando os rebeldes começaram a operar ao nível de companhia, a guerra prosseguia a ritmo lento. A FRELIMO estabeleceu um comando central em 1966 para uma melhor coordenação das operações nas diferentes regiões, e aumentou os seus efectivos para 8.000 homens no ano seguinte, a maior parte dos quais era treinado na Tanzânia, no campo de treino de Kongwa, e os quadros no exterior, na União Soviética e na China. A ajuda soviética intensificou-se sob a forma de AK -47, morteiros 82 mm, canhões de 75 mm e RPG 7. A arma mais efectiva era a mina terrestre anti-pessoal e anti-tanque. O poder aéreo, nesta fase inicial, era usado para impedir o fornecimento pelas rotas atravès das fronteiras, com a execução de um patrulhamento sistemático na fronteira norte, tanto ao longo do rio Rovuma, como nas infiltrantes mais utilizadas, e como reacção imediata a ataques de guerrilha, mas os recursos eram ainda limitados. De início não existiam alvos fixos, dada a forma de actuação do inimigo, numa acção de bate e foge, e disseminação entre a população.
Em 1968 a FRELIMO foi reorganizada durante o seu 2º Congresso, com a abolição da divisão entre os sectores civil e militar e as unidades de combate foram destacadas por sectores, cada um dos quais com o seu próprio batalhão, com três companhias a 150 homens. Os combatentes regulares eram apoiados pela milícia popular local. A Zâmbia tornou-se independente em 1964 e a nova nação passou também a disponibilizar bases para a FRELIMO. Para além disso, as forças destacadas passaram a constituir bases em território português. Os rebeldes passaram assim a ter capacidade para se infiltrarem para o distrito de Tete colocando uma ameaça à barragem de Cabora Bassa, e começaram a receber foguetes de 122 mm com um alcance de 16 km. Nunca conseguiram interromper os trabalhos da barragem devido ao redirecionamento correspondente das forças portuguesas.
A campanha rebelde na região de Tete durante 1968 foi prejudicada pela migração de uma grande parte da população nativa para o Malawi, assim como pela luta interna na FRELIMO que alcançou o seu ponto alto no início de 1969. Depois da expulsão dos tradicionalistas, durante o 2º Congresso, e da entrega às autoridades portuguesas do chefe Kavandame em 3 de Fevereiro de 1969, a FRELIMO sofreu uma viragem acentuada na sua forma de actuação. Os ataques passaram a ser muito mais violentos, agora já com um apoio muito importante da Zâmbia.
Em função da evolução da guerra, o dispositivo aéreo foi sendo estabelecido e progressivamente activado. De notar que entretanto decorreu a chamada crise do petróleo, ou crise da Beira, que envolveu reforço de meios aéreos, designadamente PV2, P2V5 e F-84G, e que não será descrita neste trabalho.
É interessante referir que o plano das infra-estruturas aprovado do anterior, antecipou um dispositivo ditado por razões estratégicas ou pela evolução da ameaça. A cobertura principal contemplava o Norte do território, materializada por uma malha de aeródromos, distantes entre si de forma compatível com o raio de acção das aeronaves atribuidas, e que cobria os distritos de Cabo Delgado e Niassa, onde a subversão mais se fez sentir. A outra área relativamente coberta era a zona do distrito de Tete para onde a guerrilha dirigiu o seu esforço, a seguir ao Norte.
A única Base Aérea na Região era a Base Aérea nº 10, na Beira, que constituiu sempre a base de rectaguarda, relativamente afastada da zona de operações, e essencialmente guarnecida com meios aéreos de transporte.
Mais a norte constituiu-se uma linha de aeródromos base, que poderíamos designar como linha tampão: o Aeródromo Base nº 5 em Nacala, o Aeródromo Base nº 6 em Nova Freixo, o Aerródromo Base nº 7 em Tete. Em Lourenço Marques constituiu-se o Aeródromo Base nº 8, muito distante da zona de operações, dotado apenas aviões de transporte médio, designadamente C-47, que inicialmente estiveram atribuidos à Base Aérea nº 10.
