Portugal nasceu, “de facto”, no dia 24 de Junho de 1128, pela mão do Infante Afonso secundado pela maioria dos barões de entre Douro e Minho.Comecemos pelo princípio, isto é, quais as causas que levaram à independência do Condado Portucalense:- em primeiro lugar, razões políticas, pois tal constituía um desígnio natural na Europa medieval: as suseranias tentavam libertar-se de outrem e formar a sua própria - terreno que o Conde D. Henrique porfiadamente preparou - e ainda por os barões portucalenses pretenderam afastar a influência dos barões galegos sobre D. Teresa;- por razões religiosas, a diocese de Braga pretendia autonomizar-se da diocese de Santiago de Compostela e de Toledo;- por razões económicas, para permitir que a riqueza produzida revertesse para o Condado e das boas perspectivas de comércio que o Porto já proporcionava;- por razões geopolíticas, a luta contra os mouros, incluída na reconquista cristã do Ocidente, abria boas perspectivas de expansão;- por razões diversas, que potenciavam aquelas: acidentes geográficos; a luta contra o infiel; o apoio das ordens militares (sobretudo os Templários), menos por questões de uniformidade rácica, exceptuando talvez, a influência sueva que tinha instalado um reino com a capital em Braga, no século VI. Segundo os etnólogos e etnógrafos, Portugal é constituído por uma mestiçagem de 13 grupos étnicos principais.Finalmente:- O “Milagre de Ourique”: independentemente de ter havido milagre ou não - essa é uma questão de Fé - Afonso Henriques não perdeu tempo em fazer a exploração política do fenómeno, além de ser aclamado Rei pelos seus homens no fim da batalha (até então era apenas duque) reuniu, mais tarde, testemunhas na Igreja de Santa Cruz de Coimbra, fazendo publicar sob juramento a descrição do aparecimento de Cristo. Ou seja, o reino de Portugal passou a existir por Direito Divino, tinha uma missão no mundo e Afonso Henriques, ele próprio, era abençoado por Deus.
Portugal percorreu, desde então, oito grandes ciclos político-estratégicos:- o ciclo da reconquista, que vai até D. Afonso III;- o ciclo da consolidação, que se prolonga até D. João I;- o ciclo da expansão, que se segue até D. João III;- o ciclo da decadência, que reporta até ao Prior do Crato;- a coroa dual, que corresponde ao ciclo Filipino;- a Restauração, que implica o primeiro grande pagamento que a Nação Portuguesa teve que efectuar: ou seja a perda de quase todo o Oriente;- o ciclo “brasileiro”, com início no reinado de D. Pedro II, em que se viveu de e para o Brasil e que terminou com a independência deste, que foi o segundo grande pagamento a ser feito, a fim de nos vermos livres dos franceses;- o ciclo contemporâneo que reporta até 1974, onde se dá o terceiro grande pagamento efectuado: para se obter a Democracia, melhor dizendo, para nos incluirmos na CEE, tivemos que perder a África e restantes parcelas ultramarinas.Neste período podem ser individualizados cinco sub-períodos:- implantação do liberalismo, que vai de 1820 a 1851;- o desenvolvimento e fim do liberalismo monárquico, que se arrasta até 1910;- a 1ª República de 1910 a 1926;- o período das ditaduras (1926-1933);- a 2ª República e Estado Novo que perdurou entre aquela data e 1974.Vivemos agora um período a que poderemos chamar “pós contemporâneo” cujas linhas de referência e orientação não aparecem devidamente delineadas o que constitui o período mais longo que até hoje tivemos de indefinição estratégica o que, dado o fenómeno da “aceleração da História” se deve assumir como uma vulnerabilidade actual e grave, do Estado Nação Português.Como outros grandes períodos de reflexão estratégica, ou esquinas da História podemos considerar:- a crise sucessória de 1383-85, que se prolongou depois da vitória das forças patrióticas nacionais e se veio a clarificar com a ida a Ceuta, em 1415;- o período de reflexão ocorrido no reinado de D. João III, que culminou com o abandono da maioria das praças do Norte de África, e a transferência faseada do esforço estratégico do Oriente para o Brasil;- o período que sucedeu à guerra civil de 1828/32, que culminou com a directiva de Sá da Bandeira, de 1836, relativamente à prioridade a dar a África[1].
Em todo este espaço temporal podemos constatar que lidámos com cinco forças inimigas principais:- os castelhanos (mais tarde os espanhóis);- os muçulmanos (quer sejam mouros, árabes, persas ou turcos);- os judeus, a partir da sua expulsão, em 1496 e da acção da Inquisição, desde 1536;- os reformistas luteranos e calvinistas (excepção feita para os Anglicanos, a não ser durante o período Filipino);- as forças comunistas, enquanto as houve (PCUS da URSS, 1917-1989).E como amigos pode-se dizer que, verdadeiramente, não temos ninguém. Apenas a Inglaterra como aliada e quando os seus interesses coincidem com os nossos; a Espanha pontualmente: Salado; aliança contra a pirataria no mar; por motivos religiosos na Contra Reforma; Pacto Ibérico e pouco mais.O Brasil, sem qualquer consequência; da Santa Sé, com grande tumulto e desconfiança; finalmente da emergente potência marítima, os EUA, quando tal lhe conveio, por postura ideológica anti-comunista e, sobretudo, por causa dos Açores.Devemos ainda ter presente que, até à I Grande Guerra, houve quatro potências que foram determinantes nos “status quo” português: a Espanha, a França, a Inglaterra e a Santa Sé. Após a I Grande Guerra e sobretudo após a II GM, juntam-se a estes Estados, a URSS e sobretudo os EUA pela importância global que vieram a ter.Em boa verdade, nós só devemos contar connosco próprios, verdade que se tornou avassaladora desde que regressámos às fronteiras europeias.
Para fazer face a todas as ameaças com que fomos confrontados, possuímos desde o início da nacionalidade um conjunto de factores coesos talvez únicos em todo o mundo:- fronteiras estáveis na Europa desde muito cedo, em 1297 e sem paralelo em mais nenhuma Nação, a não ser o Japão, que é, recorde-se, uma ilha (e só se unificou depois dos portugueses terem introduzido as armas de fogo, no séc. XVI...);- homogeneidade cultural e linguística;- ausência de conflitos raciais, religiosos ou regionais;- unidade religiosa, apenas perturbada pela questão judaica no século XVI e pelo anticlericalismo da 1ª metade do século XIX e na I República;- elevado espírito patriótico e apego à independência;- elevadas capacidades de trabalho, desembaraço e adaptabilidade do povo português e muito boas qualidades de combatente que se tornam excepcionais quando bem liderado;- o mar como janela de liberdade e oportunidades.Mas também temos grandes vulnerabilidades:- fronteira com um único país (caso único na Europa à excepção da Irlanda), que nos é quatro vezes superior em potencial estratégico e que exerce uma atracção centrípeta enorme;- apenas 1/3 do território com apetência agrícola e subsolo sem riquezas naturais apreciáveis; território descontínuo e com pouca profundidade estratégica;- incapacidade acentuada para recrutar, formar e escolher elites que preencham os principais lugares de responsabilidade na sociedade portuguesa - sobretudo a partir de D. João III;- necessidade de procurar apoios fora da Europa, que compensassem as nossas debilidades peninsulares;- descaso do aparelho militar em tempo de paz;- desequilíbrios financeiros cíclicos;- falta de um serviço de informações capaz; à excepção do reinado de D. João II, e durante o Estado Novo;- instrução média da população, baixa;- tendência inata para divergir do homem português, relativamente à desejável complementaridade de esforços no sentido do bem comum;- a inveja como expoente dos defeitos associados à natureza humana.
