Nº 2543 - Dezembro de 2013
Pessoa coletiva com estatuto de utilidade pública
Conselho da União Europeia de dezembro de 2013, consequências para a Política Comum de Segurança e Defesa
Coronel
Nuno Miguel Pascoal Dias Pereira da Silva

1. Introdução

 

O Conselho da União Europeia (UE), de dezembro de 2013, vai ter como um dos pontos da agenda mais importantes a discussão da Política Comum de Segurança e Defesa (PCSD). Este ponto de agenda, serviu-nos para refletir, cerca de dois anos depois do último artigo que publicámos na Revista Militar sobre este assunto, que tanto nos tem apaixonado ao longo da última década, tendo em vista verificar exclusivamente se a criação dos “Battle Groups”, única estrutura de forças em termos permanentes existente à disposição das UE, foi importante na operacionalização da PCSD, bem como se houve alguma evolução relevante na eliminação/mitigação das principais lacunas (“Shortfalls”) existentes e sobejamente conhecidas, e identificadas na UE.

 

 

2. A gestão de crises e as missões da UE

 

2.1. O “Comprehensive Approach” a nível institucional

 

A conceptualização, apresentação para aprovação ao Conselho e posterior implementação duma política integrada e holística que permita que a PCSD e a consequente Gestão de Crises na UE saiam do âmbito exclusivo do Conselho, permitindo que a Comissão e o Parlamento, através da sua subcomissão de defesa, possam entrar neste processo, parece ser essencial para que a PCSD possa dispor de todos os instrumentos que as instituições da UE já dispõem, tendo em vista tornar-se mais eficiente e eficaz na resposta global a uma eventual crise ou conflito fora das fronteiras da UE.

 

2.2. O “Comprehensive Approach” ao nível político estratégico

 

2.2.1. A criação de novos conceitos e mecanismos de resposta a crises no seae[1]

 

A conceptualização e implementação duma abordagem integrada, no âmbito específico da gestão de crises da UE a nível político-estratégico, deverá ser efetuada usando como interface o SEAE. Esta nova abordagem será facilitada pelo fato de ter sido atribuída a chefia do SEAE a uma só entidade, que é, simultaneamente, a representante da PCSD no Conselho e a responsável pelas Relações Externas na Comissão.

O conceito de “Comprehensive Approach” a nível político estratégico deverá permitir uma maior e mais abrangente coordenação de toda a Gestão Civil e Militar de Crises na UE, facilitando e permitindo o desenvolvimento de novos órgãos e mecanismos de resposta a crises.

O SEAE, nos últimos dois anos, agregou todos os órgãos relacionados com a PCSD já existentes no Conselho, reestruturou-os, articulou-os e deu-lhes coerência no planeamento, na execução e na monitorização das crises.

No SEAE foram integrados, desde o início do processo de gestão civil crises, todas as dimensões civis necessárias para o sucesso de uma missão civil – das quais destacamos, a justiça e a segurança – num órgão designado por “Civilian Planning Capability Conduct” (CPCC).

Em termos exclusivamente militares parece faltar o equivalente ao CPCC, pois ainda não houve vontade política de dotar a UE de uma capacidade efetiva de efetuar “Military Strategic Advance Planning”. Para criar esta capacidade no SEAE, obviamente que este teria que ser reforçado com militares.

Em nossa opinião, ao nível operacional (na UE corresponde ao nível estratégico) deve ser privilegiada uma abordagem integrada (‘Comprehensive Approach’), articulando as componentes civis (política, diplomática, económica, policial e judiciária) e militares, de acordo com as necessidades de cada missão, o que constitui condição indispensável para o seu sucesso.

As atuais crises, e as que se preveem no futuro próximo, são cada vez mais complexas, impondo-se soluções ao nível civil e militar, desde o início das mesmas, razão pela qual se deve considerar que a opção mais adequada não passa pela criação de duas estruturas distintas, mas antes a conceção de uma estrutura integrada, de base permanente.

