Começam agora a chegar a público as reais consequências da tão proclamada reforma “Defesa 2020”, apontada como instrumento para aumentar a operacionalidade das Forças Armadas e o seu reforço, como instrumento da política externa e cumprimento das missões constitucionais de afirmação e defesa da soberania nacional.
Uma reforma que tem como argumento para o seu êxito a repetida referência, pela tutela, de uma “economia” de 1300 milhões de Euros de gastos com as Forças Armadas nos próximos anos (?), mas que importa explicitar como são obtidos e que consequências vão ter, quer no presente, quer no futuro, designadamente as implicações estruturais na composição, organização e componente operacional de toda a Instituição Militar.
Uma reforma que, para atingir aquela “economia”, aponta como grandes medidas, a redução de efectivos; a redução de infra-estruturas; o cancelamento de programas de reequipamento; a venda de equipamentos; cortes na assistência, na saúde e no apoio à Família Militar, em claro desrespeito pela Condição Militar e pela Lei 11/89, de 1 de Jun.
A realidade do atual Hospital das Forças Armadas é bem o espelho dessa reforma, que produziu até agora uma infra-estrutura com insuficiência de blocos operatórios, de camas para internamento, com menos valências hospitalares, com carências de medicamentos e de consumíveis, com menos pessoal médico e paramédico, aumentos de tempo em listas de espera e com uma capacidade de resposta na Urgência inferior à que existia no Hospital Militar Principal.
Em relação aos efetivos, as Forças Armadas perderam cerca de 25%, tendo como referência os quantitativos presentes nas fileiras em 2011, fruto do cancelamento de incorporações, não renovação de contratos, congelamento de promoções e constrangimentos organizacionais que, no Quadro Permanente, levou ao aumento de passagens à Reserva, à diminuição de ingressos na Academia Militar e na Escola de Sargentos. A situação é ainda mais gravosa, uma vez que os efectivos autorizados pela tutela passaram a incluir os efetivos em instrução e formação, quer em voluntários e contratados, quer no QP, cadetes e futuros sargentos, portanto não prontos, o que significa menos efetivos disponíveis para a componente operacional.
No que se relaciona com os programas de reequipamento, o que se assistiu foi ao seu cancelamento, deixando uns inacabados e outros abandonando-os pura e simplesmente, ignorando verbas já investidas, como é o caso do projecto “Pandur” e o projecto “NH-90”, respectivamente. Estão ainda por esclarecer os custos da saída destes programas, face às penalizações por não cumprimento dos compromissos contratuais assumidos na assinatura dos mesmos, para além daqueles que resultam das avenças pagas aos escritórios de advogados, que hoje conduzem as negociações judiciais. De mencionar ainda a opção de investir milhões de Euros na modernização de sistemas de armas, para em seguida os alienar, como irá acontecer com os aviões F-16 da Força Aérea.
A Lei de Programação não conduziu qualquer investimento para programas de reequipamento, durante os anos de 2012 e de 2013, limitando-se a pagar compromissos assumidos relativamente a projectos que vinham dos anos anteriores e a satisfazer algumas necessidades, inadiáveis, em termos de manutenção dos grandes sistemas de armas. Naqueles anos, nenhum projecto de reequipamento das Forças Armadas foi lançado, nem os que do antecedente eram considerados indispensáveis e que evitariam que algumas das nossas Forças Nacionais Destacadas tivessem de actuar em teatro de operações, com material emprestado.
Relativamente ao Dispositivo, a orientação estratégica desta reforma é o corte de 30% das infra estruturas, não se entendendo como é que isso se poderá processar em cada um dos Ramos, o que importa preservar ou o que se pretende integrar.O que é evidente é uma clara intenção de alienar património, sem qualquer programa de orientação das mais-valias obtidas e do que é que as Forças Armadas poderão beneficiar disso.
Ainda recentemente, o senhor Ministro da Defesa Nacional, sobre a reforma, confirmava, publicamente, que o resultado atual, não tinha a ver com as perspectivas futuras decorrentes de investimentos realizados, mas sim com as economias resultantes daquilo que designou por “ajustamentos imediatos, em linguagem coloquial: cortes” e, como referiu um importante órgão de comunicação social – nada mais.
A realidade é bem diferente e o panorama atual, de uma reforma que pretendia reforçar a operacionalidade, são umas Forças Armadas abaixo dos mínimos em termos de efetivos, sem qualquer programa de modernização no quadro de um processo de reequipamento, com redução de sistemas de armas, por alienação, sem recursos para garantir, quer uma manutenção adequada dos equipamentos ainda existentes, quer o treino que é devido às tropas, sejam os exercícios em terra, no mar e no ar, seja a rotina da operação dos equipamentos, terrestres, aéreos e navais. Continuamos com a ilusão irresponsável, de que com menos é possível fazer mais, numa atividade em que, na maioria das vezes, o erro se paga com a vida.
Importa não esquecer que continuamos a pertencer à OTAN, em que os vários Estados membros assumem compromissos e se comprometem a concretizá-los. No caso de Portugal, o compromisso orçamental, por norma não é respeitado, mas actualmente isso é ainda mais notório. Fez-se a afirmação pública, em documento de cariz estratégico, de que, a partir de agora e no futuro próximo, o Orçamento das Forças Armadas seria de 1,2 % do PIB, mas ignorou-se isso, logo no primeiro ano de aplicação do critério anunciado. Num mundo globalizado a informação não tem fronteiras ou compartimentos estanques e as atitudes e comportamentos não deixam de marcar os seus autores, positiva ou negativamente, perante os seus parceiros.
Nasceu em Sintra, em 21 de Abril de 1947, e entrou na Academia Militar em 6 de Outubro de 1964.
Em 17 de Dezembro de 2011, terminou o seu mandato de 3+2 anos como Chefe do Estado-Maior do Exército, passando à situação de Reserva.
Em 21 Abril de 2012 passou à situação de reforma.
Atualmente exerce as funções de Presidente da Direção da Revista Militar e de Presidente da Liga da Multissecular de Amizade Portugal-China.