Os traços atrás apontados, sobretudo os de índole geopolítica, cedo deram origem ao que hoje poderíamos denominar por “escolas de pensamento geopolítico”, que se podem condensar na “escola” do Infante D. Pedro e na do Infante D. Henrique.O Infante D. Pedro, certamente marcado pela dilatada viagem que empreendeu pela Europa culta da sua época - que aliás lhe valeu o título do “das sete partidas” - privilegiava o comércio e as ligações políticas e culturais com a Europa do Norte e do Mediterrâneo, sem no entanto pôr em causa a expansão ultramarina - ele próprio financiava as expedições no Atlântico Central e Ocidental. Por sua vez a Escola Henriquina, sem pôr em causa as ligações às outras nações europeias, privilegiava a expansão ultramarina, como forma de contrabalançar o Poder Castelhano, a fim de manter a paz na Península, e o combate pela Fé. Esta dialéctica nasceu aquando das opções a tomar, entre a expansão para a Andaluzia/Granada, ou Norte de África - Ceuta - por alturas de 1410 - e pode, com outras roupagens, traduzir-se modernamente entre a continentalidade e a maritimidade.Será ainda de reter como ensinamento que sempre que Portugal se envolveu nas contendas europeias, saiu a perder.A diferença nestas “posturas”, que se vieram a alternar desde então, até aos nossos dias, fizeram variar os pilares dos eixos político-estratégicos, provocando um maior ou menor afastamento das contendas europeias; uma maior ou menor aproximação à potência marítima dominante; um maior ou menor esforço evangelizador; a procura de alianças de casamento com princesas ibéricas, nomeadamente castelhanas, quando se alimentou a esperança de vir a sentar um príncipe português no trono de Madrid, e a procura de casamentos fora da Península quando se pretendia afastar o perigo contrário.Chegados finalmente ao Oriente, isto é, à Índia e ao Prestes João - objectivo prosseguido sistemática e cientificamente durante 83 anos (se nos reportarmos a Ceuta) - estava por fim estabelecida a ponte entre os Cristãos do Ocidente e os Cristãos do Oriente (os do rito de S. Tomé na Índia e os coptas da Abissínia), verdadeira meta escatológica para se atingir a globalização espiritual, agora sob a égide do Espírito Santo e pela mão dos portugueses...Tal consubstanciava também uma estratégia indirecta de ataque ao Império Turco e seu comércio, “pelas costas”.As coisas acabaram por correr de modo diferente, mas ainda assim estabeleceram-se duas correntes de actuação geoestratégica: a defendida pelo 1º Vice-Rei, D. Francisco de Almeida, que pretendia basear toda a força no mar, apenas com um ou dois pontos de apoio em terra (ex. Cochim), estritamente necessários para o apoio das Armadas; e a preconizada por Afonso de Albuquerque que optou por procurar apoios mais fortes em terra que permitissem uma presença estável e dessem todo o apoio necessário às armadas e ao comércio e, ainda, pela tomada de pontos chaves que controlassem os estreitos e, através deles, as linhas de comunicação marítimas. São exemplo disto, Socotorá, Ormuz, Malaca, Ceilão, etc.Faltava uma base central de grande importância que permitisse o comando operacional e o apoio logístico-administrativo às nossas operações no Oriente. Para tal escolheu-se Goa, em 1510.Finalmente, promoveu a miscigenação de raças e as alianças com os reinos que nos eram favoráveis.A justeza da sua concepção estratégica permitiu aos portugueses dominar o mar e o comércio no Oriente até princípios do século XVII. Toda esta concepção veio a ser herdada e posta em prática posteriormente, pelos ingleses.Infelizmente, depois da morte do “terribil” Albuquerque, os portugueses deslumbraram-se, falharam no princípio do objectivo, distenderam demasiado o dispositivo e as linhas de comunicação e a expansão passou a ser em todas as direcções, multiplicando-se em fantásticas aventuras, mas perdendo a coerência estratégica.
Com a dinastia Filipina entrou-se em refluxo. Tal refluxo teve o seu epílogo em 1975. Esperemos que não passe daí.Como traves mestras da Estratégia ao longo dos séculos podemos divisar:- um espírito de Cruzada até ao século XVII;- conter Castela em terra e batê-la no mar;- apoios externos que se consubstanciaram na expansão ultramarina, que nos protegessem da vulnerabilidades europeias;- aliança com a potência marítima dominante, desde o século XIV, e sempre que as debilidades nacionais o impusessem;- tentativas de neutralidade nas contendas europeias;- primazia da acção diplomática sobre a actuação militar;- predomínio da estratégia defensiva sobre a estratégia ofensiva, apenas com excepções na expansão ultramarina (1415-1550);- balanceamento entre as potências marítimas e as continentais, acabando sempre por predominar as primeiras, devido à necessidade de salvaguardar as terras de além-mar;- troca de profundidade estratégica ultramarina por soberania no núcleo fundamental europeu, a partir da Restauração.
Pelo meio de tudo isto tivemos que travar o que denominámos por “cinco guerras de independência”: a primeira cabendo à acção de D. Afonso Henriques na individualização do Condado Portucalense e sua futura transformação e sustentação do Reino de Portugal; a segunda trata-se da ultrapassagem da crise sucessória de 1383-85 e que durou 26 anos; a terceira é a Guerra da Restauração, que durou 28 anos; a quarta refere-se à expulsão do invasor francês e sua completa derrota que durou sete anos, que foram de grande destruição, violência e letalidade; a quinta guerra de independência foi a levada a cabo durante o Estado Novo, onde se teve que tirar Portugal da bancarrota e do ciclo vicioso dos empréstimos versus pagamento dos juros e descolonizar o país, economicamente dos ingleses e culturalmente dos franceses.É muito possível que a próxima guerra da independência que iremos ter que travar se quisermos sobreviver, seja contra o federalismo europeu e o iberismo, que aquele potencia em extremo.
Noutro sentido, várias foram as vezes que procurámos a neutralidade versus a intervenção. Nem sempre o que se conseguiu coincidiu com os objectivos esperados. E é sempre necessário ter em conta que não é neutral quem quer, mas sim quem pode, isto é, quem tem força para isso. E, neste âmbito, o braço militar é fundamental.Vejamos a síntese desta dualidade:Durante a 1ª dinastia repartimos a estratégia ofensiva com a defensiva, e a primeira vez que entrámos nas contendas europeias foi no âmbito da Guerra dos Cem Anos, durante o reinado de D. Fernando, com resultados desastrosos.Durante a 2ª Dinastia, manteve-se uma postura maioritariamente ofensiva:- Sucessão ao trono Castelhano/Espanhol- Norte de África- Expansão UltramarinaDurante a dominação Filipina não tivemos Estratégia própria. Reagimos a ataques e participámos em guerras alheias (invencível Armada, Flandres/Estados italianos). Sem embargo aproveitámos a oportunidade para nos expandirmos no Brasil para além do acordado no Tratado de Tordesilhas.A partir da Restauração a estratégia passou a ser defensiva.Ensaiaram-se posturas neutras que falharam:- na Guerra de Sucessão de Espanha- na Guerra dos Sete Anos- na Guerra PeninsularResultaram:- na Guerra Civil Espanhola- na II GMEnsaiaram-se estratégias ofensivas com resultados pouco positivos:- na Campanha do Roussilhão- na Intervenção na Flandres, durante a I Grande Guerra.
Infelizmente, desentendemo-nos algumas vezes a ponto de termos guerras civis. A primeira ocorreu logo no reinado de Afonso II com as irmãs; no de D. Sancho II, com o irmão; nos reinados de D. Dinis e D. Afonso IV, entre pai e filho; no interregno de 1383-85, entre os partidários do Mestre de Avis e os de D. Leonor Teles; no reinado de D. Afonso V, com o tio D. Pedro; finalmente, em 1846/7, a Guerra da Patuleia. Mas a maior e mais sangrenta contenda interna, foi sem dúvida a guerra civil entre Liberais e Absolutistas, entre 1828-1834. Guerra que deixou marcas até hoje.Resta ainda referir as incursões monárquicas de 1912 e 1919, resultantes da proclamação da República, por meios violentos e aquela que não chegou a ser, evitada a custo, em Novembro de 1975.Tais contendas provocaram perdas (por morte ou emigração) e renovação de elites, sendo as principais as que ocorreram ao tempo da aclamação de D. João I como Rei de Portugal; na afirmação do Poder Real com D. João II; com a expulsão dos Judeus a partir de D. Manuel I; com a divisão de águas após a Restauração da Coroa Portuguesa na Casa de Bragança; com a ida da Família Real para o Brasil, em 1807; após a vitória liberal consagrada na Convenção de Évora Monte, de 1834; após o 25 de Abril de 1974, até o país estabilizar.