 

2.2.2. Estrutura de forças e nível de ambição

 

Battle Group

A UE desenvolveu, na sequência da intervenção francesa na República Democrática do Congo e da intervenção Britânica na Serra Leoa, o Conceito de “Battle Group” (BG), tendo em vista dotar a União duma Capacidade de Intervenção Rápida, permanentemente à sua disposição, para efetuar eventuais operações de dimensão semelhante às operações que lhe serviram de modelo.

O conceito de BG, – constituição de uma força multinacional com um “Force Headquarter”, mil e quinhentos homens (uma unidade de escalão Batalhão reforçado com meios de apoio de combate e de serviços), apoiados por componente naval e aérea adequada –, após a sua definição, foi operacionalizado, sendo continuamente disponibilizados pelos Estados Membros, dois BG constituídos com base nos Comandos e nas Forças nacionais e multinacionais existentes.

Quando estes BG, que têm que ser obrigatoriamente multinacionais, não são constituídos com base nos Quartéis-generais multinacionais e nas forças multinacionais existentes na Europa, são organizados duma forma “ad hoc”, facto que, como militares, sabemos que não garante a sua eficiência nem eficácia do ponto de vista operacional.

A certificação dos BG não é da responsabilidade da UE, mas sim dos Estados Membros que compõem a força, facto que constitui um fator limitativo da sua operacionalidade.

A eventual utilização desta força, que, até à data, nunca foi utilizada, pressupõe que haja vontade política de todos os Estados Membros em utilizá-la (Consenso), em operações em que se exige uma intervenção num determinado Teatro Operacional quase imediata.

Para além do Consenso, necessário entre todos os Estados Membros, a utilização do BG pressupõe que todas as despesas com a sua utilização sejam efetuadas pelos Estados Membros que o compõem, muito em especial pela “Framework Nation”, facto que, em tempos de crise económica, é difícil que estes a assumam.

Pelo exposto, parece ser importante revisitar este conceito, conforme consta da proposta da Alta Representante para as Relações Externas da UE (HR) para a próxima reunião do Conselho, de forma a melhor o operacionalizar.

A proposta referida, com a qual concordamos de uma maneira geral, refere a necessidade de desenvolver a modularidade da força, tendo em vista evitar a rigidez da sua organização e permitir que os Estados Membros possam contribuir com meios de uma forma mais proporcional. A proposta refere, ainda, a necessidade de promover a realização de mais exercícios para treinar os BG, e que as Forças devam ser sempre previamente certificadas, bem como refere a necessidade de se melhorar o “advance planning”, tendo em vista reduzir o tempo de reação para a sua utilização nos eventuais cenários de atuação previamente identificados e estudados.

Acerca do empenhamento operacional dos BG, a proposta da HR também refere a necessidade de se partilharem custos ou de que estes, eventualmente, possam vir a ser custeados por fundos comuns, baseada no conceito de “Comprehensive approach” em termos institucionais, em que o financiamento da força possa passar para a UE, ou seja a Comissão, após aprovação do Conselho e conseguida a autorização do Parlamento para custear as despesas.

 

 

3. O desenvolvimento de Capacidades Militares na União Europeia

 

3.1. Nível de ambição da UE e geração de Capacidades na União Europeia

 

O atual nível de ambição da UE – ter sessenta mil homens, prontos em sessenta dias para atuar a uma distância de sessenta mil quilómetros de Bruxelas – não nos parece dever ser mexido no atual ambiente de crise financeira em que a Europa se encontra, sob risco de, eventualmente, vir a ser diminuído.

Este objetivo de força ainda não alcançado pela UE, dado que existem vários “Shortfalls” identificados em termos de Capacidades, é um objetivo que permite grande latitude na sua operacionalização, uma vez que não se vislumbra nenhum cenário em que a UE tenha que atuar com um efetivo superior a sessenta mil homens.