Dependentes dos Aeródromos Base (AB) existia uma malha de Aeródromos de Manobra (AM):
- do AB 5:
AM 51 em Mueda;
AM 52 em Nampula.
- do AB 6:
AM 61 em Vila Cabral (primeira localização prevista para o AB 6);
AM 62 em Marrupa.
- do AB 7:
AM 71 em Furancungo;
AM 72 em Chicoa;
AM 73 em Mutarara.
O Comando da Região Aérea situava-se em Lourenço Marques, tendo-se constituido posteriormente o Comando Avançado de Nampula. Existiam em Moçambique 15 grandes infra-estruturas aeroportuárias, civis e militares (Beira - 3 pistas, 2400 m; Marrupa, 1560 m; Mueda - 2 pistas, 2350 m; Nacala, 2500 m; Nampula, 2000 m; Nova Freixo, 2500m; Porto Amélia, 1800m; Quelimane, 1800m, Tete, 2500m; Vila Cabral, 2000m; Furancungo; Chicoa; Mutarara; Lourenço Marques; Tenente Valadim), e mais de 200 pistas de aterragem com comprimento superior a 700 metros distribuidas por todo o território, conforme já se disse.
A quase totalidade destes aeródromos ainda estava em construção no ano de 1962. Para além dos aeródromos base e dos aeródromos de manobra acima mencionados existia um conjunto de aeródromos de recurso, onde existiam as facilidades mínimas para a operação aérea.
Em 1963 apenas estavam activados a Base Aérea nº 10, com 6 C-47, 4 NORD e 4 PV2, e o AB 5 em Nacala com 9 T-6, 8 DO-27 e 2 AUSTER.
A partir de 1964 começa o reforço da dotação que prossegue a um ritmo rápido, na medida das possibilidades então existentes, tendo em conta o empenhamento da Força Aérea nos outros dois teatros de operações. Assim, em 1965 a BA 10 é reforçada com 2 DO-27 e 4 AUSTER; o AB 5 passa a ter 21 T-6, 14 DO-27, e 15 AUSTER; e o AB 8 é dotado com 5 C-47, 2 DO-27 e 2 AUSTER.
Numa segunda fase o AB 6 é guarnecido com 8 T-6, 9 DO-27 e 4 AUSTER, e são atribuidos ao AB 7, 7 DO-27, 4 AUSTER e 8 T-6.
Em 1967 estavam atribuidos à 3ª Região Aérea 9 NORD, 6 C-47, 6 PV2, 24 DO-27, 16 AUSTER, 45 T-6G, e 6 AL III, tendo sido realizadas no ano seguinte 16.368 horas de voo e cerca de 8.000 missões.
A 25 de Dezembro de 1968 chegam ao porto da Beira os primeiros 8 FIAT G91, desmontados e em contentores. Seis dias depois todos estavam montados e transferidos para o AB 5 em Nacala, em situação de prontos para operações, dado que os pilotos já tinham sido previamente colocados na Região Aérea.
Em Setembro de 1970 chega ao porto da Beira a segunda leva de FIAT G91, num total de oito aeronaves. Depois da montagem e teste voam para o AB 7 em Tete.
Em 1970 o efectivo era o seguinte: 35 DO, 36 T-6, 25 ALIII, 16 G-91, 5 C-47, 8 NORD, 13 AUSTER, 4 Cherokee e 6 CESSNA, com 102 pilotos atribuídos. A quase totalidade destes meios estava atribuida aos aeródromos do norte. Nesse mesmo ano foram efectuadas 15.736 horas de voo, no cumprimento de 10.969 acções aéreas. Em 1972 efectuaram-se 27.839 horas de voo e em 1973 voaram-se 35.026 horas. Estes números reflectem bem o aumento brusco da actividade aérea, que quase duplicou num ano, e que continuou num cresscendo.