Num aspecto, porém, e independentemente da política ou estratégia seguida, nunca se conseguiu colocar a economia portuguesa a funcionar em termos sustentados e evitar rupturas financeiras. Isto é, nunca se conseguiu aproveitar as riquezas de momento e transformá-las em mais-valias futuras. E tal aconteceu com as especiarias do Oriente, o ouro do Brasil, as riquezas de África e, agora, com os fundos da U.E. É uma espécie de maldição que nos persegue!...Sem embargo convém, muito sucintamente, enumerar as principais razões para o que se acabou de apontar:- pobreza do território nacional europeu, com deficit em minérios e cereais;- guerras frequentes;- expulsão dos judeus, que representavam a classe empresarial mais dinâmica;- posturas económicas defensivas dos nossos mais directos concorrentes que levaram a que se enveredasse mais por uma política de transporte, do que de produção (apesar de tentativas feitas, ex. feitorias da Flandres e na Liga Hanseática);- acordos ruinosos com a Inglaterra, por fraqueza nossa de que aquela se aproveitou (ex Tratado de Metween, abertura dos portos brasileiros, etc.);- espírito religioso que favorecia a caridade em vez do lucro (ao contrário do que prevalece com reformistas, anglicanos e calvinistas);- perda de hábitos de trabalho a partir do século XVI, devido ao excesso de escravos e ao gosto da ostentação;- falhanço das duas revoluções industriais, devido às guerras civis do século XIX;- espírito de “cigarra” em vez de mentalidade de “formiga”.Houve algumas tentativas de inverter estas tendências, mas não fizeram vencimento duradouro, como é o caso da acção de D. Dinis, D. João II, do Conde da Ericeira, do Marquês de Pombal, de Fontes Pereira de Melo e Salazar. Foi até no consulado deste último que se lançou, pela primeira vez, as bases do desenvolvimento sustentado e da industrialização do País, através do I Plano de Fomento, em 1951.Finalmente, é necessário perceber e assumir que a economia não é um fim em si mesma. Ela deve servir uma Política e ser instrumento de uma Estratégia. E ainda que o sistema financeiro não deve servir só para enriquecer banqueiros, quer nacionais quer estrangeiros: deve estar ao serviço da economia e do povo que lhe confia os seus réditos.
Finalmente, merece referência o impacto doutrinário/ideológico ocorrido por três vezes na História do nosso país e que modificou sucessivamente o que denominamos de “matriz nacional original”. São tudo importações estrangeiras. São elas, as mudanças radicais ocorridas no Reinado de D. João III e que têm a ver com o estabelecimento da Inquisição e do Tribunal do Santo Ofício; o estabelecimento em Portugal da Companhia de Jesus por via do combate à Reforma (que foi liderada por teólogos portugueses e espanhóis) e, sobretudo, as alterações (com enclausuramento), efectuadas nas Ordens Militares, pelo frade castelhano, Jerónimo de Lisboa, a mando de D. João III.Cabe aqui referir, por causa da sua importância, que existem quatro alturas chave relativamente às Ordens Militares: a decisão do rei D. Dinis em as nacionalizar - a fim de evitar que pudessem ter Grão-Mestre estrangeiro; a acção de D. João I em as tornar reais - pondo cada um dos seus filhos à frente de cada uma; a decisão, ainda mal estudada de as reformar, obrigando à clausura, por ordem de D. João III - isto é tirando-lhes o Poder; a sua extinção por D. Pedro IV, em 1834; finalmente, a República tornou-as honoríficas.A matriz portuguesa, que era sobretudo cistercense, templária e franciscana, passou para o predomínio dos Dominicanos, que dominavam a Inquisição; e da Companhia de Jesus, aríete da Contra Reforma e da futura evangelização. O culto do Espírito Santo que era uma espécie de religião peculiar dos portugueses, desde meados do século XIII - e que não era propriamente católica, apostólica, romana - foi jugulada e quase desapareceu. A herança da dinastia de Avis foi, aparentemente, mudada e as capelas imperfeitas do Mosteiro da Batalha - que ficaram assim até hoje - são disso, talvez, o exemplo mais eloquente.A segunda grande mudança, digamos assim, telúrico-filosófica, foi consequência das invasões francesas. Mais profundo do que as mortes e destruições causadas - cujo grau nunca foi igualado, nem antes nem depois - por continuado no tempo, foram os ideais da Revolução Francesa que aqui medraram, dando origem ao liberalismo imposto pela força das armas, primeiro em 1820 e depois definitivamente, em 1834, após ser vencida a oposição da grande maioria do povo português, indubitavelmente amante do Trono e do Altar. Esta mudança que teve na extinção das Ordens Religiosas e na Reforma Administrativa de Mouzinho da Silveira, os seus esteios mais importantes, terminou, após a implantação da República, com a imposição da chamada democracia directa. A instabilidade que este processo acarretou demorou cerca de um século e explica, em grande parte, os 48 anos do Estado Novo.A terceira mudança de matriz ocorreu na sequência da revolução em que o golpe de Estado ocorrido a 25 de Abril de 1974, se transformou.Foi a vez de irromperem em força os ideais internacionalistas, que tinham estado confinados, até 1926, aos diversos ritos maçónicos, mas que agora se estendem a novas organizações de Poder não democrático, com grandes ramificações no âmbito do sistema financeiro internacional. Inundou-se ainda a sociedade portuguesa de ideais libertários oriundos do Maio de 68, em França, habilmente explorados por forças laicistas e capitalistas apátridas.Estas forças aliaram-se, num momento, à maioria do povo português na rejeição do totalitarismo marxista a cujos fundamentos, ele é profundamente adverso, o que culminou no 25 de Novembro de 1975.De tudo isto resultou a tentativa de implantação, em curso, do relativismo moral e da liquidação dos esteios identitários da Nação Portuguesa.A situação é muito grave, pois ela é feita a partir de dentro do próprio Estado, o que nos parece ser a primeira vez que acontece em toda a nossa História!
Em tudo o que dissermos, existe um factor primordial de base, na geopolítica, para além da geografia - presente em tudo o que dissemos - e que é o carácter do Povo.Nós somos portugueses e não outros. Temos uma idiossincrasia própria que muda muito lentamente, quando muda. Isto é uma realidade que todos os líderes nacionais, políticos, religiosos, militares, empresariais, etc., devem ter à cabeça nas análises que façam.É com a nossa gente que o país se faz e não com outra. Por isso é fundamental preparar e escolher elites que tenham isto em mente e, já agora, dado que são as leis que regem a sociedade “devem-se fazer as leis para os respectivos povos, pela simples razão de que não se podem fazer povos, para as leis”.
(a) A sua localização no extremo SW do Continente Europeu e sua configuração rectangular, com uma largura média de 180 Km e um comprimento de cerca de 550 Km;(b) A existência de bacias hidrográficas importantes e de alguns dos melhores portos da península ibérica, os quais proporcionam fácil acesso aos eixos de penetração mais transitáveis, para a meseta ibérica e, através desta, à França;(c) A existência de três regiões homogéneas:- a faixa litoral centro norte, bastante urbanizada e apresentando uma vegetação frequentemente densa, maioritariamente constituída por planície e colina;- a região norte interior, montanhosa;- a região sul, de planície;(d) A existência de uma boa rede de comunicações viárias tanto no sentido norte/sul, como no sentido leste/oeste, dispondo ainda de um bom conjunto de infra-estruturas aeronáuticas;(e) A concentração dos principais centros políticos, urbanos e económico-industriais na orla marítima, numa faixa de 50km, que vai de Braga a Setúbal;(f) A acessibilidade por mar e a facilidade de acesso através da fronteira terrestre, principalmente nas zonas centro e sul do território.
