Com este Número, damos início ao 166º ano de publicação ininterrupta da Revista Militar ; mas, em 2015, também se concretiza a digitalização de todos os exemplares publicados até 2003, numa colaboração com a Biblioteca do Exército, passando a Revista a ficar totalmente disponível para a consulta “online”, na Biblioteca Digital Nacional, sem limitações temporais ou territoriais. Além disso, também se mantém o plano editorial, com a previsão da publicação de nove edições, a realização dos tradicionais Encontros da Revista, em parceria com uma Universidade e, ainda, a participação ou realização de Seminários temáticos, nomeadamente sobre a Saúde Militar na Iª Guerra Mundial ou sobre um tema atual.
Relativamente à atualidade nacional e internacional, a nossa atenção continuará focada nas questões que interessam à Defesa Nacional e às Forças Armadas, procurando que a nossa Revista continue a ser um espaço de reflexão e debate sobre essas matérias, assim como relativamente à conjuntura estratégica internacional atual e as suas implicações para a Segurança e Estabilidade da cena internacional.
Neste último domínio, merecem especial atenção a situação na Ucrânia; o Médio Oriente; a barbárie conduzida pelo designado Estado Islâmico; a permanência do Terrorismo; a situação no Iraque e na Síria, neste último a interrogação em como lidar com Bashar Assad e com o seu futuro; mas também na Líbia; na África do Sahel; na Nigéria; a postura estratégica da Rússia e do seu líder Putin, que nos lembrou que a força é para ser utilizada, por quem a detém, quando estão em causa interesses considerados estratégicos ou mesmo tácticos.
Constituem ainda sérios desafios à segurança internacional, a pirataria, a proliferação das armas de destruição massiva, a disseminação das tecnologias de mísseis balísticos, o cyberterrorismo, a necessidade de garantir a segurança do acesso às fontes e continuidade dos fluxos energéticos, a escassez dos recursos estratégicos, designadamente, a água e o permanente aumento da procura de energia.
Os recentes acontecimentos de Paris, a par da intensificação da atividade e do discurso de violência do ISIS, a continuidade da situação na Ucrânia, com a posição da Rússia, tanto no quadro deste conflito como na postura estratégica em relação à OTAN, sugerem a adoção, por parte dos estados-membros da União Europeia, de uma atitude psicológica de disponibilidade para o espírito de defesa, incluindo a pedagogia junto das gerações mais jovens, relativamente à legitimidade da guerra e do emprego da coacção militar, como instrumento político-estratégico, necessariamente não desejado, mas último e indispensável, para defender um projecto político, consentâneo com a segurança, salvaguarda e prossecução do interesse coletivo. Qualquer passividade ou indiferença neste domínio, além de não contribuir para fortalecer o espírito de defesa das populações, indiciaria a um eventual adversário uma fragilidade de poder estratégico, tanto mais gravosa se esta resultasse de uma incapacidade de explicar às opiniões públicas, a legitimidade e a necessidade das despesas com a defesa.
Nesta linha de atitude estratégica, a Europa gostaria de ver um maior empenhamento dos EUA, que favorecesse a sua segurança, mas a atitude estratégica americana, para além de ter uma agenda própria, como aliás é natural, tem preocupações que considera mais urgentes na região Ásia-Pacífico e procura uma nova forma de influência decisiva em termos mundiais, que não o seu empenhamento militar directo. Os EUA parecem estar mais empenhados em utilizar a coacção financeira e económica, agitando-a como “cenoura”, na atribuição de créditos e intervindo nos mercados financeiros e como “pau”, na aplicação de sanções; paradoxalmente, esta atitude pode ter reflexos negativos, quer na relação transatlântica, quer na própria sanidade financeira das grandes companhias americanas.
Esta eventual alteração estratégica de intervenção global, não é isenta de dificuldades; a realidade atual tem mostrado que é cada vez mais difícil aos EUA construir coligações, a par de uma cada vez maior relutância dos aliados europeus em participarem em conflitos abertos, incluindo novos compromissos internacionais. É também evidente a dificuldade do entendimento entre europeus e americanos, em lidar com a Rússia e com Putin, com a política de sanções e os seus efeitos que, embora afete a economia russa, não é indiferente à economia europeia, mas que tem igualmente reforçado internamente a popularidade do líder russo e estimular, perversamente, a sua disponibilidade para agudizar as relações com o Ocidente.
De referir também que, no domínio financeiro, embora a influência americana se faça sentir no FMI e no Banco Mundial, existem outros atores neste espaço, que se assumem como alternativas credíveis e revelam um dinamismo que não pode ser ignorado; em 2014, os BRICS lançaram um Banco de Desenvolvimento, com ativos de 50 mil milhões de dólares e, de acordo com os números de 2013, o Banco de Desenvolvimento do Brasil (BNDES) conduziu investimentos da ordem dos 85 mil milhões de dólares, em comparação com o Banco Mundial que se ficou pelos 52,6 mil milhões de dólares. No mesmo período, o Banco da China para o Desenvolvimento concedeu empréstimos na ordem dos 240 mil milhões de dólares.
No domínio militar, os investimentos nesta área têm conhecido um aumento por parte da Rússia e da China e uma desaceleração, sem surpresas, pela parte europeia; do lado americano a procura da superioridade militar no século XXI, reorientou investimentos para o “cloud computing”, para a inteligência artificial, para as nano tecnologias e para os materiais compósitos avançados.
Em termos nacionais será prudente não perder de vista que as unidades políticas regulam as relações na cena internacional, num quadro de legitimidade, assente em normas, no direito internacional e nas Instituições, mas também na gestão da coação, seja ela militar ou outra. A nível interno e externo, a Instituição Militar e as Forças Armadas são um instrumento de Poder, que gera segurança e ordem, tornam visível o espírito e vontade de defesa e a determinação para a defesa do interesse nacional, devendo para isso serem credíveis em termos de meios humanos e capacidades, de uma forma coerente com a dimensão estratégica do país.
A não observância desta realidade, corresponde à incapacidade para sermos co-autores e co-responsáveis pelas decisões tomadas nas Alianças e Organizações Internacionais a que pertencemos, tornando-nos irrelevantes e dispensáveis, com consequências certamente gravosas para o interesse nacional, quer em termos regionais quer no quadro da CPLP.
Nasceu em Sintra, em 21 de Abril de 1947, e entrou na Academia Militar em 6 de Outubro de 1964.
Em 17 de Dezembro de 2011, terminou o seu mandato de 3+2 anos como Chefe do Estado-Maior do Exército, passando à situação de Reserva.
Em 21 Abril de 2012 passou à situação de reforma.
Atualmente exerce as funções de Presidente da Direção da Revista Militar e de Presidente da Liga da Multissecular de Amizade Portugal-China.