As estruturas que foram criadas no âmbito da PESC, ora PCSD, que lhe permite desenvolver Capacidades Militares, são o Comité Militar (EUMC) e os seus dois Grupos de Trabalho (WG), de destacar o “Headline Goal Task Force” (HTF), grupo “ad hoc” estabelecido para o desenvolvimento de Capacidades Militares, e a Agência Europeia de Defesa (EDA).

A EU, como instituição, pretende possuir Capacidades para responder a crises nos níveis Político, Militar, Estratégico e Operacional, não pretendendo possuir Comandos de Forças nem Forças próprias, devendo estas pertencer aos Estados Membros que voluntariamente as colocarão à sua disposição quando necessário.

Na Cimeira de Helsínquia foi estabelecido o HHG[2] que referia, muito sumariamente, que a UE deveria vir a dispor de uma força de escalão Corpo de Exército de cerca de 60 000 homens, capazes de serem projetados até 60 000 Km, para intervir em Operações designadas por “Petersberg”, quando a OTAN não estiver envolvida (“when NATO as a whole is not engaged”).

Para a transformação deste objetivo político em Capacidades Militares e para o seu posterior desenvolvimento, foi estabelecido inicialmente de uma forma “ad hoc” o “Helsinki Task Force”, “Working Group” do EUMC, secretariado pelo Estado-Maior da UE (EUMS).

Os peritos nacionais que constituíam o HTF, começaram por importar os cenários ilustrativos genéricos da UEO, que consubstanciam as missões designadas por “Peteresberg”, designadamente a Prevenção de Conflitos, Separação de Partes pela Força, a Estabilização dum conflito, as Ações Humanitárias e a Evacuação de Cidadãos da UE de países terceiros para, em seguida, com base nesses cenários, elaborar uma listagem de Requisitos e Capacidades necessárias para atingir o HHG, que se designou por “Helsinki Requirements Catalogue” (HRC). Os requisitos listados no HHG foram certificados pela agência da OTAN designada por NC3A.

Após a aprovação dessa listagem, foram pedidos aos Estados Membros contribuições voluntárias com Forças que respondessem aos requisitos expressos no Catálogo, tendo-se com essas forças elaborado o “Helsinki Forces Catalogue” (HFC)[3].

A diferença entre as Capacidades que se pretende vir a possuir listadas no HRC, e as que foram disponibilizadas voluntariamente pelos Estados Membros em termos de Forças listadas no HFC, foi a base para a elaboração do Catálogo com as lacunas (Shortfalls) que se designou por “Helsinki Progress Catalogue” (HPC), ou seja, as Capacidades que a UE precisava de vir a adquirir para atingir o HHG.

Após a aprovação do HPC no Conselho da EU, foi lançado o “European Capability Action Plan”, tendo em vista resolver o problema das lacunas na UE. Portugal, neste processo, disponibilizou um Quartel-general de Operações Especiais, lacuna então existente na UE e que foi colmatada.

Este processo de elaboração dos Catálogos foi repetido duas vezes, entre 2003 e 2007, tendo Portugal, em 2007, então na Presidência da UE, finalizado o, agora, designado por “Progress Catalogue” (PC).

Na revisão do processo do “Headline Goal”, finalizada em 2007, foi introduzido um novo cenário designado por Assistência a Estados Falhados e entrou-se em linha de conta com a ameaça transversal do terrorismo em todos os cenários, facto que implicou que todas as forças da UE projetáveis para o exterior necessitassem de maior proteção, logo, requisitos mais exigentes em termos de proteção da força.

Ainda em 2007, foi estabelecido e aprovado no Conselho um novo processo de desenvolvimento de Capacidades Militares, designado por “Capability Development Plan” (CDP).