Em 1974 existiam em todo o teatro 5 SA-330, 27 DO, 26 T-6, 31 ALL III, 16 FIAT G-91, 9 NORD, 8 C-47, 10 AUSTER, 4 Cherokee e 6 Cessna. O número total de pilotos era de 122, que voaram, no primeiro semestre um total de 15.760 horas, assim distribuidas: ALL III - 5.267; DO 27 - 3.104; T-6 - 1.842; NORD - 1.816; C-47 - 1.566; FIAT G-91 - 894; e SA 330 - 569; Auster, Cherokee e Cessna voaram no conjunto 702 horas.
Estes números mostram claramente a evolução na dotação dos meios e o incremento progressivo do esforço de voo, ou seja, a intensificação da guerra.
Conforme já referido, depois do início da barragem de Cabora Bassa, a guerrilha montou um dispositivo na área de Tete, realizando um conjunto de acções que tinham em vista mostrar presença, atacar as unidades terrestres e impedir o desenvolvimento da construção da barragem. A ordem de batalha foi assim alterada e a guerra estendeu-se a Oeste da Província.
Os aviões FIAT começaram a operar em finais de 1968 no AB5; foi constituída uma segunda ESQUADRA em 1970 no AB 7; efectuaram destacamentos no AM52, em Porto Amélia e no AM 51, de forma regular, e operaram ainda no AB 6, no AM 61 e na BA 10.
Os AL III chegaram a atingir o quantitativo total de 31, que operaram a partir do AM 52, AM 51, AM 61 e da BA 10, e era a frota que mais voava.
As operações assumiam um carácter semelhante às que decorriam nos outros teatros. Na fase inicial a missão mais importante era a detecção das incursões provindas do Norte e subsequente ataque, na modalidade de reconhecimento armado. O apoio aéreo próximo era igualmente relevante, como retaliação aos ataques feitos pelas forças da FRELIMO aos aquartelamentos das nossas forças ou a povoações. O avião disponível para esta missão era o T-6 armado, na fase inicial. O reconhecimento visual era executado, essencialmente pelo avião DO-27; para o reconhecimento fotográfico era utilizado o C-47 que efectuava a cobertura actualizada das principais bases inimigas.
A partir de 1968 entra em acção o avião FIAT G-91 que altera o potencial ofensivo, de forma muito significativa, não só pelo poder de fogo como pela elevada capacidade de resposta, respondendo em minutos aos pedidos de apoio aéreo pelo fogo.
Em 10 de Junho de 1970 é lançada a maior operação da guerra no Ultramar, designada por Operação Nó Górdio, no norte de Moçambique, que envolveu de início cerca de 10.000 homens, integrados em forças de combate e de apoio, com o objectivo de desarticular o dispositivo da FRELIMO e recuperar populações reféns da guerrilha. A operação assumiu aspectos de operação clássica, com ataque a bases inimigas, muito bem defendidas, abertura de itinerários, envolvimento ou cerco das forças da guerrilha, e durou cerca de oito meses, envolvendo em termos acumulados cerca de 30.000 homens. A quase totalidade dos meios aéreos esteve empenhada nesta operação, com o bombardeamento das bases, o transporte de assalto com forças especiais em ALIII, o transporte aéreo de forças e material para a zona de operações, o reconhecimento visual e fotográfico de presença inimiga, a evacuação sanitária do local de acção com helicópteros e aviões. A reacção anti-aérea neste período foi bastante intensa.
A experiência operacional em Moçambique demonstrou de forma evidente uma das características fundamentais do poder aéreo, que é a mobilidade. De facto, de acordo com as exigências operacionais os meios aéreos deslocavam-se com frequência, para grandes distâncias para a realização de operações específicas, mais do que em qualquer um dos outros teatros de operações, para constituirem agrupamentos operacionais que actuavam coordenados a partir da mesma plataforma ou de bases próximas.