(a) A reduzida superfície das ilhas, nomeadamente Porto Santo, onde se faz sentir falta de água;(b) O relevo muito acidentado e irregular da ilha da Madeira, com uma costa escarpada e sem praias;(c) Boas infra-estruturas aeronáuticas em ambas as ilhas;(d) Um porto com algumas capacidades, no Funchal;
(a) A pequena superfície das ilhas, o seu relevo acentuado e a reduzida acessibilidade por mar;(b) Boas infra-estruturas aeronáuticas, com algumas limitações nas ilhas das Flores e do Corvo e razoáveis instalações portuárias.
Considera-se espaço interterritorial o espaço marítimo e aéreo compreendido entre as parcelas do território nacional.
(a) O TN;(b) A zona económica exclusiva;(c) O espaço interterritorial;(d) O espaço aéreo sob responsabilidade nacional.
- As que decorrem das virtualidades da nossa posição geoestratégica, fundamental para acções de reforço transatlântico, para apoio a operações na bacia do Mediterrâneo e Médio Oriente e, ainda, para o controlo de várias linhas de comunicação aéreas e marítimas vitais para o abastecimento da Europa;- A existência de fronteiras terrestres com apenas um país permite a consideração de uma só ameaça terrestre directa;- A existência de três parcelas de território - continental e insular - confere profundidade ao conjunto e permite aumentar a sobrevivência do Estado, pela possibilidade de transferência atempada dos centros de decisão;
- Falta de profundidade defensiva de cada uma das parcelas do território nacional para operações convencionais terrestres;- Descontinuidade territorial, pelas dificuldades que levanta para a defesa do território e para a vigilância e controlo do espaço inter-territorial;- Situação periférica resultante da nossa posição geográfica em relação à Europa, o que dificulta o acesso às áreas mais ricas do continente e consequente tendência para a dependência em relação ao espaço espanhol;- A existência de fronteiras terrestres com um país apenas, dada a diferença de potencial estratégico existente acarretar diminuição de capacidade negocial e impedir qualquer via alternativa terrestre com o centro da Europa.- A proximidade com o norte de África por via da instabilidade ali existente e potencial.- A inserção de Portugal numa área onde se podem sobrepor interesses de países terceiros pode conduzir a que o território português, ou parte do mesmo, seja arrastado para conflitos alheios ao interesse nacional.
- a vivência de uma História partilhada durante quase nove séculos ao longo da qual há a afirmação permanente de uma forte identidade nacional;- a coesão nacional, resultante da homogeneidade cultural da população, da ausência de conflitos rácicos, étnicos ou religiosos;- A existência de importantes comunidades de emigrantes, no sentido em que favorecem o prestígio e influência de Portugal junto dos países de acolhimento constituem fonte importante de divisas e atenuam o desemprego;- Influência no mundo por via do património histórico, cultural e linguístico resultante da vocação universalista do povo português.- Boas capacidades de adaptação, de trabalho e de combate do povo português, desde que devidamente liderado.
- Desertificação humana de largas regiões do interior do continente, o que impede um desenvolvimento global equilibrado e provoca grandes assimetrias regionais;- Degradação da consciência nacional em alguns sectores da sociedade portuguesa, relativa à importância da defesa nacional e do papel das Forças Armadas;- A existência de importantes colónias de emigrantes naquilo que podem prejudicar a capacidade produtiva e de mobilização nacional e produzir o envelhecimento da população e a desvirtualização dos valores nacionais;- Dificuldades em assegurar, face à sua dimensão e dispersão, a protecção das comunidades portuguesas espalhados pelo mundo, no caso de ameaças à sua segurança.- Diminuição da taxa de natalidade e envelhecimento da população;- Limitada capacidade de mobilização.
- O sistema democrático do tipo ocidental tem concitado uma aceitação maioritária e estável, contribuindo para a paz civil e a integração em organismos internacionais e de grande relevância geopolítica e geoestratégica;- A participação em organismos internacionais de segurança colectiva e “fora” internacionais mais importantes, nomeadamente a NATO; ONU, CSCE, UE, actores influentes no desenvolvimento económico e estabilidade política internacional;- A aceitação pública de que as Forças Armadas, a Magistratura e a Diplomacia servem a Nação e devem ter um carácter suprapartidário, não se devendo envolver directamente na luta política.
- A participação em organismos internacionais de união político/económica e/ou de segurança colectiva, potencia uma alienação e/ou diluição de poderes soberanos e subalternização de interesses nacionais;- Alguma liberalização excessiva no quadro legislativo existente, porventura desadequado da realidade portuguesa e da maneira de ser maioritário da população, poderá pôr em causa a autoridade do Estado, a harmonia social e a prevenção da criminalidade;- Existência de uma forte, quiçá excessiva, partidarização da vida social e económica, o que afecta a coesão da população e a obtenção de consensos;- Administração pública pouco eficiente, pesada e burocrática, com reflexos negativos na confiança das populações;- Preconceitos contra as actividades de serviços de informações, prejudicando a obtenção, tratamento e exploração de informações, aspecto fundamental para a defesa e segurança nacionais;- Baixa prioridade atribuída à defesa nacional, com reflexos evidentes no orçamento do Estado;- Aparelho do Estado ainda insuficientemente preparado para executar um conceito global de defesa e segurança nacionais;- Existência de ideias autonomistas e regionalistas que poderão vir a ser lesivas da coesão e unidade nacionais.
- Possibilidade institucional de controlo estatal de alguns sectores de interesse estratégico fundamental;- Existência de significativas reservas de ouro;- Mão-de-obra comparativamente barata (a nivel ocidental);- Possibilidade de melhorar a exploração dos recursos do mar;- Elevada capacidade instalada de refinação de ramas de petróleo;- Existência de algumas reservas de minerais, nomeadamente urânio, cobre, volfrâmio, chumbo e prata;- Energia hídrica e outras não poluentes, ainda não esgotadas;- Existência de mercados potenciais nos novos países de expressão portuguesa.
- Cerca de um quarto, ou mais, das instituições bancárias estarem já em mãos estrangeiras;- Grande défice da balança comercial;- Dívida externa muito significativa;- Assimetria geográfica das estruturas produtivas;- Baixo nível de produtividade e de competitividade;- Graves carências na estrutura do sector agrícola, com grande insuficiência na produção alimentar e bens de consumo que já ultrapassa os 60% das necessidades;- Sector industrial com pequena dimensão para concorrer no mercado internacional onde Portugal se movimenta;- Quase total dependência energética do exterior, com especial incidência nas ramas petrolíferas;- Grande dependência do exterior no que respeita a transportes marítimos e aéreos, o que condiciona o nosso comércio externo e mesmo interno;- Níveis inadequados de reservas estratégicas, com excepção do crude;- A quase inexistência de logística de produção com interesse para a defesa;- Dificuldades estruturais e de mentalidade para fazer face às evoluções tecnológicas e de mercado.
- Existência de razoável capacidade em meios humanos capazes de desenvolver actividades científicas avançadas e para operar meios sofisticados;- Existência de algumas infra-estruturas de base e acesso a base de dados internacionais;- Participação portuguesa em várias organizações internacionais, o que permite uma assinalável variedade de opções, além do acesso ao intercâmbio de informação e à participação em projectos bi ou multilaterais;- As capacidades já existentes permitem penetrar em áreas de investigação e desenvolvimento de países menos evoluídos, em especial nos países de expressão portuguesa;(b) Vulnerabilidades- Fraco desenvolvimento da investigação e sua aplicação prática;- Grande dependência do exterior no que respeita a alta tecnologia e tecnologia de ponta;- Insuficiente capacidade de manutenção dos meios sofisticados que operamos;- Sistemática falta de capacidade para adequar métodos, materiais e equipamento às nossas necessidades e projectos.
- Um forte apego à independência, sobretudo nas classes de mais baixo nível económico e cultural;- A acção formadora e enformadora das grandes instituições nacionais, nomeadamente a Igreja, a Universidade e as Forças Armadas;- A existência de um número considerável de cidadãos com preparação técnico-cultural elevada;- As capacidades já existentes permitem penetrar em áreas de investigação e desenvolvimento de países menos evoluídos, em especial nos países de expressão portuguesa.