O CDP é um processo muito complexo que em nosso entender devia ser simplificado, em que o MC e a EDA, têm diferentes responsabilidades na priorização das lacunas, facto que terá influência no desenvolvimento de novas Capacidades Militares na UE a médio/longo prazo. No CDP estão definidas as responsabilidades específicas do EUMC e da EDA nas quatro fases do processo, designadas por parcelas (“Strands”), em que se entra em linha de conta com as lições apreendidas nas operações da UE, bem como com as tendências de desenvolvimento de novas Capacidades, tendo em vista desenvolvê-las e incorporá-las a médio/longo prazo.

 

3.2. Maximização das Capacidades existentes

 

O “Headline Goal 2010”[4], mais global (“Comprehensive”) do que o primeiro, que era estritamente militar, obrigou a que se revisitasse novamente todo o planeamento de forças (desenvolvimento de Capacidades), pois implicou que fosse elaborado um novo Catálogo de Forças que listasse, pela primeira vez, as Capacidades Civis e Militares existentes na UE.

Atualmente, neste âmbito, está a ser novamente pedido aos Estados Membros que coloquem mais forças e meios à disposição da EU; como sabemos, os Estados Membros têm mais forças do que as que disponibilizam voluntariamente para o Catálogo de Forças da EU que, por esse facto, está longe de ser o somatório dos inventários das Forças existentes nos Estados Membros.

Esta nova revisitação dos Catálogos permitirá otimizar as sinergias civis e militares o que, conjugado com a sempre presente intenção de evitar duplicações com a OTAN, poderá ser importante para maximizar as Capacidades da UE.

Numa nova revisão dos Catálogos a efetuar, eventualmente, após o Conselho do corrente ano, em termos de desenvolvimento de Capacidades, poderemos ter de revisitar todos os cenários ilustrativos genéricos do Catálogo de Requisitos, tendo em vista introduzir transversalmente requisitos suplementares relacionados com a “Cibersegurança”, bem como, eventualmente, introduzir novos cenários ilustrativos para que a UE possa planear forças e meios para fazer face à instabilidade no Sudoeste Asiático, aos cenários de conflito emergentes na região da India-Pacífico, a eventuais respostas aos regimes agressivos no Médio Oriente, e a ameaças da pirataria à livre circulação dos hidrocarbonetos e do comércio mundial. Esta revisão de requisitos poderá implicar, após uma adequada análise operacional, que a UE necessite de mais Capacidades e/ou de outros tipos de Capacidades que não tinham sido equacionados até à data no CDP.

 

3.3. A EDA e o “Pooling and Sharing”

 

Antes de a EDA ter sido estabelecida, foram realizados vários seminários, com peritos militares, investigadores operacionais, cientistas, entre outros, provenientes dos diversos Estados Membros da UE, tendo em vista estabelecer uma visão de longo prazo, (“Long Term Vision”) para 2014, de acordo com as prospectivas de desenvolvimento estabelecidas nos diversos domínios, tendo em vista determinar qual o futuro papel da agência no desenvolvimento das Capacidades Militares a médio /longo prazo.

Na sequência dos referidos seminários, a EDA foi implementada em 2006 e formalizada posteriormente no Tratado de Lisboa, em 2007, tendo em vista criar uma Agência Intergovernamental, onde estão representados todos os Estados Membros da UE aos mais diversos níveis de decisão, desde os Ministros da Defesa no seu “Steering Board”, aos Diretores Gerais de Armamento e aos peritos nacionais provenientes das Direções Gerais de Armamento.

Uma das missões da EDA é estabelecer a ligação entre as universidades e os seus investigadores, as indústrias de defesa Europeias e os decisores políticos, tendo em vista desenvolver projetos conducentes ao desenvolvimento de Capacidades Militares. Neste sentido, a EDA pretende servir de “motor” para o desenvolvimento das indústrias de defesa dos Estados Membros.

A agência tem ainda como missão atuar como facilitadora de todo o processo de “Procurement” dos Estados Membros, desenvolvendo projetos onde se pretende que participem o maior número possível de Estados Membros.

