O Conselho da União Europeia, de dezembro, ao colocar na Agenda como ponto de discussão a ‘Política Comum de Segurança e Defesa’ (PCSD), levanta naturais expectativas, uma vez que as decisões sobre esta matéria, nos últimos anos, têm sido pouco assertivas, levando a resultados com pouco significado, quer político quer no domínio operacional e emprego de meios. Embora os “Battle Group” sejam uma realidade, não serviram ainda para uma efetiva afirmação militar da União Europeia (UE).
Sobre esta matéria, a Assembleia da República organizou um interessante Seminário, com conferencistas civis e militares, nacionais e estrangeiros que, durante dois dias, debateram os temas da PESD e da PCSD, proporcionando um debate, de onde foi possível extrair quatro grandes grupos de preocupações: a necessidade da construção efetiva e consolidação da PCSD; a oportunidade da sua concretização; a falta de vontade política para esse desiderato, associada à crise financeira e económica europeia e às naturais críticas das opiniões públicas, quanto aos necessários investimentos nesta área; por último, a visão de que a OTAN continuará ser a Organização relevante neste domínio e que será aqui que europeus e americanos continuarão a desenvolver a defesa europeia.
Não se sabendo, naturalmente, qual será a orientação do debate e as conclusões do Conselho Europeu, as preocupações expressas no Seminário da Assembleia da República, dão-nos uma ideia quanto às perspetivas nacionais sobre a matéria que, face ao que se tem construído no quadro da UE, relativamente à PCSD, não será muito diferente dos restantes parceiros europeus, talvez apenas com a exceção da França e do Reino Unido.
No que se refere à necessidade da efetiva capacidade da PCSD, isso decorre da evidente incapacidade da UE para assumir responsabilidades militares significativas, sem o apoio americano, fruto das lacunas de capacidades militares relevantes, da inexistência de reservas de equipamentos e sistemas de armas e de informação, indispensáveis para combater a conflitualidade atual, como foi constatado na situação da Líbia e, mais recentemente, nos avanços e rápidos recuos, no caso da Síria.
Quanto à oportunidade, os incentivos americanos vão nesse sentido, decorrendo de um seu discreto, mas progressivo menor empenhamento na OTAN, numa afirmação de maior interesse estratégico na região Ásia-Pacífico. Por outro lado, há a considerar uma atitude mais proativa em termos políticos e estratégicos por parte da Rússia e da China, e ainda o arco de instabilidade, que se estende da margem sul da Bacia do Mediterrâneo, ao Médio Oriente e ao Irão.
Quanto à falta de vontade política e à atitude das opiniões públicas, estamos perante uma contradição entre o reconhecimento político de uma necessidade e a prática do seu contrário, a par de uma falta de pedagogia política das opiniões públicas, que serve de álibi à inação e que legitima a ausência de decisões neste domínio. Contudo, a sensibilização das opiniões públicas e dos líderes de opinião, para estas questões, é uma responsabilidade política, quer dos Governos quer dos Parlamentos que, pelo resultado final, não tem existido, mas cuja realidade não pode servir de justificação para a situação atual.
Por último, quanto à atitude de conforto europeu que representa a existência e funcionamento da OTAN, deve dizer-se que o facto de a afirmação política da defesa europeia se fazer naquela Organização, constitui uma forma subtil de disfarçar a absoluta indispensabilidade das capacidades militares americanas, exatamente as lacunas operacionais europeias, sempre reconhecidas, mas nunca minoradas, apesar do “Capability Development Plan” (CPA), da Agência Europeia de Defesa (EDA) e, mais recentemente, do conceito “Pooling and Sharing”.
Por outro lado, para além das insuficiências europeias no domínio militar, no seio da Aliança, não se percebe o que leva os responsáveis europeus a fazerem uma afirmação de maior empenhamento na defesa europeia, a nível OTAN, quando a vontade política e a postura das opiniões públicas, em cada um dos seus países, é aquela que atrás se referiu e nada, que se sinta e veja, está a ser feito para que isso se altere.
O caso nacional é exemplo bem ilustrativo dessa postura política, um discurso político de afirmação europeia, de múltiplas referências aos CPA, EDA e “Pooling and Sharing”, mas uma prática, no domínio da política de defesa, que aprova um CEDN que desvaloriza a defesa militar, relativamente às missões de apoio à política externa e as de interesse público e põe em prática uma reforma, que tem como grandes objetivos, menos efetivos, menos sistemas de armas, leia-se menos capacidades militares, incluindo algumas que são lacunas operacionais identificadas a nível europeu, como é o caso do apoio da saúde militar, a mobilidade tática e a disponibilidade de helicópteros.
Resta assim aguardar pelo Conselho Europeu para se poder aquilatar, finalmente, se o discurso político pretende, efetivamente, caminhar no sentido da materialização de uma PCSD, mesmo que de forma faseada, ou se iremos assistir, uma vez mais, a declarações vagas e à eleição de novos conceitos políticos, de interpretação alargada, que legitimem o “status quo”, que caracteriza uma UE sem visão estratégica coerente, de duvidosa vontade de defesa, individualista do ponto de vista das políticas de defesa nacionais e incapaz e inapta para se constituir parceiro, nas grandes questões da paz, da segurança e da estabilidade mundial.
Nasceu em Sintra, em 21 de Abril de 1947, e entrou na Academia Militar em 6 de Outubro de 1964.
Em 17 de Dezembro de 2011, terminou o seu mandato de 3+2 anos como Chefe do Estado-Maior do Exército, passando à situação de Reserva.
Em 21 Abril de 2012 passou à situação de reforma.
Atualmente exerce as funções de Presidente da Direção da Revista Militar e de Presidente da Liga da Multissecular de Amizade Portugal-China.