- Baixo nível sócio-económico e cultural em grande parte da população;- Deficiente funcionamento do sistema educativo, gerador de baixos índices culturais, de competência profissional, consciência cívica e amor pátrio;- Deficiente organização do sistema de saúde e percentagem elevada de cidadãos deficientes;- Carência de chefias, mau rendimento do trabalho e dificuldades em desempenhar actividades de alto tecnicismo;- Afrouxamento dos laços familiares tradicionais;- Existência de fontes de tensão social potencial, como sejam o aumento da criminalidade, narcotráfico, corrupção, desemprego e existência de manchas importantes de pobreza;- Propensão para o individualismo e alastramento das ideias materialistas, hedonistas e egoístas na sociedade portuguesa;- Deficiente informação pública por parte de alguns órgãos da comunicação social relativamente aos aspectos da defesa e segurança nacionais;- Alastramento do sentimento anti-militar, que contribui para o enfraquecimento do patriotismo e para dificuldades no recrutamento de pessoal para as Forças Armadas;- Deficiente entrosamento da “cultura do mérito”, na sociedade;- Relações de autoridade atenuadas e desequilibradas, no meio social e politico;- Sensibilidade da população a manipulações demagógicas, embora de resultados não duradouros;- Ressurgimento, embora pouco generalizado de ideias “iberistas” em épocas de crise que ponham em questão a identidade nacional;- Relativismo moral, em ascensão;- Predominância dos “Direitos”face aos “Deveres”.
- Instituição Militar enraizada na organização do Estado, no subconsciente da Nação e na sua auto-imagem, alicerçada por muitos séculos de vivência e interdependência comum. A História de Portugal é, em grande parte, a História das suas Forças Armadas;- O número de infra-estruturas aeronáuticas, portuárias e logísticas e de eventual estacionamento de meios, conferem a Portugal significativo valor estratégico/militar;- A existência de um número elevado de quadros competentes, permite perspectivar uma adequada exploração dos meios, a possibilidade de expansão do dispositivo e sistema de forças e a correcta condução das operações militares;- O estatuto e organização das forças de segurança, nomeadamente a GNR, permitem reforçar a capacidade de defesa militar do País;- A participação de Portugal na NATO e na UE permite, em termos militares, colher benefícios no campo doutrinário, técnico-científico, táctico e financeiro, aumentando, em simultâneo, a capacidade de dissuasão;- A especial apetência do homem português para a luta não convencional (guerrilha) pode ser, se devidamente explorada; um factor dissuasor importante;- O número de quadros, equipamentos e conhecimento, existentes, relativamente aos países de expressão portuguesa, permitem a Portugal dispensar substancial ajuda técnico-militar às Forças Armadas desses países.
- Contínuo decréscimo dos orçamentos (em termos reais), destinados à defesa militar do País;- Menor poder global relativo, face à Espanha;- Existência de um aparelho militar caracterizado por baixos índices de modernidade e com uma panóplia de sistemas de armas muito limitada para satisfazer a defesa própria mínima para fazer face às ameaças e assegurar uma adequada liberdade de acção externa;- Dotação de meios e capacidades de sustentação muito abaixo dos padrões existentes nos restantes membros dos sistemas colectivos de segurança de que fazemos parte;- Capacidade muito reduzida de presença e vigilância no espaço interterritorial, de protecção das linhas de comunicações e de execução de acções de projecção de força e sua sustentação em qualquer área do espaço estratégico de interesse nacional;- Lei do serviço militar desajustada em relação à realidade portuguesa e às necessidades das Forças Armadas;- Fraca participação, em termos práticos, nas organizações de segurança internacional de que somos membros (NATO+UE);- Inexistência de um sistema de mobilização e requisição que possa aumentar, quando necessário, as actuais capacidades militares;- Perda de dignificação das Forças Armadas em termos sociais;- Diminuição efectiva do “moral” dos quadros;- Incompatibilidade entre as missões atribuídas e os meios disponíveis;- Quase total dependência do exterior no que respeita a equipamentos para a defesa.
(1) o mais importante espaço estratégico é aquele que é definido pelo território do Continente e os Arquipélagos da Madeira e Açores, bem como o espaço aéreo e marítimo entre eles o que configura o que já é conhecido por triângulo estratégico nacional português. Associados a estes espaços devemos considerar as FIR de Lisboa e Santa Maria - o que obriga à existência de sistemas efectivos de controle do espaço aéreo e serviços de busca e salvamento (SAR).Se Portugal conseguir a extensão da Plataforma Continental - o que representaria o ganho estratégico mais importante desde meados do século XVI! - além da enorme quantidade de massa oceânica e subaquática para onde nos podemos expandir, a mesma permite constituir um contínuo de EEIN, entre os três “vértices do triângulo” sem qualquer solução de continuidade[7].É por este espaço que terão de passar as ameaças directas ao TN; por onde passam a totalidade das linhas de comunicação aérea de e para o nosso país e por onde chegam - via marítima - 90% dos abastecimentos de que carecemos. O cruzamento das linhas de comunicação marítima para o tráfego internacional também é muito importante, estimando-se que só ao longo da costa do continente circulem diariamente cerca de 500 navios.Dada a forma arquipelágica do território nacional, o mar tem que ser encarado com uma “estrada ou ponte” que os une e não como um obstáculo que os separa.Relativamente a este enorme espaço é bom reter sempre, que o EEIN dos EUA se projecta no Atlântico Norte e Central e se estende até aos Açores - considerados até, como uma defesa avançada daquela super potência; assim como os EEIN da França e da Espanha se estendem pela Península Ibérica e se projectam no mar até àquele arquipélago português.A Grã-Bretanha - nossa secular aliada - como grande potência naval que ainda é, também considera toda esta área marítima e aérea de especial interesse para a sua segurança, e utilizará todo o seu poder de modo a que nenhuma parte do território português seja influenciado ou ocupado por uma potência que lhe seja hostil.Finalmente, a Espanha tem uma apetência secular (de sempre…), em querer marcar presença no mar português (quando não ocupar!), estando em excelentes condições para preencher, de imediato, qualquer vazio estratégico que se lhe proporcione.É deste EEIN, que devemos considerar de espaço vital, que poderemos projectar outros espaços que sejam do interesse de Portugal em marcar presença, projectar interesses ou estar particularmente vigilante.