No Âmbito do CDP, em julho de 2008, foi efetuada a primeira priorização das lacunas listadas no PC e, em 2011, a segunda, após várias negociações, tendo em vista conseguir que o interesse coletivo da UE seja coincidente com o dos Estados Membros, para que haja consequências efetivas no desenvolvimento das acordadas dez mais importantes Capacidades em falta (Top Ten).

O “Top Ten” das lacunas atualmente existentes na EU em termos de Capacidades é relativo a: “Counter Improvised Explosive Devices”(C-IED); “Medical Support”; Intelligence Surveillance Target and Reconnaissance”; “Cyber Defense”; “Increased Availability of Helicopters”; “Multinational Logistic Support”; “CSDP Information Exchange”; “Airlift Management”; Fuel and Energy”; “Mobility Assurance”.

O conceito de “Pooling and Sharing” foi estabelecido na Cimeira de Ministros da Defesa de Ghent, em setembro de 2010, e, em março de 2012, o “Steering Board” da agência, ao nível de ministros da defesa, atribuiu especificamente a missão à EDA de desenvolver e pôr em prática o conceito, em virtude da Agência ser, por excelência, o órgão onde este conceito se pode consubstanciar na prática.

Tendo em vista mitigar algumas das atuais lacunas, a EDA já desenvolveu algumas Capacidades e projetos relativos ao C-IED no Afeganistão, nomeadamente, instalando um laboratório com a missão de romper as redes de IED (“Disrupting IED networks”), bem como efetuou, em 2012, também no Afeganistão, treino específico nesta área, ministrando um curso específico a alguns Estados Membros que o integraram. Para além destes processos relacionados com IED, a EDA está ainda a desenvolver efetivamente projetos na área de treino de helicópteros e de exercícios com algum sucesso.

Em termos de “Air to Air Refueling”, a EDA iniciou um projeto, atualmente ainda numa fase embrionária, tendo em vista resolver esta “Enabler Capability”, identificada como muito crítica na operação da Líbia, no entanto. a maioria das outras “Enablers Capabilities” está ainda por resolver, por manifesta falta de vontade dos decisores políticos dos Estados Membros em desenvolvê-las.

A EDA, atualmente, possui as capacidades necessárias para efetuar a coordenação estratégica, tendo em vista desenvolver projetos de cooperação bilaterais e multilaterais direcionados prioritariamente para as dez principais lacunas apresentadas em 2011. O trabalho desenvolvido neste âmbito, pela EDA, facilitará a Cooperação entre os diversos Estados Membros de uma forma mais estruturada, quer em termos de planeamento integrado de defesa quer em todos os processos subsequentes de “Procurement”, incluindo a Investigação e Desenvolvimento (I&D).

A Cooperação entre Estados Membros é a única forma de desenvolver e de adquirir as Capacidades requeridas, devido ao facto de serem muito dispendiosas. Nenhum Estado Membro, de momento, parece ter a capacidade de desenvolver as “Enablers Capabilities” sozinho.

As principais lacunas só podem ser mitigadas aumentando a cooperação entre todos, o “Pooling and Sharing” parece ser a forma de tornar mais eficientes os gastos em defesa, numa altura de escassos recursos financeiros.

O “Pooling and Sharing” é, na prática, um método de desenvolvimento de Capacidades, muito flexível e pragmático que permite que os Estados Membros participem duma forma concreta em iniciativas cooperativas.

No domínio do desenvolvimento de novas Capacidades, a UE ainda não desenvolveu nenhuma Capacidade em comum, dada a característica intergovernamental da PCSD.

A utilização por civis e militares de algumas Capacidades, (“Dual Use”), é uma porta que a Comissão recentemente abriu para poder financiar alguns projetos de I&D, bem como para, eventualmente, poder financiar a aquisição das mesmas de uma forma comum, facto que poderá ajudar a resolver algumas lacunas críticas já identificadas.