O inimigo dispunha de artilharia anti-aérea calibre 12,7 mm, mais concentrada no planalto dos Macondes. Em 1965 atingiu 5 DO, 8 T-6 e 1 Auster; em 1966 7 DO, 8 T-6, 1 Auster, 1 NORD e 1 PV2; em 1967 atingiu 14 T-6, um dos quais abatido com o piloto; em 1972 5 DO, 11 T-6, dos quais 2 abatidos, 11 AL III de que resultou a morte de um piloto e de um mecânico e de 4 pilotos feridos, 2 G-91 e 3 NORD; em 1973 7 G-91, 3 C-47 de que resultou a morte de um radiotelegrafista, 5 NORD, 11 DO, 3 T-6, 10 AL III de que resultou a morte de um piloto e de dois atiradores, mais dois pilotos feridos, e 1 C-47; no primeiro semestre de 1974 11 DO, 3 T-6, 10 AL III com a morte de um piloto e dois atiradores, e mais dois pilotos feridos.
A aquisição do míssil Strella não conseguiu produzir os resultados obtidos que tinha produzido na Guiné, fundamentalmente porque já não constituiu surpresa e já tinham sido introduzidas as adequadas contra-medidas. O único caso de impacto com sucesso deu-se contra um C-47 ao ser atingido por um míssil; o impacto deu-se num dos motores, mas mesmo nestas condições a tripulação conseguiu aterrar numa pista de emergência - esta aeronave transportava adidos militares estrangeiros em visita ao teatro de operações, que não tiveram, à altura, uma percepção correcta do acontecido.
As grandes distâncias entre o Comando Operacional, as unidades de base e as zonas de operações dificultaram naturalmente a coordenação da actividade aérea e a cooperação com as forças de superfície, consumindo muitas horas de voo em trânsito.
Conclusões
O esforço de voo realizado pela Força Aérea na Guerra do Ultramar atingiu números altamente significativos, tendo em conta as capacidades nacionais. Durante este período os efectivos mais do que duplicaram, e o número total de horas de voo aproximou-se da meta das cem mil. Tomando os valores de 1972 e 1973, últimos anos da guerra, a 1ª Região Aérea voou 32.698 e 29.420 respectivamente; a 2ª Região Aérea 33.917 e 29.789; a 3ª Região Aérea 29.944 e 37.324. Quer dizer que tanto a 1ª como a 2ª Região Aérea reduziram a actividade de um ano para o outro, ao passo que a 3ª Região teve uma subida extraordinária de cerca de 25%, o que é notável, e reflecte a intensificação da guerra neste período.
Quanto a Unidades de Base, aquela que mais voou foi a Base Aérea nº 12, na Guiné. Para se ter uma ordem de grandeza, em 1972 a BA 12 voou cerca de 15.400 horas, a BA 9 em Luanda cerca de 14.000 horas, o AB 4 em Henrique de Carvalho cerca de 13.100 horas, o AB 5 em Nacala cerca de 10.500 horas e o AB 7 em Tete cerca de 10.100 horas. O AB 5 voou mais 3.000 horas em 1973 do que no ano anterior e o AB 7 mais 2.000.
Este números dão uma indicação do esforço dispendido por todo o pessoal da Força Aérea nesse período. De facto, ao fazer a avaliação deste esforço será sempre necessário ter em mente a ideia de sistema no que diz respeito ao emprego do poder aéreo, com a aeronave no seu centro.
Dada a continuada dependência dos meios aéreos em infra-estruturas no terreno, a primeira preocupação dos responsáveis pelo planeamento foi a criação das condições que permitissem a operação aérea, em condições satisfatórias de segurança, não só ao nível do teatro mas também na ligação entre teatros, que não existiam antes - as ajudas à navegação e à aproximação aos aeródromos foram as mínimas indispensáveis, e neste aspecto não existe nenhuma comparação com o que actualmente se passa.
Apesar das condições difíceis da operação, sem apoios eficazes para a referenciação e navegação, os casos de fratricídio, muito frequentes em ambientes desta natureza, foram muito raros, ou quase inexistentes, ao longo dos treze anos de guerra.