(2) O EEIN que aparece evidente, de seguida, é aquele que poderemos designar de “regional” e abrange a restante Península Ibérica, o norte de África e se projecta em todo o Mediterrâneo Ocidental até ao “meridiano” definido pela Península Italiana, a Sicília, Malta e o norte da Tunísia[8].O Mediterrâneo constitui um exemplo de uma área geoestratégica que nunca se identificou como área geopolítica, mesmo quando ali imperou a “pax romana”. A história do Mediterrâneo foi e ainda é, uma história de conflitos. Nunca houve no Mediterrâneo homogeneidade de culturas, nunca se manifestaram objectivos políticos comuns, nunca houve nada que unisse os povos desta região, a não ser a força do mar comum que os atrai ao litoral, que favoreceu o conhecimento mútuo, mas que não os amalgamou, não os confundiu nem diluiu e, no entanto, foi berço de civilizações.Desde a “pax romana” só os ingleses conseguiram, durante 150 anos, depois de Trafalgar, impor uma estratégia naval vitoriosa quase sem perturbar politicamente os países das suas margens. Esta estratégia foi baseada em três pontos de apoio: Gibraltar, Malta e Chipre; o protectorado do Egipto foi a excepção a esta regra.O Mediterrâneo estende-se de Gibraltar à entrada leste do Mar Negro, numa extensão de 3.800 km. A evaporação é cerca de três vezes superior à pluviosidade e ao caudal dos rios que nele desaguam. É do Atlântico e do Mar Negro que vem o recompletamento das suas águas. A bacia ocidental é quase fechada a leste com a Sicília, a Ilha de Malta e a Ilha de Pantelleria (da Sicília à Tunísia distam cerca de 143 km). O Mediterrâneo é um “mar entre terras”. O conjunto é envolvido por cadeias montanhosas que fazem a separação com o interior da Europa, a norte, com linhas de infiltração bem marcadas e, a sul, com o deserto. No Mediterrâneo existem 15 estreitos de importância internacional, dos quais os mais importantes são Gibraltar, o Canal do Suez e o Bósforo.Para o nosso trabalho interessa-nos caracterizar um pouco melhor o primeiro: o Estreito de Gibraltar tem 48 km de comprimento e 13 de largura e a sua profundidade chega aos 150 metros. Na sequência da guerra da Sucessão de Espanha, a cidade que lhe dá o nome, ficou na posse da Inglaterra, pelo Tratado de Utrech, de 1713. O Estreito de Gibraltar é regulado pelo princípio da liberdade de navegação.A bacia do mediterrâneo compreende cerca de vinte países ribeirinhos onde se verifica uma grande diversidade de atitudes, crenças, poderes e problemas. São diferentes nações, religiões, línguas, estruturas sociais e políticas que se confrontam desde tempos ancestrais. Existe uma “cultura” de confronto, nomeadamente no norte de África, região pontuada por inúmeros conflitos. A União do Magrebe Árabe (UMA), firmada pelo Tratado de Marraquexe, de 1989, entre Marrocos, Mauritânia, Argélia, Tunísia e Líbia, constitui uma tentativa para o entendimento entre países. Contudo, nunca funcionou na prática. Aparentemente estes países ainda não estão maduros para um tal entendimento, não existe visão nem capacidade de gestão comum de crises.As assimetrias entre países da orla Norte e os da orla Sul são muito grandes, em todos os campos e todos os indicadores são favoráveis à parte europeia.A demografia nos países do norte de África é enorme comparada com os vizinhos do Norte e tal facto está a causar graves problemas de desemprego, de pressão urbanística, de gestão da água e produção de alimentos e a uma tendência fortíssima para a emigração legal ou não.Este fosso económico e social é tido pelas populações do sul como injustiça que é necessário reparar.No Mediterrâneo Ocidental a Espanha, a França e a Itália, assumem-se como potências militares, fazendo-se sentir ainda a presença naval americana (apesar da sexta esquadra ter abandonado a região) e a força naval da NATO; a presença naval russa desapareceu quase por completo após a queda do muro de Berlim.No âmbito da UEO, entretanto desaparecida, foram criadas, em 1995, duas forças militares combinadas de que Portugal faz parte juntamente com os outros três países europeus acima mencionados: a Euroforce, com sede em Florença e a Euromarforce, com sede em Barcelona.Devemos lembrar ainda que, para os estrategas clássicos, o território português faz parte do “Rimland” faixa a que Spykman também chamou área de decisão e que circunda o “Heartland”, fazendo de área tampão entre a potência continental e a potência marítima.Em súmula o Mediterrâneo Ocidental é de grande interesse estratégico para Portugal:- pela sua proximidade e complementaridade;- pela existência do Estreito de Gibraltar, um dos principais choke points do planeta;- pela necessidade de preservar as comunicações aéreas e marítimas;- pela eventualidade de nele se constituírem riscos e ameaças ao interesse nacional;- pela importância do factor económico.Situação actual: ameaças e riscosConcentrados que estamos na parte ocidental do Mediterrâneo não podemos descurar o facto de a sua segurança ser afectada, em maior ou menor grau, pelos acontecimentos em toda a sua bacia.De um modo geral podemos considerar como afectando a segurança em toda a área, os problemas derivados:- das relações entre os países árabes e Israel e a situação na Palestina;- dos conflitos entre a Grécia e a Turquia;- do conflito entre a Grécia e a Albânia e entre aquela e a Macedónia;- do precipitado reconhecimento à independência do Kosovo;- da desintegração da ex-Jugoslávia;- da situação interna dos países árabes;- da situação no antigo Sahara espanhol;- das reivindicações de Marrocos sobre Ceuta, Melilla e sobre a República Sahauri;- das reivindicações da Espanha relativamente a Gibraltar.Não se considera existir nenhuma ameaça directa militar a qualquer país europeu, dado o desnível do potencial militar existente, favorável aos países da margem Norte e ao facto dos exércitos dos países do Sul terem estruturas arcaicas e estarem mais virados para a segurança interna e para os conflitos fronteiriços com vizinhos.Sem embargo, existem vários riscos que, a não serem confinados e/ou a não serem eliminadas as causas que lhe dão origem, podem degenerar em situações de enorme gravidade destacando-se:- a proliferação de armamento, nomeadamente armas de destruição maciça;- o subdesenvolvimento económico e assimetrias sociais;- as disputas nacionalistas, de que se destacam o conflito entre a Espanha e a Grã-Bretanha sobre Gibraltar e o conflito sobre Ceuta e Melilla, entre a Espanha e Marrocos;- as questões de autonomia de regime político, como são os casos do Sahara espanhol; a situação na Córsega e o terrorismo na Argélia derivada da ilegalização da frente islâmica de salvação (FIS);- os conflitos de delimitação de fronteiras entre a Argélia e Marrocos e a Argélia e a Tunísia;- a demografia galopante;- os fluxos de emigrantes clandestinos;- o fundamentalismo religioso;- o terrorismo internacional;- o narcotráfico e outros tipos de contrabando;- eventuais rupturas no fluxo energético do petróleo e gás natural da Argélia;- a gestão dos recursos aquíferos;- eventuais reivindicações relativamente aos arquipélagos próximos do norte de África (Baleares, Canárias e Madeira);- questões relativas a pescas.Por último, o carácter dos regimes políticos no Norte de África e Médio Oriente, normalmente baseados na autoridade forte de um líder e respectivos apoios, tornam extremamente aleatória a sua sucessão.A evolução da política mundial determinou que, nesta parte do mundo, sobretudo a seguir à queda do comunismo, a UE e até a NATO passaram a prestar mais atenção ao que aqui se passava. Os EUA, preocupados fundamentalmente com o curso dos eventos no Médio Oriente, têm tentado que os problemas da bacia do mediterrâneo passem a ser geridos pelos europeus, sem embargo da sua intervenção fundamental na Bósnia e Kosovo e na quarentena que impuseram ao regime líbio (em fase de esbatimento), ou até pontual, como se verificou há poucos anos no conflito entre a Espanha e Marrocos sobre o ilhéu de Perijil.A NATO enviou, em 1989, a força naval para o mediterrâneo (Stanavformed) e mais tarde, em 1997 formou um grupo de trabalho, o “Mediterranian Cooperation Group” sobretudo preocupado com questões de defesa e segurança e que promove uma a duas reuniões anuais com os países do “diálogo do mediterrâneo”. Este grupo tem feito alguns avanços em termos de busca e salvamento, gestão de crises, protecção civil em seminários diversos, tendo por objectivo primeiro o estabelecimento de um clima de confiança mútua, sabendo-se que por detrás de tudo se encontra subjacente o conflito israelo-árabe.A UEO antes de ser extinta, e por iniciativa da França, criou a Euroforce e Euromarforce (1995), já citadas e estabeleceu diálogo a nível de embaixadores, em Bruxelas, com o Egipto, a Argélia, a Tunísia, Marrocos e Mauritânia e manteve a funcionar um grupo de trabalho para o Mediterrâneo. Com o fim da UEO, as iniciativas em execução passaram para outros órgãos da UE.A nível da União Europeia promoveram-se os trabalhos da Conferência para a Segurança e Cooperação no Mediterrâneo (CSCM), estabeleceu-se o diálogo 5+5 (entre Portugal, França, Espanha, Itália e Malta, com Marrocos, Argélia, Tunísia, Líbia e Mauritânia) e, após a declaração de Barcelona, de 28 de Novembro de 1995, que visava criar uma zona de comércio livre, em 2010 e em cujo processo participam 15 estados da União Europeia, 12 da margem Sul do Mediterrâneo e 11 observadores.Esta ideia, da então presidência espanhola da UE, visa criar as condições nos países do Norte de África que permitam um substancial desenvolvimento económico e social de modo a diminuir as tensões existentes e a minorar os riscos para os países da UE (isto é, visa, fundamentalmente deter os fluxos migratórios).Por seu turno a OSCE também tem tratado, embora sem resultados visíveis, a problemática mediterrânica.No meio de tudo isto importa reter que os países europeus pensam mais em relação ao Magreb, em termos de defesa e segurança enquanto os países do Sul pretendem, sobretudo, o co-desenvolvimento e aspiram a um estatuto de igualdade e não de paternalismo, ao passo que vêem os desenvolvimentos militares a norte como ameaça a si próprios.Ora estes são dois níveis de entendimento muito diferentes, sendo assaz difícil obter-se acordos ou confiança mútua, enquanto tal situação se mantiver.