Eventualmente, poder-se-á prospectivar que, num futuro próximo, as Capacidades Militares possam vir a ser desenvolvidas no quadro da Comissão em cooperação com a EDA, se tal for englobado numa perspetiva de desenvolvimento das Indústrias de Defesa Europeias, que são fundamentais para a manutenção de postos de trabalho e para o desenvolvimento das economias atualmente em crise na maioria dos Estados Membros.

 

3.4. Capacidades necessárias para 2025

 

Em 2007, a EDA estabeleceu uma nova visão (“Long Term Vision”) para 2025, visão que foi posteriormente revisitada pelo Instituto de Estudos Estratégicos (ISS) de Paris, tendo estes dois documentos servido de base para o relatório da HR, que vai ser apresentado ao Conselho, em dezembro próximo.

Nos documentos referidos são escalpelizadas algumas novas Capacidades que as forças militares da UE devem vir a adquirir, tendo em vista responder aos desafios que se virão a colocar a médio/longo prazo, após uma aprofundada análise do atual e do previsível contexto estratégico que ocorrerá no futuro, assim como das eventuais operações em que a UE possa vir a participar.

Na análise do atual e do “futuro” contexto estratégico é realçado que a complexidade das operações a efetuar no âmbito da PCSD será cada vez maior, e que aquelas serão, na sua maioria, de caráter expedicionário, multinacionais e assimétricas, devendo a UE estar preparada para responder de uma forma integrada e global, quer no âmbito do planeamento quer no da conduta das operações. A componente militar será integrada numa campanha global onde serão englobados todos os instrumentos civis de que a UE dispõe.

As Forças Armadas podem esperar que, no futuro, estejam à sua disposição capacidades tecnológicas e científicas que lhe permitirão dispor de meios, facilitando a comunicação e a troca de informações em tempo real, novos sistemas de armas que utilizam novas fontes de energia letais no campo de batalha, permitindo maior precisão e letalidade bem como de proteção contra esses efeitos.

Os planeadores de forças deverão desenvolver e explorar ao máximo as tecnologias de informação, permitindo que sejam tomadas decisões bem fundamentadas, que incluam uma clara visão da situação desde o nível operacional atá ao nível tático.

A capacidade de trabalhar em rede (“Net Workcentric Warfares”) será fundamental no estabelecimento das prioridades das operações da PCSD. No estabelecimento dessa “network”, deverá, sempre, ser tida em consideração a interoperabilidade necessária que tem que existir entre as capacidades civis e militares em todos os níveis, desde o político estratégico até ao tático, para além dos “Standards” OTAN definidos. A melhor forma de garantir a interoperabilidade é a de efetuar “Common Aquisitions”.

O acesso à informação e às novas tecnologias de informação será, no entanto, disseminado muito rapidamente por toda a população mundial, num mundo cada vez mais globalizado, pelo que a eventual vantagem em possuir a mais elevada tecnologia nesta área permite uma superioridade sobre o adversário que poderá, no entanto, ser muito efémera.

As novas tecnologias permitirão efetuar medidas conducentes à redução de pessoal, pois o uso de sistemas de automação, de robots, de Veículos Aéreos Não-Tripulados (UAV) será privilegiado em detrimento dos meios convencionais, que terão cada vez menos influência no campo de batalha.

O desenvolvimento de novos sistemas de armas baseadas na utilização direta de energia parece estar para breve, facto que influenciará todos os níveis da guerra.

De uma forma geral, as novas forças a desenvolver devem possibilitar o estabelecimento de sinergias, ser ágeis, seletivas e sustentáveis, devendo estas caraterísticas ser traduzidas nos seis domínios em que tradicionalmente se dividem as Capacidades, nomeadamente, de comando e controlo, de informações, de empenhamento (“Engage”), de proteção, de projeção e sustentação.