Um outro aspecto relevante a mencionar é o que se refere à sustentação das forças, de forma continuada no tempo; na experiência portuguesa este foi um objectivo atingido de forma notável, dentro das limitações existentes, que eram pesadas. Esta sustentação teve a ver, não só com a aquisição e prontidão dos meios materiais, o apoio logístico a três teatros situados a grande distância, mas também com o recrutamento e a formação de pessoal qualificado, o que implicou um esforço de retaguarda tão importante como o esforço na linha da frente. Os centros de preparação operacional na Metrópole que entretanto se formaram para responder às necessidades operacionais, iam sedimentando ensinamentos e criando doutrina, dado que o pessoal formador, em rotação permanente, dispunha de experiência ultramarina, em regra. A operação e manutenção dos meios aéreos exigia pessoal bem treinado para se atingirem os objectivos impostos pela guerra, em níveis aceitáveis de segurança de voo, e isso, não sendo tarefa fácil, foi atingido de forma satisfatória, em especial naquelas unidades aéreas onde foi possível manter um bom enquadramento do pessoal. A rusticidade da operação e manutenção exigia cuidados especiais para se evitarem situações de risco acrescido. Tão importante como as condições materiais eram as condições mentais, a preparação psicológica dos combatentes e o apoio da Nação - a guerra tinha estas duas frentes, igualmente importantes.
Importa fazer uma referência à natureza da guerra.
Os guerrilheiros não podem dispôr de poder aéreo, por razões inerentes à própria natureza da guerra e porque ele é necessariamente conspícuo, e esta é uma das características, entre muitas outras, que a distingue da guerra convencional. O Poder Aéreo, quando usado de forma correcta, neste contexto, é um factor de desiquilíbrio porque explora a terceira dimensão de forma envolvente, em termos de projecção de força, de visibilidade, de penalização ou de flagelação, criando incerteza e insegurança, e também em termos de apoio às populações. A competição pela segurança das populações era um dos objectivos de ambas as partes em conflito.
O combate à guerrilha pode não exigir meios altamente sofisticados, mas o mais importante é manter presença, criar insegurança aos guerrilheiros e populações que os apoiem, conquistar as populações através de acções cooperativas e justas que permitam uma melhoria de condição de vida - neste contexto, os meios aéreos desempenham um papel relevante. Diz-se normalmente que o objectivo principal da guerrilha é o desgaste das forças convencionais, o que é uma verdade; mas também não é menos verdade que a guerrilha também se desgasta se se exercer uma pressão continuada sobre as suas forças e uma acção psiciológica que influencie também as populações e degrade a vontade de combater, embora se reconheça que isto envolve custos assinaláveis. O objectivo do guerrilheiro é conquistar o poder político no tempo da sua vida, e o prolongamento da sua actividade subversiva também lhe produz desgaste, não só físico, mas também psicológico.
Face a uma carência natural de recursos, a necessidade do aproveitamento da característica de flexibilidade e da versatilidade do meio aéreo tornou-se mandatório. Meios aéreos concebidos para o patrulhamento marítimo foram utilizados como meios de ataque, de apoio próximo, de evacuação sanitária e até de transporte. Meios aéreos de transporte geral foram aproveitados para ataque e reconhecimento. Aviões de instrução foram adaptados para aviões de ataque ao solo - o avião T-6 foi a aeronave de apoio próximo às forças de superfície mais utilizada, em todos os teatros, com resultados muito positivos. A mobilidade táctica das forças, proporcionada pelos helicópteros foi determinante para o sucesso de muitas operações; a coordenação desta manobra com o apoio de fogo fornecido pelos aviões convencionais e/ou de reacção, atingiu níveis de precisão notáveis.
Conforme ficou demonstrado pelos factos, o Poder Aéreo constitui um factor de desiquilíbrio em guerra de guerrilha, a favor das forças convencionais, por ter acesso a todos os pontos do teatro, dificultando a criação de santuários indispensáveis à guerrilha, pela capacidade de observação forçando à camuflagem do inimigo, camuflagem que nunca é totalmente eficaz, pela capacidade ofensiva, e pela possibilidade de apoio às populações em vários domínios.