Não é apenas, porém, no âmbito da Segurança e Defesa que este EEIN “regional”, deve merecer a atenção portuguesa: no âmbito político, sobretudo relativamente ao despontar de ideias iberistas de ambos ao lados da fronteira, bem como na manutenção do espírito de concórdia com o Magreb, onde se deve destacar a preservação do notável Tratado de Paz com Marrocos, efectuado em 1774; no âmbito cultural, entre os nossos vizinhos e os países do Norte de África, nomeadamente Marrocos, não tanto por afinidade, mas por laços históricos; e no campo económico/financeiro, onde se deve cuidar bem dos investimentos na Península onde a fronteira - por via da UE - passou a ser muito permeável e a melhoria da balança comercial entre Portugal e Marrocos, Argélia e Tunísia. Estes países e ainda outros (Líbia, Mauritânia e Sahara) são mercados ao alcance dos produtos e da tecnologia portuguesas, e representam áreas de interesse piscatório, na parte atlântica.
(3) O EEIN seguinte é aquele que deriva da transposição de um dos vértices do triângulo estratégico português - o Arquipélago da Madeira - para o Arquipélago de Cabo Verde.Cabo Verde seria, então, o vértice de um outro triângulo estratégico cujos pontos restantes seriam Brasília e Luanda.Estes enormes EEIN configuram espaços de projecção de poder, visam estabelecer uma área de segurança no Atlântico Sul e, ainda, fornecer um esteio político-estratégico à CPLP.Os oceanos cobrem 70% do planeta, e é de 70, também, a percentagem do tráfego comercial mundial, que se faz através deles. E a população do mundo habita, na mesma ordem de grandeza, junto ao mar e até 30 milhas para o interior.Os oceanos são formados por água e sais minerais, são extensos, são profundos, opacos e dinâmicos. São fonte de riqueza mineral, animal, vegetal e energética e representam “auto estradas” de comunicação e transporte. O mar é fonte de muitas indústrias e o Poder marítimo é uma componente essencial do Poder Nacional.O Oceano Atlântico ocupa cerca de um quarto da superfície líquida do planeta, com 76.762 milhões de Km2. [9] É o segundo maior oceano da terra a seguir ao Pacífico e é o único que liga o Pólo Norte à Antárctida.O Atlântico tem seis acessos, três a leste, três a oeste, sendo dois a norte, dois ao centro e dois a sul.A passagem do Noroeste é feita pelo Norte do Canadá; a do Nordeste é muito vasta, possuindo dois estrangulamentos: um na zona da Gronelândia, Islândia e Grã-Bretanha; o outro no conjunto Gronelândia, Islândia e Noruega.A sul, a ligação à Antárctida é muito aberta, já que a distância entre o Cabo da Boa Esperança e o Cabo Horn é de 9.000 milhas.A ligação ao Índico é também muito extensa - cerca de 2.100 milhas (entre 35º Sul e 70º Sul), o elo com o Pacífico realiza-se pela passagem Drake, entre o Cabo Horn e o arquipélago das Shetland do Sul e pelo Estreito de Magalhães. Os acessos centrais são representados pelo Canal do Panamá e pelo Estreito de Gibraltar.A menos largura do Atlântico (1.560 milhas - cerca de 3.000 Km), verifica-se entre Natal (Brasil) e Freetown (Serra Leoa), o que representa uma espécie de “equador geopolítico” que separa o Atlântico Norte do Sul. A sua largura máxima situa-se no paralelo 60, cerca de 6.500 Km. A parte norte possui um conjunto de ilhas muito mais importantes do que a zona sul. Cabo Verde situa-se cerca de 600 milhas a norte do “equador geopolítico” e a 300 do continente africano.A Sul apenas merecem menção a ilha inglesa de Ascensão (8º Sul), que tem uma base aérea, uma estação de rastreio de mísseis dos EUA e um centro retransmisor de comunicações, e o Arquipélago das Falkland igualmente inglês, muito perto do Cabo Horn. Outras ilhas são Fernando de Noronha (Br), Santa Helena (UK), Tristão da Cunha (UK), Sandwich e Geórgia do Sul (UK). S. Tomé e Príncipe fica no equador, muito perto do Golfo da Guiné e a sua posição está a ser valorizada por causa da exploração de petróleo e gás na zona.No Atlântico Sul as rotas mais importantes vão na direcção norte/sul, prolongando-se depois para o Atlântico Norte - Cabo da Boa Esperança-América Central e Norte; Cabo da Boa Esperança-Europa, Cabo Horn-Europa; Cabo Horn-América Central e Norte.Cabo Verde fica, assim, no cruzamento das principais rotas marítimas do Atlântico.Nos últimos anos tem-se intensificado uma rota marítima entre o Brasil e Angola/Nigéria/S. Tomé.Duas rotas secundárias - muito poucos navios a utilizam - vão do Cabo da Boa Esperança ao Rio da Prata (3.720 milhas) e Cabo da Boa Esperança ao Rio de Janeiro (3.270 milhas)[10].Complementares a este espaço devemos considerar e sobrepor as FIR do Sal, do Atlântico, Recife, Brasília, Curitiba e Luanda; bem como as ZEE de Cabo Verde, Guiné-Bissau, Brasil, S. Tomé e Príncipe e Angola.
O Atlântico Sul foi o oceano mais importante para o comércio mundial, entre a Europa, África e América Latina, entre os séculos XVII e XVIII, depois das grandes navegações e descobertas, em grande parte por causa do tráfico negreiro e o comércio dos produtos tropicais. O Atlântico Norte só suplantou esta importância no século XX, com o declino do comércio entre a África e a América do Sul e aumenta muitíssimo as trocas entre a Europa e a América do Norte.Entre os séculos XVI e XVIII, todo o espaço do Atlântico Sul serviu para o transporte de mercadorias entre continentes, entre as quais ouro e prata, o que atraia inúmeros ataques de piratas e corsários. Desde o século XVI e XIX, houve muitos conflitos por causa do acesso a colónias e territórios ultramarinos, bem como a guerras de ocupação e de libertação.Durante a I Guerra Mundial o Atlântico Sul foi um palco secundário, sem embargo de Portugal e o Brasil terem participado no conflito. Apenas uma batalha significativa ocorreu, em Dez. de 1914, perto das Malvinas. Em África houve conflitos sobretudo envolvendo as antigas colónias alemãs.Já durante o segundo conflito mundial o Atlântico Sul foi palco de intensa campanha naval entre os Aliados e potências do Eixo, onde se destaca a batalha onde foi afundado o couraçado alemão “Graf Spee”, perto do litoral do Uruguai.Quando se entrou na “Guerra Fria” a importância estratégica do Atlântico Sul decresceu muito relativamente à sua parte Norte, devido à confrontação entre os EUA e a URSS. Esta situação começou a mudar após o choque petrolífero, de 1973, quando este oceano passa a ser uma das rotas mais importantes para o transporte de petróleo, no mundo. Esta relevância aumentou com a guerra das Malvinas, em 1982; a guerra civil em Angola, de 1975 a 1989 e a guerra da independência da Namíbia. Sobretudo a guerra das Malvinas fez mudar profundamente a perspectiva da ameaça, nos países da região. Na sequencia o Brasil impulsionou a criação de uma “Zona de Paz e Cooperação do Atlântico Sul”, que ocorreu em 1986.Presentemente a área de conflito potencial mais perigosa é o Golfo da Guiné, onde se desenvolvem disputas sobre águas territoriais e zonas económicas exclusivas, sobretudo por causa das reservas de hidrocarburetos, ao passo que a pirataria tende aumentar. Salienta-se ainda que a fronteira de conflito religioso com o mundo muçulmano já chega ao paralelo que corta a Nigéria ao meio.