Todas estas Capacidades, necessárias para que, em 2025, a UE seja um ator com relevância na cena internacional, bem como as que ressaltaram e ressaltarem das “Lessons Learned” dos conflitos em que a UE se venha a empenhar, serão introduzidas pela EDA e pelo EUMC no CDP e serão determinantes nas futuras revisões dos Catálogos de Requisitos e de Forças. O desenvolvimento de Capacidades na UE é um processo dinâmico em constante revisão.

 

 

4. Conclusões

 

A eventual utilização dos BG, que à data ainda nunca foi utilizada, pressupõe que haja vontade política de todos os Estados Membros em utilizá-la (Consenso), em operações em que se exige uma intervenção num determinado Teatro Operacional quase imediata.

Para além do Consenso necessário entre todos os Estados Membros, a utilização do BG pressupõe que todas as despesas com a sua utilização sejam efetuadas pelos Estados Membros que o compõem, muito em especial pela “Framework Nation”, facto que, em tempos de crise económica, é difícil que estes a assumam.

Muito embora o desenvolvimento de Capacidades seja um vasto mundo que está em constante evolução, como verificámos ao longo deste estudo, é necessário que haja vontade política por parte dos Estados Membros para adquirir as principais Capacidades em falta, facto que não tem acontecido na última década, malgrados os esforços que têm sido feitos em termos de desenvolvimento de Capacidades na conceptualização, na criação de novos órgãos, na identificação, priorização e implementação de processos, tendo em vista, no seu conjunto, contribuírem para a mitigação/eliminação das principais lacunas identificadas (“Shortfalls”) existentes na UE, de que este Conselho, em dezembro de 2013, é mais uma tentativa, que esperemos seja, finalmente, frutífera.

 


 *     Artigo coligido antes da realização do Conselho da União Europeia, em dezembro de 2013.

**     Vogal Efetivo do Conselho Fiscal da Revista Militar.

 

[1] Serviço Europeu de Ação Externa.

[2] Helsinki Headline Goal: To develop European capabilities, Member States have set themselves the headline goal: by the year 2003, cooperating together voluntarily, they will be able to deploy rapidly and then sustain forces capable of the full range of Petersberg tasks as set out in the Amsterdam Treaty, including the most demanding, in operations up to corps level (up to 15 brigades or 50,000-60,000 persons). These forces should be militarily self-sustaining with the necessary command, control and intelligence capabilities, logistics, other combat support services and additionally, as appropriate, air and naval elements. Member States should be able to deploy in full at this level within 60 days, and within this to provide smaller rapid response elements available and deployable at very high readiness. They must be able to sustain such a deployment for at least one year. This will require an additional pool of deployable units (and supporting elements) at lower readiness to provide replacements for the initial forces.

[3] O processo de desenvolvimento de Capacidades na EU é um processo voluntário, em que os Estado Membros voluntariamente disponibilizam Capacidades para o Catálogo de Forças (FC), bem como integram projetos para desenvolvimento de Capacidades futuras (lacunas), ao invés da OTAN que, nos seus ciclos de planeamento de forças, distribui fatias do “bolo” das capacidades que necessita por todos os países, de acordo com o seu Produto Interno Bruto, necessidades essas que depois são consubstanciadas nos questionários de defesa designados por DPQ.

[4] Building on the Helsinki Headline and capability goals and recognising that existing shortfalls still need to be addressed, Member States have decided to commit themselves to be able by 2010 to respond with rapid and decisive action applying a fully coherent approach to the whole spectrum of crisis management operations covered by the Treaty on the European Union. This includes humanitarian and rescue tasks, peace-keeping tasks, tasks of combat forces in crisis management, including peacemaking. As indicated by the European Security Strategy this might also include joint disarmament operations, the support for third countries in combating terrorism and security sector reform. The EU must be able to act before a crisis occurs and preventive engagement can avoid that a situation deteriorates. The EU must retain the ability to conduct concurrent operations thus sustaining several operations simultaneously at different levels of engagement. (Extrato do Headline Goal 2010)

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2014-04-13
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REVISTA MILITAR @ 2024
by COM Armando Dias Correia