Na guerra de contra guerrilha há lugar à diferença entre operação conjunta e operação de apoio, na medida em que naquela a definição de objectivos e a concepção da manobra são estabelecidas pelas forças participantes, explorando as sinergias resultantes das capacidades próprias de cada tipo de força. A operação de apoio responde a solicitações precisas emitidas pelas unidades apoiadas; contudo, para este tipo de operação torna-se mandatório o estabelecimento de padrões de execução que permitam uma melhor compreensão das potencialidades e vulnerabilidades do meio aéreo, que resulta na exploração maximizada das capacidades da força apoiante. Esta diferença foi muito importante em determinadas condições, pese embora a dificuldade em ser gerida de forma perfeita pela própria natureza do ambiente de combate.
Ao nível da execução, para além dos problemas próprios da navegação, em muitas circunstâncias era tão difícil detectar os alvos inimigos como referenciar as forças amigas - com a tecnologia disponível na altura esse era um problema muito difícil de resolver, dificuldade que no entanto não conduziu a situações de fratricídio. Não se dispunha de armamento guiado, mas a sua inexistência não afectou substancialmente os resultados das operações, dada a natureza dos alvos, o nível de treino da grande maioria das tripulações e a superioridade aérea local, até ao aparecimento do míssil, que permitia uma certa estabilidade na execução do ataque.
Na contra guerrilha não são necessários meios muito sofisticados de combate, mas é determinante saber explorar as potencialidades desses meios face às necessidades de missão.
No caso português, na luta entre a aeronave e as armas anti-aéreas aquela conseguiu sobreviver, adoptando tácticas apropriadas e reagindo de forma penalizadora para o lançador do ataque contra a aeronave. Diz-se, com frequência, que foi o aparecimento do míssil Strella que fez com que a guerra terminasse mais cedo. Em nosso entender, esta análise carece de fundamento, sendo certo que o abate de vários aviões num período de tempo muito curto produziu um efeito psicológico muito importante, pela surpresa, o que não impediu que a reacção se manifestasse e fizesse baixar drasticamente os resultados iniciais. Conforme se referiu, na Guiné, onde o efeito se verificou, em 1973 voaram-se apenas menos 779 horas, ou seja, cerca de 5%.
Em todos os teatros a Força Aérea, para além da participação em operações conjuntas e de apoio, actuou de forma autónoma no planeamento e execução de muitas acções, como era por exemplo o caso do reconhecimento aéreo sistemático na exploração de notícias ou dos relatórios de operações, ou o ataque selectivo a posições inimigas que se constituiam como alvos de oportunidade, ou em zonas onde não era fácil o acesso terrestre. Em todos os teatros foram marcadas zonas de livre intervenção da Força Aérea, onde não era necessária a coordenação prévia para a realização de operações, de acordo com directivas superiores da estratégia da guerra.
A possibilidade do helitransporte de tropas frescas para o local de acção, qualquer que fosse o grau de acessibilidade terrestre a esse local, fez alterar a forma de fazer a guerra e terá constituído um factor de desequilíbrio a desfavor da guerrilha. O planeamento desta acção requeria cuidados especiais para se obter alguma surpresa, sendo igualmente necessário o correspondente apoio de fogo para minimizar as vulnerabilidades, em especial no momento da largada.
Na guerra de guerrilha é muito mais difícil obter informação precisa sobre os objectivos militares, porque o guerrilheiro vive misturado com a população. Contudo, esta posição de princípio muitas vezes não tem correspondência com a realidade; à medida que a guerrilha evolui vai criando uma configuração mais próxima da das forças convencionais, não dispensando no entanto a população como sua matéria-prima e como fonte de apoio logístico.
A guerra terminou com o fim do regime político em Portugal, donde resultou a independência formal desses territórios ultramarinos, a que se seguiu uma guerra civil por mais cerca de vinte anos nalguns deles. A área de cooperação que mais cedo se iniciou e mais se desenvolveu entre Portugal e os novos países, foi justamente a área militar, o que parece ser de realçar na medida em que tal facto decorre do respeito mútuo e do reconhecimento papel dos combatentes.
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* Vice-Presidente da Assembleia-Geral da Revista Militar.