Sendo o estabelecimento deste EIEN um objectivo alargado à CPLP, deve passar a contemplar todas as restantes áreas de intervenção estratégica, ou seja a diplomacia, a economia/finanças, a cultura, a defesa e o âmbito psicológico.O motor doutrinário de toda esta concepção deve ser Portugal; o primús inter pares, político só poderá ser o Brasil e as alavancas económico/financeiras serão repartidas entre o Brasil e Angola com o contributo de Portugal (a que se deve juntar a área tecnológica), pois são os únicos países com potencial para tal. Moçambique será, obviamente, um forte candidato a juntar-se a este grupo logo que o seu desenvolvimento o permita.Uma correcta evolução desta estratégia - cujo desenvolvimento não cabe no âmbito deste trabalho - permitirá a Portugal aumentar o seu peso negocial com a UE (permitirá ser até, uma alternativa futura, caso a evolução da UE, passe a ser contrária aos interesses nacionais!), a NATO, os EUA - que passaram a olhar para o Atlântico Sul e para África com crescente prioridade - ao passo que aumentaria a importância relativa dentro da comunidade ibero-americana. Por outro lado, seria do interesse do Brasil, pois o favoreceria no âmbito do MercoSul e os ajudaria a defender de eventuais cobiças norte americanas, nomeadamente quanto à Amazónia, e quanto à “concorrência” relativamente ao programa espacial brasileiro. Isto só para abordar toda a questão pela rama[11],
(4) Complementar a estes dois EEIN, haverá um outro definido por um “rectângulo” que cobrirá todo o território de Moçambique e se projectaria no mar, até englobar a Ilha de Reunião e o Arquipélago das Seicheles.Este espaço seria integrado, outrossim, no âmbito da CPLP[12].O fulcro de todo este espaço é o Canal de Moçambique, por onde “afunila” a grande maioria do tráfego marítimo que se dirige, de e para, o Cabo da Boa Esperança, estimada numa média anual de 23.000 navios, 97% dos quais pertence ao mundo ocidental e por onde passa cerca de 73% do petróleo importado pelos países da NATO[13]. Este facto é tão mais importante quando pensarmos que o Canal do Suez - inaugurado em 1869, e com 163 Km de comprimento - já esteve encerrado à navegação, por motivo de guerra, entre 1956 e 1958, e de 1967 a 1975 (e pode ser sabotado...).Para além disso no Canal do Suez não passam todos os tipos de navios, nem petroleiros com tonelagem superior a 250.000 toneladas.Por outro lado no Cone Sul de África concentra-se algumas das mais importantes jazidas de matérias-primas, cujo valor estratégico assenta mais no controlo do seu abastecimento do que na posse dos recursos naturais (a RAS, por exemplo, possui cerca de 60% das reservas industriais de crómio e 80% de manganês e platina).Ao Canal de Moçambique deve adicionar-se a ZEE a que o país tem direito, bem como a FIR da Beira.A ligação deste “espaço” ao Atlântico Sul, aparenta ser de grande importância para o desenvolvimento de Moçambique, ajudará à sua coesão interna (a longa faixa norte/sul do território é geopoliticamente fraccionável) e defendê-los-ia da colocação de excessos populacionais indianos (a União Indiana olha para a África Oriental como um prolongamento natural da sua geografia…), e do neocolonialismo chinês que tende a tudo invadir (Angola incluída), ao passo que andam a adquirir terras cultiváveis que lhes forneçam bens alimentares de que tanto carecem.À CPLP convirá todas as acções que possam “libertar” Moçambique da Commonwealth e outras organizações que operam na região. Tudo isto se passa no Índico, oceano com 65.5 milhões de Km2, ou seja a quinta superfície marítima do globo.O Índico é o terceiro oceano mais vasto do planeta, liga-se ao Atlântico a SW; ao Pacífico, a Leste e à Antárctida, a Sul, tem uma profundidade média de 3.480 m, a sua maior distância N/S é de 9.000 Km e E/W de 10.000 Km. Contém um número assinalável de choke points como são, o Cabo da Boa Esperança, Àdem, Ormuz, Socotorá, Malaca, Estreito de Sonda, Estreito de Lombok, Timor, Torres, etc., e o próprio Canal de Moçambique, a Norte.Do Mar Vermelho e do Golfo Pérsico, as zonas de maior produção de petróleo e gás natural do planeta (cerca de ¼ da produção mundial e 2/3 das reservas conhecidas), saem quatro rotas para a Europa, América do Norte e Japão, por onde são exportados algo como 460 milhões de toneladas/ano, daqueles produtos. É também pela via preferencial do Canal do Suez que passam a maioria do tráfego de produtos manufacturados entre a Europa e o Japão, que rondam os 190 milhões de toneladas.A Grã-Bretanha retirou-se militarmente da região, mas os EUA possuem grandes bases na Ilha de Diego Garcia e aumentaram muitíssimo as suas forças no Médio Oriente desde a invasão do Iraque. A França mantém a sua presença em Djibuti, na Reunião, Mayotte e ilhas dispersas. E tem influência nas Maurícias, Seichelles, Madagáscar e Comores. A Rússia, depois da queda do muro e do fim da sua influência na Somália e Etiópia, praticamente não têm influência no Índico, salvo as boas relações que mantém com a União Indiana e o Irão (enviou navios para o Corno de África, por causa da pirataria). A UI e o Paquistão concentram por si só, uma tensão permanente e uma corrida aos armamentos.Finalmente, toda a zona oriental de África mantém-se pobre e com inúmeros conflitos e carências de toda a sorte, ao passo que a zona marítima do corno de África às Seicheles e ao Mar Vermelho passou a estar infestado de piratas o mesmo se passando junto ao Arquipélago Indonésio e Península da Malásia.É toda esta panóplia geopolítica e geoestratégica de riscos e oportunidades que se depara a uma expansão da CPLP e de Portugal naquela vasta área.(5) Outros dois EEIN podem ser definidos mas agora apenas no âmbito económico/financeiro e cultural. Estamos a referir-nos a uma área que englobe a Abissínia, Oman e a costa leste da União Indiana, que abranja Goa, Damão e Diu (àreas onde chegámos ainda nos finais do século XV!). Este é um espaço bem conhecido historicamente pelos portugueses onde a memória da sua presença permanece e que deve ser potenciado para a manutenção do antigo património arqueológico, laços culturais e abertura de negócios úteis para as partes.Do mesmo modo se deve actuar no Extremo Oriente, a fim de garantir a presença cultural portuguesa em Timor Leste (onde arribámos, em 1517) e Macau (1555), complementadas pelos antigos laços que nos ligam ao Japão (1543) e Tailândia 1516), escolhidos como pontos de potencial esforço diplomático/comercial (não é por acaso, certamente, que o Navio-Escola Sagres, na terceira volta ao mundo que anda a efectuar, toca praticamente em todos os pontos referenciados...)[14].Em complemento destes EEIN e dos restantes, poderiam ser elaborados “roteiros lusíadas” em diferentes partes do globo, que englobariam e ligariam todos os locais onde os portugueses marcaram ou deixaram vestígios da sua presença, que deveriam constituir um forte incentivo ao turismo, à divulgação cultural e à coesão e inspiração do mundo que os portugueses criaram.(6) Finalmente, os EEIN, que interessa considerar são aqueles que podem ser projectados pelas chamadas “novas fronteiras”: o Espaço, o leito dos Oceanos e a Antárctida.Portugal não pode ficar de fora do desenvolvimento a ser efectuado nestes âmbitos.Mais uma vez, não tendo o nosso país recursos suficientes para lidar com estes assuntos por si só, terá que fazer uso dos organismos/alianças internacionais, de que faz parte para deles colher usufruto. A complementaridade que fará do seu investimento dependerá da habilidade e vontade política de que dispuser.Mais uma vez a CPLP pode vir a ser um actor fundamental neste desiderato.
(a) Espaço.
(b) Leito dos Oceanos.
(c) Antárctida
* Sócio Efectivo da Revista Militar.